O Cristo, o Papa e a Igreja

Pe. Julio Maria espiritualidade

Tudo sobre a Igreja Católica e o sucessor de Pedro. Conheça a verdadeira história, desconhecida da maioria dos católicos!

Pe. Júlio Maria

Missionário de N.Senhora do SS. Sacramento

O Cristo,o Papa e a Igreja

ou Segredos Íntimos do Papado

TERCEIRA EDIÇÃO

Revista pelo autor

1940

EDITORA O LUTADOR

Manhumirim

 

NIHIL OBSTAT:

P. Angelo Contessotto S.J.

Gonsor ad hoc

IMPRIMATUR

Caratingen,, 15 Aprilis 1935

  Josephus Maria

Episc.. Dicacesanus

REIMPRIMATUR

Coratingen., 7 Augusti 1939

Joannes

Episcopus Dioc.

 

Aprovação
de Sua Excelencia Rvma.
D. José Maria Parreira Lara
D.D. Bispo de Caratinga

Revmo. P. Julio Maria,
Mando-lhe os meus sinceros parabéns pelo seu novo livro: “O Cristo, o Papa e a Igreja” e parabéns também por aproveitar tão bem os talentos que Deus lhe confiou.
Segue o meu Imprimatur, com muito prazer, e envio-lhe a opinião do Censor ad hoc.
O censor escreveu ao Exmo. Sr. Bispo:
“Li o livro de 450 páginas que V. Excia. me remeteu, e edifiquei-me muito com uma leitura tão convincente e sólida.
Acho que “O Cristo, o Papa e a Igreja ou Segredos íntimos do Papado” é obra fadada a produzir um grande bem entre os fracos na fé, que se deixam, facilmente, impressionar com essas discussões protestantes que, apesar de mil teses refutadas, voltam novamente à baila nesse continuo “esporte de hereges”, como classificou essa campanha de discussões o nosso P. Leonel Franca.

Com o meu “Nihil obstat”, como Censor ad hoc, nomeado por V. Excia., vão também os meus sinceros parabéns, por uma obra de tanta erudição e utilidade, no momento.”

P. ANGELO CONTESSOTTO S. J.

 

APRECIAÇÃO DO EPISCOPADO E DA IMPRENSA SOBRE O PRESENTE LIVRO

O ilustre Episcopado é unânime em proclamar as extraordinárias qualidades da presente obra.
Sua Eminência o Cardeal D. Sebastião Leme chama “um livro luminoso que vitoriosamente refuta todas as objeções contra a Igreja.”

D. José Carlos de Aguirre, Bispo de Sorocaba, escreve “Venho passando dias a fio na leitura de seus livros de polêmica religiosa. São admiráveis!

Concedeu-lhe Nosso Senhor, dotes inapreciáveis de clareza, vigor de argumentação, e sobretudo, delicadeza no trato com os adversários, fazendo-se ler por eles com interesse.”

D. Severino Vieira de Melo, Bispo de Piauí, escreve.
“Li, com cuidado, o seu livro: O Cristo, o Papa e a Igreja; gostei imensamente: estou certo de que irá fazer um grande bem.”

D. Rodolfo de Oliveira Pena, Bispo de Barra do Rio Grande, escreve:
"Não posso deixar de afirmar-lhe a minha admiração, pelo talento que Deus Nosso Senhor lhe deu, e que tanto refulge em seu livro admirável: O Cristo, o Papa e a Igreja. Quanto bem vai fazer este livro!”

D. José Maria Parreira Lara, Bispo de Caratinga, mandou ao autor os seus parabéns, pelo livro e por aproveitar tão bem os talentos que Deus lhe confiou.

O Censor Eclesiástico, Pe. Angelo Contessotto S.J. diz na NIHIL OBSTAT, que se edificou muito com esta leitura tão convincente e sólida, que acha obra fadada a produzir um grande bem entre os fracos na fé, com as suas sinceras palavras por uma obra de tanta erudição e utilidade no momento.

A “A Cruz”, do Rio de Janeiro, diz, por sua vez, entre outros louvores; “O Cristo, o Papa e a Igreja é um livro magnífico, uma obra de fôlego destinado ao mais franco sucesso.

O Padre Júlio Maria disserta com proficiência a fé. Em cada um dos assuntos que focaliza se entrevê uma autoridade que fala, um crente que convence, um artista que fascina. É um livro que instrui, não deixando na sombra, uma dúvida sequer, dos pontos combatidos de nossa religião. É um livro que se impõe sem necessidade de propaganda."

O "Diário" de Minas, escreve: “Os livros do Pe. Júlio Maria correm o mundo e são lidos em toda a parte, com o interesse que corresponde aos assuntos palpitantes que ele trata.

Pode-se dizer que em nossos dias, o Pe. Júlio Maria é um dos autores mais lidos, tanto por causa de seu modo vivo, claro e penetrante de expôr as verdades, como pelos assuntos palpitantes que trata.

Em seus livros, e de modo especial no presente livro, “O Cristo, o Papa e a Igreja”, não há banalidades, lugares comuns; tudo aí é novo, cheio de vida, de entusiasmo, e o que é melhor ainda, cheio de uma doutrina sólida, profunda que permite ao leitor penetrar no âmago das questões mais abstratas.

O presente livro, no dizer dos entendidos, é um dos mais belos que produziu o espírito luminoso do grande polemista.”

A “Ave Maria”, de S, Paulo, recomendando o livro, escreve: "Recebemos com grande júbilo outro livro da brilhante pensador P. Júlio Maria. Merece, na verdade, as mais francas e entusiásticas felicitações o espírito culto do conhecido e apreciado escritor por esta sua nova, valiosa produção literária, onde resplandece, mais do que nunca, seu primoroso talento, indiscutivelmente, um dos mais belos de que se possam orgulhar as nossas gloriosas hostes católicas.

Recomendamos, por isso, instantemente, a recente publicação de tão benemérito religioso literato, P. Julio Maria.”

O “Lar Católico”, de Juiz de Fora, escreve também: “Eis um ótimo trabalho do incansável missionário de N. Sra. do Ssmo. Sacramento, que é o Revmo, Pe. Júlio Maria. Realmente: O Cristo, o Papa e a Igreja é uma das melhores publicações do Revmo. Pe. Júlio Maria, e devia ser lida e estudada por todos os católicos que pelas circunstâncias se veem obrigado a estar sempre em contato com protestantes ou maus católicos.”

“Terminemos estas apreciações pela análise do grande publicista, literato, Soares de Azevedo, nas "Vozes de Petrópolis”:

“Espírito combativo, escritor ardente e versado em todas as questões que mais de perto dizem respeito à Igreja Católica, o P. Júlio Maria já é autor de uns 20 livros, todos eles de considerável aceitação em nossos meios de cultura. O livro de agora, mais de polêmica, nem por isso deixa de expôr doutrina muito solida e por processos amenos, não raro jocosos. Assim é que vemos o Pe. Júlio Maria às voltas com as mil e uma acusações que os protestantes formulam contra a riqueza do Papa, o tráfico religioso, as riquezas das padres, as diatribes contra certos pontífices que os protestantes consideram de vida menos austera. Daí passa à constituição da Igreja, aos primeiros papas, à inspiração divina, à tradição e às Escrituras, à infalibilidade, etc.

Conquanto sempre em forma de polêmica, não raro vigorosa, o Padre Júlio Maria oferece-nos um trabalho de grande atualidade, dadas as manifestações dos últimos anos, partidas de sectários impenitentes, contra a vida da Igreja de Deus e a sua atuação nos graves problemas dos nossos tempos. “Obra de erudição e de atualidade” — diz o censor, e nós não precisaremos de dizer mais, por escusado."


Introdução

O mundo moderno quer conhecer segredos.
Tudo o que tem aparência de segredo exerce irresistível atrativo.
Uma ciência, ou uma doutrina, só se torna apreciada pelo seu lado revelador de SEGREDOS.
Segredos do passado ou do futuro... segredos de família ou de consciência... segredos da natureza ou dos transcendentes... segredos desta vida ou de além-túmulo... haja segredos, e haverá leitores... é diante de uma tal disposição quase mórbida que, sem ser profeta, eu mesmo predigo um futuro glorioso para o humilde livrinho, que hoje lanço ao público.
O livro terá sucesso, porque tem segredos... MUITOS SEGREDOS... segredos palpitantes... que quase todos ignoram e que todos deviam conhecer.
O presente livro corresponde plenamente à ansiedade geral de conhecer segredos.
Temos de desvendar um grande segredo... um segredo misterioso.
Um segredo profundo!
Um desses segredos que nos envolvem, nos penetram, excitam a nossa admiração, sem que os mais argutos cheguem a penetrar no âmago da questão e a desvendar o nó enigmático do mesmo.
O mundo quereria conhecê-lo... e parece ter medo de conhecer a verdade.
Porque este medo?
Pela razão de a revelação deste SEGREDO impõe uma norma à nossa vida e uma orientação às nossas ideias.
Ora, tal norma e orientação exigem uma reforma.
Toda reforma exige um sacrifício... e a natureza viciada tem horror ao sacrifício.

***

Este segredo é a Igreja CATÓLICA, é O PAPADO.
Eis uma instituição multissecular, sempre atacada e sempre triunfante... excitando o entusiasmo de uns e o ódio de outros.
Não é um misterioso segredo aquele que é continuamente um objeto de amor e de ódio:
Instituição curiosa...
Donde vem ela?
Que pretende?
Como é feita?
Quais são seus meios de ação?
Qual é a sua base?
Qual a sua força?
Qual o segredo de sua sobrevivência?
Eis umas tantas perguntas que revelam fatos palpáveis e inexplicáveis para muitos, deixando entrever um mistério... um segredo.
E este segredo quero desvendá-lo aqui.

***

O presente livro será um livro REVELADOR para muitos, pois lhes mostrará uma Igreja que desconheciam por completo, ou conheciam apenas através do prisma multicor das calúnias grotescas da impiedade ou das tolas objeções dos protestantes.
É uma Trindade na UNIDADE: Trindade na natureza... unidade na pessoa.
O Cristo, o Papa e a Igreja, — é uma única e mesma pessoa: O Cristo.
São três naturezas distintas.
O Cristo é DEUS.
O Papa é o REPRESENTANTE de Deus.
A Igreja é a OBRA de Deus.
Trindade admirável, cujas relações íntimas constituem uma das mais sublimes páginas de teologia católica!
Penetrar estas intimidades... levantar um canto do véu que encobre estes tesouros divinos... desvendar o segredo que envolve a existência do Papado e da Igreja: tal é o fim destas páginas.
Este estudo foi provocado, como verá o leitor nos primeiros capítulos, por boletins protestantes e consultas católicas.
Após a refutação às objeções, não convinha parar em caminho; e, depois de ter removido a poeira e a lama com que a ignorância e a impiedade procuram embaciar o esplendor do Papado, era mister fazer-se uma exposição clara, simples, teológica, dos segredos íntimos da Igreja, para melhor salientar sua GLÓRIA perante o mundo e sua SANTIDADE perante Deus.
Leiam estas paginas aqueles que, sinceros e sedentos de verdade, procuram a luz para o espírito e o amor para o coração.
Encontrarão aqui os SEGREDOS ÍNTIMOS da Igreja, a sua fonte de vida, sua força no martírio, seu segredo de expansão, seu heroísmo na luta e seu triunfo na virtude.
Não receio repeti-lo: Este livro é um REVELADOR DE SEGREDOS para muitos e muitos... até para homens instruídos que, embora conheçam a Igreja em sua constituição e em sua vida exterior, ignoram-na em sua vida interior e nos segredos de sua fecundidade.
Fazer brilhar e cintilar a verdade — pois ela nunca brilha com demasiado fulgor — e aproximar as almas desta verdade — já que nunca se aproximam bastante — tal é a única aspiração do autor.

P. Júlio Maria S.D.N.


Uma simples aproximação
Entre as numerosas consultas que me chegam, a cada instante, recebi um folheto interessante que demonstra mais uma vez o ódio dos amigos protestantes à Igreja Católica e o seu grande desejo de humilhá-la.
Estamos fartos de saber disso; porém os boletins que eles espalham, além de mostrarem o rancor que os possui à verdade, revelam ao mesmo tempo uma estupenda ignorância dos fatos e da história, e isto não se perdoa num século de civilização e de progresso.
Enviou-me um estudante a seguinte cartinha e o boletim que quero estampar aqui integralmente para dar-lhe uma resposta clara e sólida.


Revmo. Padre Júlio Maria.
Sendo leitor assíduo de vosso extraordinário “O Lutador” e observando, por meio dele, a vossa grande sabedoria, digna dos maiores encômios, resolvi, mediante vossa lucidez proverbial, dirigir-me a vós, pedindo mui respeitosamente a V. Revma. fazer por obséquio a refutação do canhestro paralelo entre Jesus Cristo e o Papa, o qual se encontra no boletim incluso.
Confiado, não no meu pedido, mas na vossa bondade, despeço-me muito grato, e subscrevo-me.

De V. Revma, servo em J. Chr.

BR.


I. O boletim infamante
Jesus Cristo e o Papa (segundo Delilez)
1. Jesus Cristo, o homem de dor, trazia uma coroa de espinhos, a gotejar sangue. O Papa goza todas as delícias e traz uma tríplice coroa real, estrelada de pedrarias.
2. Jesus Cristo nasceu pobre, e pobre viveu e morreu. O Papa possui terras, casas, palácios. É riquíssimo.
3. Jesus Cristo não tinha onde repousar a cabeça.O Papa habita um palácio que contém 11.000 câmaras, o mais vasto do mundo.
4. Só do céu se ocupava Jesus Cristo.O Papa se ocupa somente de política, e tem embaixadores junto de todas as potências.
5. Jesus Cristo veio servir, e dar a vida para redimir a humanidade. Os papas se fazem servir, e têm ocasionado a morte de milhões de homens que não pensavam como eles.
6, Jesus Cristo queria que seus discípulos fossem servos de todos. Dos seus o Papa faz príncipes.
7. Jesus Cristo e seus discípulos curavam as doenças e faziam milagres. O Papa e o seu clero têm torturado e trucidado os homens.
8. Jesus Cristo andava a pé pela Galileia para pregar. O Papa não se move do lugar senão carregado por quatro homens.
9. Jesus Cristo lavava os pés a seus discípulos. O papa dá o seu pé a beijar, salvo uma vez por ano, em que ele finge imitar o Mestre.
10. Jesus Cristo era manso e humilde de coração. O Papa foi sempre intolerante e dominador.
11. Jesus Cristo alimentava as multidões.O Papa se circunda de riquezas e de cofres atulhados de adereços e pedrarias, enquanto o povo da Itália morre de fome.
12. Jesus Cristo ensinava a verdade. O Papa ensina e pratica o contrário do que Jesus Cristo ensinou. Dando mentiras intocáveis, à força imposta ao povo, e que produzem a hipocrisia geral.
13. Jesus Cristo expulsava do templo os vendilhões. O Papa e a Igreja fazem tráfico de cerimônias religiosas: a missa, os sacramentos, as orações, as indulgências, as relíquias, etc.

14. Jesus Cristo ordenava que todos respeitassem as autoridades. papas tem desligado súditos do juramento de fidelidade aos príncipes.
15. Jesus Cristo era a mesma santidade. Leia-se a história de Xisto IV, Inocêncio VIII, João XI, João XI, Alexandre VI, João XXI.
16. Jesus Cristo disse: Amai-vos uns aos outros. Os papas têm acendido ódios, açulado guerras. Trinta anos, Albigenses, Valdenses, S. Bartolomeu, Dragonadas, etc.
Ninguém pode servir a dois senhores — Mt6:24.
Escolhei hoje a quem haveis de servir — Js,24:15.

II. O boletim verdadeiro
O primeiro boletim é o produto do ódio que insulta e blasfema sem saber o que é e o que faz o Papa.
Vou reproduzir aqui o mesmo boletim, mas dando-lhe o termo de comparação verdadeiro.

Jesus Cristo e o Papa
(Segundo a verdade)
1, Jesus Cristo, o homem de dor, trazia uma corda de espinhos, a gotejar sangue. O Papa é o mártir de todos os séculos, flagelado pelos ímpios, coroado de espinhos pelos maçons, cuspido pelos protestantes, vendido pelos apóstatas, blasfemado pelos espíritas, carregando a cruz pesada sob os apupos dos libertinos, comunistas, divorcistas, sexualistas, etc.
2. Jesus Cristo nasceu pobre, e pobre viveu e morreu. O Papa nada possui neste mundo o palácio que ele habita é o patrimônio da Igreja católica, e de nada ali pode dispor, vivendo e morrendo pobre como o seu divino Mestre.
3. Jesus Cristo não tinha onde repousar a cabeça. O Papa repousa a cabeça como Jesus, em cima do travesseiro dos ódios, das blasfêmias, da ignorância e do fanatismo de todos os falsos credos, perdoando seus perseguidores e orando por eles.
4. Só do céu se ocupava Jesus Cristo. O Papa ocupa-se só da Igreja, das almas, da felicidade do seu imenso rebanho e da conversão de seus inimigos.
5. Jesus Cristo veio servir, e dar a vida para redimir a humanidade. O Papa é o servo dos servos de Deus, o pai da humanidade, dando a sua vida para o bem e o progresso da Igreja e da humanidade.
6. Jesus Cristo queria que seus discípulos fossem servos de todos. O Papa exige, conforme o Evangelho, que todos os católicos sejam os servos dos pobres e dos que sofrem, ensinando e praticando a caridade para com todos.
7. Jesus Cristo e seus discípulos curavam as doenças e faziam milagres. O Papa alivia em toda parte a pobreza e o sofrimento; faz milagres, cura doenças, como fizeram Pio X e o Pontífice Pio XI, em diversas ocasiões.
8. Jesus Cristo andava a pé pela Galileia para pregar. O Papa, não podendo ir pessoalmente, pois os papas são sempre homens de idade avançada, manda os seus missionários através do mundo e dos séculos, e ele mesmo, pelas suas encíclicas, instrui e dirige os católicos.
9. Jesus Cristo lavava os pés a seus discípulos. O Papa lavaria até os pés dos protestantes, maçons, espíritas, comunistas, se eles voltassem a Roma, em vez de lançar o seu ódio contra a Santa Sé.
10. Jesus Cristo era manso e humilde de coração. O Papa é o mais humilde e manso dos homens, e quem não o acredita que vá até Roma verificá-lo.
11. Jesus Cristo alimentava as multidões. O Papa alimenta o mundo pela palavra divina, e até a multiplicaria os pães para nutrir os inimigos, se fossem ter com eles.
12. Jesus Cristo ensinava a verdade. O Papa, infalível como sucessor de S. Pedro e de Cristo, nunca errou em matéria de fé e de costumes. Ele é o representante da verdade contra a mentira e o erro.

13. Jesus Cristo expulsava do templo os vendilhões. O Papa expulsa do templo de Deus os sucessores dos vendilhões, os que vendem a sua alma por interesses humanos.
14. Jesus Cristo ordenava que todos respeitassem as autoridades. O Papa manda respeitar toda autoridade legítima nos seus limites, mas não aceita falsas autoridades como Lutero, Knox, Alan Kardec, Staline, etc.
15. Jesus Cristo era a mesma santidade. Entre os 266 papas, desde S. Pedro até hoje, há 86 santos canonizados após verificação rigorosa de suas virtudes e dos milagres por eles operados, e 166 foram homens de excepcionais virtudes.
16. Jesus Cristo disse: Amai-vos uns aos outros. O Papa tem sido sempre o Pacificador do mundo, o exemplo vivo da caridade para com o próximo.

Tal é a comparação desapaixonada, que não simplesmente os católicos devem fazer, mas a que é obrigado todo homem sensato.
Não se trata de julgar um homem segundo a apreciação dos seus mais rancorosos inimigos, mas é necessário ouvir os seus amigos, e sobretudo os indiferentes.
O juízo destes últimos, desde que não haja ódio e obcecação, é mais acertado, pois já estão em melhor condição de julgar imparcialmente a verdade.
Os pobres protestantes, que nunca viram o Papa, que nunca foram a Roma, nem sequer leram um livro a não ser protestante, são incapazes de julgar o Papa porque desconhecem completamente os fatos e a história.


III. Conclusão
Terminemos com o mesmo texto com que termina o folheto protestante.
Ninguém pode servir a dois senhores (Mt.6,24.)
Estamos plenamente de acordo.

O Cristo e Lutero:

Eis aí dois Senhores.
O Papa não é um SENHOR, mas, sim, o sucessor de S. Pedro, o continuador e representante de Jesus Cristo na terra.
Seguir o Papa é seguir a Jesus Cristo.

E Lutero?
De quem é ele o representante e sucessor?
De Satanás, do primeiro revoltoso, do primeiro mentiroso...
Seguir a Lutero é, pois, seguir ao próprio Satanás.

E o boletim protestante termina a sua triste ladainha, dizendo: Escolhei hoje a quem haveis de servir. (Js,24,15).
A nossa escolha já está feita; e se não o estivesse, não haveria nenhuma hesitação.
Seguiremos a Jesus Cristo, representado no mundo pelo Papa, o Pai, e o seu legítimo substituto.
Não seguiremos a Satanás, representado por Lutero, o revoltoso, o libertino, o apóstata, o bêbado...
Escolhei, pois, caros protestantes, e lede bem a vida de vosso fundador, para vos convencerdes de que Deus, a verdade, a santidade, a pureza infinita, não pode ser representado neste mundo por um homem que tão vergonhosamente destoa de toda verdade, de toda santidade e de toda a pureza.(1)

(1) Ler o nosso livro: O diabo, Lutero e o protestantismo, ou segredos internos do protestantismo. Obra de apreciação intima, histórica e moral do protestantismo.

Escolhendo entre os dois, não hesitamos: Queremos o Papa... unicamente o Papa, exclusivamente o Papa, porque somente ele tem credenciais de autoridade divina, de virtude pessoal, com as promessas do próprio Jesus Cristo: Quem vos escuta a mim escuta, e quem vos despreza, a mim despreza. (Lc10,16).

Objeções contra o Papa
Recebi uma consulta interessante, cuja resposta agradará aos protestantes e aos católicos.

Aprecio muito tais consultas, pois tomando em flagrante as ideias dos amigos e inimigos; há ocasião de lançar um jato de luz no meio das trevas acumuladas pelo erro.
Agradeço, pois, ao meu digno consulente, que não é católico, isto é palpável, mas que diz não ser protestante.
Talvez seja ele batista, pois os batistas, dizendo-se descendentes de S. João Batista, não o querem ser de Lutero.
Mas pouco importa a origem da seita que o meu consulente segue; o certo é que a sua consulta levanta grande número de erros que procurarei refutar aqui sem nada omitir, sem nada esquecer, nem desviar, pois a Igreja Católica não receia a luz e o estudo, mas somente a ignorância e o vício.

1. Consulta e resposta geral

Eis a carta em questão:

Andradas, 27 de Junho de 1934.

RVMO. PADRE JÚLIO MARIA.

Rvmo. Senhor:
Antes de dar começo ao assunto principal que me levou a lhe escrever a presente, devo dizer-lhe que não sou protestante e nem espírita.
Li no seu jornal de 24 deste mês o boletim "infamante”, como V. Revma. diz, e também a comparação feita por V. Revma. da leitura de ambas as comparações, a feita pelos protestantes e a feita pelos padres, no meu fraco entender, cheguei à conclusão que V. Revma. pretendeu desviar o assunto, querendo negar o que os protestantes afirmam, dizendo que o Papa não é rico, que “o palácio que ele habita é o Patrimonio da Igreja católica e de nada ali pode dispôr, vivendo e morrendo pobre como o seu Divino Mestre”
Eu, pelo pouco que li da história de Cristo, sei que ele viveu e morreu pobre, mas não sabia que ele, como o Papa, viveu em Palácio!!!
Para evitar o prolongamento desta, peço a V. Revma. esclarecer-me os pontos abaixo, mas com respostas claras e leais, (espero que V. Revma. fazendo exceção dos demais padres que tem a alma da cor da roupa), seja leal, não pretendendo desviar as respostas.

1º O Papa traz ou não a tríplice coroa estrelada de pedrarias?
2º É verdade que o Papa não se move do lugar senão carregado?
3º É mentira que o Papa dá o pé para se beijar?
4º Não é verdade que o Papa e a Igreja traficam as cerimônias religiosas?
5º Dos 266 papas, desde S. Pedro até hoje, os 86 canonizados, por quem o foram? E se todos eles foram homens virtuosos, no tempo das celebres “Fogueiras Santas”, os papas andavam no mundo da lua?
V. Revma, dizendo que de tudo que disse de Lutero, nada disse de si, mas que tudo foi recolhido dos historiadores, Denifle, Grizar e etc., porém esqueceu-se de citar também aqui as histórias de Xisto IV, Inocêncio VII, João XI, Alexandre VI, etc, que também são ótimas!...

Criado ao dispor,

J.M.S.

Além das cinco perguntas, há na carta do amigo, um conjunto de afirmações, ante as quais não devo passar em silêncio, pois se, deveras, ele procura a verdade, é dever meu salientá-la em todas as partes da consulta.
Na resposta ao boletim infamante, não desviei nem uma só vírgula do assunto, mas neguei peremptoriamente o que o tal boletim afirmava.
Basta apenas um pouco de bom senso, para ver o ódio, a má fé e a calúnia em cada linha e em cada palavra de tal CONTRASTE entre Cristo e o Papa.
O raciocínio tem por fim descobrir a verdade entre diversas asserções, como o contraste tem por fim salientar um ponto, comparando-o com outro.
Diga-me, caro consulente: pode o amigo acreditar que o Papa seja tal qual o pintam os protestantes e outros inimigos da religião?
Permitiria o mundo católico, que professa para com o sucessor de S. Pedro sentimentos de obediência, de veneração e de amor profundo, que este homem fosse um monstro, um perverso ou uma espécie de anticristo?
Então o católico, por ser católico, não terá mais nem brio, nem dignidade, nem consciência?
Governadores, reis, imperadores, generais, marechais, sábios e ricos prostram-se diante deste ANCIÃO venerável que se chama o Papa, julgando ser uma honra e uma felicidade, o receber a sua bênção e beijar-lhe a mão, e pode o sr. acreditar que este ancião, que se impõe no respeito e veneração dos homens, do mundo e dos séculos, seja um simples explorador, um perverso, um monstro?
Um município revolta-se contra um prefeito indigno.
Um Estado arranca do trono um presidente vicioso.
Uma nação pega em armas para exilar um, chefe miserável.
E o mundo católico consentiria ser governado por miseráveis exploradores, por monstros humanos, sem revoltar-se, sem protestar e sem, sentir-se envergonhado?
Ah! é demais, caro protestante, e só o ódio, cego é capaz de formular tais baixezas.
Para elevar a dignidade da autoridade suprema, a Igreja católica, que, de certo, bem ultrapassa em cultura, em nobreza, em brio e em virtude, as seitas protestantes, escolhe entre, os seus sacerdotes o que há de mais digno, mais virtuoso e mais capaz... Se escutássemos os protestantes, todos os papas seriam uns monstros humanos!...
Mas, não vê o sr. que isso é insultar à cristandade inteira, que é rebaixar o mundo católico em peso, unicamente para satisfazer a ódio, e rancores?...
Não vê o sr. que um tal procedimento é indigno e que uma tal afirmação não é o produto do raciocínio, nem do exame dos fatos da história, mas unicamente da má fé e do ódio, que diz que o Papa é perverso porque os protestantes dizem que ele assim deve ser?...


II. O palácio do Papa
Vamos à segunda afirmação perversa da carta do nosso amigo batista.
E uma tecla já gasta, a dos palácios e da riqueza do Papa.
Ninguém pode acreditar nisso, como de fato ninguém acredita.
O Papa habita um grande palácio! Perfeitamente, e deve habitá-lo.
Se não tivesse o seu palácio, seria uma suprema humilhação para o catolicismo inteiro.
Não tem o presidente da república o seu palácio? Porque não mora ele numa choupana de palha?
Porque não anda de pés descalços?
Porque?
Tal pergunta é insensata.
Mas apliquemo-la à situação do Papa.
O presidente do Brasil é o CHEFE TEMPORAL de uns 50 milhões de brasileiros, e aí limita-se a sua autoridade.
O Papa é o CHEFE ESPIRITUAL do mundo, a maior autoridade do universo, a mais respeitada, a mais incontestada, a mais extensa, a profícua e mais duradoura.
E este chefe, ao qual reis e imperadores visitam, consultam, prostrando-se reverentes aos seus pés, este chefe não teria direito a um palácio, a um trono e às honras protocolares?
Mas, então, caro protestante, o mundo católico, civilizado, é um mundo de zulus e de índios?
Se o Papa não tivesse um palácio, e até o mais belo palácio do mundo (o que não tem), uma corte, um trono, deixe-me dizer todo o meu pensamento: seria a suprema vergonha dos católicos, como o seria para o povo brasileiro se o seu presidente não tivesse nem palácio, nem ministros, nem honras, nem regalias.
O Catete é o palácio do chefe do Brasil. O Vaticano é o palácio do chefe da Igreja católica.
Digam-me se isso não é lógico e necessário.
E se o é, porque então estes protestos simplesmente grotescos dos protestantes?
É simplesmente inveja, ciume!
O protestantismo não tem chefe, Nele cada qual é chefe, e como tal não precisa de palácio ou corte.
A Igreja é a sociedade monárquica, instituída por Jesus Cristo.
Esta sociedade tem um chefe, e uma autoridade, o sucessor de S. Pedro, e esta autoridade não é uma supremacia mumificada, mas viva, espiritual e social.
Como autoridade ESPIRITUAL deve manter íntegra a religião de Jesus Cristo.
Como autoridade SOCIAL, deve adaptar-se aos usos e costumes dos séculos, enquanto estes usos e costumes são compatíveis com a moral de Cristo.
Os primeiros chefes do Brasil, ao virem de Portugal, para porem os alicerces da civilização brasileira, não encontraram aqui palácios, mas moraram em choupanas, depois em casas coloniais, e só séculos depois é que foi construído o Catete.
Jesus Cristo veio ensinar aos homens a verdade divina como peregrino e missionário, fundou a Igreja católica, sem casa e sem morada fixa.
Pedro foi o primeiro sucessor do Cristo na terra.
Por sua vez, S. Pedro foi, antes de tudo, apóstolo, missionário, pregador do Evangelho, não precisava de palácio e nem podia tê-lo.
À medida que a Igreja foi se organizando, se solidificando, podendo ter o seu centro seguro, os sucessores de S. Pedro fixaram-se em Roma, onde morreram martirizados os apóstolos S. Pedro e S. Paulo; organizaram o centro administrativo da Igreja, os seus arquivos, os seus auxiliares, e, para isso, precisavam de um prédio adequado, adaptado a estas necessidades.
É a origem do palácio do Vaticano.
O Vaticano foi construído sobre o túmulo de S. Pedro, e os primeiros papas já ali fixaram a sua residência.
É aí que em 800 S. Leão II recebeu Carlos Magno e o coroou Imperador.
Foi o Papa Nicolau V que inaugurou as atuais construções do Vaticano em 1447.
O edifício foi se completando, pouco a pouco, conforme as necessidades, até tomar a feição atual, sob o pontificado do Papa Pio VII, o qual foi adaptado às necessidades administrativas do centro da Igreja Católica.
Sim, o Papa mora em um palácio, porque é chefe, é autoridade, e toda a autoridade, para merecer o respeito dos súditos, deve saber respeitar a si mesmo.
E este respeito não é simplesmente a VIRTUDE.
A virtude é interior e muitas vezes despercebida pelos homens; mas o que todos percebem é a MAJESTADE: da imponência, da habitação, do ambiente e da convivência.
Todos os povos civilizados e até incultos exigem isso de seus chefes; e nós, católicos, poderíamos permitir que o nosso chefe, nosso pai e mestre, fosse um vulgar plebeu, pela morada, pela vida, pelo vestuário?
Ah! isso não, meu protestante, nunca!
Em qualquer lugar os próprios protestantes fazem questão que o seu pastor, que nenhuma autoridade possui, seja bem hospedado, trajado e tratado. E a primeira autoridade do mundo, a primeira, seria obrigada a habitar um casebre e andar de pés descalços, a trajar-se de túnica grosseira, sob o pretexto que S. Pedro, ao ser chamado pelo divino Mestre, andava talvez descalço, trajava túnica operária e habitava um humilde casebre?
Mas, meu amigo, tudo isso é grotesco.
Então, o mundo não pode mais progredir, evoluir?
Será preciso conservar os usos e costumes primordiais da raça humana?
Adão e Eva, no paraíso terrestre, vestiram-se de um cinto de folhagem, andavam de pés descalços, dormiam na verde relva e comiam os produtos da natureza em seu estado natural.
Será preciso que a sociedade moderna continue com estes usos?
Em acreditar no protestante assim devia ser.
Mas, então, porque não começa ele a fazê-lo?
Verdade é que o protestantismo, em sua inesgotável fecundidade de ABSURDOS, já produziu os ADAMITAS, seita que toma por base andar nos trajes de Adão.
Mas, felizmente, a polícia encarregou-se de mostrar-lhes que a sociedade progride e possui manicômios, o que não havia no tempo de Adão, e aí foram parar os tais Adamitas.
Mas vamos ao caso de Jesus Cristo e do Papa.
Jesus Cristo viveu neste mundo, pobre, desprezado, sofrendo, e terminou no patíbulo da Cruz, para salvar a humanidade perdida.
Ele passou uma vida de trabalho, de miséria e de opróbrios. Era o Redentor.
Mas, meu caro amigo, lembre-se que Jesus Cristo era Deus, que fazia milagres ressuscitava os mortos, etc.. ele podia humilhar-se, rebaixar-se e sempre ficava grande, sublime, porque era Deus.
E mais Ele se humilhava, mais sublime ficava, pois a grandeza, ao humilhar-se, não se amesquinha, mas aureola-se.
Um rei ou imperador que desce de seu trono, e prostra-se aos pés de um pobre para consolá-lo e servi-lo, torna-se maior neste ato, do que sentado em seu trono, com o cetro na mão e a coroa na cabeça.
Assim foi o Cristo.
Mas o Papa não é o Cristo em pessoa; é o seu REPRESENTANTE.
O Papa, embora revestido de uma autoridade divina, permanece HOMEM, e não tendo a grandeza por natureza, como o Cristo, deve adquiri-la pela situação e majestade de sua vida exterior.
Ele é o REPRESENTANTE de Cristo, e como tal deve cercar-se da dignidade e da grandeza que convém Àquele de quem é representante.
Ele é o CHEFE SUPREMO da Igreja universal e, como tal, deve manter-se numa altura que convém a uma autoridade.
Ele é o PAI DA CRISTANDADE; por isso, deve conservar sobre os seus próprios filhos a autoridade de Pai, pela dignidade e a bondade que exerce sobre eles.
Ora, eu pergunto ao meu caro protestante o que diria o sr. se, indo a Roma, encontrasse ali um simples padre mal trajado, de pés descalços, morando numa casinha pobre, trabalhando num quintal? Que não diria o povo, — amigos e inimigos?
Diria instintivamente: Será este o representante de Cristo, a maior autoridade do mundo? Não pode ser!... Isto é indigno!
E diriam muito bem.
Eis porque o Papa deve ter o seu palácio, a sua corte, a sua guarda de honra, o seu protocolo, as cerimônias solenes, para mostrar a todos a GRANDEZA d'Aquele a quem representa.
Ele é o embaixador de Cristo.
Os povos tributam aos embaixadores as mesmas honras que tributam ao chefe da nação que eles representam.
Devemos, pois, honrar e venerar o Papa, não como PESSOA HUMANA, mas como PESSOA REPRESENTATIVA da autoridade de Jesus Cristo.
E como o Cristo está acima de todas as honras e dignidades, podemos e devemos, de modo relativo, honrar o seu representante... E toda honra está abaixo da que tal representante merece.
Eis porque chamamos o Papa Sua Santidade, ou ainda: O Santo Padre.
É como se disséssemos: A santidade de Cristo, representada pelo Papa.
Pouco importa a santidade pessoal do Papa; o que importa é a santidade de Cristo; ele é sempre: O Santo Padre.

IV. O Ancião de Roma
Após estas considerações gerais, o meu caro batista deve compreender — se o quiser — a razão porque o Papa mora num palácio e cerca-se de majestade, sem, com isso, afastar-se, dos exemplos e da doutrina do divino Mestre que disse: As raposas têm as suas covas e as aves do céu os seus ninhos; porém, o Filho do homem não tem onde reclinar a cabeça. (Mt7,20)

Jesus Cristo nada possuía para si próprio, mas sempre achava um agasalho onde passar a noite e aí reunir os seus discípulos.

O Papa é tão pobre como o seu divino Mestre, e foi por ser ele pobre que a Igreja construiu-lhe um palácio, o Vaticano, que é o PATRIMÔNIO da Igreja universal, mas este patrimônio não pertence a nenhum Papa em particular.

O Papa é pobre, mora em um palácio que não é propriedade sua, mas pertence à Igreja católica; vive, por assim dizer, da caridade de seus filhos que o sustentam.

O Papa aparece majestoso, mas com paramentos e adornos que são próprios à sua DIGNIDADE e não à sua pessoa CIVIL.

Ele vive no Vaticano, longe da família e dos amigos, unicamente cercado pelos seus auxiliares na administração, exercendo uma atividade que se pode chamar quase milagrosa.

O Papa é um cidadão venerável, pela idade, pelo saber, pela virtude, e, muitas vezes, pelo sangue. Um ancião, já exausto pelos trabalhos do ministério das almas, que não vive mais para si, mas unicamente para o imenso rebanho e que lhe foi confiado.

E este ancião, vestido de branco, descendente de uma estirpe imortal, anel vivo de uma corrente inquebrantável, coluna indestrutível, contra a qual se quebram os dentes das feras humanas, como os golpes dos tiranos; este homem está sempre sorridente, calmo, dominando os tempos, os séculos e os impérios.

O mar das paixões, o oceano da corrupção, o vulcão do ódio, como os esgotos dos vícios lançam-lhe a lama e as suas lavas ferventes, e este ancião, com a mesma mão que abençoa os seus filhos fiéis, abençoa também os que o maldizem e blasfemam.

Oh! pobre protestante, confessa que tudo isso é divinamente belo, majestoso, e ao mesmo tempo grandiosamente divino.

Procuras provas da divindade da Religião?

Eis aí uma prova resplandescente, que nenhum raciocínio humano pode explicar.

A única explicação possível é a palavra do divino Mestre: Tu és Pedro, e, sobre esta pedra edificarei a minha Igreja, e as portas do inferno não prevalecerão contra ela. (Mt16,18).

Este ancião é Pedro...

É Pedro, sempre vivo na pessoa de seus sucessores.

E este ancião, curvado sob o peso dos anos, não é simplesmente a mão que ABENÇOA, mas a mão que TRABALHA.

Um Papa é um perpétuo milagre.

Para não citar fatos do passado, citemos apenas os exemplos do saudoso Papa até há pouco reinante, o Santo Padre Pio XI.


Um pouco antes de escrever eu o presente artigo encontrei no “O Mensageiro da Fé”, Maio de 1935, a seguinte notinha, mais eloquente que todos os raciocínios:

-Sua Santidade o Papa Pio XI completou em 31 de Maio o seu 77º aniversário natalício. A data, entretanto, não foi festejada, consoante o desejo do Pontífice de vê-la passar o mais despercebido possível.

Apesar da idade avançada, o Papa continua a impressionar pela sua energia e atividade permanente. Nos últimos meses ele trabalhou dia e noite, não constituindo exagero afirmar que o seu labor foi superior ao de muitos homens da metade de sua idade.

Durante as festividades do Ano Santo, com efeito, sua santidade pronunciou 1.307 discursos ou sermões curtos, dirigidos aos peregrinos, “os recém-casados, membros de associações religiosas e outras agremiações, desse total, mil foram feitos em italiano e o resto em francês e alemão.

“O Sumo Pontífice, durante aquele período, falou quatrocentas vezes aos grupos de jovens católicos pertencentes a varias associações, duzentas aos recém-casados e sessenta a diversos grupos constituídos de pessoas pertencentes a distintas atividades ou profissões. Os seus discursos os mais notáveis serão enfeixados em livros e publicados numa edição especial comemorativa das festividades do Ano Santo.

o Papa, como ele é realmente e não como o representam os protestantes.

Para eles o Papa é uma espécie de MÚMIA e de estátua que se carrega na Basílica de S. Pedro e no Vaticano, enquanto ele apresenta os seus pés a beijar, e abençoa aos que se prostram diante da sua sede gestatória.

Estão vendo a diferença entre a fisionomia verdadeira do Papa e a representação maníaca do protestantismo.

Mas, trataremos deste assunto separadamente.


V. O Sacerdócio

Antes de responder às perguntas de meu amigo protestante não devo passar em silêncio uma acusação grotesca por ele atirada nos padres em geral.

É outra mania protestante.

Acusa os padres de terem a alma da cor da roupa, e espera que eu seja mais claro e leal que os outros padres.

Não levanto o insulto; tenho pena do insultador.

Baba não se refuta: varre-se e desinfecta-se.

Mas vamos à história, aos fatos, com sinceridade e lealdade sem desviar as respostas.

Que é o sacerdócio? Que é um sacerdote?

Talvez o bom batista nunca tenha examinado de perto tais perguntas.

O sacerdócio é a continuação do ministério de Jesus Cristo entre os homens.

É um ESTADO, e não uma simples função.

S. Paulo já o disse formalmente; “Tu és sacerdote para a eternidade, segundo a ordem de Melquisedeque”. (Hb.5,6).

E em que consiste esta ordem de Melquisedeque?

E ainda S. Paulo quem a explica: Era sacerdote do Altíssimo, diz ele, sem pai, sem mãe, sem genealogia, sem princípio de dias, sem fim de vida, e tornado assim semelhante ao Filho de Deus, permanece sacerdote para sempre. (Hb.7,1-3).

O sacerdócio de Jesus Cristo é o TIPO EXEMPLAR, figurado pelo sacerdócio de Melquisedeque... e Jesus Cristo instituiu este sacerdócio, em sua Igreja, como devendo ele constituir a parte DOCENTE da mesma Igreja, enquanto os fiéis serão a parte ENSINADA.

Como meu Pai me enviou, assim eu vos envio, diz Ele aos seus apóstolos, os primeiros (Jo,20,21).

Sendo ele, pois, sacerdote da ordem de Melquisedeque, e enviando os seus apóstolos na mesma qualidade, é claro que estes últimos participam deste mesmo sacerdócio, ficando pertencentes à mesma ORDEM.

Sem pai, sem mãe: deixando tudo, para consagrar-se ao serviço de Deus.

Sem genealogia: sem esposa, guardando a castidade por amor de Jesus Cristo.

Sem princípio de dias: visto o sacerdócio ser eterno, e achar em Deus o seu protótipo.

Sem fim de vida: não podendo nunca terminar; pois o Sacramento da Ordem imprime na alma um caráter indelével, tornado assim semelhante ao Filho de Deus, que não teve pai na terra, que ficou virgem sem geração, que é Deus e como tal eterno.

Eis o que é o SACERDÓCIO instituído por Jesus Cristo.

Agora é preciso saber distinguir numa classe a ASSOCIAÇÃO e os MEMBROS. Todos o compreendem.

A sociedade ou classe sacerdotal é santa, é divina.

Os sacerdotes ou membros desta classe são homens, e, como tais, podem ter as suas fraquezas.

Tudo que é humano está sujeito a esta lei.

A classe médica é digna, nobre, altruística, embora haja médicos exploradores, ignorantes, assassinos.

A classe nada perde com tais elementos prevaricadores; o mal recai sobre o indivíduo e não atinge a classe.

Ninguém discute esta regra.

Porque os protestantes querem discuti-la quando se trata dos sacerdotes?

O sacerdócio, como estado, é DIVINO. A grande, a grandíssima maioria dos sacerdotes é constituída por homens de virtudes, de abnegação, de sacrifício e de zelo.

Pode haver uns traidores entre eles, mas são relativamente poucos.

Quando acontece um escândalo, a imprensa inimiga mete a trombeta no mundo e grita nos quatro cantos do universo, com imenso exagero, o fato escandaloso.

E que são tais fatos quando se pensa que no mundo inteiro há perto de 700.000 sacerdotes? (À época, em 1940.)

Note-se bem: 700.000, de modo que, se em um ano houvesse 700 escândalos, isso seria 1 nobre 1.000.

Qual é a classe que encontra apenas UM escândalo entre MIL componentes?

Tal classe não existe aqui na terra.

E o sacerdócio católico está nestas condições.

Pode-se dizer que tais escândalos não somente são UM por mil, mas talvez UM sobre DEZ MIL.

Pode haver aqui e acolá um traidor, um Judas. Infelizmente há, mas raras vezes, em comparação ao número dos sacerdotes.

E o protestante tem a coragem de chamar à alma do sacerdote de "alma negra"!

Meu caro amigo, examine de perto os tais homens a quem vós protestantes chamais pastores, sejam eles batistas, evangelistas, metodistas, presbiterianos, etc.

Faça uma estatística, o que outros já fizeram e publicaram, e aí o senhor encontrará sobre 10 pastores, embora casados, dois ou três de vida francamente imoral e nojenta.

Isto é um fato.

A mancha no clero católico é calúnia.

Nunca foi e nunca será provada.

O sacerdote católico é instruído, moral, honesto, trabalhador e progressista. O sacerdote católico está acima das calúnias, do ódio, do vício e do despeito; ele é casto, virtuoso e digno ministro de Deus.

Eis a verdade, tanto histórica como experimental.

Está vendo o meu amigo, que a sua asserção é uma hipótese mentirosa, proveniente ou da ignorância, ou da calúnia, ou da falta de bom senso.

Há atualmente no Brasil perto de 5.000 sacerdotes.

Não existem tantos; muitos dos que os batistas padres nunca o foram, como ultimamente fizeram com um mulatinho sem compostura, a quem chamaram de padre doutor Emílio Ferreira.

“Tal mulatinho nunca foi nem padre, nem doutor, mas um simples porteiro de seminário, depois preparatoriano, expulso por falta de inteligência e comportamento.

Pondo, pois, cinco escândalos por ano, isto representaria UM por MIL.

Que bela e admirável é aquela classe que conta entre mil, apenas 5 desleixados ou indignos!

Digitus Dei est hie.

Para uma pessoa capaz de refletir, seria isso o bastante para provar a divindade da Igreja católica, pois só ela, no meio de todas as religiosas, possui um sacerdócio casto e santo, e somente ela conta ministros que vivem exclusivamente para Deus e para as almas.


VI. A coroa do Papa

Após as elucidações precedentes, posso agora responder diretamente às interrogações do amigo batista.

Ele pergunta: O Papa traz ou não a tríplice coroa estrelada de pedrarias?

Não, o Papa não traz uma tal corôa, mas faz uso dela nas grandes cerimônias de seu magistério.

A coroa é o símbolo da realeza.

Todos os reis recebem semelhante coroa, não para trazê-la sempre, mas para usá-la por ocasião das manifestações extraordinárias de seu poder.


O Papa possui a sua TIARA.

Que é a tal TIARA?

E a mitra usada por todos os bispos nas grandes cerimônias. A mitra e o báculo constituem as insígnias próprias de sua autoridade.

O Papa, nas cerimônias litúrgicas, usa a mitra episcopal como qualquer outro Bispo, e só usa a tiara nos préstitos solenes, nas cerimônias de coroação, antes e depois das funções pontificais, na Basílica de S. Pedro.

A tiara tem a forma de uma mitra, tendo como formato três coroas de metal superpostas, para exprimir o seu poder de papa, de bispo e de rei; a tiara é encimada por uma cruz.

A tiara é feita de seda como a mitra dos bispos. Será ela encrustada de pedras preciosas? Não o sei; mas, assim sendo, ela é apenas o que deve ser: a expressão da grandeza e do poder que representa.

Sendo a tiara a coroa do maior monarca do mundo, do sucessor de São Pedro, ou representante do próprio Cristo, nunca será bastante bela, rica e preciosa para tal autoridade.

Ela não é a coroa do Papa como homem, mas, sim, a coroa do Cristo vivendo entre os homens, na pessoa de seu lugar-tenente.

Eis onde terminam as formidáveis invectivas dos amigos protestantes.

Porque não protestam eles contra a coroa do czar da Rússia, que era de ouro puríssimo e pedras preciosas que lhe custaram milhões de contos?

Porque não protestam eles contra as coroas do rei da Inglaterra, da Itália, da Bélgica, assim como contra os antigos imperadores de Roma, da França e da Alemanha?

Porque?

Por ser o Papa o chefe da Igreja católica, é para eles o único e o maior inimigo, e o que ele faz é censurável, mesmo se não o fosse em outros.

Menos ódio, caros protestantes... mais bom senso... mais lealdade e mais dignidade.


VII. A Sede gestatória

Outra pergunta, que exprime uma objeção dos protestantes: É verdade que o Papa não se move do lugar senão carregado?

Não é verdade... é outra mentira grosseira.

Como já mostrei acima, o Papa, embora seja homem de idade avançada, não é uma MÚMIA, mas é de uma atividade e de um espírito de trabalho espantoso.

O Papa anda, viaja, passeia até, e em vez de ser carregado, é capaz de carregar os outros, como tem acontecido com diversos papas, que, carregavam até doentes para o hospital.

A vida do Papa, como provarei mais tarde, é antes de tudo uma vida de oração, de meditação de união a Deus, para poder governar a catolicidade, porém os papas são homens de ação... e de ação quase milagrosa.

Quem não conhece as obras teológicas, ou, os volumes de encíclicas do grande Leão XII?

Quem não ouviu falar da atividade assombrosa do Santo Pio X, reformador do direito canônico, do cantochão e de muitas outras modificações úteis na Igreja, por este Pontífice levadas a efeito?

Quem não ouviu ainda falar da atividade extraordinária do saudoso pontífice Pio XI e das suas volumosas obras científicas?

Homem de ciência, linguista, cientista, trabalhava quase noites inteiras, escrevendo inúmeras cartas aos Bispos, aos governos, publicando encíclicas que são verdadeiros tratados teológicos, esgotando o assunto, e com isso administrando pessoalmente a Cidade do Vaticano, interessando-se pelos telégrafos, rádio, estradas de ferro, etc., etc..

E o amigo protestante julga que tal homem, só sai de seu palácio, majestosamente sentado num trono, carregado por outros?

A tal sede gestatória, de que fala o amigo, é toda outra coisa.

É um pequeno trono móvel, no qual o Papa é levado unicamente nas solenes entradas na Basílica de S. Pedro.

Tal cerimônia existia em Roma entre os imperadores e os chefes militares, que eram carregados em triunfo pelo povo.

Este uso transmitiu-se à pessoa do Papa.

Além disso, nas imensas aglomerações de povo que ocorre de todas as partes do universo, para as grandes festas religiosas na Basílica de São Pedro, é preciso que todos possam ver o Papa, e o único meio de vê-lo é de ele percorrer a Basílica, carregado e sentado em seu trono, que é a sede gestatória.

Daí ele pode ser visto por todos e abençoar a todos.

E esta entrada é uma das cerimônias mais tocantes do catolicismo.

Nesta multidão imensa, há pessoas de todos os credos como de todos os países e de todas as posições sociais.

Há pessoas que vão assistir a estas festas por devoção, ao passo que outras ali vão por curiosidade; uns são os filhos do Pastor Supremo que desejam aclamar, outros são filhos rebeldes que o querem criticar.

Mas, apenas o mestre de cerimônias dá o sinal anunciando a entrada do Soberano Pontífice... apenas o seu vulto majestoso, calmo, aureolado de não sei que reflexo sobrenatural, aparece na entrada... apenas todos fitam um olhar nesta aparição, que parece ser do outro mundo... e ei-los de joelhos, amigos e inimigos, almas piedosas, indiferentes e censores, todos prostram-se como impelidos por mão invisível.

Há uns que choram, outros que suplicam, outros que aclamam, mas ninguém fica indiferente.

Sente-se que é o Cristo que passa.

Vê-se que é ele quem abençoa...

E entre aqueles que entram, há incrédulos, zombeteiros e censuradores, que se levantam comovidos, soluçando...

Sentiram a mão de Deus...

Viram qualquer cousa da majestade divina.

Eis aí coisas, caro protestante, que são uma prova da divindade da Igreja católica.

Só a Igreja católica tem destas manifestações onde se sente perfeitamente o sobrenatural; onde ele parece entrar no homem por todos os seus sentidos e até por todos os poros de seu corpo.

O protestantismo, rancoroso, crítico, mumificado em seu grosseiro materialismo, não tem ideia destas grandiosas manifestações, em que o Cristo parece REVIVER entre nós na pessoa de seu sucessor, o Pontífice romano, para, por ele, dirigir, consolar e abençoar a humanidade.


VIII. O beija-pés papal

Mais outra formidável objeção protestante. O consulente pergunta: É mentira que o Papa dá o pé para se beijar?

Sim, caro amigo, é mentira, e mais que mentira.

O Papa, como autoridade suprema, deixa-se beijar os pés, pela devoção do povo.

Perfeitamente, e isto mostra a veneração, o amor que o povo católico dedica ao representante de Cristo.

Vê-se, pela objeção, que os protestantes afiguram-se o Soberano Pontífice tal qual uma estátua, colocada em cima de um trono, e os católicos a desfilarem diante desta estátua, beijando-lhe os pés.

Ideia grotesca, como aliás o são todas as ideias protestantes no que diz respeito ao culto católico.

O Santo Padre recebe diariamente centenas e centenas de visitas e às vezes dá audiências a milhares de pessoas.

Ele recebe a todos, em pé, com carinho, e com aquele sorriso que parece ser próprio aos sucessores de Cristo, parecendo um reflexo do olhar profundo do próprio Cristo.

Ele conversa com todos, e tem para todos palavras de animação e de conforto.

Na ocasião da entrada do Pontífice, todos os assistentes põem joelhos em terra, para receberem a benção do Santo Padre; e depois desta benção, aproximam-se, cumprimentam e entram em conversa com ele.

Tudo isso é digno, como é simples... é paternal, como é majestoso... é diplomático, como é íntimo.

Escute a este respeito o que acaba de publicar o "Santuário d'Aparecida”: a notícia é de ontem, e põe em plena luz o que acabo de dizer:

“TODOS DE JOELHOS — Em Abril deu o Santo Padre audiência a 70 jornalistas, representantes de quatro mil jornais.

Nunca o Representante de Cristo se mostrara a uma reunião tão variada, pois quanto à raça tanto havia europeus e americanos, como africanos e asiáticos; quanto á religião ao lado dos católicos havia protestantes, judeus, maometanos e pagãos.

Reunidos na sala de audiência, ficaram esperando mais de uma hora e discutiram em voz baixa se deviam acompanhar a “moda católica” de se ajoelhar.

Um protestante, natural de Berlim, não gosta de dobrar os joelhos diante do Pontífice Romano; e então o árabe, inimigo do cristianismo? e o judeu? e o japonês, adorador de Buda?

Ainda não tinham chegado a um acordo, quando entrou um diplomata da corte pontifícia que os cumprimentou sorrindo, e disse: “Então, meus senhores, cada um conforme o seu gosto". Era o gesto mais liberal e cavalheiresco possível: que cada um fizesse conforme lhe ditava a sua a sua educação, seu modo de ver.

O Santo Padre entrou e... todos se puseram de joelhos, nem um ficou de pé.

“E nenhum perdeu com isto uma pérola de seu diadema”, escreveu depois um jornalista protestante que esteve presente.

Admirável grandeza da dignidade papal que mesmo a esses homens dominou e impôs tão profundo respeito”.

Que tal, amigo crente, onde está o seu tão censurado beija-pés?

Os jornalistas nem sequer se lembraram dele; apenas lembraram-se de porem-se de joelhos e embora uns fossem anticatólicos, nenhum deles hesitou em fazê-lo, sentindo como que refletir-se sobre a pessoa do Pontífice supremo a majestade divina.

Quer dizer isto que ninguém beija os pés do Pontífice romano?

Não... longe disso... todos os católicos sentir-se-iam felizes em poderem beijá-los como expressão de sua veneração.

É por causa deste sentimento que foi se introduzindo o costume, em certas ocasiões, de beijar os pés do Santo Padre.

Nas recepções particulares e solenes, é costume que aqueles a quem o Papa recebe beijem-lhe os pés.

Eis as grandes cerimônias protocolares em uso.

O Santo Padre assenta-se no trono Pontifical, cercado dos cardeais assistentes.

As pessoas admitidas à esta recepção solene, aproximam-se e beijam um dos pés do Santo Padre, e tratam depois o assunto que os levou à presença do Chefe da Igreja.

Tudo isso é simples e majestoso.

O Papa não dá o pé a beijar por orgulho ou espírito de dominação, mas deixa-se beijar o pé, para satisfazer o respeito e a piedade dos fiéis, que sentem-se felizes em poder beijar os pés do REPRESENTANTE de Cristo, e que o fazem com a mesma veneração, com que beijariam os pés do Salvador.

Está vendo o amigo protestante que o caso é todo diferente daquele que lhe apresentou a imaginação!


Conclusão

Para não prolongar exageradamente esta resposta, dividamo-la aqui, reservando para outros capítulos a resposta às duas últimas objeções.

Estas últimas, de fato, não podem ser tratadas superficialmente, sob pena de se lhe tirar o valor de uma resposta irrefutável.

Do que precede devemos tirar uma conclusão.

O meu consulente deve ter notado que as objeções formuladas provêm todas da ignorância dos fatos.

A história não se inventa, pois é uma realidade, uma série de fatos, e só se pode julgar destes fatos e reuni-los em história, depois de conhecer todos os pormenores, antecedentes e consequentes.

E é isso o que falta completamente aos protestantes.

Eles têm por princípio não ler livros romanos.

É a primeira e maior recomendação de seus pastores.

Pouco importa que leiam autores comunistas, espíritas, ateus, hereges, mas não devem ler autores romanos.

Porque esta prevenção... esta proibição?

Da parte da classe dirigente protestante, a razão é muito simples. Eles não ignoram que os católicos tratam as questões religiosas com muito respeito e carinho e penetram até no âmago das questões.

Os raciocínios católicos são claros, convincentes, e as suas conclusões imperiosas.

Os pastores devem saber disso; e receando que esta clareza e esta lógica imperiosa abram os olhos daqueles que estão iludidos por eles, proíbem a leitura destes livros.

Entretanto, meu caro batista, reflita bem; se o conhecimento do protestantismo é o bastante para ser protestante, ele não é suficiente para atacar o catolicismo.

Para atacar princípios, dogmas, ensinos, etc, é preciso conhecer tais princípios e dogmas.

Ora, nenhum protestante conhece a doutrina católica; e não a conhecendo, vai andando por paus e pedras, negando o que nós afirmamos e afirmando o que nós negamos.

Pretende abater ídolos que só existem em sua imaginação exaltada, destruir doutrinas que não existem, e ridicularizar cerimônias que nunca viu, mas que conhece, apenas, através da lente de aumento do preconceito e da mentira.

Tudo isso não é sério, caro amigo, mas é de criança.

O que precede, que é a simples resposta documentada às suas objeções, é mais uma prova dessa asserção.

São calúnias, interpretações erradas, exageros, e tudo isso envolto na mais completa ignorância.

Sendo sincero o meu consulente, deve confessar que estava completamente iludido em tudo que aqui tenho exposto, acerca do famoso palácio da Papa, da vida e atividade do Papa, da coroa (tiara), da sede gestatória e do beija-pés Papal.

Tudo isso entendido como o entende o espírito dos protestantes, aumentado pela ignorância e o rancor da seita, parecia verdadeiro fantasma, quando em realidade tudo isso é natural, lógico, digno e nobre, tanto em sua concepção, como em sua execução e simbolismo.

E assim caem todas as objeções protestantes. Basta opor-lhes a realidade dos fatos, para que a fantástica objeção se desmorone e desapareça.

Como se vê, a Igreja católica não procura, nem pode procurar DESVIAR os assuntos a tratar, mas ela os toma bem de frente e pela base e os expõe pela simples exposição da verdade.

Se o amigo, sincero e leal, comparasse a verdade católica com o simulacro protestante, compreenderia logo de que lado está a verdade, a sinceridade, e de que lado está a mentira e a hipocrisia.

Espero que estas noções hão de dissipar em seu espírito muitos preconceitos nebulosos, mostrando-lhe a grandeza e a sublimidade do pontificado de S. Pedro sempre vivo, sempre firme atravessando os séculos e as paixões, sem nada perder de sua glória e de sua firmeza.

Sempre e sempre será o rochedo inabalável sobre o qual o Cristo fundou a sua Igreja imortal, prometendo estar com ela até ao fim dos séculos.

E o Cristo não mentiu.

Ele está com a sua Igreja.

E esta Igreja está sempre com ele, sem que as paixões humanas possam macular a sua branca túnica, ou que as revoluções possam abalar o seu granítico pedestal.

Tu és Petrus, repetem os séculos, inclinando-se diante do Pontífice Romano.

Tu és Petrus, repete o Cristo Eterno, protegendo o seu representante na terra.

Tu és Petrus, exclamam os católicos, soluçando de comoção e beijando-lhe os pés sagrados.

Tu és Petrus... e os teus pés são os pés de um homem, mas este homem é verdadeiramente o representante de Deus na terra.


CAPITULO III

As riquezas do Vaticano

Continuemos a responder às objeções de nosso amigo batista.

Após a leitura do que precede, ele já deve ter reformado um certo número de suas ideias sobre o Papado e as cerimônias do palácio dos papas; e talvez que as respostas desenvolvidas tenham dissipado as dúvidas das perguntas ainda não respondidas.

Estas perguntas são duas, e quero dar-lhes aqui uma resposta completa, para que as névoas levantadas pelo erro protestante desapareçam, cedendo lugar à luz resplandecente da verdade católica.


1 - O tráfico religioso

A 4a objeção é a seguinte:

Não é verdade que o Papa e a Igreja traficam as cerimônias religiosas?

Não, meu amigo, nem há sombra de verdade nisso; há somente cegueira protestante.

Antes de tudo faço-lhe notar a injustiça de atribuir ao Papa e à Igreja o que devia ser atribuído aos padres.

Se tal tráfico existisse, não seria obra; nem do Papa, nem da Igreja, mas unicamente de seus ministros, os sacerdotes.

Mas, pouco importa; vamos ao caso, sem nada omitir, e depois de provada a mentira da objeção, provarei a verdade da existência deste fato entre os protestantes.

O que o amigo entende por cerimônias religiosas é, com certeza: a santa missa, os sacramentos, as procissões religiosas, etc.

Vender objetos religiosos como tais, chama-se SIMONIA, e é um crime condenado positivamente pela Igreja.

Não basta acusar com palavras, é preciso citar fatos.

Eu quereria que o perspicaz amigo me citasse um único exemplo de tráfico religioso.

O Padre celebra a missa nas intenções daqueles que o pedem; não vende a missa, mas, pede apenas uma remuneração pelo seu trabalho.

De fato, a missa dura pelo menos meia hora.

Para celebrar é preciso paramentos de seda, altar, com as diversas alfaias prescritas, vinho, hóstia, velas, um ajudante, etc.

Ora, tudo isso exige uma despesa.

E além disso, o sacerdote deve vestir-se e alimentar-se.

Por que seria ele obrigado a fazer tudo isso sem nada receber daqueles que lhe encomendam a missa?

Depois há os sacramentos. São sete.

O batismo: o padre precisa das alfaias necessárias, de registros para lançar os assentos; tem, pois, direito a uma pequena remuneração.

A crisma é administrada pelo Bispo ou por um sacerdote delegado. Há uma remuneração sem importância, que serve para a viagem do Prelado.

A eucaristia, embora ocasione despesas, é inteiramente GRATUITA.

A confissão é completamente GRATUITA, e aí só paga quem tiver roubado, fazendo a restituição do bem alheio, mal adquirido.

A extrema unção, que exige mais fadigas, é completamente GRATUITA.

A ordem é GRATUITA, mas exige a vocação sobrenatural e os estudos necessários.

O matrimônio exige uma leve remuneração, pois exige bastante tempo, leitura dos proclamas e registros volumosos.

Todas as outras cerimônias são feitas de graça. Há procissões, benção do Santíssimo, novenas, via sacra, recitação do terço, orações vocais e mentais, devoções, etc., etc., e tudo isso é GRATUITO.

Entre todos os serviços da Igreja, as únicas cerimônias para as quais se pede uma espórtula, aliás muito modesta, são: a Santa Missa, quando os fieis a pedem para si, o Batismo e o Matrimônio.

Todas as outras são GRATUITAS.

Eis o que passa na Igreja católica.

Se comparássemos isso com o que se passa, nas seitas anticatólicas, o amigo ficaria horrorizado pelo CONTRASTE.

A comparação seria longa; é melhor resumi-la com a história de um católico que virou protestante para não ser mais obrigado a contribuir às obras religiosas.

A história dirá mais que todas as razões que se podia citar, pois é a expressão exata de fatos vistos que todos os protestantes reconhecerão.


II. história de Serapião

Lavrador incansável, duro na enxada e na foice, o tio Serapião tinha um defeito: chorava, quando devia desatar os cordéis do saquitel que lhe servia de carteira. Tirar daí um mil réis era, operação dolorosa, mais dolorosa do que a extração de um dente recalcitrante.

Quando lhe vinham apresentar uma subscrição, o sovina, que farejava de longe os esmoladores, mandava responder-lhes que não estava em casa, mas o ardil, uma vez descoberto, não surtia o menor efeito, e os suplicantes não se retiravam sem a esmola implorada. O lavrador tinha que se explicar, fosse como fosse.

Em vão alegava que a crise era assoberbadora e que a roça não rendia, sendo-lhe impossível assinar quantia mui avultada.

— Qualquer coisa serve, retorquiam os irmãos; o santo agradece a boa vontade.

E o velho, quase morto de dor, acabava por dar uma pelega que via sair do saquitel, como as mães aflitas contemplam o filho de partida para a guerra.

Também era demais! Não tinham fim os peditórios que se repetiam, a bem dizer, como os dias do calendário. Hoje era a festa de São Sebastião e amanhã a missa de São Benedito.

Mais adiante vinha a ladainha de Nossa Senhora da Conceição ou o novenário do Divino. Numa semana perambulavam os andores do Santíssimo, e na outra os encarregados de Santo Antônio. Quando não era para São José, era preciso para São Pedro.

Até das paróquias vizinhas apareciam esmoladores devidamente autorizados. A folhinha parceia ter sido repartida entre os promotores de solenidades religiosas e os festeiros enxameavam como nuvens de gafanhotos.

— Já dei, já dei, gemia de cada vez o tio pião, com uma voz de flagelado!

Deu, mas não foi para a nossa lista, retorquiam os algozes.

E de coração a sangrar, O triste roceiro desembolsava algum níquel querido.

Conversando uma noite na varanda com um vizinho protestante, o tio Serapião lamentava tamanhos excessos. O biblista aparou na unha o pião da queixa e gabou, com frases bastante insinuantes, entremeadas de versículos, o desprendimento dos irmãos separados.

— Nossa lei não tem disto!

— Como? indagou o ferreta.

— Experimente! Há de ver que nossa religião não festeja santos, nem mercadeja sacramentos, nem vende missa e nem vive à custa das almas.

— Oh! que coisa boa! Exclamou o somítico.

— E vosmecê abraçando a Bíblia, não sabe quantas economias fará.

Diz o provérbio que todos os caminhos levam a Roma. também é de crer, seja verdade o inverso, pois por mil veredas é fácil afastar-se alguém de Roma.

Pela estrada da avareza foi que o nosso lavrador abandonou os arraiais papistas. Ao chegar no biblismo, onde não mais seria vítima de irmandades, o bom velho deu um suspiro de alívio, como o viajante que escapou do temível perigo.

Apesar de não saber ler comprou uma Bíblia a preço convidativo. O pastor assegurou-lhe que revendia o livro com perda.

Ao depois, o neófito, apesar de ter uma voz de bambu oco e rachado, recebeu a coleção dos hinos e salmos, para cantar na hora do culto. Sempre evangelical, o ministro afirmou que não ganhara no negócio, e que deveria exigir o duplo por tão linda obra.

O tio Serapião gemeu no cobre.

Eram sacrifícios da entrada.

Neste mundo não há ventura que se não pague, e o néo-virado julgou melhor não se fazer de rogado.

Um belo dia, recebeu o verdadeiro batismo. Fremiu pela igrejola um alegrão, porque está escrito: “Haverá maior júbilo no céu pelo pecador que fizer penitência, do que por noventa e nove justos que não precisam de penitência” (Lc15,7).

No auge da piedade, o pastor mandou vir cerveja e doces em honra do catecúmeno, por cuja conta ficou a nota a pagar, naturalmente.

O lavrador quis protestar, para estrear o diploma de protestante, mas por cautela conservou-se mudo.

Decorreram quinze dias numa calma amorável sem aparição de esmoladores, quando,

num sábado, na hora do almoço, apresentou-se um presbiteriano.

- Venho, disse este, saber com que quantia vosmecê contribuirá para o fundo presbiteral!

— Contribuir para quê? urrou tio Serapião, que pulou como se estivesse em cima de agulhas.

— Para o fundo presbiteral!

Mau, mau! Já começa a inana! Mas quem é o senhor?

— Sou o procurador dos envelopes. Ajunto ofertas para o pastor.

O velho fona esfregou o rosto, mas subscreveu qualquer mensalidade, para não passar por tíbio da nova lei, e porque, se enticasse com os novos irmãos, ficaria ridicularizado perante os católicos.

No dia seguinte surgiu o cobrador dos dízimos, funcionário importante do presbiterianismo. Como o lavrador escancarasse os olhos, ao ponto de quase tirá-los das órbitas, o protestante fitou o céu e elucidou suavemente:

Está escrito: Todos os dízimos da terra, ou sejam de grão, ou sejam de frutos, são do Senhor. (Lv27,30). Irmão, não sejas surdo à voz materna da Bíblia, que nos manda depositar aos pés do Altíssimo, representado pelo pastor, a décima parte dos seus haveres!

Vagas saudades do romanismo começaram a viçar no coração do roceiro que, doente de tantas facadas, se sentia feliz como esfolado vivo> Via que o pior vem sempre depois, mas era tarde para o contravapor.

E cada dia, na casita do ancião, desfilaram verdadeiros cristãos: zeladores do seminário presbiteriano de Campinas, propagandistas do vintém diário presbiteral, cobradores de moedas de aniversários, encarregados da casa de vulto, construtores de novos templos, redatores do jornal da seita, promotores de escolas dominicais, delegados do hospital evangélico, era um nunca acabar de pedintes biblistas que surgiam, empalmavam a mão e desapareciam. O pobre matuto teve até de assinar uma subscrição promovida para ofertar um brinde à senhora do pastor, no dia em que a piedosa criatura fizesse anos pela sexagésima vez.

O tio Serapião dava, dava e dava, mas de cada vez o furor se lhe adensava na alma, tanto que, incapaz de tolerar mais tempo a mendicância biblieira, muniu-se um belo dia de uma estaca de madeira, ao ver aparecer no batente da porta o procurador dos envelopes. Se este não lhe cumprimentasse ligeiro, em lastimoso estado lhe ficaria o crânio, tamanha era a cólera do desfrutado.

No domingo seguinte, durante a Missa paroquial, o tio Serapião penetrava devagar na Igreja católica e ali, encostado num pilar, piedosamente rezava o terço. Ao sair, como com ironia lhe perguntasse alguém se já deixara os bíblicos, o bom do lavrador respondeu:

— Deixei, sim, senhor! E para nunca mais lá voltar! Homem, o catolicismo, com tantas festas, ainda me sairá mais barato.


III. As riquezas dos padres

É a eterna lenga-lenga dos protestantes que procuram acusar os padres, de serem homens de dinheiro.

Nada mais ridículo.

Já houve tempos, é certo, em que o sacerdote estava em condições de fazer fortuna, porém estes tempos já passaram.

Ninguém, absolutamente ninguém aspira ao sacerdócio por fins lucrativos.

Para formar um padre, são exigidos não menos de 12 anos de estudos.

E tais estudos devem ser feitos como internos de um seminário.

Supondo que o seminarista, pagando a sua pensão e uma leve despesa de livros, de roupa e de viagens, gaste apenas a quantia de uns dois contos por ano, isso daria um total de 24 contos de réis a gastar para que um menino chegue ao sacerdócio.

É uma despesa superior a qualquer outro estado de vida intelectual.

Com menor despesa os pais podiam formar o filho em medicina, advocacia, farmácia, guarda-livros, dentista, comércio, etc.

De modo que a formação de um padre é a mais dispendiosa e menos rendosa e logo que os pais não têm nenhum INTERESSE MATERIAL em dirigir um filho para o seminário, como o filho não tem interesse pessoal, em abraçar o estado sacerdotal.

Este estado, além do sacrifício de castidade que impõe, do afastamento do mundo e do trabalho exaustivo que lhe é próprio, não lhe promete nenhum bem-estar que compense estes sacrifícios.

O sacerdote deve receber de Deus a graça da vocação; do contrário seria incapaz de perseverar num estado de vida em que TUDO É PARA DEUS, e nada para si mesmo.

Depois destes sacrifícios iniciais, o padre pode ser colocado numa capela. Que ganhará ele aí?

O necessário para viver, manter-se e conservar as obras religiosas que lhe impõe o seu cargo.

Quantos vigários vivem pobres, completamente pobres, e depois de uma vida trabalhosa, não possuem nem um vintém para tratar-se na velhice.

— Mas há padres ricaços, exclamam os protestantes!

Pode haver... e os há, de certo; mas notem bem que de 50, talvez 45 receberam estas riquezas por herança dos pais, e apenas uns 5 chegaram a ajuntar um modesto pecúlio.

No clero católico, não há somente filhos de plebeus, há filhos de ricos, milionários, de nobres, e até de príncipes e reis.

Que eles sejam ricos, podem ser; é fortuna paterna, que lhes é pessoal, podendo dispôr dela para as obras católicas, ou deixá-la à família após a sua morte.

Ninguém pode retirar-lhes este direito.

E mesmo se o padre ajuntasse uma pequena fortuna de seu grande serviço na milícia clerical, seria isso pecado?

O Salvador disse que o operário merece a sua remuneração: Dignus est operarius mercede sua. (Lc10,7). E o apóstolo: Não sabeis vós que aqueles que servem ao altar, participam do altar. (1Co9,13).

O padre é ministro de Deus, mas é homem também. Como homem deve vestir-se, ter a sua casa, ter o seu sustento, e, não podendo entregar-se a outros afazeres que não combinam com a sua dignidade e o seu ministério, como poderá ele viver, se nada recebe em retribuição de sua dedicação ao serviço da Igreja?

Qualquer homem de bom senso compreende o ridículo desta objeção inspirada unicamente pelo ódio e a mania de protestar.

O sacerdote é o homem DO ALTAR, e como tal deve viver do altar.

Ele não vende, nem trafica nenhuma cerimônia religiosa, mas tem direito a uma remuneração pelos serviços que presta sem obrigação, em virtude de seu ofício.

Confessa, às vezes, dias e noites inteiras; distribui a sagrada comunhão, visita os doentes, consola-os, administra-lhes os últimos sacramentos, ensina o catecismo às crianças, prega aos adultos, celebra o santo sacrifício, e para tudo isso nada pede... absolutamente nada; portanto, é razoável que exija pelo menos uma remuneração de seu serviço daqueles que pedem para si a INTENÇÃO da Missa, como dos que fazem batizar as crianças e daqueles que se casam.

É pouco... porém é o bastante para a sua vida sóbria, modesta e retirada do mundo.


IV. As indulgências

Na acusação que diz respeito ao tráfico das cerimônias religiosas, deve, de certo, estar incluída a velha objeção contra as indulgências.

Tenha o meu amigo pensado ou não nesta acusação, será, entretanto, útil explaná-la e dar-lhe depois a resposta necessária.

Dizem que foi por causa das indulgências, que Lutero revoltou-se contra a Igreja.

Não pode ser; a questão das indulgências foi apenas um PRETEXTO.

Lutero acreditava nas indulgências, mas sentiu-se humilhado por não ter sido escolhido em vez dos dominicanos para pregá-las.

Acusou, pois, a Igreja, de vender as indulgências a preço de dinheiro.

Esta acusação é falsa.

O Papa Leão X mandou pedir esmolas para terminar as construções da Basílica do Vaticano, e em recompensa desta boa obra o Pontífice concedeu uma indulgência.

Uma coisa é: comprar uma indulgência e outra; receber uma indulgência em recompensa de uma boa obra.

A Igreja concede indulgência aos que tratam dos enfermos, aos que instruem as crianças nas verdades religiosas, aos que cooperam às diversas boas obras de caridade, de zelo, de apostolado, etc.

Tais indulgências são uma recompensa e não uma compra.

A acusação de Lutero e dos outros protestantes, seus netinhos, é pois uma calúnia, uma invenção malévola e sem fundamento.

Que é a indulgência?...

A indulgência é a remissão da pena temporal, devida ao pecado venial ou mesmo ao pecado mortal, depois de perdoada a pena eterna.

As indulgências não perdoam, pois, os pecados; estes são perdoados pelo batismo e pela penitência, mas somente a pena temporal, anexa ao pecado já perdoado.

Encontramos na própria Bíblia a mencionada existência desta pena temporal.

Moisés pede a Deus: Perdoa o pecado deste povo, segundo a grandeza de tua misericórdia.

E Deus lhe respondeu: Eu lhe perdoei, conforme tu me pediste, mas nenhum dos que se desviaram de mim verá a terra que eu prometi com juramento a seus pais. (Nm14,19).

Eis como Deus perdoa aos israelitas o pecado cometido, mas não lhes perdoa toda a PENA TEMPORAL, devida aos mesmos pecados.

Mas tem a Igreja católica o poder de perdoar as penas temporais?

Não há duvida; ela tem pleno poder para isso. Note bem, amigo batista, que Jesus Cristo disse somente a PEDRO e a mais Ninguém eu te darei as chaves do reino dos céus: tudo o que ligares sobre a terra, será também ligado no céu, e tudo o que desatares sobre a terra, será também desatado no céu. (Mt16,19).

Estas palavras mostram claramente que Pedro e seus sucessores têm o poder de perdoar todo o pecado, toda a pena ETERNA como TEMPORAL, e tirar todo o OBSTÁCULO que possa impedir os fiéis de gozarem eternamente de Deus.

Este poder é admiravelmente simbolizado pelas chaves do reino do céu.

Não é desde o tempo de Gregório I que as indulgências estão em uso na Igreja católica, como cavilosamente insinuam os protestantes, e sim, desde o princípio do cristianismo.

O apóstolo S. Paulo, perdoando ao incestuoso de CORINTO a pena que lhe fora imposta, não fez mais que conceder uma INDULGÊNCIA. A indulgência de que usei... foi por amor de vós, na pessoa de Cristo, diz ele. (2Co2,6-10).

A este respeito vale a pena recolher uma confissão do próprio Lutero.

Escute bem, caro amigo, o que ele escreve, numa carta a Alberto: Por minha alma, eu vos garanto que, quando me abandonei a contestar as indulgências, eu não sabia o que era uma indulgência, mais do que aqueles que me vinha consultar sobre tal matéria. (Ep. ad Alb. 1518).

Bela e sincera confissão de ignorância, que se pode aplicar aos protestantes que atacam as indulgências sem saberem O QUE É uma indulgência.

E depois de ter aprendido o que é uma indulgência, ele escreve em suas discussões:

“Nunca desprezei, nem jamais ensinei que, se desprezassem as indulgências. Se há quem, negue a verdade das indulgências do Papa, seja, anátema” (Disp. Lips. th. 3).

Tais indulgências não se adquirem a preço de dinheiro, mas a preço de BOAS OBRAS.

Para excitar a fazer boas obras, a Igreja promete indulgências, como ela as concede em remuneração de boas obras feitas: Nada mais!

Não se trata pois de traficar cerimônias, mas sim, de estimular as boas obras, e recompensar as nobres iniciativas.

Nada mais... e isso já é muito.


Conclusão

Concluamos aqui este assunto, lançando o olhar sobre as tão decantadas riquezas do Papa.

Mentir, exagerar, caluniar, — são coisas de que qualquer tolo é capaz; porém, DIZER NÃO É PROVAR, e até hoje os protestantes não provaram uma só das ASSERÇÕES absurdas que levantaram contra o Papa... enquanto nós provamos diariamente pela história e pelas estatísticas a falsidade de suas objeções.

Não há boletim protestante que não faça alusão ás riquezas fabulosas amontoadas nos cofres do Vaticano.

Parece ser moléstia crônica nos arraiais adversos.

Em todos os países cristãos fazem-se anualmente as COLETAS destinadas às obras católicas, como são a propagação da fé, a santa infância, o óbulo de São Pedro, etc.

Entra dinheiro nos cofres do Vaticano.

De fato, deve entrar qualquer coisa para, que também possa sair.

Que fazem os papas com tanto dinheiro?

Que fazem?

Basta ler as revistas religiosas para sabê-lo.

Que fez o Santo Padre em prol dos prisioneiros, órfãos e famílias enlutadas, durante a grande guerra?

Distribuiu milhares e milhares de liras, figurando em frente de todas as obras de caridade.

Que fez ainda, há pouco, o Vaticano, pela, Rússia, país que cada vez mais se afasta de Roma?

Milhões de liras saem todos os anos do Vaticano, para aliviar as necessidades do gênero humano.

É grande deslealdade mencionar apenas as somas que ENTRAM no Vaticano, e não querer ver as que dali SAEM.

Os protestantes e comunistas gritam, aqui no Brasil, que os católicos mandam enormes, quantias para o Vaticano, calando-se, porém, quanto ás maiores quantias que o Brasil recebe.

Eis uma pequena estatística a respeito:

No ano de 1929 o Brasil mandou para Roma 98.000 liras (uns 98 contos).

É um fato, E quanto recebeu para as missões entre os selvícolas do Amazonas, Pará e Mato Grosso?

Recebeu a respeitável soma de 480.000 liras (cerca de 480 contos).

Recebemos deste modo, 372 contos mais do que demos.

A famosa “Casa do Vaticano”, o “Banco de S. Pedro”, como se vê, é o melhor do mundo.

Pondo-se nele 98 contos, recebe-se 480 contos.

No Ano de 1932 o Brasil mandou para Roma 226.375 liras.

A generosidade dos católicos vai aumentando... e Roma não se deixa vencer.

Recebemos de lá 478.000 liras, isto é, 478 contos.

Roma enviou-nos 251 contos a mais do que enviamos.

Estes 251 foram distribuídos entre as missões dos diversos estados do Norte.

E assim nos outros anos.

A diferença ora é maior, ora é menor, mas, ainda nunca as nossas coletas superaram os subsídios que Roma nos mandou para as nossas missões.

Em compensação desta generosidade o Vaticano é constantemente injuriado pelos ignorantes e pelos perversos.

Eis os tesouros do Papa. São TESOUROS DE UM PAI; e se a sua mão direita recebe, a mão esquerda distribui o que recebe!

Parece até que o amor deste pai multiplica os donativos para aliviar os sofrimentos de seus filhos, como Jesus Cristo multiplicava os pães para sustentar as forças dos que o seguiam.

Eis o tráfico religioso que existe em Roma, e o modo como o Papa vende as cerimônias.

A acusação é ridícula.

A refutação parece-me bastante clara, para confundir os caluniadores e abrir os olhos aos ignorantes.

É o que eu queria fazer neste capítulo.

 

CAPITULO IV

Os papas canonizados

A última objeção de meu amigo batista-maçon, — digo batista-maçon, porque descobri no fim de seu nome os três pontos característicos, — levanta uma questão que muitos ignoram.

O irmão tri-pingado pergunta: Dos 264 papas, desde S. Pedro até hoje, os 86 canonizados por quem o foram?

A pergunta é lógica e merece uma resposta completa, porque se todos sabem o que é um santo, poucos sabem como ele é canonizado.

É o que pretendo explicar aqui.

A pergunta “por quem o foram” indica o pensamento do consulente, que certamente julga que o Papa pode canonizar a quem quiser.

Quanto à frase seguinte, zombeteira como é, deixo-a correr; ela receberá a sua resposta pela exposição da verdade. De fato, ele ajunta esta frase muito maçônica e muito batista: “E se todos eles foram homens virtuosos, no tempo das celebres “Fogueiras Santas” os papas andavam no mundo da lua?”.

Não é preciso ir até o mundo da lua para descobrir a verdade; os lunáticos andam por este mundo, embora sujeitos às influências da lua, enquanto os ignorantes em história sobem, até à lua, sem saber o que se passa aqui na terra.

Vamos, pois, fazer luz nestas trevas, para instruir um pouco os ignorantes.

Que é um santo?

Como se faz uma canonização?

Pode o Papa canonizar a quem quiser?

Que é exigida da parte do santo para ser canonizado?

Eis quatro perguntas a que vou responder aqui.

I. Que é um santo

Que é um santo?

É um católico que, durante a sua vida, praticou, de modo heroico, as virtudes cristãs.

É um homem como outro qualquer, porém, em sua vida TRÊS elementos devem ficar ilibados: a retidão de DOUTRINA, a retidão da VIDA e o HEROÍSMO na pratica das virtudes.

Faltando um destes três elementos não pode haver santidade.

Deve professar integralmente a religião de Jesus Cristo, de modo que não se encontre em sua doutrina, professada ou ensinada, falada ou escrita, nenhum erro voluntário no que diz respeito aos dogmas da Igreja Católica.

É o primeiro distintivo.

A retidão de vida consiste em praticar integralmente a vida cristã, tal qual é revelada por Jesus Cristo e ensinada pela autoridade da Igreja.

Nenhum vício, nenhum elemento contrário à Lei Divina pode entrar em sua vida.

Deve afastar todo pecado mortal e todo apego ao pecado venial.

Com estes dois elementos temos o homem PERFEITO, mas não temos ainda o santo.

O que constitui a santidade propriamente dita é o cumprimento do terceiro requisito ou a prática heroica da virtude.

A pratica HEROICA da virtude é mais que a SIMPLES prática da virtude.

O afastamento de todo o pecado já é uma virtude, e pode até ser uma virtude heroica num ponto determinado,

Chama-se heroico o que exige da nossa parte um esforço acima do comum.

É mais que bravura; É BRAVURA desmedida.

É mais que coragem; É ARROJO extraordinário.

É mais que virtude; É O HEROÍSMO da virtude.

E o Santo é aquele que pratica a virtude, de um modo heroico.

Agradecer um serviço prestado é educação.

Retribuir um serviço é nobreza.

Fazer o bem ao próximo é virtude.

Fazer bem aos inimigos É HEROÍSMO.

Do mesmo modo pode-se dizer:

Cumprir com os mandamentos de Deus e da Igreja é ser bom católico.

Fazer mais do que Deus pede é ser virtuoso.

Praticar os conselhos evangélicos é ser santo.

Eis o que é um santo.

É ser homem pela natureza e ser anjo pela virtude.

É, na expressão de Cristo, viver neste, mundo, sem ser deste mundo: De mundo non estis, sed ego elegi vos de mundo (Jo15.)

São João diz que o mundo é concupiscência da carne, concupiscência dos olhos e orgulho da vida (1Jo,2,16).

A santidade é o contrário; é o domínio da concupiscência da carne, a mortificação da vista e a humildade da vida.

O santo é tudo isto.

Estão vendo, pois, que a santidade não é uma promulgação da Igreja; a Santidade é SUBJETIVA, está no homem, é praticada pelo homem; a Igreja nada mais faz, senão reconhecer que tal homem é SANTO.

Todos os homens podem ser santos, pois a de Deus não falta; porém, todos não são santos, porque todos não cooperam com a Graça Divina.

Nem o protestantismo, nem o espiritismo, nem o maçonismo, nem o comunismo, podem ter santos, porque falta-lhes a RETIDÃO da doutrina, são hereges, e como tais separados de Deus.

O catolicismo tem SANTOS, embora todos os católicos não o sejam, porque não sabem pedir a Deus a coragem e a força necessárias para praticarem atos heroicos de virtude.


II. Como se canoniza um santo

Ninguém, por santo que seja, mesmo fazendo milagres, pode ser canonizado durante a vida, porque, sujeitos às fraquezas humanas, aqueles que hoje estão em pé, podem cair amanhã. São Paulo nos avisa com muita razão que aquele que julga estar em pé tome cuidado para não cair. (1Co10,12).

É preciso, pois, morrer antes... porém não é a morte que traz a santidade, mas, sim, a vida que deve dá-la.

É durante a vida que o homem deve praticar as virtudes que fazem os santos.

Morrendo uma pessoa, com reputação de virtude extraordinária, a Igreja, com uma prudência consumada, não permite seja logo considerada, nem invocada como santa.

Ela exige que o santo demonstre, ele mesmo, do alto do céu, a virtude de sua vida, fazendo milagres... ou, melhor, a Igreja espera que Deus manifeste a santidade de uma pessoa, comunicando-lhe o DOM DE MILAGRES.

E, fazendo milagres, uma pessoa, é canonizada, santa?

Nada!... é apenas a entrada, é o primeiro passo.

Fora de casos excepcionais nenhum santo é canonizado antes de 50 anos depois de morto; a Igreja quer provas, provas palpáveis e irrefutáveis.

E aqui começa o processo da canonização, processo longo, minucioso, rigoroso.

Primeiro a Igreja ordena ao bispo do lugar que organize um Tribunal Diocesano.

Este tribunal recolhe todos os documentos deixados pelo finado, interroga os sobreviventes, examina os escritos, verifica os fatos e os milagres, examina a heroicidade das virtudes praticadas, e, após anos de indagações e de investigações, recolhe todos os documentos pró e contra e remete-os à Roma.

Uma comissão de cardeais e teólogos é nomeada pelo Soberano Pontífice para examinar os escritos, as virtudes e os milagres do servo de Deus.

Passam-se meses e anos.

Tudo é examinado e discutido.

Havendo fatos sólidos e virtudes extraordinárias, a comissão nomeia o advogado ou defensor da causa e o seu contraditor.

Ambos fazem um estudo sobre os três pontos em questão: DOUTRINA, VIRTUDES, MILAGRES, porém, fazem-no num sentido oposto.

O DEFENSOR procura provar a ortodoxia da doutrina do servo de Deus, as suas virtudes e o valor dos milagres feitos por ele, depois da morte.

O CONTRADITOR, sempre apoiado sobre os documentos, procura rebater as asserções do primeiro e mostrar o lado fraco da doutrina, das virtudes e dos milagres aduzidos.

Após várias reuniões, em presença dos teólogos e outros sábios, a questão é resolvida favorável ou desfavoravelmente.

Averiguando-se a absoluta ortodoxia da doutrina, a heroicidade das virtudes praticadas, o servo de Deus sai vencedor, no primeiro exame, Averiguando-se a certeza absoluta de um milagre, provado, autêntico, a Igreja proclama o servo de Deus: VENERÁVEL.

Depois disso, espera-se mais uns anos.

Havendo outros milagres, ficam submetidos ao exame e às discussões da comissão, e averiguado mais outro milagre, provado, autêntico, o venerável recebe o título de BEM-AVENTURADO.

Novamente demora-se alguns anos...

Se o bem-aventurado continuar a fazer milagres, a comissão examina-os de novo, com o mais extremo rigor, e sendo o TERCEIRO MILAGRE provado autenticamente, o Soberano Pontífice lavra o decreto definitivo de canonização.

Usando de seu privilégio de infalibilidade, pela assistência do espírito Santo, ele proclama a absoluta retidão de doutrina, a heroicidade das virtudes e a autenticidade pelo menos de três milagres, dando ao bem-aventurado o título glorioso de SANTO.

Eis como a Igreja canoniza os santos.

O amigo está vendo, pela demora, pelas investigações e discussões, que a Igreja procede com extrema prudência, e que o chefe da Igreja, ao dar o título de SANTO a um servo de Deus, cerca-se de todas as garantias humanas, além da assistência especial do espírito Santo, que faz deste ato de canonização um ato de infalibilidade pontifical.

Chegamos à terceira e quarta pergunta já indicadas: pode o Papa canonizar a quem quiser? e que é exigido para ser canonizado?

Como acabamos de ver, a canonização não depende do Papa, mas, sim, da SANTIDADE da pessoa a qual deve ser manifestada pelos milagres.

O Papa não pode canonizar a quem quiser, mas somente a quem estiver nas três condições aqui indicadas:

Ter uma doutrina reta.

Ter praticado as virtudes de modo heroico.

Ter feito, pelo menos, três milagres, depois da morte, e tudo isso deve ser averiguado e provado autenticamente, por testemunhas, escritos, ou outros documentos.

O Papa é, pois, o INSTRUMENTO da canonização, proclamando uma santidade já manifestada por Deus, pelos milagres.

Ora, o milagre é o selo de Deus.

Só Deus pode fazer milagres, e só pode fazê-los para o bem e para a edificação da Igreja.

Nada mais sério e rigoroso do que as discussões acerca da heroicidade das virtudes.

Já, humanamente falando, após tantas precauções e exigências, é quase impossível o Papa enganar-se.

E, religiosamente falando, sendo a canonização um ato de suprema autoridade em questão diretamente ligada aos dogmas de fé, à prática da moral e à edificação pública, o Papa torna-se infalível, fala ex-Catedra, com toda a autoridade de sucessor de S. Pedro, e o poder do próprio Cristo, que lhe disse: Quem vos escuta, escuta a mim: Qui vos audit, me audit. (Lc10,16)

O Papa não pode canonizar quem não reúne em sua pessoa as três qualidades indicadas.

Eis o que reduz a nada as numerosas objeções protestantes contra os santos.

Em sua ignorância a respeito das leis rigorosas da canonização em uso na Igreja católica, eles julgam que basta o Papa dizer que alguém é santo, para que o seja, como basta um, pastor dizer a qualquer crente que de hoje em diante ele será pregador, para que ele julgue sê-lo, e percorra o mundo, dizendo asnices de todos os quilates.

Ninguém é santo, porque o Papa o proclamou; mas o Papa o proclamou porque É SANTO, e porque tal santidade está autenticamente verificada e provada.

***

Há anos um sábio professor protestante, inglês, da universidade de Oxford, quis examinar de perto e de visu o proceder das canonizações.


Partiu para Roma com carta de recomendação, pedindo para examinar por si mesmo os documentos das canonizações O cardeal prefeito, encarregado das causas, entregou-lhe o processo completo, pró e contra, de umas oitenta CAUSAS em julgamento.

O professor levou os documentos para o hotel, onde, durante um mês, examinou-os detidamente, confrontando as razões a favor, citadas pelo defensor e as razões CONTRA, dadas pelo contraditor.

Examinou, confrontou, tirou as suas conclusões favoráveis, e, convenceu-se de que todos os fatos, a doutrina, as virtudes e os milagres eram incontestáveis e que estes nomes mereciam toda a auréola dos santos.

Assim disposto, foi então ter com o cardeal, para entregar-lhe os documentos e agradecer-lho a nímia gentileza, manifestando o resultado positivo de seu inquérito, e dizendo-se convencido da rigorosa exatidão dos processos e da certeza dos resultados.

Ah! se todos os processos fossem deste modo seguros e provados, exclamou o professor protestante, ninguém mais podia duvidar dos santos existentes na Igreja Romana.

Mas, qual não foi o seu espanto, quando o cardeal lhe respondeu:

- Pois bem, todas estas causas que o sr. julgou irrefutáveis e certas, foram rejeitadas pela Igreja como insuficientes, nenhum deste milagres foi aprovado pela comissão.

O professor caiu das nuvens... ou melhor, saiu do erro protestante, e hoje venera e invoca os santos com tanto maior fervor quanto mais os desprezara antes, enquanto protestante.

***

Conhecendo agora como se canoniza um santo e o que é exigido para isso, podemos resolver o problema posto pelo nosso batista-maçon.

Dos 266 papas, 86 são canonizados

— Por quem, pergunta ele?

Pelos papas, segundo os trâmites que acabo, de indicar, tendo sido examinados a vida, a doutrina e os milagres feitos por eles.

Citemos aqui a lista admirável destes santos papas, desde São Pedro até S. Felix, sem nenhuma interrupção, isto é, do Ano 32 da era cristã até ao ano 532, tendo-se sucedido neste intervalo 57 papas, todos eles santos canonizados.

Do ano 532 até os nossos dias, uns foram canonizados, outros não, porém, todos, fora de uns três, talvez, têm sido homens de extraordinárias virtudes.

As calúnias protestantes têm procurado lançar a sua lama sobre a túnica alva de certos pontífices, porém, à medida que as paixões humanas vão diminuindo, e que a história verdadeira vai sendo examinada mais imparcialmente, desaparecem tais manchas, e não está longe o dia em que o papado brilhará com todo o fulgor de uma santidade sem sombra, como brilha a sua infalibilidade nunca desmentida.

 

IV. Santos papas

Para vermos, de perto, este fenômeno, único na história, de uma sucessão ininterrupta de 56 papas, sucedendo-se no governo supremo da Igreja, todos eles aureolados com o resplendor da santidade, citemos aqui a lista dos 100 primeiros papas.

Mais eloquente que todos os raciocínios, esta lista admirável mostrará o dedo de Deus, a divindade da Igreja, e a dignidade dos sucessores de São Pedro.

E, notem bem, os papas não são santos porque os seus sucessores assim o declararam, mas os papas os canonizaram porque eles DERAM PROVAS manifestas de sua santidade, pelas virtudes durante a vida e pelos milagres depois da morte.

Esta longa lista será pois um argumento irrefutável para aqueles que sinceramente querem acreditar nos argumentos.

A tal lista será, ao mesmo tempo, a refutação àqueles que procuram aviltar o papado, caluniá-lo, procurando citar nomes de papas perversos, os quais só existem em sua imaginação ou nas histórias falsificadas pelo ódio protestante e maçônico.


SECULO I

S. PEDRO, príncipe dos apóstolos, residiu primeiramente 7 anos em Antioquia; dali transferiu a sede apostólica para Roma, onde sofreu o martírio no dia 29 de Junho do ano 67, depois de ter governado a Igreja durante 34 anos, dos quais 25 anos e 2 meses passou em Roma.

1 S. Pedro governou de 33 a 67.

2 S. Evaristo da Síria 67 a 69.

3 S. Anacleto 79 a 90.


SECULO II

4 S. Clemente I, romano, mártir 90 a 99.

5 S. Evaristo, da Síria 90 a 107.

6 S. Alexandre I, romano 107 a 116.

7 S. Sisto I, romano 116 a 125.

8 S. Telesforo, grego 125 a 136.

9 S. Hygino, grego 136 a 140.

10 S. Pio I, d'Aquiléa 140 a 154.

11 S. Aniceto, siríaco 154 a 166.

12 S. Sotero, da Campania 166 a 174.

13 S. Eleuterio, epiroto 174 a 189.


SÉCULO III

14 S. Victor I, africano, mártir 189 a 198.

15 S. Zeferino, romano 198 a 217.

16 S. Calisto, 217 a 222.

17 S. Urbano, 222 a 230.

18 S. Ponciano, 230 a 235.

19 S. Antero, grego 235 a 236.

20 S. Fabiano, romano 236 a 250.

21 S. Cornélio, romanno 251 a 253.

22 S. Lucio I, romano, 253 a 254.

23 S. Estevão I, romano, 254 a 257.

24 S. Sixto II, de Atenas 257 a 258.

25 S. Dionísio, de Tunis 259 a 268.

26 S. Felix I, romano 269 a 274.

27 S. Euticiano, toscano 275 a 283.

28 S. Caio, dalmata 283 a 296.


SÉCULO IV

29 S. Marcelino, romano, mártir 296 a 304.

30 S. Marcelo, romano 308 a 309.

31 S. Eusébio, da Calabria 309 a 310.

32 S. Melchiades, africano 311 a 314.

33 S. Silvestre I, romano 314 a 335.

34 S. Marcos, romano 336

35 S. Julio I, romano 337 a 352.

36 S. Liberio, romano 352 a 366.

37 S. Damaso, português 366 a 384.

38 S. Siricio, romano 384 a 399.


SÉCULO V

39 S. Anastacio, romano 399 a 401.

40 S. Inocencio I, de Albano 401 a 417.

41 S. Zozimo, grego 417 a 418.

42 S. Bonifacio I, romano 418 a 422.

43 S. Celestino I, da Compania 422 a 432.

44 S. Sixto III, romano 432 a 440.

45 S. Leão I, toscano 440 a 461.

46 S. Ilaro, de Cagliare 461 a 468.

47 S. Simplicio, de Tivolo 468 a 483.

48 S. Felix II (III), romano 483 a 492.

49 S. Gedasio I, africano 492 a 496.

50 S. Anastacio II, romano 496 a 498.


SÉCULO VI

51 S. Simaco, romano 498 a 514.

52 S. Hormisdas, de Frassinoni 514 a 523.

53 S. João I, toscano, mártir 523 a 526.

54 S. Felix III (IV), de Benevento 526 a 530.

55 S. Bonifacio II, romano 530 a 532.

56 S. João II, romano 533 a 535.

57 S. Agapito I, romano 535 a 536.

58 S. Silverio, de Fron, mártir 536 a 537.

59 Virgilio, romano 537 a 555.

60 Pelagio, romano 556 a 561.

61 João III, romano 561 a 574.

62 Benedito I, romano 574 a 579.

63 Pelagio II, romano 579 a 590.

64 S. Gregorio I (Magno), romano 590 a 604.


SÉCULO VII

65 Salbiniano, de Volterra 604 a 606.

66 Bonifacio III, romano 607 a 607.

67 S. Bonifacio IV, Marso 608 a 615.

68 S. Adeodato, romano 615 a 618.

69 Bonifacio V, de Napoles 619 a 625.

70 Honorio 1, da Campania 625 a 638.

71 Severino; romano 640 a 640.

72 João IV, dalmata 640 a 642.

73 Theodoro 1, grego 642 a 649.

74 S. Martinho I, de Todi, márt. 649 a 653.

75 Eugenio 1, romano 654 a 657.

76 S. Vitaliano, de Segni 657 a 672.

77 Adeodato, romano 672 a 676.

78 Dono, romano 676 a 678.

79 E Agathão, grego 678 a 681.

80 Leão 11, siciliano 682 a 683.

81 Benedicto II, romano 684 a 685.

82 S. João V, antiochiano 685 a 686.

83 Conon, da Thracia 686 a 687.


SECULO VIII

84 S. Sergio 1, siciliano 687 a 701.

85 João VI, grego 701 a 705.

86 João VII, grego 705 a 707.

87 Sisinnio, da Syria 707 a 707.

88 Constantino I Syria 708 a 715.

89 S. Gregorio II, romano 715 a 731.

90 S, Gregorio III, da Syria 731 a 741.

91 S. Zacharias, grego 741 a 752.

92 S. Estevão II, romano 752 a 757.

93 S. Paulo I, romano 757 a 767.

94 S. Estevão III, de Syracusa 768 a 772.

95 Adriano I, romano 772 a 795.

96 S. Leão , 795 a 816.

97 S. Estevão IV, 816 a 817.

98 S. Pascoal I, romano 817 a 824.

99 Eugenio II, romano 824 a 827.

100 Valentino romano 827 a 827.


Conclusão

Paremos aqui...

Eis os 100 primeiros papas, com a sua origem e o tempo do seu pontificado.

Para um protestante sincero, que continuamente ouve falar dos papas como monstros humanos, e do papado, como sendo uma invenção romana, tal lista deve fazer impressão.

E note ele, que tal lista não é uma combinação romana; mas, sim, um fato HISTÓRICO, que a própria história profana transmite e confirma.

Que prova isto?

Prova, primeiro, que o papado é verdadeiramente uma INSTITUIÇÃO DIVINA.

Ele desce diretamente do próprio Jesus Cristo, que escolheu São Pedro, como primeiro papa; e os papas foram se sucedendo através dos séculos, com uma pontualidade quase matemática.

Os papas dos três primeiros séculos, salvo s excepções, foram martirizados.

Como o seu grande chefe, São Pedro, eles também pagaram, solene profissão de sua fé.

Ora, apenas corre o sangue de um papa, os chefes da Igreja se reúnem e, sob a inspiração do espírito Santo, elegem-lhe um sucessor que, por sua vez, apenas poucos meses depois de sua eleição, é arrancado de seu trono, tingindo de seu sangue o cetro imortal da soberania que acaba de receber.

Mas pouco importa!

Sucedem-se novos papas...

Com um heroísmo quase dramático, senta-se um outro sobre o trono há pouco banhado pelo sangue de seu antecessor e enquanto eleva o seu cetro para governar o mundo católico, inclina a cabeça, para dar a sua vida pelo rebanho dos cristãos.

E apesar do martírio ceifar os papas, e deitá-los num túmulo sempre aberto pelas perseguições, a Igreja nunca fica sem pastor.

A palavra de Cristo realiza-se ao pé da letra: Eu estou convosco até ao fim dos séculos. (Mt27,20)

Nunca as portas do inferno prevalecerão contra a Igreja. (Mt16,18)

Oh! diga-me, caro protestante, não é admirável isso? não é divino? não é um milagre perpétuo do poder divino?

E assim vai sucedendo os papas, desde S. Pedro até ao Pontífice atual, Pio XII, gloriosamente reinante.

***

E o que não é menos divino que esta SUCESSÃO ininterrupta é a SANTIDADE dos papas.

Já expliquei o que é preciso para ser santo, e para ser canonizado,

Pois bem, examine esta longa lista dos cem primeiros papas, e veja quantos entre eles têm ante o nome a letra S, que indica que já são canonizados.

Os 57 primeiros papas, sem nenhuma exceção, são canonizados.

Eis 57 heróis da fé e da virtude, e estes, mártires heroicos, sucedem-se sem desfalecimento... sem hesitação.

De 57 em diante, vão-se alternando os que, são santos canonizados, e outros que, embora não o sejam, foram quase todos homens de extraordinária virtude.

Aqui e acolá há uns que não são santos, porém a santidade cerca sempre o seu trono, e de vez em quando aparece com mais fulgor, durante a sua vida e após a morte.

Examine a lista, caro protestante, e diga-me se tudo isso não é admirável e divino!

O fulgor da santidade, que realça e eleva a Cátedra de S. Pedro, é tão grande e refulgente, que os hereges e viciados de todos os tempos concentram sobre ela o seu ódio e as suas calúnias.

Mas calúnia não é argumento, nem história; é baixeza, indigna de um homem sincero.

Medite, pois, no que acabo de expôr aqui sobre o papado, e tire a conclusão que dimana dos fatos históricos certos.

Esta conclusão deve ser necessariamente a admiração, o respeito, a submissão e a convicção de que o Papa é verdadeiramente O SUCESSOR de S. Pedro, e que estes sucessores sempre estiveram e sempre estão na ALTURA de sua sublime missão, que é representar o Cristo aqui na terra e conservar integra a religião divina ensinada por Ele.

Assistido pelo espírito Santo, o Papa sempre tem confirmado os seus irmãos, como lho pediu o Salvador: Confirma fratres tuos. (Lc21,32).


Os maus papas

O meu consulente batista acaba naturalmente a sua lista de objeções, dizendo que tendo eu dado informações sobre a vida de Lutero, devia dar também sobre a vida de certos papas, e dizer o que foram Xisto IV, Innocencio VIII, João XI, Alexandre VI.

Pois não, caro amigo; vamos percorrer um instante a vida destes papas, ou melhor, quero mostrar-lhe o que foram, porque vejo que o senhor o ignora completamente, ou conhece apenas a história dos papas através das calúnias protestantes.

Não se deve repetir simplesmente o que os inimigos da religião vão citando. Em questões tão graves, é preciso recorrer às fontes, ou pelo menos a autores sérios e desapaixonados.

Digamos aqui umas palavras sobre cada um destes papas incriminados, e analisemos-lhes a vida com sinceridade e franqueza.

 

1. O Papa Xisto IV

O Papa Xisto IV ocupou o trono Pontificial de 1471 a 1484, isto é, durante 13 anos.

A memória deste Papa tem sido enxovalhada indignamente pelos inimigos da religião.

O tradutor de César Cantú, protestante fanático (Antonio Ennes), sob pretexto de pôr a história universal em conformidade com o estudo atual das ciências históricas, falsificou completamente a história dos papas, tecendo ou reproduzindo estas miseráveis lendas, que bem mostram a ódio protestante, a mentira baixa dos sectários, na triste faina de rebaixar a glória da sede de São Pedro.

O livro de Cesar Cantú, atualizado pelo sr. Antonio Ennes, não merece nenhuma fé, desde que trata de história da Igreja; é um simples caluniador, um falsário da história verdadeira, como se pode prová-lo pelas histórias contemporâneas e por numerosos documentos até hoje conservados nas bibliotecas antigas.

O Papa Xisto IV, no século: Francisco de la Novere, era religioso Franciscano, e foi até geral de sua ordem.

Os historiadores contemporâneos falam de sua admirável piedade e de seu espírito ponderado.

E assim devia ser.

Quem conhece um pouco as ordens religiosas, sabe que sendo o superior geral eleito entre os mais dignos da ordem, tais superiores são quase sempre homens de virtudes e de capacidades superiores.

O Embaixador Nicodemo de Pontremoli, que o conhecia de perto, diz que “era de todos conhecida a piedosa e santa vida levada por ele, até ser eleito Papa aos 57 anos”, idade em que não se acredita facilmente que uma pessoa piedosa possa mudar completamente de procedimento moral.

Um outro testemunho ocular, Senarega, genovez e embaixador em Roma, escrevendo mais tarde os anais de sua cidade, faz os maiores elogios do Papa Xisto IV, dizendo que era: “muito insigne pela santidade de sua vida.”

Do mesmo modo exprimem-se os cronistas contemporâneos Angelo de Tumulillis e André Bernardo.

A linguagem dos historiadores imparciais, da época é unanime em louvar a virtude deste, pontífice.

O único que levantou a voz para caluniar este papa, foi um inimigo da religião e dos papas, um politiqueiro chamado Infessura.

Mas, que valem as acusações de um sectário diante da unanimidade dos testemunhos contrários? Testis unus, testis nulus, dizem os causídicos.

Os próprios historiadores protestantes reconhecem a calúnia, que só o ódio ou a ignorância pode propalar acusações que nunca foram provadas.

O Anglicano Creighton (III,115), por exemplo, escreve: “Infessura manchou a memória deste Papa, com acusações dos mais atrozes crimes. Estas incriminações, feitas por um homem parcial, que escreve com patente animosidade devem ser desprezadas como destituídas de provas.”

O historiador Reumont (Lourenço 11, 453) não é menos explicito. ele escreve: “Infessura exagera contra a verdade a culpa do Papa.” E chama-o: “o verdadeiro representante da inexaurível maledicência dos romanos, o qual ofereceu matéria a todos aqueles que se deleitam em casos escandalosos.”

Mais outro historiador, Gregorovius, diz que há mentira patente em Infessura (L. Borgia, Siuttgart, 1847, 11-12).

Frantz (p. 481 e 483) que estudou cuidadosamente a vida de Xisto IV, tal qual o apresentou o caluniador Infessura, mostra adulterações da verdade feitas por ele, dizendo que chega a aceitar pasquinadas como testemunhas irrefragáveis, (V. Thomasini, 550).

Diante destas afirmações eu pergunto ao meu consulente, onde está a verdade?

A história imparcial inteira, sem exceção, considera o Papa Xisto IV como um homem de excepcionais virtudes.

Uma única voz levanta-se entre estas testemunhas, a voz de um sectário, inimigo do Papa (pois era um partidário dos Colonas, que combatiam o Papa).

Esta única voz, a de Infessura, foi repelida e refutada pelos próprios contemporâneos e historiadores subsequentes, como caluniadora e mentirosa.

Que fica, pois, em pé?

A verdade da história, não como conta o falsificador de Cesar Cantú, mas como o proclama a tradição e a história.

O Papa Xisto IV era um homem de virtude, e não manchou em nada a alva túnica de seu pontificado.

Não quero aqui contar, em seus pormenores, a vida e o governo deste ilustre Pontífice; basta refutar as calúnias atiradas contra ele, mostrar a sua completa inocência, e o ódio maldizente dos protestantes que aceitam e propalam tudo o que é contra a Igreja, sem examinar as fontes, ou os fatos destas calúnias.


II. O Papa Innocencio VII

O Papa Innocencio VII figura também na lista negra dos inimigos da Igreja. Este Pontífice foi o sucessor de Xisto IV no governo da Igreja, e reinou de 1484 a 1492, ocupando a Sé Apostólica, durante quase 8 anos e glorificando-a pelas mais belas virtudes como pelo zelo mais esclarecido.

Para bem compreender a ação deste papa como a de seu antecessor, necessário seria historiar a Inquisição tão difamada pelos inimigos da Igreja, que querem atribuir á Igreja um excessos dos governos.

Innocencio VII, antes de entrar nas ordens sagradas, era um rico negociante de Gênova, foi casado e teve muitos filhos.

Após a morte de sua esposa, ordenou-se e foi um sacerdote exemplar.

Sua virtude, seus talentos e seus sucessos em vários negócios importantes o fizeram nomear sucessivamente bispo, cardeal e depois papa, em sucessão a Xisto IV.

Era na época de grandes perturbações na Europa.

Fernando V e Isabel, rainha de Castela, sua esposa, depois de oito anos de guerra contra os mouros, acabaram por tomar-lhes a cidade de Granada, sua capital.

Pela tomada desta cidade, a Espanha ficou livre para sempre da dominação dos muçulmanos, que os esmagava desde mais de oito séculos.

Nestes momentos de entusiasmo patriótico, no delírio de uma vitória tão assinalada, compreende-se que houve da parte dos espanhóis uma reação contra os mouros, judeus e hereges.

Desejosos de firmar os seus triunfos, os reis da Espanha queriam expulsar o resto dos maometanos e os próprios hereges, que tanto sangue tinham derramado no solo pátrio.

Fernando e Isabel pediram, pois, ao Papa, Xisto IV a licença de erigir em seus Estados o tribunal da Inquisição, para confirmar a fé e felicidade de seus povos; porém, convém salientá-lo: a Inquisição não tinha o caráter bárbaro e perseguidor que os protestantes lhe atribuem.

O Papa Xisto IV concedeu a licença em, 1478, porém com dificuldade e com condições, destinadas a salvaguardar os direitos que a caridade cristã reconhece sempre ao arrependimento.

Esta Inquisição era independente dos bispos e colocada sob a autoridade do rei.


Tinha um fim inteiramente político e assemelhava-se, nas ideias de Fernando e Isabel, ao que chamamos no Brasil “a polícia estadual" (V. Histor. protestantes Ranke, Leo, Guizot, etc.)

Os regulamentos foram feitos em conselho real, pelos dois soberanos, e Torquemada, a quem se tem tanto caluniado, nada mais fazia, do que executá-los.

À Inquisição na Espanha, foi em geral mais severa do que entre os outros povos.

Roma censurou várias vezes seus atos e foi mesmo um lugar de refugio para muitos culpados ou acusados, que apelavam para os juízes, sempre mais indulgentes da côrte pontifícia.

Talvez se deva atribuir essa severidade da Inquisição espanhola ao seu caráter exclusivamente político.

Os espanhóis, exasperados pela má fé dos judeus, e por tantas lutas contra os mouros, não podiam deixar de se conduzir com algum rigor.

São as reflexões de Balmes (Tom.1) do cardeal Paca (Mem. t. II) e de Berault (t. VIII).

E mesmo assim, com todo o seu rigor, este tribunal procedia com justiça e paciência.

Os juízes anunciavam aos hereges um termo de graça de 30 para 40 dias, durante os quais eles podiam reconhecer a sua culpa, pedir e obter o perdão.

Qual é o tribunal civil de hoje que principia por oferecer a graça e misericórdia aos culpados?

Nenhum.

E o tribunal da inquisição o fazia impreterivelmente.

Basta de exageros e de calúnias.

Para julgar uma instituição é preciso conhecer os tempos, os costumes desta época, e analisar os fatos em seu quadro próprio, e não conforme as ideias do tempo em que vivemos.

Quanto ao número das pessoas que pereceram, sobre o cadafalso, é incontestável que a inquisição, não só na Espanha, mas das quatro partes do mundo, derramou muito menos sangue do que as guerras civis das diversas nações.

Eis a época em que apareceu o Papa Inocencio VIII.

A sua ação foi calma, energética, justiceira, e nenhuma violência perturbou os oito anos de seu reinado.

Para poderem manchar a alva túnica deste pontífice, os protestantes inventaram as mais extravagantes e absurdas acusações.

Innocencio VII, elevado à suprema dignidade da Igreja, recebia frequentes visitas de sua família.

Nada havia de se admirar nisso, pois tendo sido casado, e tendo diversos filhos, era natural que estes últimos, com as suas famílias, visitassem o pai, o sogro, e talvez avô.

Este fato tão natural e tão simples deu ocasião a maliciosas críticas e a calúnias mesquinhas e inverossímeis.

Os historiadores contemporâneos, entre os quais Onufro, louvam a mansidão exemplar deste pontífice, a perfeita integridade no fim de sua vida e limitam as acusações inventadas contra este pontífice. Nenhuma delas resiste ao mínimo exame, tanto da história tanto do bom senso.

É invenção do ódio protestante, para amesquinhar a glória do trono de S. Pedro, porém a história já fez justiça a este ódio, e o trono papal resplandece sempre na majestade de uma indefectível grandeza.


III. O Papa Alexandre VI

O sucessor de Innocencio VIII, foi o Papa Alexandre VI, no século: Rodrigues Lenzuoli. Antes de entrar no sacerdócio, Rodrigues era oficial nos exércitos do rei de Espanha.

Nascera em Valença no Ano 1431; foi nomeado cardeal em 1456 por Calixto III, papa virtuoso e sábio, promovido ao soberano pontificado em 1492, com 61 anos de idade; morreu em 1503, tendo governado a Igreja durante 11 anos.

Os inimigos da religião imputam-lhe toda espécie de crimes, devassidão, incestos, usurpações, envenenamentos, assassinatos, etc. porém, parece certo que estas acusações não passam de outras tantas calúnias.

É verdade, segundo a maior parte dos historiadores, Rodrigues Lenzuoli ou Borgia teve 5 filhos durante a sua vida militar; mas Chantrel, autor distinto e consciencioso, prova com ótimas razões que se esta asserção não é falsa (pois a dúvida é fundada), o jovem guerreiro teve esses filhos dum legitimo matrimônio; ele conservou sempre bons costumes no meio, mesmo dos exércitos, e que não entrou no sacerdócio senão depois da morte de sua mulher, (Hist. pop. des Papes: t. 17, p. 37 a 76).

Irrepreensível na carreira das armas, sua, conduta tornou-se edificante todo o tempo do seu cardinalato.

“A vida do cardeal Borgia, diz Chantrel, foi sempre exemplar e digna de elogios; para o acusarem, seus inimigos foram obrigados a acoimá-lo de hipócrita.”

"Ele era tão estimado (por suas virtudes, como por seus talentos) que se lhe confiava os negócios mais importantes da Igreja e do Estado, e na morte de Innocencio VIII, os cardeais o escolheram unanimemente entre três candidatos, como o mais digno do pontificado e o mais capaz de remediar os grandes males que ameaçavam e principiavam a perturbar a religião e a sociedade”. (Td. p. 125).

Alexandre VI correspondeu plenamente à expectativa geral.

Homem de vasto gênio e de perfeita integridade, restabeleceu a ordem e fez respeitar a Justiça.

Segundo Audin, sob o seu pontificado, tanto o pobre como o rico, puderam achar juízes em Roma.

Povo, soldados, cidadãos, todos lhe tinham a maior estima e o mais sincero afeto.

Sua vida era piedosa, laboriosa, caritativa, sóbria e austera (Hist. de Leon X, t. I) e sua te foi tão bela e edificante como seu pontificado. (Chantrel: Ib. p. 195).

Em uma palavra, Alexandre VI, conclui Chantrel, foi um GRANDE REI e um GRANDE PAPA.

***

Como explicar a origem de tantas imputações contra aquele Pontífice?

Sua energia em reprimir as desordens e em repelir as pretensões dos príncipes rebeldes, juntas à circunstância de ter ele tido filhos na sua mocidade, embora legítimos, foi mais que suficiente para dar lugar a essas falsas acusações.

Quantas vezes a calúnia é ainda mais gratuita.

Não vale a pena levantar todas as atrocidades assacadas à memória deste ilustre pontífice.

Fala-se, por exemplo, de seu comércio incestuoso com a filha Lucrécia, porém este pretenso crime não passa de fábula, fabricada pelo ódio protestante.

O historiador Burchard, que é tão brutal em sua narração e tão franco em contar tudo quanto ele achou de mau na vida de Alexandre VI, não diz uma palavra sobre tal comércio incestuoso.

Outros acusaram o pontífice de ter envenenado o irmão do sultão Bajaset, chamado, Djem.

Ora, o mesmo Burchard afirma que a causa da morte de Djem foi uma comida que lhe fez mal; e o médico do príncipe atestou que sucumbira a um catarro do peito:

Muitas outras testemunhas refutam tal calúnia.

Brognolo, testemunho ocular, escrevia em 1495 ao Marquês de Mantua: “A 25 do passado morreu em Nápoles o irmão do Grão turco; acredito em sua morte natural, ainda que muitos dizem que lhe foi dado de beber veneno: o que é verdade é que era desregradíssimo em tudo”.

Outra acusação: o envenenamento do cardeal Orsini.

É outra calúnia, já refutada. Um amigo, do cardeal Orsini, Justiniano, escrevendo ao Doge, diz que o cardeal Orsini estava nas últimas, e que os médicos desesperavam de o salvar, sem dizer uma palavra de tal envenenamento.

Mais outra calúnia:

Dizem que Alexandre VI e seu irmão César morreram de um veneno que tinham preparado para os cardeais.

É uma inépcia.

Tal notícia achou assento na enfermidade simultânea do Papa e de César, e na rápida corrupção do cadáver.

O consciencioso historiador Von Pastor diz que a última doença do Papa foi a perigosa febre romana, e, segundo o parecer de um dos médicos assistentes, a causa imediata da morte foi a apoplexia.

“A noite de 17 para 18, diz Von Pastor, foi má; a febre voltou com violência.

Alexandre VI confessou-se ao bispo de Carinola e comungou.

O seu irmão César Borgia, melhorou e venceu a enfermidade, mas a idade avançada do Papa não resistiu ao ataque (contava 73 anos) e morreu na mesma tarde.” “Considerando o intervalo do estado normal de saúde, que durou seis ou sete dias, desde os primeiros sintomas da doença, e considerando também o curso dos acessos periódicos da febre, deve-se, sem dúvida alguma, excluir o envenenamento,” E Von Pastor conclui; “Vai também de encontro a tal hipótese a relativamente pequena violência dos fenômenos ocorridos, o relativo bem-estar entre o primeiro e o segundo acesso, e finalmente a própria duração da enfermidade e os sintomas da mesma”. (Hist, dos papas II, 474 e seg).

Quem levantou tais calúnias foi sobretudo o libertino Guicciardini; pois bem, escute apóstrofe que o ímpio e insuspeito Voltaire lhe dirige a esse respeito: “Eu ouso dizer Guicciardini: A Europa é enganada por ti, e o tens sido pela tua paixão; tu eras inimigo da Papa, tu acreditaste demais no teu ódio”. (Dissertação sobre a morte de Henrique IV).

Eis o ilustre Papa Alexandre VI, tão caluniado pelos inimigos da religião, vingado por uma crítica sã e desapaixonada da história e reabilitado ma glória e na majestade de sua dignidade.

Chamo a atenção sobre esta reivindicação de dignidade, dos próprios escritores católicos, pois um certo número dentre eles, tem se deixado iludir pelas asserções caluniosas de Bembo, Giovio, Sanuto e Pedro mártir, que todos foram copiando calúnias uns dos outros, sem procurarem provas sérias e fundadas.

Muitos livros católicos procuram restringir os pretensos crimes do Papa Alexandre VI, mas poucos têm tido a coragem de refutá-los, de rejeitá-los, como asserções sem provas.

Este desagravo mostra com quanta cautela se deve ler ou ouvir as imputações formuladas contra os soberanos Pontífices.

Lembremo-nos que a revolta e o ódio procuram sempre abater as cabeças mais altas.

Sendo o Papa a cabeça da Igreja, tem contra ele o rancor, o ódio, a calúnia e os insultos de todas as heresias e de todos os vícios.


IV. O Papa João XI

Deixei para o último lugar o Papa João XI, mais uma vítima do ódio anti-clerical.

Este Pontífice foi eleito Papa em 931, e morreu em 936, após um pontificado apenas de 5 anos incompletos.

Para compreender as razões das acusações levantadas contra este Pontífice e os outros que o seguiram, é preciso conhecer um pouco a decadência desta época de sangrentas perseguições de cisma, de heresias, de invasão dos bárbaros.

No meio das paixões políticas, das violências e vinganças daquela época sucederam-se quatro papas, todos os quatro incriminados, porém sem prova nenhuma; são: Sergio III, João X, João XI e João XII.

O meu consulente fala apenas de João XI, porém não será inútil lançar um olhar escrutador sobre os quatro para melhor compreendermos a sua ação, no meio da agitação daquele tempo.

É certo que houve um tempo em que o papado se tornou vítima dos partidos que se disputavam Roma e o cetro imperial.

Diversos papas sucederam-se, no governo da Igreja, alguns deles, talvez, sem o devido preparo, e até sem os antecedentes que os deviam recomendar ao mundo católico; entretanto, fato maravilhoso, digno de reparo e que patenteia a assistência divina da Igreja, nenhum destes papas falhou no desempenho de suas altas funções de chefe da Igreja.

Não somente nenhum deles, na cadeira de Pedro, ensinou o erro, mas, diversas vezes, embora suspeitos em sua vida anterior, quando nomeados papas, mostraram-se virtuosos e hábeis.

A época era de decadência geral, e certo papas deste tempo, promovidos ao solio pontifical pelas facções, muitas vezes sem liberdade, nada podiam fazer para preservar da decadência os povos que lhes eram confiados.

Roma era dominada pela condessa Teodora, princesa de Toscana, e suas filhas, Teodora, a moça, e Marozia, afamadas pelas suas desordens e poderosas pelas alianças que tinham formado.

Intrometeram-se diversas vezes na eleição dos papas, procurando colocar, na Sé pontifical, bispos por clãs protegidos.

O fato é certo; porém não prova ainda que tais bispos ou cardeais, embora protegidos por estas princesas poderosas, por serem filhos de amigos ou parentes, fossem indignos das honras do Pontificado.

Deus se serve até das paixões dos homens e dos acontecimentos políticos, para executar os desígnios de sua Providência.

Os papas desta época, em consequência das desordens destas protetoras, têm sido injusta e indignamente acusados, porém, sem provas suficientes, e muitas vezes por paixões políticas contrárias.

O primeiro destes papas é Sergio III.

Flodoardo e outros historiadores graves e conscienciosos afirmam e provam que Sergio subiu ao trono pontifício (em 905), não pelas intrigas de Marozia, como dizem os inimigos da Santa Sé, mas a pedido do clero e do povo romano, segundo o costume daquele tempo.

Acrescentam que Sergio, longe de levar uma vida criminosa com sua pretendida protetora, honrou tanto a seu pontificado, que se fez admirar por todo o orbe católico. (1) igualmente falso dizer-se que João X, chegado ao pontificado por empenho de Teodora, não tivesse outro mérito senão o de um belo exterior e de um amor culpado para sua protetora.

(1) Hist, de Pinfaill des Papes: Rohrbach, T, XII — Blanc: Tom. II. — A. Goud: Hist, Eccl.

A verdade é que ele foi um papa cheio de sabedoria, fiel a todos os seus deveres, digno de veneração, e que, durante mais de 14 anos, foi a glória e a felicidade da Igreja romana.

Ele foi digno, conclui Flodoardo (2), por sua morte, de ir ocupar um lugar no céu, pois, foi assassinado, no Ano 928, por ordem de Marozia; isto vem a ser, que morreu pela justiça.

(2) Flodoardo — Nicolas le Mystique, Patriarche greg.— Muratori.


Marozia, a mulher depravada, fez assassinar este pontífice, só porque não lhe era simpático e não se sujeitava a seus caprichos.

Bastaria este fato para provar que este papa não foi imposto por esta criatura, e nem sequer tinha a sua estima.

Sucederam a João X os papas: Leão VI e Estevão VIII, ambos de curto pontificado, morrendo o último em 931, após dois anos de reinado.

Aqui intervém a opressão onipotente de Marozia, ela fez nomear papa, com o nome de João XI, um filho que tivera, por um comércio criminoso, de Guy, duque de Spoleto.

Este soberano Pontífice foi ordenado na idade de 25 anos, e deixou-se inteiramente governar por um irmão uterino, que afinal fê-lo lançar numa cadeia onde morreu miseravelmente em 955.

Afora sua injustificável fraqueza não se lhe exprobaram crimes ou inconduta.

É certo até que estabeleceu regras, cheias de sabedoria, para a canonização dos santos e a eleição dos papas.

As acusações, levantadas contra este papa, são grotescas, ridículas e sem fundamento; e basta falar de sua morte, como prisioneiro de seu próprio irmão, para refutar os absurdos inventados contra ele.

Falta ainda João XII, outro filho que Marozia tivera do duque de Spoleto.

A imposição foi mais violenta ainda no caso presente do que no caso de João XI.

um estudante apenas de 18 anos.

É de acreditar que, nesta idade, o jovem não estivesse preparado para tal encargo, porém nada prova que ele fosse indigno.

Não há crimes que os inimigos da Igreja não lhe imputem; porém tais acusações são desmentidas pelos historiadores mais sérios e pelos monumentos contemporâneos.

Um concílio, celebrado em 964, encerra um belo elogio deste papa (1), mostrando assim, publicamente, que se houvesse qualquer irregularidade em sua promoção, a sua vida estava à altura de seu cargo e de sua dignidade.

O meu consulente pediu apenas uma explicação sobre a vida de João XI; eis que fui além de seu pedido, e talvez, sem que ele o soubesse, assinalei mais outros papas incriminados dando-lhe a explicação de todos eles. (2)

(1) Henri Leo: Hist. d'Italia — De Othon Frenisque — Baronio — Muratori, ismondi — Miley

(2) Para 05 outros papas acusados, ver o nosso livro: Balburdia protestante,

 

Cap. VII — Os maus papas.

Conclusão

Terminando aqui o libelo de meu consulente, devem também parar as respostas.

Creio ter respondido a tudo, não deixando uma só virgula nas trevas, de modo que o amigo batista, sendo sincero e leal, poderá ele mesmo tirar a conclusão, e verificar que a objeções formuladas contra a Santa Sé de Roma não passam de calúnias sem fundamento, asserções sem prova e de argumentos balofos.

Um homem sério, desejoso de conhecer a verdade, e não de satisfazer a preconceitos e paixões, deve confessar que o papado é a mais bela e sublime instituição deste mundo; é tão sublime que ultrapassa o esforço humano, mostrando por si ser uma instituição divina.

Não negarei que tenha podido haver fraqueza na pessoa de certos papas, porém estas fraquezas são raríssimas, constituem a rara exceção e nunca alcançaram o ensino infalível da autoridade suprema, que o papa representa e de que ele é o órgão vivo neste mundo.

As acusações, acumuladas pela heresia, pelo ódio e o vício, são quase sempre falsas e sempre exageradas.

Entre os diversos papas acusados, há apenas uns três, quando muito, contra os quais a acusação parece ter algumas provas convincentes: um no X século, outro no XI e outro no XV. Digo e repito que as acusações parecem ter umas provas, mas não digo que as têm, porque até para os mais incriminados há contraditores sérios e contradições flagrantes.

E estes poucos fatos não podem escandalizar a ninguém; ao contrário, mostram a proteção especial da Providência, mostram que os papas são homens, revestidos de uma autoridade divina.

Aliás, a exceção prova a regra; não se notaria tanto as faltas de uns papas, se a imensa maioria não fosse digna, santa; sobre um papa que escandalizou a Igreja, cinquenta a edificaram.

É incontestável que nenhum trono no universo produziu tanta sabedoria, ciência e virtude como o trono de S. Pedro.

***

Podia-se perguntar aos detratores de Roma, porque privilégio inaudito quereriam que em tempos de decadência universal, tanto nos povos como nos monarcas, a santa Sé estivesse ocupada senão por homens excepcionais, geniais e santos?

A infalibilidade não é gênio, nem impecabilidade, mas, sim, à preservação do erro em tudo o que diz respeito á fé e á moral.

Um outro fato, verdadeiramente divino que mostra com quanto desvelo Jesus Cristo dirige e protege a sua Igreja é o não haver em dias de perturbações nem hereges, nem impostores, nem lobos, procurando perturbar o divino rebanho.

Parece que nos tempos em que o pontificado romano luta com dificuldades internas, o demônio do erro fica encadeado.

Quando, por raríssima exceção aparece, sobre o trono eterno de Pedro, um papa incapaz, é neste tempo que a Igreja goza de uma tranquilidade perfeita, como se Deus não permitisse que a verdade fosse atacada, desde que o seu representante não esteja em condições de defendê-la.

Se Deus permite que pilotos indignos sentem-se ao leme, ele mesmo então encarrega-se de dirigir o navio da Igreja.

Parece que Deus permite, às vezes, estas nuvens de decadência para melhor salientar o brilho da luz divina.

ele reserva para si o governo supremo; os homens são seus instrumentos; quando os instrumentos não são aptos, ele mesmo age diretamente, mostrando, deste modo, que ele é o Chefe Supremo, a pedra fundamental, a base da Igreja.

E estas falhas, além de fortificar a nossa fé em Deus, devem aumentar a nossa confiança em sua Igreja.

Terminemos com a citação de um pequeno trecho do conhecido Papini, autor da história de Cristo:


QUEM É O PAPA?

“Aquela criatura é um homem como nós e fala em nome da divindade.

É uma criatura terrestre, como nós o somos, e fala sempre do céu, mesmo quando parece conversar sobre as coisas da terra.

Que é vivente e em perene comunhão com os mortos.

Que é moderno e parece antiquíssimo, porque representa a perpetuidade.

Que é pecador e, entretanto, pode perdoar toda a culpa e distribuir a herança das gracas deixadas pelos santos.

Que é de uma nação e dirige todas as nações.

Criatura única, que deveria ser ouvida e obedecida mais do qualquer mestre, mais do que qualquer rei.

Eis o Papa!”.

Amor, veneração, pois, à Igreja imortal de Cristo... e que este amor e esta veneração se estendam ao seu chefe visível, no sucessor de Pedro, ao representante de Cristo, ao supremo pontífice desta Igreja... ao Santo Padre, o Papa!


CAPITULO VI

A Dinastia de Pedro

O tempo passava diante de mim... o terrível tempo, que, com a foice destruidora na mão, a tudo abate, destrói e faz desaparecer.

Que fizeste tu, ó terrível destruidor, destes impérios que pareciam encher o universo com o ruído de suas conquistas?

Onde está Tebas?

Onde está Babilônia?

Onde está Atenas?

Onde estão os palácios dos Césares?

E o tempo, com um sorriso melancólico e desdenhoso, indicou com o dedo uns farrapos de púrpura, restos de coroas, colunas de mármore em ruína, sobre as quais se sentavam os pastores descuidados:

Olha! disse-me ele.

E que farás tu dos impérios, das repúblicas que hoje dominam o mundo, e destes cetros, destas coroas, destes tronos tão resplandecentes?...

— O que fiz dos outros: um pouco de pó que o vento dissipará.

— Que farás deste trono aparentemente tão fraco, que nenhum poder humano sustenta, deste trono, em que está sentado, na calma e na oração, aquele que o mundo católico chama o Papa?

O tempo ficou silencioso e irado, e a Eternidade, indicando-o desdenhosamente com dedo, respondeu-me com um acento que ma arrepiou até no mais íntimo de meu ser: Nunca o destruirá! Non praevalebit!...

E diante deste trono eterno, que venho inclinar-me, meu Deus!

É a sublime e divina dinastia deste trono que quero estudar agora.

Tenho refutado as calúnias que a impiedade atirou contra uns papas: é o lado negativo. Quero mostrar agora o lado positivo, a fundação, a grandeza do trono e da dinastia que se senta sobre este trono: a dinastia de Pedro.


I. A Igreja

É um estudo sublime que vamos começar.

São horizontes divinos que vamos contemplar.

Em vez de nos determos na parte NEGATIVA da Igreja, mostrando o que ela NÃO É entremos na parte POSITIVA, considerando o que ela é verdadeiramente.

Para compreender bem o que é o Papa, é preciso não isolá-lo da obra divina que ele dirige: a Igreja, — como para bem compreender a grandeza da Sma. Virgem Maria, é preciso não separá-la do plano divino; mas colocá-la no lado de Jesus Cristo, de quem ela recebe a sua auréola e a sua grandeza.

Ao tratar-se do Papa deve-se seguir o mesmo método.

O Papa, considerado na Igreja, é grande e sublime; aparece aureolado da glória que cerca o próprio Cristo; enquanto considerado isoladamente é um homem dotado do maior poder deste mundo, mas sempre um homem.

Ora, o que devemos ver no Papa é O REPRESENTANTE DE DEUS na terra, é o Chefe mortal de uma Igreja imortal e o guia infalível da verdade eterna.

Façamos este estudo... tão atraente quão sublime...

A Igreja do Cristo é um mundo inteiro de ideias que se levanta diante de nós.

Que é a Igreja?

O Catecismo responde que é a sociedade de todos os cristãos que professam a mesma fé e recebem os mesmos sacramentos, sob a obediência dos legítimos pastores e principalmente do Papa.

É uma definição analítica bela, completa, ao alcance de todos, Podia-se dar uma definição sintética, mais curta, e, para as inteligências cultas, mais luminosa ainda.

Que é a Igreja?

É a sociedade das almas na luz e no amor.

Há sociedades de estudos, de comercio, de negócios: são as sociedades humanas.

Há uma sociedade divina: a reunião das almas.

E que querem as almas?

Querem LUZ E AMOR.

A luz da VERDADE.

O amor DO CORAÇÃO.

Que sociedade sublime!

Os homens se unem para explorar esta verdade única, e banhar-se neste amor, o único amor verdadeiro.

E sendo uma sociedade, deve haver um CHEFE.

E esta sociedade, procurando bens divinos como são a verdade e o amor, o seu chefe deve ser DEUS.

Esta sociedade, funcionando aqui na terra, este chefe deve ser um HOMEM.

Que mistério inefável! Uma sociedade divino humana, com um chefe divino humano.

Sim, é misterioso, mas é divinamente belo, e tudo isto está divinamente realizado na Igreja de Cristo.

A Igreja existe aqui na terra; é uma verdadeira sociedade, uma reunião visível de homens, mulheres e crianças; e esta sociedade tem por chefe o Filho de Deus, o próprio Cristo.

E como o Cristo, imortal, depois de sua morte, ressurreição, ascensão, não pode mais permanecer de modo visível e sensível no meio desta sociedade, ele tem o seu representante, o Papa.

O Papa é da terra, mas representa o céu.

O Papa fala à terra, mas fala do céu.

O Papa ensina na terra, mas a verdade ensinada é do céu.

O Cristo é o chefe da Igreja, abrangendo as igrejas: gloriosa no céu, padecente, no purgatório, militante, na terra.

A majestade de Cristo governa a Igreja do céu.

A misericórdia de Cristo governa a Igreja do purgatório.

O representante de Cristo governa a Igreja da terra.

É uma única Igreja.

É também um único chefe.

A Igreja é pois uma obra divina, uma SOCIEDADE destinada a comunicar aos homens A LUZ E O AMOR.

Mas, para que haja uma sociedade, deve haver um regime, uma forma governamental.

Jesus Cristo escolheu o governo monárquico, porém uma monarquia como que transformada, que nada tem, nem pode ter, do absolutismo das monarquias humanas, como nada, tem do orgulho do governo aristocrático, nem, nada da turbulência dos governos democráticos.

O Cristo formou um governo desconhecido até então: UM e imutável como a monarquia, ativo e ardente como a democracia, resistente e adaptável a todas as circunstâncias... todo HUMANO de um lado, absolutamente DIVINO de outro lado.

Examinemos isto de mais perto, e veremos surgir diante de nós uma Igreja que talvez nos era desconhecida.

Jesus Cristo formou a sua Igreja da terra, sobre o tipo da Igreja do céu.

Um só rebanho e um só pastor.

Fiet unum opile et unus Pastor. (Jo10,16).

A Igreja é tal um sistema planetário, em, que se contam milhares de astros lançados no espaço, com um ÚNICO CENTRO, em redor do qual todos giram em grupos harmoniosos.

É uma unidade perfeita.

Tudo depende do centro, tudo gira em redor do centro, tudo recebe do centro luz e calor.

O sol é o centro de nosso sistema planetário... iluminando tudo, dirigindo tudo na marcha harmoniosa que admiramos, conservando entre os satélites e os planetas a ordem, a unidade e a harmonia.

O PAPA É O SOL DA Igreja. A luz divina, que o Cristo depositou nele, irradia-se sobre todos os membros desta Igreja, pela qual todos recebem dele a luz da verdade e o amor de Deus, que nos fazem girar em ordem perfeita e harmoniosa, em redor do próprio Cristo, que o Papa representa.

Como representante de Cristo, o Papa é aqui na terra o que o Cristo é na Jerusalém celeste, conforme a descrição do Apocalipse: A sua lâmpada é o Cordeiro e as nações caminharão à sua luz. (Ap21,23,24).


II. O Centro da Igreja

O centro da Igreja é Pedro...

Jesus Cristo o indica e o escolhe como tal, desde o primeiro dia; e esta escolha é feita “com uma lentidão calculada, para que o mundo saiba, que tal escolha não é o fruto da casualidade, mas sim de um plano divino.

Se Pedro tivesse vindo primeiro a Jesus, ou tivesse sido escolhido em primeiro lugar, ter-se-ia podido pensar que tal PRIMAZIA provinha de ele ter sido o primeiro a apresentar-se.

O primeiro escolhido não será, pois, Pedro, para bem salientar que não é o primeiro em DIGNIDADE, porque o foi na escolha, mas sim porque o Cristo assim o determinou.

André e João são os primeiros escolhidos.

André vai buscar o seu irmão (Jo,1,42).

Pedro aparece em terceiro lugar; mas, ao aparecer, a cena muda por completo, e ele toma logo o primeiro lugar.

O evangelista o faz notar expressamente:

Jesus, diz ele, fixando nele o olhar disse: Tu és Simão, filho de João, tu serás chamado Cefas, que quer dizer Pedro (pedra). (Jo1,49).

Eis um primeiro distintivo, uma preferência formal, uma ELEVAÇÃO BÁSICA.

O nome vulgar de Simão é substituído por, um nome simbólico e significativo, cujo sentido será explicado pelo porvir.

Esta mudança de nome é extremamente significativa, e na Bíblia só encontramos três casos de tal mudança, e cada vez para exprimir um grande acontecimento.

Deus mudou o nome Abrão em ABRAÃO (Gn.17,5), para exprimir que ele devia ser o pai de muitos povos.

Mudou também o nome de Jacó em o de: ISRAEL (Gn32,28), para significar a força contra Deus, com a qual Jacó lutou contra o anjo.

Aqui muda o nome de Simão, em o de PEDRO, para exprimir que Pedro devia ser o fundamento de sua Igreja. Pedro, em aramaico Kefas, é um nome próprio de pessoa e o nome de pedra, rocha, como, em francês, Pierre significa Pedro e pedra, como, em português, a palavra é quase idêntica.

***

Sigamos agora o desenvolvimento deste o ato do Salvador.

Pouco depois Jesus sobe ao alto de uma montanha, e depois de ter orado muito, escolhe os seus apóstolos, em numero de DOZE.

Ora, diz S. Mateus, os nomes dos doze apóstolos são estes: O primeiro é Simão, que se chama Pedro, e André seu irmão, Tiago, filho de Zebedeu e João seu irmão... etc, (Mt,10,2).

Porque Pedro é o primeiro?

É João que foi o primeiro a falar com o Salvador.

É André que foi o primeiro a exclamar: Encontramos o Messias!

João ou André deviam ser os primeiros.

Porque Pedro passou na frente?

Porque?

Porque o Mestre o quis, o escolheu, o colocou primeiro como chefe dos outros.

Não há outra razão.

***

Mas talvez seja apenas um título, uma precedência de honra!

Escutemos ainda o Evangelista, que vai responder-nos.

Jesus penetra na solidão do Jordão; em caminho ele pergunta a seus apóstolos:

Quem dizem os homens que é o Filho do homem?

E eles responderam: Uns dizem que é João batista, outros que é Elias e outros que é Jeremias, ou algum dos profetas.

E Jesus lhes disse: E vós, quem dizeis que eu sou?

Respondendo Simão Pedro, disse: Tu és o Cristo, Filho de Deus vivo. (Mt,16,13-16).

Escutemos agora a resposta de Jesus Cristo. Ela é de uma majestade, de uma autoridade, de uma força, de uma simplicidade e grandeza singulares.

Bem-aventurado és, Simão, filho de João: porque não foi a carne e o sangue que lho revelou, mas meu Paí que está nos céus; e eu te digo que tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei a minha Igreja, e as portas do inferno não prevalecerão contra ela.

E eu te darei as chaves do reino dos céus: e tudo o que ligares sobre a terra, será ligado, também nos céus; e tudo o que desatares sobre a terra, será desatado também nos céus. (Mt,21,17-19)

Tais são as palavras criadoras do papado.

Sente-se em cada palavra a autoridade suprema do Mestre e Senhor do céu e da terra.

E notemos como foram admiravelmente preparadas tais palavras!

Primeiro, o Cristo separa Pedro da multidão, colocando-o á parte, chamando-o PEDRO ou pedra.

O Cristo precisa de uma pedra fundamental para a sua Igreja, e escolhe esta pedra: Tu és pedra, e não mais Simão.

E porque esta pedra?

Para servir de base à Igreja: Sobre esta pedra edificarei a minha Igreja.

Eis positivamente a INDEFECTIBILIDADE prometida a Pedro.

O fundamento de uma Igreja eterna, imutável, contra a qual não prevalecerão as portas do inferno, é necessariamente IMPERECÍVEL, não pode desaparecer; pois, ruindo os alicerces, o edifício também deve ruir.

O que serve de sustento a uma Igreja eterna não pode ter fim.

***

A base está colocada, e esta base é PEDRO, Pedro INDEFECTÍVEL, que não perece.

Mas não basta ser indestrutível; é preciso que a Igreja, e em consequência o chefe desta Igreja conserve integralmente a doutrina recebida de seu Mestre; senão a Igreja, embora imperecível em sua EXISTÊNCIA, podia variar em seu ENSINO, em sua doutrina, e nas verdades que explica.

É preciso, pois, que Pedro, imperecível na existência, seja também INFALÍVEL na doutrina.

É preciso que Pedro, além da SOBERANA AUTORIDADE, tenha também uma LUZ SOBERANA.

Eis porque Jesus Cristo continua numa majestade divina: Eu te darei as chaves do reino dos céus.

Não são simplesmente as chaves do reino da terra, pois a Igreja, pela sua extensão no céu e no purgatório, é um reino celeste, e como tal as chaves da parte terrestre deste reino são chaves celestes, pois a parte terrestre é a porta da parte celeste. Não são dois reinos, mas é um ÚNICO REINO, são duas partes do mesmo reino, tendo íntimas relações uma com a outra.

A Igreja é a sociedade das almas, começada na terra, mas que só no céu recebe a sua perfeição total. É o que exprime claramente o divino fundador: Tudo o que desatares sobre a terra, será desatado também nos céus.

Numa outra ocasião o Salvador indicará a infalibilidade do ensino de Pedro.

É na sua última ceia, poucas horas antes de sua morte, que dirigindo-se a Pedro Jesus lhe disse; Simão, Simão, eis que Satanás vos reclamou com instância para vos joeirar como o trigo, mas eu roguei por ti, para que a tua fé não falte, e tu uma vez convertido, confirma os teus irmãos. (Lc21,31,32).

Eis um novo privilégio: a INFALIBILIDADE: Eu roguei por ti, para que a tua fé não falte.

Que quer dizer isto?

Basta querer compreender, para compreendê-lo.

É como se o Cristo dissesse; A tua fé será sempre santa, sempre verdadeira, sempre a mesma: firme e luminosa; e isso não simplesmente para ti, para te iluminar, mas também para iluminar os teus irmãos, para confirmá-los na verdade, caso viessem a tropejar, a hesitar, a vacilar.

Eu teria podido pedir para eles esta firmeza e esta luz, como teria podido dar a cada planeta a sua luz própria, mas não o faço, reservei esta prerrogativa somente para ti, como reservei ao sol a prerrogativa de iluminar os planetas; tu serás o centro luminoso e firme da minha Igreja, como o sol é o centro luminoso e firme do sistema planetário levando tudo para o termo final: o céu.

Bastante firme está o edifício cujos alicerces estão firmes.

Não há escapatória ou subterfúgio: Pedro e todos os seus sucessores são INFALÍVEIS na doutrina, como é IMPERECÍVEL a Igreja governada por eles.

Como tudo isso é claro, refulgente, grandioso encanta e faz sentir o dedo de Deus!

É próprio de Deus o mostrar-se sublime pela simplicidade.

E aqui tudo é simplesmente sublime.


III. O Pastor Supremo

Pedro é pois o centro da religião, ou como disse o Salvador: o fundamento da Igreja.

É o que fazia dizer a Santo Ambrósio: Ubi Petrus, ibi Ecclesia! Onde está Pedro, aí está a Igreja. é uma coisa só.

Na vontade divina Pedro e a Igreja são duas coisas inseparavelmente unidas, como num edifício são unidos os alicerces e o edifício.

Pela INDEFECTIBILIDADE Pedro é o fundamento da Igreja.

Pela INFALIBILIDADE ele é a luz da Igreja.

Mas há mais que isso. Seria em vão que Pedro mostraria o caminho aos viandantes da terra, e em vão lhes ensinaria a verdade, se não tivesse o poder de GOVERNÁ-LOS, pelas suas leis, e pela sua direção soberana arrancá-los dos perigos que os ameaçam.

Ora, Jesus Cristo não faz a sua obra pela metade: a plenitude, e a perfeição são o selo das obras divinas.

Jesus Cristo deve, pois, terminar a obra dando a Pedro a autoridade de PASTOR SUPREMO.

É uma das páginas mais deliciosas e ternas do Evangelho.

A cena teve lugar depois da ressurreição, na terceira aparição do Salvador.

Acabavam a modesta ceia, à qual o próprio Jesus quis participar após a pesca milagrosa.

Tendo eles, pois, jantado, narra o Evangelho, disse Jesus a Simão Pedro:

Simão, filho de João, tu amas-me mais do que estes?

ele disse-lhe: Sim, Senhor, tu sabes que eu te amo.

Disse-lhe: (Jesus) APASCENTA OS MEUS, CORDEIROS.

Disse-lhe outra vez: Simão, filho de João, tu amas-me?

Ele disse-lhe: Sim, Senhor, tu sabes que eu te amo.

Disse-lhe: (Jesus) APASCENTA OS MEUS CORDEIROS.

Disse-lhe, pela terceira vez a Simão, tu amas-me?

Ficou Pedro triste, porque pela terceira vez lhe disse: Tu amas-me? E disse-lhe: Senhor, tu conheces tudo: tu sabes que eu te amo.

Disse-lhe Jesus: APASCENTA AS MINHAS OVELHAS. (Jo21,15).

É impossível exprimir a beleza e a ternura destas palavras, tudo que há nelas de delicadeza e de força, e como tudo ali se harmoniza com a missão da Igreja.

Jesus pergunta três vezes a Pedro se o ama: porque esta tríplice interrogação?

Há uma dupla razão: uma de REPARAÇÃO, outra de INVESTIDURA.

Durante a paixão, no átrio de Caifás, Pedro tinha tido a fraqueza de renegar três vezes o seu divino Mestre: Jurou que não conhecia, este homem. (Mt26,74).

Pedro devia reparar esta tríplice negação por uma tríplice afirmação de amor a Jesus.

E, à medida que vai afirmando a sua fé, que vai jurando num solene ato de amor sua inalterável fidelidade ao Salvador, este último dá-lhe a investidura da autoridade suprema sobre a sua Igreja inteira.

Notemos, de fato que a Igreja, na sua sublime e perfeita unidade, compõe-se de três partes:

Os simples FIÉIS.

Os SACERDOTES.

Os BISPOS.

E todos estes estão sob as ordens de Pedro.

Em seus termos significativos, podemos constituir a cena do seguinte modo:

— Pedro, tu amas-me mais do que estes?

— Sim, Senhor, tu sabes que eu te amo,

Pois bem, sê o Pastor dos Bispos da Igreja.

Pedro, tu amas-me?

Sim, senhor, tu sabes que eu te amo.

Pois bem, sê o Pastor dos meus sacerdotes.

Pedro, tu amas-me?

Senhor, tu conheces tudo; tu sabes que eu te amo.

Pois bem, sê o Pastor de todo o meu rebanho, de todos os fiéis.

É divinamente delicioso!

À cada ato de amor e de reparação de Pedro, corresponde da parte de Jesus um ato de INVESTIDURA da autoridade suprema.

Os bispos e os sacerdotes seus auxiliares, possuem o mesmo sacerdócio, porém, nos bispos reside a plenitude deste sacerdócio, formando sob a autoridade de Pedro: a Igreja DOCENTE.

Os fiéis são as ovelhas do grande rebanho, formando a Igreja DISCENTE.

E Pedro é o chefe da Igreja inteira: dos bispos, dos sacerdotes e dos fiéis.

O Cristo já havia dito: haverá um único rebanho e um único Pastor. (Jo10,16).

Este Pastor único, ei-lo; é Pedro, é o Papa, tendo plenos poderes de iluminar as almas, plenos poderes de governá-las, plenos poderes para afastar dela os óbices, não podendo nunca falhar a Igreja, nem na ordem da VERDADE, nem na ordem da GRAÇA; não lhe faltando nunca, e exercendo sobre as almas a soberana autoridade de um Rei.

É com Pedro que o Cristo começa a construção de sua Igreja.

No corpo do homem, antes que tenha órgãos existe um CENTRO VITAL:

Jesus Cristo segue a mesma lei: Ele começa pelo CENTRO: começa pelo Papa.

Eis como aparece bela, radiante a figura humano divina do Papa, ele é HOMEM pela natureza e pela personalidade.

Ele é DIVINO pela autoridade e pelo ensino.

É um homem que fala, mas a sua palavra, é a palavra de Deus desde que fala como chefe supremo.

É um homem que governa, mas os atos de seu governo são atos divinos, desde que se dirigem à Igreja universal.

E tudo isso está tão claramente indicado no Evangelho, que não se compreende como é que pode haver pessoas que não vejam e não entendam tão belas e tão sublimes verdades!


IV. O Episcopado

Podíamos parar aqui e limitar-nos à verificação da autoridade suprema de Pedro, porém seria deixar inacabado e mutilado um MONUMENTO, considerando apenas a estátua que o domina, sem olhar para o pedestal que o sustenta.

Tudo isso forma um monumento único; são diversas peças do mesmo monumento; não de igual autoridade, mas de igual valor artístico.

Como acabamos de ver, pela tríplice afirmação de seu amor, Pedro recebe uma tríplice supremacia, tornando-se o Chefe e Pastor do rebanho inteiro, que é composto de bispos, de sacerdotes e de simples fiéis.

Jesus Cristo acaba de criar o Papado, É uma verdadeira criação e quão sublime!

Mas o Papa não pode ficar só.

Como alcançará ele as almas, todas as almas, até a extremidade do tempo e do espaço?

Podia, sem dúvida, fazê-lo, escolhendo ministros, instituindo-os e revocando-os, à vontade, como fazem os protestantes.

Para eles basta querer ser pastor, assim pensado, está feito; do dia para a noite o analfabeto vira doutor; ontem nem sabia da existência da Bíblia, hoje adquire uma Bíblia, e amanhã a explicará aos outros.

Isto é sério... é menos que humano.

O Cristo não podia agir deste modo, na organização de sua Igreja imortal.

Era preciso uma hierarquia... e uma hierarquia divinamente instituída.

Eis porque inferior ao PAPADO o Salvador cria o EPISCOPADO, e cria-o eterno, indestrutível, como é o próprio Papado, de igual instituição divina, mas não de igual autoridade.

Ele escolhe os primeiros titulares: são apóstolos. Forma-os ao mesmo tempo que Pedro, e do mesmo modo, per modum unius.

São quase as mesmas palavras de INSTITUIÇÃO, porque a missão é a mesma. É outra passagem do Evangelho de uma lucidez deslumbrante, de uma energia sem réplica, de uma ternura maternal.

Recolhamos estas palavras, como temos recolhido as que instituem a supremacia universal de Pedro.

É outra cena, realizada depois da ressurreição. Jesus aparece, de repente, a seus Apóstolos, na sala onde estavam reunidos por medo dos Judeus.

Jesus lhes disse: A paz seja convosco.

Assim como meu Pai me enviou, também eu vos envio a vós.

Recebei o espírito Santo.

Aquele a quem perdoardes os pecados ser-lhes-ão perdoados, e a quem os retiverdes, ser-lhes-ão retidos. (Jo20,21,23).

Ide por todo o mundo, e pregai o Evangelho a toda criatura. (Mc,16,15).

Quem vos escuta a mim escuta; quem vos despreza a mim despreza. (Lc,10,16).

Foi-me dado todo o poder no céu e na terra; ido pois, ensinai a todos os povos, batizando-os, em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo; ensinando-os a observar todas as coisas que vos mandei: e eis que eu estou convosco todos os dias até a consumação dos séculos. (Mt27,18-20).

Tais são as palavras solenes, augustas, com que Jesus Cristo instituiu o Episcopado, encarregado de apascentar, de governar, com Pedro e sob sua direção, o mundo das almas.

Mas notai bem nesta similitude de palavras dirigidas a Pedro e aos apóstolos, as grandes e importantes diferenças.

O que o Cristo diz a Pedro lho diz à parte, separado dos apóstolos; e o que diz aos Apóstolos nunca lhes diz separadamente de Pedro.

Deste modo temos PEDRO mas Pedro SÓ, pois é a autoridade suprema, e temos os BISPOS juntos COM PEDRO.

Pedro, só, é Papa; e Pedro é bispo como o são os demais bispos.

Além desta diferença no que se pode chamar o quadro das palavras, comparai as palavras e encontrareis nova diferença.

Jesus disse a Pedro: Sobre esta pedra (Pedro) ou sobre ti, eu edificarei a minha Igreja.

(Mt16,18).

Aos apóstolos ele diz: Ide, ensinai a todos os povos. (Mt17,19).

Primeiramente Jesus coloca Pedro como fundamento de sua Igreja, e depois regulariza o seu desdobramento através do espaço.

Jesus disse a Pedro: Tudo o que ligares sobre a terra, será ligado também nos céus. (Mt,16,19).

Ele diz aos apóstolos: Tudo o que ligardes sobre a terra, será ligado também no céu. (Mt17,18).

São as mesmas palavras, porém na primeira vez foram ditas a Pedro, só, no singular, e a segunda vez a todos os apóstolos, unidos a Pedro, no plural.

Emfim, quando Jesus Cristo diz: Ide, ensinai a todos os povos, ele não o diz a Pedro separado dos apóstolos, nem aos apóstolos separados de Pedro, pois, tal divisão é impossível.

Ele o diz a Pedro e aos seus apóstolos, unidos, nesta união indestrutível que Jesus Cristo pediu, e em consequência obteve, quando disse: Meu Pai, sejam eles um só, como nós somos um só. (Jo17,11).

Como tudo é harmonioso e grande!

Pedro é o chefe supremo dos apóstolos. Os apóstolos unidos a Pedro constituem a parte DOCENTE da Igreja divinamente instituída e organizada.

E através dos séculos, esta mesma hierarquia sucede-se sem interrupção e sem sombra.

Pedro é o Papa.

Os apóstolos são os bispos.

O Papa é o bispo de Roma; é apóstolo como os outros apóstolos; e é Bispo como os outros bispos; mas ele é mais do que isso.

Como Pedro foi o chefe dos apóstolos, o Papa é o chefe dos bispos, é nele que reside a infalibilidade, nele só, e nos bispos unidos a ele.

É no Papa, e nos bispos reunidos ao Papa que reside a INDEFECTIBILIDADE da Igreja divina de Cristo.

Sempre haverá o Papa; sempre haverá bispos na Igreja de Jesus, pois ambos são de instituição divina, e as obras de Deus são indestrutíveis. — Dei perfecta sunt opera. (Dt,32,4).


V. O Sacerdócio

O Papa e os bispos formam essencialmente a Igreja DOCENTE, mas aí não se limita a sua extensão.

Entre a parte DISCENTE e a parte DOCENTE em seu elemento essencial, há o SACERDÓCIO ou os sacerdotes, os padres propriamente ditos.

Por numerosos que sejam os bispos, sendo o Papa livre de multiplicá-los conforme as necessidades, faltaria qualquer coisa à hierarquia da Igreja, à sua adaptação às necessidades, se entre os bispos e o povo, não houvesse INTERMEDIÁRIOS.

Eis porque, um belo dia, escapou do peito do Salvador este brado angustioso: Oh! como é grande a messe, mas os operários são poucos. (Lc,10,2).

Que fará Jesus para remediar o mal? ele constata o mal e logo vai aplicar-lhe o remédio. O Papa deve governar a Igreja inteira.

Os bispos, associados ao governo da Igreja, devem ser os príncipes desta Igreja, da qual o Papa é o chefe supremo.

Mas, não basta ter um governo organizado, é preciso haver oficiais e ministros que, penetrando no meio do povo, transmitam e façam executar as ordens dos chefes, sigam de perto a observação destas ordens e assinalem os abusos que podem introduzir-se no meio do rebanho. É o papel do simples sacerdote, do padre, encarregado do ministério das almas.

É outra página sublime e terna do evangelho, que nos revela a missão do padre católico.

E uma página admirável, mas que, infelizmente, não é bastante conhecida.

Sendo melhor conhecida ela traça para sempre a rota do padre no ministério da palavra divina e do serviço dos altares.

É o grande código sacerdotal dos párocos, dos missionários e de todos aqueles que labutam no ministério sagrado.

Escutemos este código divino do ministério sacerdotal.

O Filho do homem, disse Jesus, não veio para perder as almas, mas, para salvá-las. (Lc9,56).

Depois disto, o Senhor escolheu outros setenta e dois: e mandou-os, dois a dois, adiante de si, por todas as cidades e lugares, onde ele estava para ir.

E dizia-lhes: Grande é, na verdade, a messe, mas os operários são poucos; rogai pois ao dono da messe, que mande operários para a sua messe. (Lc,10,1-2).

Eis a vocação suscitada por Deus, eis a necessidade da oração pelas vocações, para que Deus as suscite, Jesus não manda ir a messe, mas manda pedir a Deus que ESCOLHA E MANDE operários para a messe.

Depois da vocação divina, manifestada pela graça, o atrativo e a capacidade, os três elementos essenciais da vocação, vem o trabalho do padre, o seu ministério, mais exaustivo, mais árduo do que o serviço dos bispos, e já indicado pelo divino Mestre.

Ide, disse Jesus aos setenta padres, escolhidos como auxiliares dos bispos.

Ide: eis que eu vos mando como cordeiros entre lobos. É o zelo e paciência sacerdotais.

Não leveis bolsa, nem alforge, nem calçado, e pelos caminhos não saudeis ninguém. É o desprendimento dos bens e dos amigos do mundo.

Em qualquer casa em que entrardes, dizei primeiro: A paz seja nesta casa, e permanecei nesta casa, comendo e bebendo do que eles tiverem; porque o operário é digno de sua recompensa, É o apostolado e os sacrifícios que ele impõe para salvar as almas.

Não andeis de casa em casa. É a perseverança no apostolado, evitando a inconstância.

E em qualquer cidade em que entrardes, e vos receberem, comei o que se vos puser diante e curai os enfermos que nela houver”. É o espírito de mortificação e o espírito de caridade para ganhar as almas.

Os primeiros discípulos, os sacerdotes, assim enviados pelo divino Mestre às populações, cumpriram as recomendações e viram os seus esforços e o seu apostolado coroados de pleno êxito.

E os setenta e dois voltaram alegres, continua o Evangelho, dizendo: Senhor, até os demônios nos obedeciam em virtude de Teu nome.

Ele disse-lhes: Eu via Satanás cair do céu como um relâmpago. É o poder sobre os próprios demônios que Jesus Cristo lhes dá.

Eis que vos dei o poder de calcar serpentes e escorpiões e de vencer toda a força do inimigo e nada vos fará dano. É o que continuadamente fazem os santos na Igreja.

Contudo, não vos alegreis, porque os espíritos maus vos estão sujeitos, mas alegrai-vos porque os vossos nomes estão escritos nos céus. (Lc.10,17-20).

É o preservar-se da vanglória e o desejo de glorificar unicamente a Deus.

Que código admirável de perfeição para todos os padres, ocupados no ministério das paróquias e para os missionários semeadores da palavra divina!

Eis a instituição dos padres encarregados da cura das almas.

Os padres não possuem os poderes dos bispos; pois Jesus Cristo os trata de modo diferente.

Há uma gradação clara, visível, palpável, entre o Papa e os bispos, entre os bispos e os padres.

Não impõe as mãos aos últimos.

Não sopra sobre a fronte deles.

Ele deixa a seus apóstolos o cuidado de fazê-lo, eles mesmos, para bem marcar a independência em que devem permanecer: CORDEIROS, a respeito do povo, OVELHAS, a respeito dos bispos.

Os PODERES dos padres, como o dos bispos e como o do Papa, vem diretamente de Jesus Cristo, mas são exercidos sob a dependência hierárquica estabelecida pelo próprio Cristo.

Os bispos exercem os seus poderes sob a direção do Papa; os padres exercem os seus poderes sob a direção dos bispos.

Do mesmo modo que os poderes do bispo não provém do Papa, assim os poderes dos padres não provêm do bispo.

O sacerdócio, como o episcopado e como o papado, é de instituição divina; e como tal, é eterno, indestrutível como eles; ou melhor, há apenas um ÚNICO SACERDÓCIO, cuja PLENITUDE está no episcopado e cuja fonte e COROAÇÃO está no Papa.

Há pois três graus na hierarquia: O PAPADO, o EPISCOPADO e o SACERDÓCIO.

São como a ossatura da Igreja, cuja justaposição e encaixe perfeitos conservam o seu corpo sagrado na mais harmoniosa unidade.

Eu disse acima que podia definir-se a Igreja: a sociedade das almas no laço sagrado do amor de Deus. Devo ajuntar agora, para que a definição seja completa: sob a direção dos Pastores, instituídos por Jesus Cristo e particularmente do Soberano Pontífice, seu representante.

Eis a dinastia completa de Pedro, a Igreja de Cristo, não simplesmente em seus componentes, mas em suas articulações sagradas que lhe dão o movimento e a vida.

É a Igreja completa com sua INSTITUIÇÃO divina, com seu PODER divino, com a sua HIERARQUIA divina.


VI. Síntese geral

Acabamos de analisar a bela e harmoniosa organização da Igreja — o monumento divino da dinastia de Pedro.

O que vimos já é sublime e, entretanto, notemos que toda a ANÁLISE, pela separação das peças que contempla separadamente, perde necessariamente a harmonia do conjunto.

Um monumento, para ser perfeitamente apreciado, deve ser visto como tal, em seu conjunto.

O fundamento, o pedestal e a estátua, separadamente podem ter o seu valor artístico, mas o monumento só adquire a sua beleza quando estas peças estão justapostas, cada uma em seu lugar, fazendo sobressair uma à outra.

O mesmo acontece com a Igreja de Cristo.

Por isso, após à ANÁLISE sucinta das partes componentes vamos, agora, numa SÍNTESE, juntar estas diversas peças, para melhor admirar a razão de sua união e a majestade de seu conjunto.

Vimos neste capítulo a bela e a harmoniosa hierarquia instituída por Jesus Cristo: o Papa, no mundo inteiro; o bispo, em sua diocese; o sacerdote em sua paróquia.

É como que uma imagem da Trindade neste mundo.

O Papa é o PRINCÍPIO de toda a autoridade.

O bispo é como O VERBO do Papa, em sul diocese.

O padre unido ao papa e o bispo é como SANTIFICADOR das almas, em sua paróquia.

É pelo padre que o povo, com quem ele está unido imediatamente, une-se ao bispo e ao papa.

Onde há um grupo de almas, há uma paróquia.

Onde há uma paróquia, há um sacerdote ou vigário.

O vigário é o HOMEM DAS ALMAS.

É ele quem as introduz na Igreja pelo batismo.

É ele quem as educa pela palavra divina.

É ele quem as purifica pela confissão.

É ele quem as alimenta pela eucaristia.

É ele, enfim, quem lhes abre o caminho do lar cristão, quem as sustenta na última hora, quem as consola, lhes mostra o céu, e não as abandona senão depois de ter depositado no cemitério os seus restos mortais.

Augusta e sublime missão, a do padre!

Ele é o laço que prende as almas a Deus e a força ascensora para o céu.

Ele é o centro unificador da paróquia na luz e no amor!

Tal é o padre, sucessor dos discípulos de Jesus Cristo.

***

Mas este é apenas o germe inicial da grande unidade católica.

Se aí parasse, haveria milhares e milhares de Igrejas isoladas, sem o laço comum; haveria IGREJAS, mas não haveria IGREJA.

É o que acontece no protestantismo, cuja casa de culto é uma igrejola, independente, sem união, sem laço que a prenda a outras casas de culto, que professam a religião que seu pastor lhe ensina, sem saber o que os outros professam; uma unidade isolada, formando uma balbúrdia no conjunto.

Mas esta é a obra de Lutero.

Jesus Cristo formou a UNIDADE PERFEITA na multiplicidade.

Ele deu ao padre imensos poderes, porém, no interesse da unidade; há apenas um poder que lhe recusou: o padre não pode criar outro padre.

O padre morre estéril, e a sua igreja morre com ele.

Temos visto exemplos tristes e sublimes no Japão.

Havia ali fiéis capazes de sofrer o martírio.

Havia padres sublimes, heroicos, mas não havia mais bispos; e a imensa e magnífica cristandade apagou-se, como uma luz, na falta de combustível; morreu, radiante de heroísmo... mas de um heroísmo que lhe servia de mortalha.

Só o bispo pode, de fato, ordenar outros padres.

Este poder é o PODER PRÓPRIO do bispo, reservado e incomunicável.

É por este poder que ele é não simplesmente uma autoridade superior, um chefe hierárquico, mas sim um PODER SUPERIOR.

Eis a razão porque, pela vontade divina e pela natureza da hierarquia, todas as paróquias, reunidas, unificadas no padre são forçadas a agruparem em torno do bispo, que, só, pode dar-lhes uma vida duradoura, ininterrupta, pois só ele tem o poder de criar padres.

Tal é o bispo, o sucessor dos apóstolos.

É em redor dele, por ele, e nele, que se, forma e vive o segundo agrupamento de almas, na Igreja: A DIOCESE.

O bispo é a unidade da diocese, na luz é no, amor.

***

Mas não basta isso.

Do mesmo modo que todos os padres unificam-se no bispo, donde tiram a vida, assim todos os bispos unificam-se no Papa. Através do espaço que as separa, as diversas dioceses olham umas para as outras e reconhecem-se como irmãs.

Elas sentem que a mesma seiva percorre os seus membros, e que todas elas juntas formam um único e mesmo corpo: a grande Igreja de Cristo.

É a sublime doutrina e a magistral exposição de São Paulo em sua Epístola aos Coríntios.

“Assim como o corpo é um, diz o apóstolo, e tem muitos membros, mas todos os membros do corpo, embora sejam muitos, são contudo um só corpo; assim também é o Cristo. (ICo12,12).

“Ora, vós sois o corpo de Cristo, e membros unidos a membros. (1Co11,27).

E assim a alguns constituiu Deus na Igreja em primeiro lugar: os apóstolos (e os apóstolos, na ordem de hierarquia e poder, como acima ficou explicado, sendo Pedro o primeiro.)

O primeiro é Simão que se chama Pedro. (Mt10,2).

As aspirações de unidade das paróquias e das dioceses encontram-se, deste modo, num ponto central único e supremo, que é o Papa.

O Papa é a JUNÇÃO SUBSTANCIAL e viva da catolicidade inteira.

Ele é ao mesmo tempo a fonte inesgotável de toda a vida.

Só ele pode criar bispos, como só o bispo pode criar padres.

Somente ele pode tornar as dioceses imemoriais, revivificando-as após a morte de cada bispo.

Só ele pode ensinar infalivelmente.

Nele somente a unidade das almas encontra a sua imagem sensível e a sua realidade viva.

Todos os fieis estão representados no PADRE.

Todos os padres estão representados no BISPO.

Todos os bispos estão representados no PAPA.


Conclusão

Eis a unidade perfeita, que só existe e só pode existir na Igreja divina de Cristo.

As seitas religiosas procuram imitar esta organização divina; nunca souberam reproduzi-la, porque o divino não se reproduz.

Tal é o fluxo e o refluxo do amor.

Respeito, obediência, dedicação, sacrifício, tudo sobe até ao padre; pelo padre até ao bispo; e pelo bispo até ao Papa... até ao Cristo, E depois tudo DESCE: luz, graça, poder, privilégios, bençãos, tudo desce do Cristo ao Papa e do Papa ao bispo, do bispo ao padre, do padre até aos fiéis.

O Papa é a unidade da Igreja na luz e no amor.

Deste modo as almas são como que ligadas, unidas por este tríplice nó da vida divina; estas três forças de atração incluem toda a organização da Igreja, formando um ÚNICO CENTRO.

Tudo se agrupa em redor do padre, na paróquia.

Tudo se agrupa em redor do bispo, na diocese.

Tudo se agrupa em redor do Papa, no mundo, para formar a Igreja universal. A cada degrau que se eleva, a vida derrama-se mais abundante, e o mistério da UNIDADE resplandece com mais fulgor.

É um verdadeiro trono, um trono imortal, eterno, o trono da Igreja católica, e, sentado sobre este trono, sempre sorridente, sempre paternal, imortal como o rochedo das montanhas, resplandescente como o firmamento estrelado, calmo e suave como a aurora, mas e como a eternidade que representa, em cima deste trono está sentado um ancião vestido de branco, tendo nas mãos as chaves do reino do céu, e sobre a fronte o resplendor da verdade infalível... e a este homem, a este ancião, que a impiedade blasfema, o Cristo rediz continuadamente a palavra criadora desta autoridade suprema: Tu és Pedro... e sobre esta pedra está construída a minha Igreja, e as portas do inferno nunca prevalecerão contra ela.

Como tudo isso é belo e grandioso! E como se sente em tudo isso o dedo divino!

Um homem sincero, desapaixonado, ao ver tais maravilhas, não pode deixar de exclamar: “Aqui está a verdade”.

E esta verdade chama-se a Igreja Católica.

E o chefe desta verdade é Pedro.

Ubi Petrus, ibi Ecclesia, dizia Santo Ambrósio.

A dinastia de Pedro é uma dinastia divina contra a qual nada pode, nem o tempo, nem o ódio, nem o poder, nem as perseguições.


CAPITULO VII

A árvore da Vida

São numerosas, na Sagrada Escritura, as comparações tiradas das árvores (Mt3, 1O-7,17-6,18-12,33, etc) e, na linguagem de Jesus Cristo, tais comparações se referem quase sempre à Igreja (Mt, 13,32).

A primeira alegoria da Igreja encontra-se na descrição do paraíso terrestre, no princípio do mundo,

O Senhor Deus tinha plantado desde o princípio um paraíso de delicias, no qual pôs o homem que tinha formado.

E o Senhor Deus tinha produzido da terra toda a espécie de árvores formosas à vista, e de frutos doces para comer: e a árvore DA VIDA no meio do paraíso e a árvore da ciência do bem e do mal. (Gn,2,8,9).

O paraíso é o mundo ainda virgem do pecado.

No centro deste mundo Deus criou A ÁRVORE DA VIDA; criou também a árvore DA CIÊNCIA do bem e do mal.

Estas duas árvores não produziram frutos de virtudes especiais, mas foram assim denominadas por Moisés, talvez porque o fruto da primeira árvore era ACONSELHADO por Deus, como elemento nutritivo; e o segundo como objeto de PROIBIÇÃO, para experimentar a sua fidelidade ao Criador.

Tal é a opinião de Sto. Agostinho (De Gem ad litt. 1. VI, e. VD.)

Podemos ver, entretanto, nesta ÁRVORE DA VIDA a alegoria à Igreja católica, cuja, doutrina é a vida das almas, como podemos ver, na ÁRVORE PROIBIDA a imagem do pecado.

A árvore da vida é a Igreja, o Papa, o chefe da Igreja, que está colocado no meio do mundo para orientá-lo, dirigi-lo, como um farol à beira do oceano, serve para orientar a marcha dos navegantes.

Vamos estudar aqui as partes constitutivas desta ÁRVORE DA VIDA.


1. O tronco, que é Pedro

Pode-se considerar numa árvore uma parte imutável, invariável: é a árvore como tal. Pouco importam as dimensões: a altura, largura, e firmeza de suas raízes: são meros acidentes. Uma árvore não depende destes acidentes, mas de sua constituição íntima, que faz que uma laranjeira seja laranjeira e não mangueira. É uma árvore: pode crescer, estender-se, tornar-se um colosso... sempre será a árvore, ou laranjeira, ou mangueira ou qualquer outra.

Mas, ficando a árvore o que é, ela se desenvolve, cresce, porque tendo vida, é próprio da vida o desenvolver-se.

Temos, deste modo, a imutabilidade de seu tronco e, como tal, a sua seiva ativa, o seu desenvolvimento, a harmonia entre as suas diversas partes e os frutos que deve produzir.

O perigo das instituições humanas é a mobilidade.

O homem pode sempre desfazer o que fez.

Somente as obras de Deus são eternas e imutáveis.

O santo homem Jó tinha razão quando dizia que nem os próprios santos são imutáveis.

Ecee inter sanctos ejus, nemo immutabilis.

(Jó,15,15) mas Deus não muda (Ml,1,6) e as suas obras são eternas.

Por isso o trono de Pedro, sendo, como acima provamos, uma obra divina, e uma obra que tem as promessas da imutabilidade, esta obra domina o mundo, e o dominará sempre, apesar dos esforços conjuntos do inferno, do mundo e da carne.

Os homens passam... os séculos sucedem-se... a impiedade empurra a impiedade... os impérios ruem e sepultam uns aos outros; e acima das vicissitudes do mundo está sempre firme e sorridente o trono eterno de Pedro... a dinastia dos papas... a coluna e o firmamento da Verdade. (1Tm.3,15), a qual é o Papado.

Se Jesus Cristo tivesse deixado aos Apóstolos o cuidado de dar uma Constituição à sua Igreja, ele poderia deixar também o cuidado de modificar esta Constituição para adaptá-la à situação, aos tempos e necessidades.

Mas não, nada disso. ele mesmo fez tudo, sem intervenção dos homens, Agiu como Deus Soberano.

O mesmo poder que lançou no espaço estrelas, numerosas como as areias das praias marítimas, chamou Pedro e os apóstolos.

A mesma onipotência que deu às estrelas e aos planetas a sua grandeza, as suas leis e atrações harmoniosas, que devem dirigi-los, deu também ao Papa, aos bispos e aos sacerdotes, poderes diferentes, mas divinos, que não podem modificar, nem destruir.

Papado, episcopado, sacerdócio, evangelho e sacramentos — tudo isso está fora do homem, está acima do homem, imposto solenemente por aquele que não disse aos apóstolos edificai a Igreja, mas que disse a um deles; Tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei a minha Igreja.

É ele, o Cristo, que vai edificar a Igreja,

E esta Igreja é a Igreja d'Ele, unicamente d'Ele,

E esta Igreja D'ELE, construída POR ELE, é construída SOBRE PEDRO.

Pedro é como o sinal exterior visível, de modo que se alguém duvidar ou hesitar onde está a Igreja de Cristo, basta olhar onde está Pedro, e ali estará a verdadeira e única Igreja de Cristo.

Ubi Petrus, ibi Ecclesia, um sinal ao alcance de todos, visível a todos. É um sinal divino.

Et hoc vobis signum. (Lc2,12).

A constituição da Igreja é pois IMUTÁVEL, porque é a obra direta, pessoal e indefectível do próprio Jesus Cristo.

Ela o é ainda por outra razão, de outro modo mais maravilhoso ainda, — e peço bem notar este fato, — pois ele é, ás vezes, esquecido e este esquecimento tem consequências desastrosas.

Os poderes divinos, que Jesus Cristo deu ao Papa, aos bispos e aos sacerdotes, Ele os imprime em suas almas, de modo que ninguém pode arrancá-los.

Ele estabeleceu um SACRAMENTO, cujo efeito é imprimir um caráter divino na alma de seus ministros: caráter indelével, eterno, que, uma vez impresso, não pode ser apagado por ninguém.

O mais humilde dos sacerdotes, desde que recebeu a imposição das mãos, é sacerdote para a eternidade.

Nem o Papa, nem os bispos, mesmo reunidos em concílio ecumênico, podem fazer que um sacerdote não seja sacerdote.

Se não tivessem mais confiança nele, poderiam então tirar-lhe o exercício do poder, retirar-lhe o campo de ação, mas, sempre lhe ficariam poderes que atestam a sua dignidade eterna, em particular o maior de todos: o poder de consagrar o Corpo e o Sangue de Cristo, poder este que não pode nunca ser invalidado porque o próprio Deus é o objeto direto deste poder.

O mesmo se deve dizer do bispo. O Papa pode retirar-lhe a diocese, mas não pode retirar-lhe o caráter.

E chegando à suprema autoridade da Igreja, o Papa, podemos continuar o mesmo raciocínio.

O Papa, uma vez legitimamente eleito, é Papa para a eternidade e não há poder, humano, ou divino, que possa retirar-lhe o caráter sagrado e divino de sua autoridade.

Todos os bispos do mundo inteiro podem, reunir-se em concílio e nada podem contra o Papa...

Se o Papa não se unir a eles, a reunião deles não pode ser ecumênica e nem gozar da infalibilidade. A autoridade reside no Papa; só no Papa, e no concílio quando o Papa o preside ou manda alguém presidi-lo.

O sacerdócio é único: o sacerdócio de Cristo, como Sacramento, e este sacerdócio está no sacerdote, no bispo e no Papa, porém, não com a mesma plenitude.

O sacerdócio tem a sua plenitude no bispo, como ORDEM; e tem a sua plenitude como AUTORIDADE, no Papa.

O Papa é como o TRONCO da grande e frondosa árvore da Igreja.

Ele é o representante de Cristo na terra, é o chefe da Igreja, mas não é simplesmente um chefe que domina pela sua dignidade e pelo seu poder; é um chefe que tem o seu trono na alma de cada católico.

Olhando para as florestas virgens, veem-se por cima da luxuriante vegetação árvores seculares que dominam o conjunto e parecem querer sentar a sua copa verdejante em cima das outras árvores que a cercam.

Examinando o colosso por baixo, vemos que ele tem as suas raízes, por baixo das outras árvores; que o seu tronco forte e possante sai das entranhas da terra, unindo deste modo à força à grandeza, a solidez à imponência.

Assim acontece com o papado.

O Papa domina o mundo pela autoridade divina, que representa e exerce sobre os outros, mas esta autoridade está como arraigada na alma do cristão... É uma autoridade que vem, ao mesmo tempo do céu, mas lança as suas raízes no âmago das almas, de modo que, se esta autoridade é divina pela instituição, ela é humana pelo respeito, pela veneração, com que a recebem e sustentam os homens.

É uma outra face do esplendor do trono de Pedro, e não é a face menos interessante, embora menos conhecida.

Procuremos penetrar nestes novos abismos onde veremos reluzir, com igual fulgor, a majestade divina e a majestade do trono do Papa.


II. Os ramos, na hierarquia

Mas eis outra maravilha.

Todo tronco de árvore é cercado de ramos.

Os ramos e os galhos, embora não constituam a árvore, são uma parte integrante da mesma.

Na Igreja, o tronco é Pedro.

Mas Pedro não pode ficar só.

O DEVER é correlativo ao DIREITO, e os súditos são correlativos aos superiores, a hierarquia é correlativa às obras divinas.

Deus não age por si, mas age pelas causas segundas. Ele é a causa primeira, e como causa primeira ele põe em movimento as causas segundas.

O Papa não deve ficar isolado.

Ele é a primeira autoridade... deve haver autoridades subordinadas...

E o conjunto destas autoridades, abaixo do Papa, mas unidas ao Papa, chama-se a hierarquia eclesiástica.

A harmonia desta hierarquia é uma das mais refulgentes provas da divindade da Igreja.

Deus comunica aos seus ministros poderes divinos, que estudamos no capítulo precedente.

Mas, não somente lhes comunica estes poderes, mas OS IMPRIME na alma, por meio de um caráter indelével.

E não somente lhes imprime na alma o caráter deste poder, mas até os limites deste poder; colocando deste modo, com mão firme e divinamente previdente ao bem e ao funcionamento da hierarquia, pela qual um membro está sujeito a outro, e não pode intrometer-se nas funções do outro, sem usurpá-las e isso sem que haja possibilidade de confusão, de encontro, de choque ou de rivalidade.

O sacerdote, pela sua ORDENAÇÃO recebe o poder de batizar, de absolver, de consagrar, porém não recebe o poder de ordenar, de fazer novos sacerdotes.

Não tendo este poder pelo seu caráter sagrado, ninguém pode dá-lo, nem o Papa, nem os bispos.

Por este fato, ele é obrigado a inclinar-se diante do bispo, que tendo poderes mais altos que o sacerdote, é o seu superior por direito divino.

O mesmo acontece com o bispo.

Em sua SAGRAÇÃO, ele recebe poderes magníficos, o poder de confirmar, de ordenar de criar sacerdotes; porém há um poder que ele não recebe, que é o de ensinar INFALIVELMENTE.

Todos os bispos reunidos não o possuem mais que um bispo isolado. Perante esta inferioridade eles são obrigados a inclinar-se diante do Papa, que é o único que possui a autoridade universal e infalível.

Nada há de semelhante nas sociedades humanas.

Nada de tudo isto existe nas seitas religiosas fundadas pelos homens, onde as dignidades são simplesmente externas.

O poder que os homens dão é uma dignidade que afeta apenas o corpo e não penetra até a alma.

As consequências deste fato são palpáveis e de todas as épocas.

O menor sopro revolucionário derruba reis, presidentes, governos, sociedades e seitas religiosas, enquanto as mais violentas tempestades nada podem contra o caráter sagrado impresso na fronte do sacerdote, do bispo e do Papa.

Perseguido, expulso, encarcerado, o padre é sempre padre, o bispo é sempre bispo, o Papa é sempre Papa.

O povo lhes obedece quando estes estão encarcerados, como quando estão sentados em cima de seu trono, pois a hierarquia permanece Inalterável.

Desta completa imutabilidade proveniente do caráter sagrado, resulta a HARMONIA no respeito, e a veneração no amor.

O padre venera o bispo, em cuja fronte resplandece a plenitude do sacerdócio.

O bispo venera o Papa, sobre cuja cabeça refulgem a infalibilidade e a autoridade soberana.

Por sua vez, o Papa venera o bispo, seu igual em poderes de ordem, e ambos veneram o sacerdote, que não é inferior a nenhum deles, no que há neles de mais sublime: o poder de consagrar o corpo e o sangue de Jesus Cristo, nos pés do qual ambos ajoelham-se para confessar as suas fraquezas e alcançar o perdão.

Deste modo, o respeito, o amor, a veneração, a obediência, como os anjos na visão de Jacó, sobem e descem ao longo desta escada divina, que é a hierarquia católica.

***

A medida que vamos estudando a imutabilidade do trono de Pedro, na admirável hierarquia que forma o seu pedestal e a sua auréola, descobrimos, a cada passo, novas maravilhas.

A harmonia é o próprio das obras divinas como a desordem é o próprio do erro e do vício.

Jó querendo dar uma ideia do inferno, nos diz que é o lugar onde há sombras de morte, onde não há nenhuma ordem, e onde habita um eterno horror, (Jó,10,22), e falando do céu, ele diz que é a suprema harmonia (Jó, 38,37).

A Igreja de Jesus Cristo é igualmente a suprema HARMONIA: harmonia na ORDENAÇÃO, harmonia nos PODERES outorgados, harmonia ainda na MISSÃO conferida.

Não basta ter o poder, é preciso ser enviado para exercer este poder.

A ORDENAÇÃO dá o poder.

A MISSÃO determina o exercício deste poder. Não basta ser padre, ser bispo; é preciso ser enviado, receber uma missão, ou um mandado.

Jesus Cristo disse a Pedro e aos apóstolos: Do mesmo modo que meu Pai me enviou a mim, eu vos envio. (Jo20,21).

O sucessor de Pedro, o Papa, diz aos bispos sucessores dos apóstolos: do mesmo modo que o Cristo me enviou a mim, eu vos envio.

O bispo por sua vez, diz aos padres, seus auxiliares: do mesmo modo que o Papa me enviou a mim, eu vos envio.

Admirável hierarquia dos poderes e inefável transmissão de MISSÕES, que prova a vida fecunda da Igreja, e nos aparece como um fio condutor, visível aos olhos, através dos esplendores da união da Igreja divina.

Há uma missão, um mandado.

A esta missão está ligado o DEVER de velar, de julgar e de transferir as pessoas enviadas, conforme as necessidades do momento, e até o DIREITO de repreendê-las.

Este dever e este direito da parte dos superiores sobre os inferiores dão à hierarquia católica o movimento, a flexibilidade que o mundo admira, mas não sabe compreender.

O padre, no fundo do seu presbitério, que viesse a desfalecer ou tornar-se indigno de seu sublime ministério, seria logo interdito pelo seu bispo; em caso semelhante o bispo o seria pelo Papa; e este pensamento é um verdadeiro conservante, que o sustenta, o afasta do mal, para preservá-lo na auréola de sua grandeza.


III - A alma da Igreja

A alma é o princípio da vida.

Tudo o que vive tem uma alma, As plantas têm uma alma vegetativa: crescem.

Os animais têm uma alma sensitiva: sentem.

Os homens têm uma alma racional: raciocinam.

A Igreja tem uma alma divina: diviniza.

O que acabamos de ver constitui o corpo da Igreja e a sua estrutura física e material.

O tronco e os ramos de uma árvore, nada valeriam se não fossem fecundados pela seiva que os vivifica.

A Igreja tem pois, uma alma.

E qual esta alma?

Lembremo-nos da cena magnífica da criação de Adão.

Depois de ter tomado em suas mãos veneráveis um pouco de barro, depois de tê-lo amassado e ter formado dele o corpo do homem, de repente Deus tira de seu próprio coração um sopro de amor, e eis que a estátua de barro por Ele formada anima-se, abre os olhos, o coração bate... e a humanidade começa.

É a imagem imperfeita do que aconteceu no berço da Igreja.

Ela está criada nas articulações divinas, as suas grandes artérias estão formadas; mas onde está o sopro que porá este corpo em movimento?

Jesus Cristo o prometeu antes de o dar, quando disse: Tenho ainda muitas coisas a dizer-vos, mas vós não as podeis compreender agora; quando vier, porém, o Espírito de verdade, ele vos ensinará toda a verdade. (Jo16,12,13).

Eu vos disse estas coisas, permanecendo convosco; mas o Consolador, o Espirito Santo, a quem o Pai enviará em meu nome, ele vos ensinará todas as coisas, e vos recordará tudo o que eu vos tenho dito. (Jo15,25-26).

Tudo isto está ainda no futuro. É uma promessa; mas esperemos a Ressurreição, e Jesus agindo como chefe da humanidade resgatada, fulgirá com toda a majestade e a autoridade de Deus: A paz esteja convosco! Assim como meu Pai me enviou, também eu vos envio a vós.

Tendo dito estas palavras, soprou sobre eles, e disse-lhes: Recebei o Espírito Santo! (Jo20,22).

No começo do mundo Deus soprou sobre a fronte de Adão, e criou nele uma alma vivente. (Gn11,7).

Aqui Jesus Cristo sopra sobre a fronte de sua Igreja — et insulflavit in eos — e faz dela uma sociedade vivente — Accipe Spiritum Sanctum — e eis porque, logo em seguida, com uma palavra onipotente, Ele a lança no espaço, como lançou Adão no espaço do mundo, dizendo:

Muntes ergo. — Ide, pois, ensinai todas as gentes, batizando-as em nome do Pai, do Filho e do Espirito Santo.

É uma das primeiras manifestações da alma que deve vivificar a Igreja. Não é ainda a solene investidura. Esta última terá lugar na ocasião de Pentecostes.

É outra cena divina... dez dias depois da Ascensão, os apóstolos com São Pedro, retirando-se à solidão, conforme a prescrição de Jesus, para preparar-se o ofício de chefe da Igreja, de repente, pela manhã, eis que um ruído, como um vento impetuoso, encheu toda a casa onde estavam sentados e apareceram destacadas, umas como línguas de fogo, que se puseram sobre cada um deles.

Logo ficaram todos cheios do Espírito Santo. (At2,1-4).

Então, Pedro, apresentando-se com os onze, levantou a voz... (At11,14). E os que receberam a sua palavra foram... cerca de três mil pessoas. (Ibd.41).

Sob o sopro de Deus, Adão levantou-se, começou a cantar, em êxtase.

A Igreja levanta-se igualmente sob o sopro do Espírito Santo, que desceu sobre ela, começa a falar, a agir e converter o mundo; e nesta ação fecunda sente-se em toda parte o influxo vivificante do Espírito Santo.

O corpo da Igreja é belo, harmonioso, o que é mais harmoniosa ainda e mais bela é a sua alma: é o Espírito Santo que a anima.

Os inimigos da Igreja estão singularmente iludidos a este respeito. Que podem eles contra a Igreja?

Encarcerar um Papa?

Exilar uns bispos?

Assassinar uns padres?

Demolir umas Igrejas?

Mas tudo isso é pequenino, é mesquinho, é baixo!

O que seria preciso é destruir a alma da Igreja, estrangulá-la.

Mas como fazer isso, quando nem se pode tocar a alma de uma criança!

Oh! perseguidores! Oh! poderosos! Deus pode entregar-vos o corpo; porém, há uma coisa que nunca segurareis: é a alma!

A alma é inexpugnável, incompreensível, irredutível. Ela desafia todas as forças do universo.

Procurai-a sobre os lábios, e ela se retira.

Procurai-a nos olhos, e ela apaga a sua chama.

Ela quer calar-se; como fazê-la falar?

Ela quer falar; como fazê-la calar-se?

É uma palavra, é um gesto, um olhar, um sopro.

É menos que isso.

Abri os olhos, estendei a mão. Que é que segurais?

Nada. A alma falou!

E se nada podeis contra a alma de uma criança, que é que podeis contra a alma divina da Igreja?

Há 19 séculos que a impiedade, o vício e a loucura procuram arrancar a alma à Igreja.

Que conseguiram eles?

Caíram; e sobre o seu túmulo a Igreja, sempre triunfante, canta o seu “De profundis!”. Ela está sempre viva e sempre gloriosa até no sangue de seus filhos... triunfante até, nas fogueiras e sob a espada de seus perseguidores.

Não se prende a alma da Igreja, porque esta alma é o Espírito Santo: é Deus.

Conta-se de César que no meio de uma tremenda tempestade, vendo o piloto tremer, ao ponto de desanimar, bradou-lhe indignado: Que temes tu? Carregas Cesar!

Era uma palavra sublime, embora orgulhosa. O cristão pode dizer melhor, em frente à tempestade do ódio, da calúnia, do sangue e do lodo que avassala a Igreja, ele brada: Que temes tu? Carregas o Cristo!

Chegados aqui, podemos agora aperfeiçoar a nossa primeira definição e dizer que a Igreja é a sociedade das almas na fé e no amor de Deus, sob a direção invisível de Jesus Cristo e o governo visível do Papa, o seu representante.


IV. A vida da árvore

Conhecemos o corpo, e conhecemos também a alma. Da união destes dois elementos constitutivos resulta A VIDA.

A vida da Igreja. Que vida será esta?

A vida é tanto mais nobre e mais elevada quanto mais nobre é a alma que anima o corpo.

E a alma da Igreja, acabamos de vê-la, é o espírito Santo... QUE VIDA DIVINA deve, pois, vincular nas veias deste corpo admirável que é a Igreja! Vida divina que sai do Papa, como do coração, passa pelos bispos que são as grandes Artérias deste corpo, ramifica-se pelos padres que constituem a pequena circulação e que comunica o sangue a todas as partes do corpo.

Estudemos um instante esta vida. É um novo mundo de maravilhas que se descortina diante de nós.

Que é a vida?

É essencialmente um desenvolvimento.

Ela supõe duas coisas: uma parte invariável sem a qual o ser desapareceria e uma parte variável sem a qual o ser se petrificaria.

São dois extremos.

Se nada ficasse, o ser deixaria de existir; se nada mudasse, não haveria vida.

Darwin esforçou-se para fazer da continua mudança a lei do mundo. É um erro. Para que uma coisa mude, é preciso que outra coisa fique.

Quantas coisas há que nunca mudam: os elementos, a estrutura das plantas, a marcha dos astros, o homem, etc.

Em geral, o que é constitutivo não muda, pois é o carimbo do Mestre e ninguém nele pode tocar.

Depois de 5 ou 10.000 anos, o homem é sempre o homem. As múmias do Egito não diferem dos embalsamados de hoje.

Mas se há uma parte INVARIÁVEL, há também uma parte VARIÁVEL, e é esta parte que constitui o desenvolvimento, o progresso, a vida.

A VARIABILIDADE afeta todos os seres, vivos.

Ora, se a Igreja de Jesus Cristo vive, nela deve encontrar-se, ao lado da parte invariável, um desenvolvimento continuo e progressivo, que é o sinal da vida.

Os teólogos fazem notar que as obras de Deus se dividem em duas categorias: As primeiras, que Deus faz em sua adorável Trindade, e que se chamam ad intra; as segundas, as que Deus produz no mundo exterior, e que eles, chamam ad extra.

As obras ad intra, sendo de Deus e para Deus, são imutáveis, invariáveis.

Eternamente o Pai ama o Filho.

Eternamente o Filho ama ao Pai.

Eternamente, deste amor mútuo procede do Espírito Santo.

Mas quantas obras Deus fez para os homens! E estas obras mudam, variam, porque o homem muda.

Encontramos o mesmo fenômeno na Igreja.

A Igreja é OBRA DE DEUS e como tal é imutável.

Mas ela é FEITA PARA OS HOMENS e como tal ela deve mudar, deve progredir, deve seguir o homem, e o homem progride.

Em todas as obras de Deus, encontramos estes dois caracteres. Procedendo de Deus elas são imutáveis; feitas para o homem, elas se desenvolvem.

E a Igreja, a obra-prima de Deus, não pode escapar a estas regras gerais.

A Igreja é imutável, não como as pirâmides do Egito, mas como uma árvore, ou como um destes imensos cedros das montanhas, cujos pés estão solidamente arraigados, enfrentando as tempestades e enquanto fica firme, inquebrantável, a seiva circula, os ramos crescem, as folhas abrem-se e as flores desabrocham.

Se um ramo seca, outro o substitui, e nesta exuberância de vida ele estende em redor de si a sua grande sombra que serve de repouso aos viandantes.

Eis a imagem com que Jesus Cristo nos representa a sua Igreja, em seu duplo elemento constitutivo: a IMUTABILIDADE e o PROGRESSO.

É a parabola do grão de mostarda: Minimum quidem omnibus seminibus, et fit arbor. (Mt,13,32).

***

Tais são as leis fundamentais da Igreja.

Vejamos agora, um instante, os fatos corroborando estas leis.

Contra estas duas leis, a imutabilidade e o progresso, dois inimigos se levantaram, procurando achar em falta os dois princípios enunciados.

Os primeiros pretendiam fazer MARCHAR a Igreja junto com eles, com o século, modas, usos e abusos.

Mas é impossível. A Igreja é imutável em seu ser, imutável em sua luz, imutável em seu amor.

Outros procuravam PETRIFICAR a Igreja, pregá-la ao chão, condená-la a uma inércia de múmia.

Mas, de novo, é impossível. A Igreja tem o progresso do ser, o progresso da luz, o progresso do amor.

É pois estes dois caracteres, magnificamente unidos, que ela confunde os seus inimigos é extasia os seus filhos, provando a ambos que ela possui verdadeiramente a vida em si — In ipso vita erat, (Jo1,4).

E como a Igreja não seria imutável?

Ela é A VERDADE, e a verdade não muda.

Ela tem a PALAVRA DIVINA, e tal palavra não muda.

Para quem foi fundada a Igreja?

Para as almas. Ora, todas as almas são criadas à imagem de Deus.

E por quem foi ela fundada?

Por Jesus Cristo. Ora, o Cristo é Deus e não muda.

E por bela que seja esta imutabilidade, esta imobilidade granítica, há coisa mais bela ainda nesta Igreja: é o seu progresso, o seu desenvolvimento sucessivo e contínuo.

Este progresso é o milagre dos milagres,

Que era esta Igreja ao sair do Cenáculo?

Um pequeno gérmen, ao ponto de vista de seu ser, de sua doutrina e de seu amor.

Um pequenino gérmen confiado a homens fracos, e este tríplice gérmen tornou-se a religião da humanidade e do mundo inteiro.

Não precisamos de outras provas: Uma tal religião é divina.

A Igreja tem um corpo, uma alma e uma vida própria que se desenvolve, que se dilata, enquanto o corpo e a alma são imutáveis e sólidos como o rochedo no meio das ondas furiosas do mar.

A vida da Igreja é a vida de uma árvore, cujas raízes mergulham e se fixam nas entranhas da divindade, enquanto o seu tronco cresce, os seus ramos se estendem e vergam sob o peso das flores e dos frutos que continuamente ela oferece à humanidade.


V. Crescimento contínuo

A Igreja católica, tendo uma vida própria, deve estender-se, deve crescer, expandir- se continuadamente.

Há só dois declives na vida: um montante, de baixo para cima; outro descendente, de cima para baixo.

O primeiro sobe do berço para as alturas, da vida plena.

O segundo desce da vida plena para o túmulo.

O primeiro é o progresso: o segundo é a decadência.

Todo ser vivo está sujeito rigorosamente a uma ou a outra destas leis, o que fez dizer aos, fisiologistas: “Ou crescer ou decair!”, “ou subir ou descer.”

Uma sociedade que não cresce mais, ou em, número ou em valor, ou em firmeza, é uma sociedade roída pelo verme da decadência.

Ora, a Igreja não pode conhecer a decadência. O Cristo disse: as portas do inferno, nunca prevalecerão contra ela.

Tem pois de crescer.

Este fenômeno é visível: Há países que, perdem a fé, que se desligam do rochedo de Pedro... é certo; mas olhai do outro lado, e vereis outras nações que se civilizam, que se convertem e entram na Igreja católica.

A Igreja pode perder de um lado, mas ganha de outro; numa árvore há galhos mortos que a tempestade arranca, porém ao lado dos que desaparecem, o orvalho beija as folhas s, os rebentos que o calor do verão faz brotar.

A árvore fica... o tronco não muda... mas sob o seu envólucro ferve a seiva viva, que desenvolve a árvore e a faz, cada ano, produzir novos frutos.

O padre Lacordaire, numa de suas conferências, representa o mundo sob a figura de um viandante, batendo à porta do Vaticano.

A FÉ; sob a figura do Papa, mostra-se na entrada e pergunta ao mundo:

— Que quereis de mim?

— Mudança, responde o mundo.

— Eu não mudo.

— Mas tudo mudou e continha a mudar neste mundo.

Porque és tu sempre o mesmo?

Porque sou de Deus e Deus não muda.

Esta palavra será sempre a última da Igreja Católica; ela não muda.

Não muda, mas, como temos visto, não é uma imutabilidade granítica, é a imutabilidade da árvore que cresce, floresce e dá frutos mas permanece sempre a mesma árvore.

Simile est regnum colorum grano si (Mt11,31).

Quando Jesus Cristo plantou a semente de sua Igreja no coração de seus apóstolos, que era ela?

Que eram eles?

Um grão de mostarda, plantado em um terreno ingrato.

Mas este grãozinho sai da terra, que devia sufocá-lo; este grãozinho cresce, desenvolve-se apesar das fogueiras de Nero e dos rios de sangue de Domiciano, que procuram matá-lo.

Eis a haste que aparece... ela cresce sempre... produz flores, produz frutos...

invade o mundo.

Procuram arrancá-la... ela resiste,

Procuram cortá-la... ela não morre,

Procuram afogá-la no sangue... ela se levanta mais bela.

Tudo isso é divino... é o dedo de Deus!

Digitus Dei est hic.

O espetáculo mais curioso que se pode imaginar é ver os apóstolos saírem do cenáculo dividindo entre eles o universo, e indo com a cruz numa mão, tendo na outra o bastão do viandante, pregar ao mundo inteiro o Evangelho que receberam de Jesus Cristo; e notemo-no bem: que Evangelho!

Pregam um Evangelho que acusa de falsidade, de abominação, de impostura e embuste tudo o que o mundo pagão acreditava e considerava atos religiosos.

Os apóstolos, sem medo, sem vacilação, sem distinção, elevam-se contra todos os abusos, exigem a destruição dos templos erigidos em honra das divindades, pisam com os pés os ídolos e fazem adorar um homem Deus, ignominiosamente morto no patíbulo da cruz.

***

A um destes audaciosos reformadores, um dos sábios do Areópago de Atenas, o qual tinha vindo escutá-lo por curiosidade, disse-lhe, talvez, admirado de tanto zelo e tamanha convicção:

Este Mestre de quem vós falais com tanta admiração, transmitiu-se, sem dúvida, meios certos de sucesso?

- Não, responde o apóstolo. Ele nos disse simplesmente: Ide, ensinai a todas as nações, nós Lhe obedecemos.

Sem dúvida, calculais atrair o povo pela isca do prazer, das honras, das riquezas?

Não! nós não prometemos, na vida premente, outra coisa senão humilhações, sofrimentos, pobreza. E tal é a única coisa que esperamos.

- Mas, pelo menos, o vosso Mestre preparou o coração dos reis e dos povos para acolhei-vos?

— Não! Ele nos disse que seríamos odiados, perseguidos, estrangulados e os nossos corpos já trazem os estigmas sangrentos dos golpes que temos recebido.

— Ele vos deu, sem dúvida, ouro, para atrair a multidão ávida, e fazer viverem na opulência aqueles que tudo abandonam para vos seguir?

Não! Nada disso: ele nos proibiu levar ouro, provisões, até duas túnicas, e exigiu que vivêssemos pobres e desapegados deixando até as nossas casas, nossos campos, nossos pais e nossos irmãos!

— Mas, pelo menos, Ele vos deu armas para defender-vos, afastar os inimigos e castigar aqueles que vos atacam?

— Não! Nada de tudo isso: Ele nos mandou como ovelhas no meio dos lobos, dizendo, que apresentássemos a face àqueles que nos quisessem bater, que rezássemos pelos nossos inimigos, fizéssemos o bem a todos.

— É preciso que o vosso Mestre tenha tido uma confiança ilimitada em vosso saber, em vossos talentos, em vossa eloquência!

— Não, não! Ele nos escolheu, porque éramos o que havia de mais insensato, de mais fraco, de mais desprezível e recomendou-nos que evitássemos toda intriga e toda duplicidade.

O sábio Areopagita, já espantado, esbugalhou os olhos... examinou este homem, e, num gesto de desdem, de supremo desprezo, exclamou:

Mas, então, sois uns loucos!

E o apóstolo, abençoando aquele que humanamente tinha razão, retirou-se feliz por ter tido a ocasião de sofrer um pouco de ignomínia por Jesus Cristo.

E eis que, pouco à pouco, os poderosos do século humilham-se, os filósofos racionalistas abjuram a sua ciência, e abandonam os seus raciocínio, os faustosos gozadores tornam-se pobres... o mundo torna-se cristão, e a Igreja estende-se em todas as nações, penetra os desertos, os impérios, senta-se nos tronos como se senta sob a choça do pobre... renova o mundo... faz um mundo novo... inclina-se sorridente sobre o berço onde nasce o homem, e deixa cair as suas lágrimas sobre os túmulos que se fecham.

Na verdade: É incrível!

Incrível?... Sim... Mas é assim... Logo, é DIVINO!

***


Hoje a Igreja é a primeira força do mundo.

Ela venceu três coisas que nenhum homem pode vencer!

Ela venceu o tempo, o espaço, o próprio homem.

Ela venceu o tempo. Quem pode duvidar disso?

Percorrei a lista imensa, ininterrupta dos papas, desde S. Pedro até Pio XII, atualmente reinante. (Nota do revisor: Este livro foi escrito em 1940. Há oitenta anos atrás!)

São os séculos que se sucedem... mas papas sucedem-se também.

Releiam a lista dos 100 primeiros papas que foi publicada no capitulo IV deste livro.

São 8 séculos que ali estão representados.

Leiam depois a continuação desta lista, no fim deste estudo, e verão que a Igreja, que é o papado venceu verdadeiramente O TEMPO.

E o espaço?

É outra vitória.

As nações têm as suas fronteiras bem determinadas: fronteira das raças, fronteira das nações... A Igreja católica não conhece nem nacionalidades, nem raças: ela é UNIVERSAL... católica.

Há 1900 anos estavam reunidos em uma pobre sala de Jerusalém — era o seu Belém, 12 humildes pescadores; havia ali uma mulher e um representante de Cristo: o primeiro Papa, S. Pedro.

Pedro e Maria Ssma. estavam ajoelhados com os onze.

Partiram deste Cenáculo, partiram doze de Jerusalém.

O Império romano massacrou uns em caminho, lançou outros nos cárceres e arrastou-os sobre os cadafalsos sangrentos.

Passaram-se uns anos, os apóstolos voltaram, reuniram-se em redor de seu chefe,

Pedro: eram mil pessoas apenas.

Após 10 séculos, eles eram o Episcopado do mundo católico, representando todas as nações, todas as raças e todas as fronteiras, e sobre o túmulo de Pedro cantam o triunfo da Igreja católica que venceu o espaço constituindo, hoje, a Igreja universal.

A Igreja é, deste modo, UM PODER que venceu O TEMPO e O ESPAÇO, venceu o que é mais difícil de ser vencido, O próprio HOMEM.

Ela, a imortal Igreja, tomou o homem, sob todas as suas formas, civilizações e desenvolvimento intelectual, tomou-o tal qual ele é, com suas aversões, seus rancores, seus ódios e sua teimosia, e transformou-o em outro homem.

O homem pagão se tornou cristão.

O bárbaro recebeu o batismo.

Os nômades fixaram-se em sociedades.

Na hora atual mais de duzentos milhões de homens cercam Pedro, para formar esta grande e harmoniosa unidade que é a Igreja Católica.

O homem foi vencido e civilizado, a família foi vencida e reformada, a sociedade foi vencida e remodelou-se na luz e no amor da doutrina de Jesus Cristo.

É um milagre perpétuo e visível para todos.


Conclusão

Parece quase que nos temos afastado do assunto a tratar: o Papa; mas não. A Igreja e o Papa formam um só elemento.


A Igreja sem o papa não é mais Igreja, é uma simples reunião de homens, sem ideal, sem movimento, sem cabeça.

O Papa, sem a Igreja, não pode existir, como o filho sem pai não existe.

Para ser PAI é preciso ter filho; e o filho supõe o pai; são dois termos que se completam, são a causa e o efeito de um mesmo fenômeno.

Convém destacar bem esta grande verdade: a imutabilidade da Igreja repousa sobre o Papa. O Cristo é o VERBO DIVINO feito HOMEM.

O PAPA é a imutabilidade da Igreja, feita HOMEM.

É a sua perpétua encarnação: a encarnação da imutabilidade divina em Pedro e em seus sucessores.

Todas as outras Igrejas poderão desfalecer; uma só é IMUTÁVEL: é a Igreja de Pedro.

Todas as sucessões apostólicas poderão ter a sua hora de desfalecimento, e até de interrupção; uma jamais se romperá.

Sempre um Papa sucederá a outro Papa, e sempre o depósito divino descerá, intacto, imutável, isento de toda mudança, de um Papa a outro, até ao fim dos tempos.

Deste modo, haverá sempre na Igreja um PADRÃO invariável, sobre o qual cada Igreja particular poderá confrontar, e medir a sua Fé, para ver se ficou fiel à doutrina divina.

Cada Igreja particular, devendo ser apostólica, isto é, devendo remontar, por uma sucessão ininterrupta, pelos seus pastores, até os apóstolos, terá um ponto de mira, imutável, autêntico, onde poderá orientar e refazer a sua sucessão apostólica, caso o tempo a houvesse obscurecido ou destruído.

Examinai a sucessão dos Pontífices Romanos.

Descei de S. Pedro (1º século) a S. Clemente, (2º século) a S. Victor, (3º século) S. Marcello, (4º século) S. Anastacio, (5º século) S. Symaco, (6º século) S. Gregorio I, (7º século) S. Sergio I, (8º seculo) até chegar ao século 20 que se abre com Leão XIII, Pio X, Bento XV, Pio XI, Pio XI.

Remontai depois de Pio XII... através dos 19 séculos, e encontrareis nesta escala luminosa uma sucessão ininterrupta de Pio XII S. Pedro.

É como a ESPINHA DORSAL da Igreja, a qual vêm ligar-se às costelas, os nervos, em redor da qual circulam todos os fluidos vitais.

Que simplicidade admirável de se reconhecer através dos séculos!

Que facilidade para as Igrejas verem em que lugar elas estão seguras!

Mas que audácia da parte daquele que fez uma tal maravilha!

Para romper a espinha dorsal de um homem, basta um golpe; é a morte certa.

Os inimigos da Igreja sabem-no perfeitamente, e eis porque se atiram sobre o papado para abatê-lo, diminuí-lo, fazê-lo vergar.

Mas é tempo perdido.

A fábula de Lafontaine se reproduz continuamente, ou melhor, continua-se através dos séculos.

Uma serpente encontrou uma lima e começou a mordê-la.

Seus dentes estragaram-se, gastou-se a língua e quando, não podendo mais nem morder, nem esfregar a língua, julga ter acabado com lima... eram os seus próprios dentes e a sua própria língua que tinham desaparecido.

Os comunistas, divorcistas, anti-clericais, espíritas, protestantes, ateus, cismáticos, sabem por demais que o Papa encarna a imutabilidade hierárquica, doutrinal e sacramental.

Há 19 séculos que isso dura.

Durará sempre, porque sempre o mal existirá neste mundo: é a consequência da liberdade que Deus deu ao homem.

É um homem contra todos... e nunca puderam vencê-lo!

Entretanto é um mortal; ele morre, mas é substituído.

O homem morre, PEDRO É IMORTAL.

A violência, a astúcia, e a traição nada podem contra o trono de Pedro.

Hoje, após 1900 anos, nós sandamos, em Pio XII o 262º anel da espinha dorsal da Igreja, sempre ameaçada e nunca rompida, sempre imutável e sempre viva e vivificante.

É a Igreja e o Papa.

A Igreja de Cristo.

O Papa da Igreja.

E ambos são de Deus, porque um não pode existir sem o outro.

Tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei a minha Igreja, disse o Mestre.

Pedro, sendo o fundamento da Igreja, não é distinto da Igreja, pois não se pode separar, numa construção, o edifício e os fundamentos, pois formam um único e mesmo edifício.

Eis porque convinha estudar o edifício da Igreja: o seu corpo, a sua alma, a sua imutabilidade, a sua incomparável fecundidade.

Esta fecundidade, este desenvolvimento, é o mais forte dos argumentos para os espíritos cultos, como tem sido a causa de conversão de protestantes e intelectuais.

Newman, o grande cardeal Newman, era protestante antes de sua conversão.

Era um homem inteligente, perspicaz, sincero.

Como protestante, escreveu um livro que foi a causa de sua conversão.

Começou a estudar o dogma católico, notou que neste dogma há um movimento contínuo.

Tirou logo esta conclusão: o que está movimento vai SE CORROMPENDO, ou está a se DESENVOLVER.

Tudo muda neste mundo; porém umas coisas mudam porque se corrompem, outras mudam porque se desenvolvem.

Newman estudou, então, as leis que presidem a este desenvolvimento; procurou aplicá-las às verdades religiosas, onde a tudo preside uma mudança que, sem alterar a natureza daquelas verdades, comunica-lhes uma fisionomia nova.

Chegou a convencer-se e a ver, com clareza e evidência, que o dogma católico não alcançou imediatamente a sua perfeição, mas Deus foi colocando os princípios, deixando aos homens, à sua fé e ao seu coração, o cuidado de deduzir as conclusões destes princípios.

Foi uma centelha para a sua inteligência e para o seu coração. Deixou tudo: posição, porvir, fortuna, para entrar na Igreja católica, na única Igreja onde existia este desenvolvimento sem prejudicar à sua imutabilidade.

É uma das belezas do catolicismo; é também a auréola do seu augusto chefe, o Papa.

É imutável... mas desenvolve-se, em crescimento, em perfeição, sob o impulso da vida divina que corre em suas veias... e que é necessariamente fecunda: é a árvore da vida.


CAPITULO VIII

A depositária da verdade

O que já vimos da Constituição hierárquica da Igreja é verdadeiramente sublime, e seria o bastante para um homem sincero descobrir nesta hierarquia o dedo de Deus e encontrar nela a prova de sua divindade.

Comparem os leitores, de fato, esta organização a qualquer instituição humana, e verá logo a imensa distância que as separa. Encontrarão na obra humana o brilho do pensamento talvez de um gênio, mas na Igreja encontrarão O FULGOR do poder divino.

Mas não é só isso: vamos adiante e a maiores pessimistas mostremos o que eles ignoram, e o que lhes revelará uma Igreja que desconhecem, a Igreja verdadeira de Cristo: as suas funções sobre as almas.

Deus criou as almas para a felicidade eterna... mas para que cheguem à FELICIDADE precisam da VERDADE.

A verdade é a felicidade da inteligência como o amor e a felicidade do coração.

É uma felicidade dupla em seu OBJETO, mas uma em seu SUBJETO; pois a inteligência e o amor são as duas faculdades de nossa alma.

Para possuirmos a verdade duas condições eram necessárias:

1. que a Igreja possuísse a verdade com uma certeza absoluta.

2. que não pudesse alterar esta verdade.

São estas duas condições que vamos tratar aqui.

1) Deus CRIANDO a verdade e confiando-a à sua Igreja: é a inspiração divina.

2) Deus ASSISTINDO à sua Igreja para que conserve de modo infalível esta verdade: é a infalibilidade do Papa.

Duas verdades divinamente belas e humanamente ternas.


I. A fonte da verdade

Os protestantes dizem que cada um possui a verdade e deve interpretá-la tendo para isso uma assistência especial do Espírito Santo.

É uma asserção ridícula para quem reflete.

Mas, então, para que a Igreja? para que os templos? para que as casas de culto? para que os pastores?

Desde que cada um possui a verdade, podendo explicá-la por si, tudo cai, e a Igreja não tem mais razão de ser: é uma inutilidade.

Entretanto o Cristo fundou uma Igreja.

É indiscutível.

Ele o afirma em vários lugares:

Edificarei a minha Igreja. (Mt16,18).

Quem não ouve a Igreja é um pagão. (Mt17,17).

Se não escuta, diga-o à Igreja (Ibd).

A Igreja está submissa ao Cristo. (Ef5,24).

Desprezareis vós a Igreja de Deus? (1Co11,29). - ;

Porque persegui a Igreja de Deus. (Gl1,13).

A Igreja orava sem cessar. (At12,5).

Estes e muitos outros textos provam que Jesus Cristo instituiu uma Igreja; e fundou esta Igreja como uma sociedade DIVINO HUMANA.

É outra verdade indiscutível.

Divina, porque o seu fundador é Deus, porque ensina uma doutrina divina, e é ligada à sociedade divina dos anjos e santos pela Comunhão dos Santos.

Humana, porque está neste mundo, é composta de homens e, como tal, deve ser dirigida, por homens.

Já temos exposto, minuciosamente, a HIERARQUIA da Igreja.

A autoridade suprema, que tem nas mãos as chaves do reino do céu, (Mt16,19) é Pedro.

O primeiro é Simão, que se chama Pedro, diz o Evangelho. (Mt10,2).

Depois e sob a autoridade geral de Pedro vem os bispos: O espírito Santo colocou os bispos para governarem a Igreja, dizem os Atos. (20,28)

E estes bispos são verdadeiramente os SUCESSORES DOS APÓSTOLOS, pois os Atos já dão este nome ao sucessor de Judas, traidor: Um outro receba o seu episcopado. Episcopatum ejus accipiat alter. (At1,20).

E o apóstolo escreve: Se alguém deseja o episcopado, ele deseja uma obra boa. (1Tm3,1).

Como desejar o que não existe?

E o apóstolo continua a enumerar as qualidades que deve ter um Bispo; deve ser irrepreensível, sóbrio, prudente, honesto, humilde, manso, etc. (1Tm3,2-7).

São Pedro resume esta autoridade, dizendo: Vós éreis como ovelhas desgarradas, mas agora vos convertestes ao pastor e Bispo das vossas almas. (1Pd,2,25).

Depois vem o sacerdócio: os Padres, que são como o laço que une a autoridade do Papa dos bispos ao povo. Ide, disse-lhes o Salvador, eis que eu vos mando como cordeiros entre lobos. (Lc10,3s).

Eis, pois, a Igreja, sociedade divina das almas, mas estabelecida entre os homens, composta de homens, governada pelos homens.

O Papa, CHEFE UNIVERSAL da Igreja.

O Dispo, CHEFE DIOCESANO da Igreja sob a autoridade do Papa.

O padre, chefe local da Igreja, sob a autoridade do bispo e do Papa.

Tudo isso é divinamente belo, harmonioso e claro.

E é esta a Igreja, assim hierarquicamente organizada que Jesus Cristo confia a sua doutrina divina, e que faz DEPOSITÁRIA da eterna verdade.

Deus teria podido confiar a verdade a cada um em particular; podia, sim, porque é onipotente, mas não devia, porque seria contrário a todas as leis por Ele estabelecidas neste mundo.

Seria dar a VIDA ESPIRITUAL, a quem nem sequer tem a vida material em si mesmo.

Mas isto seria insensato!

O homem não tem a vida em si: nem a vida material, nem a vida espiritual; tudo vem de fora... absolutamente tudo.

Que é a vossa vida? pergunta S. Tiago e ele responde logo: é um vapor que aparece por um instante, e que em seguida se desaparece. (Jac.IV,15).

E este vaporzinho, que é o homem, sem consistência, quereria ter em sua própria inteligência a vida divina, quando nem sequer tem a vida humana.

Ainda uma vez: é insensato!

É um orgulho sem limites!

Não, não, é impossível, tal não é o PLANO DIVINO!

Deve haver um FOCO DE LUZ para a inteligência do homem como há para a sua vida terrestre um FOCO DE SUSTENTO.

Olhai o mundo físico e observai o que ali se passa.

A criança, apenas nascida, lança um vagido; as suas entranhas comovem-se: tem fome.

Ora, que é a fome, senão a prova sem réplica, de que ela não tem em si o sustento da vida?

E onde está este sustento?

Fora dela: no seio materno, que se inclina sobre o seu berço levando-lhe a vida no leite aquecido pelo amor, proveniente de um coração fecundado pela maternidade.

Eis o plano do mundo físico.

Eis também o plano do mundo espiritual.

Nós nascemos com a CAPACIDADE de conhecer a verdade, como a criança nasce com capacidade de receber o sustento da vida.

Mas é uma pura capacidade.

E onde esta capacidade encontrará o que o falta?

Em si mesma?

Nunca, pois neste caso teria já em si o que deseja... e ninguém deseja o que já possui.

É fora de si.

É na Igreja... de Deus... Aí está a vida, a fonte, o sustento da vida divina.

E a graça de Deus, a vida eterna, no Cristo, diz o apóstolo. (Rm6,23).

Para que a graça de Jesus se manifeste nós, (2Co4,10) é preciso receber da Igreja a verdade divina, que Deus depositou nela.

Ela é o firmamento da verdade, (1Tm15), como a criança recebe do seio materno o elemento que lhe sustenta a vida mortal.

Eis porque os santos chamavam a Igreja a Santa Madre Igreja!

É uma mãe... e diziam isso enternecidos, tendo as lágrimas de amor e de ternura nos olhos e no coração.

Sancta Mater Ecclesia!

É do seio eterno e amoroso desta Igreja que dimana a VERDADE, que destila a verdade na alma do cristão.

Ele não tem esta verdade em si... Deve recebê-la no seio da Igreja!...

Sancta Mater Ecclesia!


II. A inspiração divina

Mas entremos nos pormenores da obra admirável que estamos analisando.

A Igreja de Cristo é a depositária da verdade.

E como é isso?

São Paulo, numa frase lapidar, dá a resposta, no preâmbulo de sua Epístola aos Hebreus: Deus, diz ele, tendo falado outrora muitas vezes e de muitos modos a nossos pais pelos profetas, ultimamente, nestes dias, falou-nos por meio de seu Filho. (Hb1,1-2).

Eis como é feita a fonte das verdades confiadas à Igreja.

Não foi feita de repente ou de uma vez, é por iluminação completa, mas sucessivamente, lentamente, de muitos modos, e muitas vezes.

E bastaria este texto, bem interpretado para fazer ruir a pretensão protestante da inspiração individual a cada alma em particular.

A inspiração total não é pessoal, mas é confiada por um ensinamento publico, a certos homens escolhidos, inspirados, enviados por Deus, para transmitir a sua doutrina divina.

A inspiração divina pode ser INDIVIDUAL enquanto é feita a uma pessoa, mas ela é UNIVERSAL, enquanto este ensino deve ser transmitido à humanidade inteira, Ora, se todos os homens são inspirados igualmente, a quem transmitirão eles os ensinos recebidos do alto?

A inspiração é UNIVERSAL ou é PARTICULAR...

Se é universal, neste caso apenas uns podem ser favorecidos por ela, com a missão de transmitir a verdade revelada aos outros, e neste caso, a inspiração individual protestante cai, desaparece, não tem razão nem possibilidade de ser.

Se é particular, os inspirados devem guardá-la para si, não fazer propaganda, nem sequer comunicá-la aos outros, não podendo os pastores pregar as suas doutrinas, nem interpretar a Bíblia, pois o espírito Santo deve falar a cada um em particular, e de novo a tal inspiração protestante rui, estando em plena contradição consigo mesmo.

Em um e outro caso estão errados: é um dilema sem saída.

Como a verdade católica é mais simples, mais clara e mais lógica!

Deus comunica a verdade aos homens, pela INSPIRAÇÃO; no começo, pelos profetas e depois da vinda de Jesus Cristo, pelos apóstolos, comunicando-lhes tal verdade, e enviando-os para anunciá-la ao mundo.

É uma corrente ininterrupta:

De Adão a Noé,

De Noé a Abraão,

De Abraão a Davi,

De Davi a Isaías,

De Isaías a Jeremias,

De Jeremias a Daniel,

De Daniel a Malaquias,

Dos profetas aos apóstolos,

S. Matheus, Marcos, Lucas, S. João, S. Paulo, etc., etc.

Cada um vem em sua hora, quanto ao tempo quanto à verdade e quanto aos termos a empregar.

Contenham eles, como Moisés, os mistérios do passado, ou contemplem eles como S.

João, um futuro desconhecido, narrem eles, como os evangelistas, os fatos presentes, pouco importa: é a inspiração divina: neles tudo é DIVINO quanto à verdade, e ao mesmo tempo tudo é HUMANO quanto ao modo de dizer.

Cada escritor conserva o seu gênio, o seu caráter, a sua educação, as suas lembranças, as condições externas e internas de sua vide Sente-se que é um homem que fala... este homem diz: ou coisas divinas, ou coisas humanas, mas as diz divinamente.

E o verbo de Deus que se faz carne e habita entre nós!

A palavra divina se faz palavra humana e chega aos nossos ouvidos, cheia de graça e de verdade.

És tu, Senhor, que falaste por minha boca, eu o teu Servo; exclama Isaías. (Is17,21)

O Espírito do Eterno falou por mim, e a sua palavra estava sobre a minha língua, diz Davi(2R21,2).

Toda Escritura foi divinamente inspirada, continua S. Paulo. (2Tm3,16).

É sob a inspiração do espírito Santo, que os santos de Deus falaram, completa S. Pedro, (2Pd1,21).

E ao mesmo tempo que Deus vai criando completando esta FONTE DA VERDADE, a aproxima da humanidade, coloca-a a seu alcance, proporciona-a à sua força, ao seu desenvolvimento, de modo que não esteja, nem demais alta para os pequeninos, nem demais baixa para os grandes.

Cada escritor conserva o seu estilo, e sob este estilo, esconde-se a imensidade do Espírito divino, como sob as variadas cascas das árvores, esconde-se a multiplicidade das madeiras.

Eis os livros santos. Eis como foram compostos. Aparentemente é uma desordem; e na realidade, é uma ordem admirável, uma medida, uma progressão, uma harmonia, uma unidade maravilhosas.

Tal um grande mestre de música dirigindo uma grande orquestra, faz sinal a um, depois a outro, excita um e faz parar o outro até terminar a peça de harmonia, assim fez Deus no decorrer dos séculos.

O seu olhar vê e percorre o teclado de quarenta séculos; ele pôs a mão, não por acaso, mas ora sobre uma, ora sobre outra tecla, até terminar esta incomparável peça de harmonia divina, que são os livros inspirados.

Deus disse tudo, não o que sabe, mas tudo o que quer dizer, e o que o homem devia saber.

Não falará mais!

A inspiração está concluída!

A peça de harmonia está completa.

O livro está fechado.

A fonte da verdade está selada.

O Apocalipse, o livro do futuro fechou para sempre a época da inspiração, que Moisés abriu.... pelo Gênesis; que S. João fechou em Patmos.

Homens, aproximai-vos desta fonte... lede este livro sagrado... que a Igreja vos apresenta... mas não os livros deturpados, falsificados, interpolados, que o protestantismo espalha.

Escutai a autoridade divina da Igreja, a quem foi confiado este depósito.

Tudo está aí: as verdades do tempo presente e os segredos do futuro!


III. A tradição e as Escrituras

Tendo criado o depósito sagrado de sua palavra divina, da fonte da verdade, Deus confiou-o à sua Igreja.

É para isso que instituiu a sua Igreja.

A Igreja é essencialmente uma depositária.

A depositária deve existir antes do depósito.

A Igreja começou no paraíso terrenal, pela união dos primeiros fiéis, que foram Adão e Eva, e depois na terra: Adão, Eva, Caim, Abel — depois Set, Enos, Enoc, Lamec, etc. sendo Adão o pontífice supremo da Igreja primitiva.

O primeiro depósito, feito por Deus e confiado à suprema autoridade na terra, foi ainda no paraíso, oralmente, para ser transmitido de pai a filho.

O primeiro depósito por escrito foi feito por Deus a Moisés, 2.500 anos após a criação do mundo.

Moisés nasceu 1.500 anos antes de Jesus Cristo, tendo havido desde a criação do mundo até Jesus Cristo perto de 4.000 anos.

A Igreja primitiva existiu pois 2.500 antes de receber as Escrituras, unicamente com o depósito oral da verdade divina que chamamos a TRADIÇÃO.

Daí, diversas conclusões a tirar contra a cegueira dos protestantes.

Dizem eles que basta a Bíblia para conhecer a verdade, e nada reconhecem de verdade fora da Bíblia.

Mas, neste caso, a verdade só começou a existir 2.500 anos depois da criação do homem!

Então Deus criou o mundo e o homem na mentira?

Como reconhece um DEPÓSITO, sem primeiro reconhecer o depositário?

Se o depósito existe, deve haver um depositário.

O depósito existe. S. Paulo o diz:

Ó Timóteo, guardai o depósito. (1Tm6,20)

O que tem poder de guardar o meu depósito. (2Tm.12).

Guardai o bom depósito pelo Espirito Santo. (2Tm1,14).

Eis o depósito da verdade.

E a quem foi confiado este depósito?

É o próprio Jesus Cristo que responde a Pedro: Eu te darei as chaves do reino dos céus. (Mt16,19)

Este reino dos céus, para nós, é a Igreja.

S. Pedro tem as chaves deste reino.

O que quer dizer que tem A GUARDA do depósito da verdade, para iluminar e confirmar os outros.

E tu, Pedro, continua Jesus Cristo, uma vez convertido, confirma os teus irmãos. (Lc21,32).

Uma segunda conclusão, continuação da primeira.

O apóstolo, no texto supra citado, diz Deus manifestou a verdade, MULTISQUE MODIS, sob diversas formas, sobretudo sob duas formas: a FORMA ORAL e a FORMA ESCRITA.

A forma oral vingou durante 2.500 anos, continua ainda hoje, pois a verdade não muda.

A forma escrita começou em 2.500, isto 1.500 antes de Jesus Cristo até a morte de João, em 104 da nossa era.

No começo, quando ainda a Escritura existia, como foi comunicada a verdade a Adão, a Noé, aos patriarcas antediluvianos?

Como foi dada a Abraão e aos justos que precederam a Moisés?

Sob a FORMA ORAL, pela tradição: Não havia outra.

Depois que foi inventada a arte de escrever serviram-se dela. É uma forma menos viva porém, MAIS ESTÁVEL.

Assim fizeram os Profetas... e mais tarde os apóstolos; entretanto não abandonaram a TRADIÇÃO.

Escreveram, mas não escreveram tudo; não teriam podido escrever tudo, sobretudo os apóstolos.

Postos em frente de Jesus Cristo, durante três anos; contemplando-o, escutando-o, encantados da doutrina, que o Mestre derramava a flux sobre a Galileia e sobre Jerusalém, não havia nem tempo, nem lazeres capazes de conter tanta riqueza de doutrina.

Nem o mundo caberia os livros que seria preciso escrever, diz S. João, se se escrevesse uma por uma todas as coisas que fez Jesus. (Jo21,25).

Mandando os seus apóstolos espalharem A VERDADE, Jesus não os mandou escrever, nem espalhar bíblias, mas PREGAR: euntes, docete omnes. (Mt27,19).

E eles pregaram sempre.

Escreveram pouco, e só por ocasião.

Eis porque recomendam sempre manter as TRADIÇÕES recebidas oralmente.

Permanecei constantes, irmãos, diz o apóstolo, e conservai as tradições que aprendestes, ou por nossas PALAVRAS ou por nossa CARTA. (2Ts2,14).

Eis a dupla fonte da verdade divina, claramente indicada por S. Paulo: AS PALAVRAS E AS CARTAS, a tradição e as Escrituras.

E estas duas formas unem-se tão estreitamente que se pode dizer, que não existe um ponto na tradição que não seja pelo menos indicado pela S. Escritura, como não há na Sagrada Escritura um dogma, um artigo de fé que não tenha as suas raízes mergulhadas na tradição.

Numa ou noutra forma encontra-se o mesmo espírito, a mesma voz: A VOZ DIVINA!

Foi uma das asserções mais insensatas e contraditórias do protestantismo, o querer rejeitar a tradição para só conservar a Escritura.

Neste caso, como já dissemos, é negar a própria instituição da Igreja.

Por direito, a Igreja é anterior às Escrituras.

Ela foi criada primeiro; o deposito da verdade foi remetido depois; e este depósito foi primeiro ORAL, e só depois de 25 séculos foi ESCRITO.

É o que o protestante Lessing reconhece. (opera., t. VII):

"Toda a religião de jesus Cristo, diz ele, era já aceita e praticada, antes que fosse escrito um evangelho".

Quando Davi, Isaías, Jeremias, falaram ou escreveram os seus salmos, as suas lamentações ou profecias, a Igreja judaica (imagem da Igreja de Cristo) lá estava para recolhê-las.

Do mesmo modo havia já tempo que a Igreja Católica existia, quando apareceu o primeiro Evangelho.

Havia tempo que S. Paulo pregava aos fiéis de Corinto, em Atenas, em Éfeso e

Roma quando apareceu o Evangelho de seu discípulo Lucas, e ele mesmo nada ainda tinha escrito.

Havia perto de 70 anos que a Igreja existia, quando S. João fechou a época da inspiração pelo APOCALIPSE.

Pregava-se, batizava-se, comungava-se, celebrava-se a Santa Missa, sagravam-se os bispos, ordenavam-se os padres, antes que houvesse um único Evangelho, uma única epístola qualquer escrito dos apóstolos.

Jesus Cristo veio, pregou o seu Evangelho, fundou a Igreja, e esta Igreja composta de seus apóstolos, depois dos discípulos, recebeu d'Ele ORALMENTE o depósito da verdade divina.

De modo que a Igreja não está fundada sobre a tradição, nem sobre as Escrituras, mas sobre o próprio Jesus Cristo, tendo ele mesmo escolhido a primeira pedra, a pedra fundamental desta Igreja: São Pedro.

Não é, pois, o depósito da verdade que sustenta a Igreja... é A IGREJA QUE SUSTENTA O DEPÓSITO DA VERDADE.

É ela a depositária certa, segura, imutável.

Pedro, eu roguei por ti para que a tua fé não falte. (Lc21,32).

As portas do inferno nunca prevalecerão contra ela. (Mt16,18).

Eis o que é claro e absolutamente irrefutável... e eis o que faz ruir por completo todo o edifício protestante, querendo que a Igreja dependa da Bíblia, e não a Bíblia da Igreja — querendo que só a Bíblia seja a única regra de fé.

É como se alguém dissesse que um livro existe antes do escritor... e que o escritor depende do livro!

Pobre cegueira! de quem não quer ver!...


IV. A assistência divina

A Igreja possui, pois, o DEPÓSITO da verdade divina.

Mas possuir não basta.

A verdade não é um diamante que se esconde e se conserva num escrínio precioso; a verdade é uma LUZ: a luz das inteligências.

Jesus Cristo o disse: Vós sois a luz do... Não se pode esconder uma cidade situada sobre um monte; nem se acende uma lanterna e a põe debaixo do alqueire, mas sobre o candieiro, afim de que ela dê luz diante dos homens. (Mt5,14-15).

A luz deve irradiar-se... deve iluminar.

A verdade divina, sendo a luz das inteligências, deve penetrar estas inteligências, e para isso duas coisas são necessárias: COMPREENDER e INTERPRETAR a palavra divina.

Compreender, pois toda escritura tem necessariamente as suas escuridões.

Por mais claro e metódico que seja o escritor, ele não é compreendido por todos os leitores, pela razão muito simples que o leitor não está sempre ao nível intelectual do escritor; e, sendo-lhe inferior, haverá necessariamente coisas que o escritor compreende bem, procura fazer compreender, mas que o leitor não compreende.

Uma perfeita compreensão entre escritor e leitor, supõe uma igualdade de inteligência.

Ora, a Sagrada Escritura, sendo a expressão da verdade divina, é infinitamente superior à compreensão da inteligência humana; daí, como o diz São Pedro das cartas de S. Paulo:

Há algumas coisas difíceis de entender, que os indoutos, inconstantes, adulteram (como também as outras Escrituras) para sua própria perdição. (2Pd3,16).

A Igreja, encarregada de conservar o depósito divino, deve compreender este depósito, deve interpretá-lo, dar-lhe o sentido verdadeiro, e se necessário for, impôr a obrigação de crer em sua palavra.

Por isto ela precisa da ASSISTÊNCIA DIVINA.

Notemos bem a diferença entre: INSPIRAÇÃO divina e a ASSISTÊNCIA divina.

A inspiração tinha por fim revelar NOVAS verdades.

A assistência tem por fim conservar, explicar e aplicar as verdades reveladas:

Quando Jesus Cristo disse aos apóstolos: Ide, ensinai a todos os povos... ensinando-os observar todas as coisas que vos mandei: e que eu estou convosco todos os dias até a consumação dos séculos, (Mt27,19-20) esta promessa incluía a inspiração e a assistência; a inspiração referia-se às SUAS PESSOAS: era um privilegio pessoal, que os fez, cada um em particular, infalíveis na exposição da doutrina. Esta inspiração, porém, limitou-se a eles e não foi transmitida a seus sucessores, os bispos.

Nenhum dos bispos, nem o próprio Papa goza da INSPIRAÇÃO divina, estando encerrada à época das inspirações.

A Igreja recebeu entretanto a promessa ASSISTÊNCIA divina: Eis que eu estou convosco, — assistência para conservar, explicar e aplicar o depósito da verdade divina.

Terminada a dinastia dos INSPIRADOS, levantou-se a dinastia dos ASSISTIDOS e esta dinastia é a dos papas de Roma: centro da Igreja católica.

Há, na Igreja, um fenômeno que já explicamos: a firmeza granítica de seus dogmas; e o crescimento contínuo destes dogmas.

É um dos mais profundos e mais resplandescentes fenômenos da Igreja, e que demonstra a divindade de sua organização, de sua assistência e de seu crescimento.

Os dogmas católicos não são pedras preciosas; são GERMENS DE VIDA.

A Igreja é uma árvore de vida.

São germens. Ora, o gérmen contém a planta, a árvore; mas para fazer desabrochar, este gérmen, é preciso semeá-lo num terreno preparado, vigiá-lo, regá-lo, dar às suas raízes a umidade do solo, e à sua haste o calor do dia.

E quem deve fazer este trabalho?

O espírito humano.

E esta obra, sendo delicada, perigosa, Deus deu à Igreja um dom: a infalibilidade que estudaremos no capítulo seguinte, para guiar, e sustentar o espírito do homem, para que não se afaste da verdade.

A Igreja é a vida.

E esta vida, ela a comunica a todos os seus membros, como a árvore comunica a vida que circula em seu tronco a todos os ramos que dele brotam.

O homem entra na Igreja, não simplesmente PASSIVO — é o grande mal da ignorância

— mas ATIVO, estudando a sua religião, procurando compreendê-la, penetrando-a até em seus mais recônditos princípios, para deles tirar consequências, fazer aplicações à sua própria vida e à vida dos outros.

E não pensem que isto é o privilégio do Papa, dos bispos e dos padres...

Não! é PATRIMONIO COMUM de todos os fiéis; todos deveriam estudar a religião, procurar conhecê-la a fundo.

A religião é um GÉRMEN.

Ora, não se sepulta um gérmen no fundo de um sepulcro.

É preciso semeá-lo no espírito, regá-lo pela oração, dar-lhe o sol da graça divina, para que possa desabrochar e dar os seus frutos.

E neste trabalho de desenvolvimento, a Suprema autoridade vigia, dirige, mostra os erros, indica a verdade, de modo que nesta efervescência de vida ela serve de TUTOR que sustenta o espírito e o conserva no caminho da verdade.

Do alto do Vaticano, sentado neste trono eterno, o sucessor de Pedro segue estes eflúvios de vida que brotam da verdade divina, regando com suas águas fecundas a face da terra; ele vê tudo, segue tudo, animando os que andam seguros, sustentando os que vacilam, levantando os que caem, reconduzindo os que se afastam do caminho!

E nesta luta eterna, nesta azafama sem tréguas, assistida pelo espírito Santo, a Igreja conserva, explica e aplica o depósito da verdade divina que lhe foi confiado.

E enquanto a humanidade obedece a esta autoridade suprema, segue o caminho da verdade, guiada com segurança por aquele que foi estabelecido para guiar e confirmar os seus irmãos.

Oh! Sancta Mater Ecelesia! como sois bela, somo sois carinhosa, como sois sublime, envolta no manto branco daquele que o mundo aclama: o Santo Padre.

Guiar é o próprio do pai; e tu és pai.

Guiar sem errar é o próprio do santo; e tu és santo.

Sois pai pela autoridade; sois santo pela representação da Santidade Suprema, que é Cristo.


V. Conclusão

Como tudo isso é belo e ignorado por aqueles que tem apenas um conhecimento superficial da religião!

Sob a irradiação destas noções doutrinais se nos aparece, grande e sublime, a Santa Igreja de Cristo, governada pelo sucessor de Pedro.

O depósito divino, hoje confiado à Igreja, foi completando-se através das idades, pelos profetas e pelos apóstolos, terminando esta fase pela morte do apóstolo S. João, o último inspirado.

A este período de INSPIRAÇÃO, que durou 4000 anos, da primeira linha do Gênesis até a última linha do Apocalipse, sucede uma segunda época, a da ASSISTÊNCIA divina.

A Igreja Católica recebeu em seu berço dons sublimes, porém Deus lhos comunicou apenas por poucos dias, e só para a sua definitiva organização e extensão no mundo, o dom da INSPIRAÇÃO.

Mil vezes superior à Igreja Mosaica, que ela termina e aperfeiçoa, a Igreja Católica não goza entretanto do dom da inspiração, não podendo ajuntar mais uma palavra ao livro divino.

O livro está encerrado e fechado; o Espírito Santo pôs-lhe o ponto final com esta frase divinamente sublime e ternamente humana que é o diadema de ouro, coroando uma obra divina:

O que dá testemunho destas, coisas, diz: Sim, venha depressa: Amém. Vem, Senhor Jesus. A graça de Nosso Senhor Jesus Cristo esteja com todos vós: Amém! (Ap21,20)

Que adorável chave de ouro a fechar o ciclo de 4.000 anos de inspiração!

O tesouro está completo: Nada mais lhe falta.

E o vidente de Patmos, o apóstolo do amor parece tomar em suas mãos trêmulas de ancião com perto de 100 anos de idade... de último dos apóstolos... de último representante dos séculos... de último testemunho de Jesus Cristo na terra... a apresentar os 72 livros inspirados à Igreja de Jesus Cristo, como o resumo perfeito, completo das manifestações divinas à terra... é a expressão integral do amor de Deus para com os homens.

A época da inspiração estava terminada.

João, em nome dos profetas do Antigo Testamento e em nome dos apóstolos do Novo, pôde escrever como termo DE ENCERRAMENTO esta frase inspirada, prova da autenticidade dos livros divinos: Eu protesto a todos os que ouvem as palavras da profecia deste livro, que, se alguém lhes juntar alguma coisa, Deus o castigará com as pragas escritas neste livro.

E se alguém tirar qualquer coisa das palavras da profecia deste livro, Deus lhe tirará a sua parte do livro da vida, e da cidade santa, e das coisas que estão escritas neste livro.

(Ap22,18-19).

Encerrando a época da inspiração. Deus não quer fazer-nos entender que nada mais tem a comunicar-nos.

É claro, Deus, sendo infinito, nunca pode comunicar aos homens tudo o que sabe.

O homem finito é incapaz de conter o infinito de Deus. Deus não se esgotou, mas disse tudo o que tinha de dizer e o que quis dizer.

Entregando, pois, o livro encerrado das revelações, São João diz à Igreja: Guardai este depósito, explicai-o... penetrai-o, com o intuito de descobrir as riquezas infinitas que ele encerra,

Guardai tudo o que eu vos ensinei, havia dito o Mestre divino... tudo: omnia.

Não mudeis nem uma vírgula, mesmo se um anjo do céu vô-lo pedisse.

Depositum custodi: guardai-o, e como o espírito humano está sujeito ao erro, mesmo na interpretação do que é claro, eis que eu estou convosco até a consumação dos séculos. (Mt27,20).

Estou convosco: eis a ASSISTÊNCIA divina — e isso até o fim dos séculos, enquanto a Igreja existir.

Eis porque não dizemos que a Igreja é INSPIRADA, para ensinar a verdade, o que seria um erro.

Não dizemos que a Igreja ensina novos dogmas.

Teria podido fazê-lo, se Deus o tivesse querido; mas não o quis, nem o quererá mais.

A dinastia dos INSPIRADOS, que durante 40 séculos ensinara aos homens verdades ainda não reveladas, sucedeu definitivamente a dinastia dos ASSISTIDOS, que nada ensinam de novo, mas que guardam, até nas mais ínfimas minúcias o que foi ensinado.

Tal é o plano divino.

Deus, pelos lábios dos profetas, criou a FONTE da verdade divina, e o mesmo Deus

pelos lábios dos papas, guarda esta fonte, na integridade e pureza de sua origem divina.

Tudo isso é divinamente belo e harmonioso e mostra o DEDO, a MÃO, e até o BRAÇO de Deus.

Quando Deus favorece uma obra, a S. Escritura diz que Deus nela põe o dedo: os céus são a obra de seus dedos, diz o salmista. (Sl7,4).

Quando a obra é mais importante, Deus nela coloca a mão: Jesus tocou-a com a mão e a febre desapareceu. (Mt8,15).

E quando a obra é de suma importância Deus põe nela o braço: Deus te conduzirá, com mão forte, de braços estendidos. (Dt5,15).

Na obra da Igreja, Deus tem posto igualmente sua mão forte e o BRAÇO ESTENDIDO: é a sua obra de predileção, a obra de seu coração: a sua esposa de amor.


CAPITULO IX

A Infalibilidade

Ao escrever esta palavra, parece-me ouvir ao longe o eco das mil objeções protestantes, do ódio, da impiedade, da inveja dos traidores, e do sarcasmo dos ateus.

Imaginem, bradam eles, falar de um HOMEM INFALÍVEL, em meio do século vigésimo, o século das luzes, é querer introduzir o despotismo numa época de emancipação e liberdade.

Que coisa retrograda!... Que absurdo!...

E lentamente vejo aparecer, no fundo luminoso da aurora, pisando aos pés as nuvens, de pó, levantadas pelo espírito irrequieto e cético dos inimigos da Igreja, o Cristo... O grande Cristo... o Cristo do Corcovado... de braços estendidos... de fronte erguida... de olhar a refletir o amor de seu coração... e este grande Cristo, este Cristo imortal, com esta mesma voz que dominava as tempestades, expulsava os demônios e fazia surgir do túmulo cadáveres em putrefação, este Cristo que pregava, que sabia chorar, sorrir, e acariciar as criancinhas... este Cristo repete por sobre a turba, envolta de poeira dos que se revoltam contra Ele: Eu sou a luz do mundo; o que me segue não anda em trevas, mas terá a luz da vida! (Jo8,12).

Nós precisamos de luz...

Precisamos sobretudo da LUZ DA VIDA.

A luz da vida é a doutrina.

Como distingui-la entre tantos erros que hoje correm mundo e penetram em toda a parte?

Pela voz de alguém que nos ensine a verdade, sem receio de errar, sem possibilidade de errar.

E este alguém, este homem privilegiado é aquele a quem o Cristo disse:

Eis que eu estou convosco até ao fim dos séculos. (Mt28,20).

Eu roguei por ti para que tua fé não falte. (Lc21,32).

Quem vos escuta escuta a mim. (Lc,10,16).

Eis a infalibilidade em toda a sua simplicidade, extensão e grandeza.

É esta infalibilidade que devemos agora estudar, como continuação, como complemento necessário da assistência divina.


1. O que é... o que não é!

O que dissemos da assistência divina, dada à Igreja, para que ela cumpra e explique o depósito das Escrituras, é já uma exposição da infalibilidade.

Aqueles que bradam contra este dogma mostram apenas nem sequer saberem o que seja a infalibilidade; confundem-na com a INSPIRAÇÃO... ou com a IMPECABILIDADE e não acreditando nem na inspiração, nem na impecabilidade, não podem acreditar na infalibilidade.

Antes de bradar contra uma verdade, é preciso conhecer tal verdade; antes de atacar um inimigo, é preciso primeiro ver onde ele está, senão seria dar murros em pontas de faca.

O fanatismo não resolve nada; mas a ignorância explica tudo.

Em que consiste a tal infalibilidade?

Consiste no privilégio outorgado por Jesus Cristo a Pedro e a seus sucessores de gozarem da ASSISTÊNCIA DIVINA, para conservar e explicar a doutrina divina, de modo a não poderem errar, quando ensinam publicamente em nome da Igreja, com a autoridade suprema de chefe da Igreja.

Nada mais... É só isso!

É pouca coisa... mas isto é de absoluta necessidade.

Tu vens a mim e me ensinas uma doutrina.

Tenho as minhas dúvidas.

Sou homem como tu, e o que tu compreendes eu posso compreendê-lo... mas, não compreendendo, continuo a duvidar.

Isso é um tormento!

Procuro um outro mais inteligente... e mais um outro... e sempre vou ficando sem bem compreender, pois o espírito humano é raciocinador. .. é crítico... e quer ver o fundo das questões.

Ora, quantas ciências são unicamente baseadas em hipóteses... em puras suposições, sem provas!

As coisas passam-se, como se obedecessem a tal lei.

Continuo a duvidar... consulto mais, até inclinar-me diante de um homem de conhecida capacidade, de conhecido preparo intelectual... inclino a fronte porque sinto que este homem não quer e não pode enganar-me.

Praticamente, atribuo a este homem o dom de uma QUASE INFALIBILIDADE.

O mundo faz isso diariamente.

Um homem vai visitar Paris, Londres, Berlim; e depois conta-me maravilhas de tudo o que viu e admirou; creio sem hesitar, embora eu não tenha talvez nunca visto uma destas cidades.

Dou a este viajante o dom da QUASE INFALIBILIDADE. Eu não vi, mas ele viu, e creio.

Pobres ateus, não querem aceitar a infalibilidade do Papa, por ser Papa, e aceitam a infalibilidade de qualquer caixeiro-viajante, de qualquer professor, de qualquer escritor!

Eles merecem fé; só o Papa não a merece, porque é Papa!

Mas isto é insensato!

Então o Papa, homem escolhido entre milhares, homem de idade, de ciência, de virtude, de experiência, desde que senta-se na cadeira suprema de S. Pedro, não teria mais um privilégio que os homens concedem a qualquer um, desde que nele notem sinceridade e capacidade?

Ora, as dúvidas que penetram o espírito, a respeito das ciências humanas, penetram também a alma, em questões religiosas.

A dúvida é uma fraqueza... e nós somos, fraquíssimos. Eis porque precisamos de alguém que nos diga clara e categoricamente: A verdade é esta: crê!

O grande escritor, Conde de Maistre, disse alhures que a infalibilidade não é outra coisa senão a soberania, e ajuntava que, reclamando para a Igreja a infalibilidade, não reclamava nenhum privilégio, senão o de que gozam todos os soberanos, pois todos agem necessariamente como infalíveis.

É uma grande verdade.

Não há soberania, não há tribunal supremo, não há juiz em última apelação, cujas sentenças poderiam deter os espíritos perturbados e restituir a paz à sociedade, se não gozassem de uma espécie de infalibilidade.

Em toda jurisdição é preciso chegar-se a um juiz que julgue e não possa ser julgado por ninguém.

Ali o espírito pára e inclina-se, sujeitando-se pelo menos exteriormente.

É somente uma QUASE infalibilidade, porque exige apenas a obediência exterior.

Se a lei pudesse exigir dos súditos a obediência interior e a submissão de espírito, seria uma INFALIBILIDADE completa.

É o caso da Igreja.

Ela não se contenta com a obediência exterior.

Ela quer mais que um silêncio respeitoso.

Ela exige uma adesão absoluta.

Porque esta exigência?

Porque se trata da palavra de Deus cuja existência e sentido ela garante.

Como dizer: creio, se houvesse da parte dela qualquer possibilidade de errar?

Deus devia dar à Igreja a infalibilidade, para que a nossa fé fosse isenta de dúvida.

Creio, meu Deus, em tudo o que revelastes, e que a Igreja me propõe a crer.

Não estão vendo que é uma necessidade?

A fé e a dúvida não podem dar-se as mãos.

A fé, mesmo divina, é sempre racional.

Onde há dúvida voluntária, não há fé.

A fé é a adesão às verdades reveladas por Deus, por por causa da autoridade d'aquele que revela.

Mas, como ter a certeza de bem compreender o que Deus revela?

Aí intervem a infalibilidade da Igreja: ela nos interpreta a verdade revelada, e nos dá a certeza absoluta, PELA ASSISTÊNCIA DIVINA, de ser tal o sentido e a extensão da verdade revelada.

A infalibilidade é pois o complemento necessário da revelação divina.

Sentimos instintivamente que uma religião divina deve descer do Sinai, com a fronte a 1uzir, tendo nas mãos as tábuas da lei, ou, então sair do Cenáculo tendo sobre a cabeça línguas de fogo e dizer depois à humanidade:

Tu precisas de verdade: Ei-la aqui.

Precisas de amor: ei-lo aqui.

Precisas ir a Deus: Dá-me a mão, pois eu, conheço o caminho que a Ele conduz.

Mas, como isso se pode dar, se a religião pode enganar-se, se pode dar-me o erro em vez da verdade! ela pode dar-me o amor falso, em vez do amor verdadeiro! pode levar-me ao abismo, em vez de conduzir-me a Deus!

Para poder ter a certeza de seguir o caminho reto — e Deus não pode permitir a dúvida em assunto tão grave — é preciso que a Igreja seja INFALÍVEL.

Infalível, porque vem de Deus.

Infalível, porque deve conduzir-me a Deus.

São verdades que nem se discutem; põem-se pelo bom senso.


II. Prova apologética

A Igreja é pois infalível...

Ela sempre o acreditou... ela sempre o afirmou.

E esta afirmação é uma prova de sua divindade.

Percorrei a lista das seitas religiosas: são tantas, de diversos credos, diversas concepções, desde o grosseiro fetichismo até ao orgulhoso positivismo; examinai as suas doutrinas, e em todas elas encontrareis pontos de contato, concordâncias, pois todas eles têm por fim aproximar o homem de Deus, mas há um ponto, em que nenhuma seita concorda com a religião católica: é a INFALIBILIDADE de seu chefe.

Entre todas as religiões, só a religião católica teve a ousadia, a simplicidade, ou então a sublimidade de acreditar na infalibilidade de seu chefe supremo.

É de fato, muita ousadia! E tamanha tal ousadia, que só pode vir do céu ou do inferno, mas nunca dos homens.

O homem pode ser orgulhoso como quiser mas nunca teve nem tem a coragem de outorgar-se a infalibilidade.

Porque isso?

Porque ele mesmo sente que está se enganando a cada instante... todos acreditam em seus erros, porque são palpáveis.

Infalibilidade — nem sequer tal palavra foi conhecida na antiguidade pagã.

Os velhos poetas, filósofos como Platão, Sócrates, Cicero, Horácio, etc., tinham fé na ciência, mas desconfiavam de sua ciência sentindo-a fraca, falha e incompleta.

Jesus Cristo veio a este mundo e proclamou A INFALIBILIDADE de sua Igreja, e esta verdade tão fundamental e tão necessária permanece sempre patrimônio exclusivo de sua Igreja.

As heresias nascem, separam-se da Igreja de Cristo, formam seitas religiosas, conservam certas práticas e até sacramentos da mesma Igreja, mas nenhuma seita teve a ousadia de pretender para o seu chefe o dom da infalibilidade.

Nem Lutero, nem Calvino, nem Henrique VIII, nem o Czar da Rússia, teve a coragem de arrogar-se a infalibilidade.

Eles mesmos sentiam que, si o fizessem, o mundo zombaria por demais de suas pretensões... todos ririam de tanta cegueira.

A Igreja católica acredita em sua infalibilidade e professa esta doutrina como dogma de fé... e ninguém zomba dela.

O protestante berra de raiva, faz mil objeções, mas sente-se vencido diante da autoridade do Papa.

É curioso que a Igreja tenha tido a coragem de proclamar tal verdade.

É mais curioso ainda que nenhuma seita religiosa, vendo a autoridade predominante que Igreja adquire com esta prerrogativa, não tenha tido a coragem de imitá-la!

A ousadia da Igreja é prova de sua divindade.

O medo, que as seitas têm de recorrer a este poder, é prova de seus erros.

A toda seita falta qualquer coisa de essencial: é a infalibilidade!

E não tem a coragem de reivindicá-la, porque sente que, sendo da terra, não tem direito a um privilégio que vem do Céu.

Eis um argumento que merece ser citado pelos apologistas, em favor da religião católica.

A infalibilidade, na explicação de uma religião divina é absolutamente necessária, senão o divino estaria sujeito ao humano, e tal religião divina deixaria de ser divina.

Tal privilégio, só existe na Igreja católica.

Só ela é pois divina, e por conseguinte verdadeira.


III. O órgão da infalibilidade

Qual é o órgão desta infalibilidade, desta incapacidade de errar?

A sede deste órgão é a sede de São Pedro.

O seu órgão próprio é o Papa.

Sempre a Igreja acreditou na existem desta prerrogativa, mas houve, às vezes,no tocante ao próprio órgão.

Uns julgavam que ele estava como que difundido no corpo docente da Igreja.

Era prudente... era uma opinião humana.

Mil ou dois mil bispos dificilmente engariam... é uma quase INFALIBILIDADE.

a infalibilidade porém, é uma prerrogativa divina e, como tal, não depende DO NÚMERO.

O que depende do número provém da terra... nas coisas divinas o número não tem importância.

Citando um texto dos livros sagrados, tanto prova um só, como provam vinte.

Se um bispo não é infalível, nem cinquenta, nem mil o serão.

A infalibilidade é uma prerrogativa completa em si; quem a possui, possui-a inteira; quem a não possui inteira, nada possui.

Não pode haver neste dom mais ou menos; é um dom integral e completo.

Eis porque a Igreja estudou a questão a fundo, penetrou-lhe até ao âmago e procurou o órgão próprio desta infalibilidade.

Procurou, e proclamou solenemente, no Concílio do Vaticano, que tal poder reside NA PESSOA DO PAPA.

Não reside no número; mas, sim, na unidade, numa única cabeça, no PAPA DE ROMA que é o sucessor de São Pedro.

Numa cabeça só, brada admirada a incredulidade, mas, e se for cortada esta cabeça... que será depois?

Sim, podem cortar a cabeça humana, não cortam a cabeça divina.

Os papas são homens; podem matar estes homens e já os mataram em número assustador.

Os 31 primeiros papas, desde São Pedro até São Marcello I, em 309, perderam a cabeça sob a espada dos tiranos.

A sede de São Pedro estava no meio de um lago de sangue.

Mas mataram apenas o homem, e a sede São Pedro continuou a dominar o mundo.

O homem morre, mas Deus não morre... e enquanto Ele está vivo, não lhe é difícil suscitar-lhe um representante.

Ah! se o Pontificado Romano fosse apenas uma instituição humana, há tempo que teria sido submergido debaixo das ondas do ódio, vício e de sangue, que o inferno levantou contra ele; mas é uma instituição divina... e as da Terra sempre descem na correnteza, não podem subir, e eis porque todos se abatem, impotentes, contra o rochedo de Pedro, não podendo nem sequer salpicar de lama o pedestal de seu trono.

Tudo isso é admirável, sem dúvida; mas há coisa mais admirável ainda.

A verdade da infalibilidade sempre existiu, ora aceita, ora combatida quanto à sua sede e à sua extensão, como o são, aliás, quase todas as questões não definidas dogmaticamente.

Uma coisa é EXISTIR; outra é ser DEFINIDO, e outra ainda é ser PROCLAMADO.

A eletricidade sempre existiu; mesmo antes que a sua ação fosse definida pelos sábios e o seu poder proclamado pelo uso.

Chegou o século dezenove, século racionalista, revolucionário.

Parece que a prudência comandava a reserva: assim pensavam os prudentes deste mundo.

Mas a Igreja não segue os caminhos dos homens. São os homens que deviam seguir os caminhos dela.

Acontece muitas vezes que, em suas horas críticas, a Igreja é como empolgada por uma força misteriosa e escondida, desconcertando os seus inimigos e até a si mesma.

É o dedo de Deus...

É a assistência divina!

Como já dissemos, a infalibilidade é a consequência lógica de sua soberana autoridade sobre as almas, e, como tal, não é uma doutrina nova, mas é uma parte do depósito da revelação.

É uma parte que se vai precisando, até ao dia em que, devido a certas circunstâncias, o Papa ou o Concilio ecumênico proclama tal verdade um dogma de fé.

A infalibilidade é a consequência lógica da palavra de Jesus Cristo: Eis que eu estou convosco até a consumação dos séculos.

Deus é infalível; quem o negará?

E aquele a quem Deus assiste o é igualmente; quem o negará?

Ora, Jesus Cristo prometeu ASSISTIR a Igreja, para que ela não errasse.

Logo, a Igreja ASSISTIDA é INFALÍVEL.

Podem-se torturar textos, como fazem os protestantes, gastar inteligência e tempo, e até grego e siríaco, para subtrair-se à evidência luminosa desta palavra, mas a verdade ficará sempre a mesma.

Ao homem calmo, porém, sensato e amigo da verdade, tendo na mão o Evangelho e a história, o bom senso perguntará: para conservar o depósito divino, compreendê-lo, para e ensiná-lo, tem ou não a Igreja precisão da infabilidade? E o próprio Jesus Cristo quis dar esta infalibilidade?

A resposta será sempre: Sim! E esta resposta será ditada pelo bom senso... antes mesmo de consultar os textos divinos, como veremos em seguida.


IV. A prova evangélica

A infalibilidade sendo considerada pelo protestantes como invenção da Igreja, convém determinar e explicar nitidamente os textos evangélicos que são a expressão deste dogma e lhe servem de fundamento, tanto para refutar o erro adverso, como para solidificar a fé católica.

Quando e como Jesus Cristo concedeu infalibilidade a Pedro só e em sua pessoa ao Papa só?

Já citamos os textos, mas não será inútil reproduzi-los mais uma vez.

Jesus Cristo concedeu a infalibilidade por TRÊS VEZES e por três palavras distintas, cada uma mais explícita e mais positiva que as outras.

A primeira foi pronunciada nas circunstâncias já conhecidas (vede página 153)

S. Pedro acabava de fazer profissão solene de sua fé; acabava de dizer ao Salvador: Tu és o Cristo, Filho de Deus vivo. (Mt16,16) E Jesus, como recompensa desta fé, lhe respondeu: Tu és Pedro (ou pedra) e sobre esta pedra edificarei a minha Igreja, e as portas do inferno não prevalecerão contra ela. (Ibi.18).

Estas palavras são dirigidas a Pedro, só e nominalmente dirigidas a ele só: Tu és Pedro não és Paulo, nem Tiago, nem João, mas Pedro.

Estas palavras colocam, pois, Pedro, como O FUNDAMENTO DA Igreja; e como fundamento INDEFECTÍVEL, visto ter ele de sustentar uma Igreja indefectível.

Claro é, de fato, que o fundamento partilha o destino do edifício, de modo que um edifício indefectível deve ter um fundamento indefectível.

E não objetem os protestantes que o Cristo é a pedra fundamental.

O Cristo é o CONSTRUTOR; ora, construtor e construção são necessariamente distintos.

Jesus Cristo diz: Eu edificarei a minha Igreja: Logo, ele é o Arquiteto... o sábio arquiteto, como diz o apóstolo, que coloca uma base para o edifício que quer edificar. (1Co3,10).

E onde porá este fundamento?

Basta ler a continuação do texto sobre pedra, que é Pedro, pois Pedro se chamava antes Simão, e Cristo mudou-lhe o nome no de pedra (Kephas, que quer dizer pedra e Pedro como em francês: Pierre (Pedro) e pierre (pedra) é uma única palavra.

A primeira palavra de Jesus Cristo é pois clara e indiscutível.

***

A segunda é mais expressiva ainda.

Simão, Simão... eu roguei por ti para que a tua fé não falte, e tu, uma vez convertido, confirma os teus irmãos. (Lc22,32).

Estas palavras divinas, em seu sentido literal e óbvio, significam que a fé em Pedro nunca faltará, pois o que Cristo pede, alcança; ele pediu que a fé existente em Pedro não faltasse jamais.

Estas palavras exprimem também que Pedro é o SUSTENTO da FÉ! QUE ANIMAVA OS OUTROS APÓSTOLOS.

Ora, este SUSTENTO deve ser INFALÍVEL, porque, se não o fosse, não podia preservar os outros da queda.

Eis pois outra palavra clara e irrefutável.

***

A terceira palavra ilumina as outras com uma luz toda divina; é um relâmpago (vede pág. 159).

Jesus Cristo perguntou a Pedro se ele o amava, e ouvindo de seus lábios a afirmação de seu amor, Ele lhe responde: APASCENTA OS MEUS CORDEIROS. (Jo21,15).

Estas palavras são de novo dirigidas a Pedro só, e diante dos outros apóstolos.

Estas palavras estabelecem Pedro PASTOR DOS CORDEIROS, que são os BISPOS.

Segue uma segunda pergunta... e uma segunda investidura, estabelecendo Pedro PASTOR DE OUTROS CORDEIROS, que são os sacerdotes, pois os sacerdotes são cordeiros, em relação aos fiéis, e são ovelhas em relação aos bispos.

Segue uma terceira pergunta... e uma terceira investidura, estabelecendo Pedro PASTOR DAS OVELHAS, que são os FIÉIS.

Tríplice investidura, graduada com infinita sabedoria e ternura: Pedro é o PASTOR GERAL: dos bispos, dos sacerdotes, dos fiéis, numa palavra: da Igreja inteira. (Vede pág.161).

Que se deve concluir destas palavras?

Apenas o que literalmente exprimem: existe em São Pedro, e nos papas, seus sucessores de direito, duas prerrogativas que lhe são pessoais: A PRIMAZIA e a INFALIBILIDADE.

Tais palavras exigem de todos os membros da Igreja de Jesus Cristo uma submissão inteira, total, exterior e interior a um ensino, e necessariamente a verdade; e uma obediência sincera e sem restrição a uma autoridade que vem diretamente de Deus, e que ninguém na terra tem o direito de contestar.

Meditem estas palavras, com sinceridade com fé: tudo aí é luminoso.

Cada palavra é um relâmpago.

Cada palavra contém qualquer coisa de infinito.

Nenhuma reserva há aqui: o Cristo as dá de mãos cheias.

O Papa é o sucessor de Jesus Cristo, porteiro do céu, o sustento de seus irmãos, o pastor das ovelhas e dos cordeiros, isto é, do rebanho inteiro.

Procurem o que o Papa não é!... e verão que ele é tudo.

Ele é imortal como a Igreja.

Ele é indefectível, como a Igreja.

Ele é infalível, como a Igreja.

Ele é a porta da salvação, como a Igreja.

Há pontos de interrogação a fazer, sem dúvida, sobre a extensão e os limites destes privilégios.

Mas, notem-no; — no começo, nas catacumbas não se faz interrogações... pois aos primeiros fieis repugnaria fazê-las.

A fé e o amor vivem de confiança e de abandono.

O que se destaca, neste tempo, e o que é o bastante, é que Pedro, o Papa, é o PRIMEIRO de todos: o mais alto representante de Cristo; que todos lhe devem respeito, obediência; que se deve tratá-lo, como se trataria o próprio Jesus Cristo.

Basta disso!

Cedo demais virão as tristes lutas; as terríveis necessidades de distinguir, de DEFINIR.

Distingue-se quando há discussão... e para que haja DEFINIÇÃO, é necessário que tenha havido negação.


V. A primazia de Pedro

Já vimos a infalibilidade do Papa.

Devemos dizer uma palavra da PRIMAZIA, pois infalibilidade e primazia são inseparavelmente unidos na pessoa do chefe da Igreja, ou melhor: a PRIMAZIA espiritual é o princípio da INFALIBILIDADE doutrinal, é a sua consequência necessária.

O concílio de Florença e depois o do Vaticano esclarecem admiravelmente esta prerrogativa:

“Ensinamos e declaramos que esta primazia da Igreja Romana, por uma disposição divina, é uma PRIMAZIA DE PODER ORDINÁRIO sobre todas as demais Igrejas, e que esta jurisdição do Pontífice romano é um poder verdadeiramente episcopal e imediato, de modo que os pastores e os fiéis, cada um e todos, qualquer que seja o seu rito e a sua dignidade, lhe estão sujeitos pelo dever da subordinação hierárquica, por uma verdadeira obediência, não somente nas coisas que dizem respeito à fé e à moral, mas também nas que se refere à disciplina e ao governo da Igreja universal."

“Deste modo, conservando a união na comunhão e na profissão de uma fé com o Pontífice romano, a Igreja de Cristo constitui um ÚNICO REBANHO, sob a direção de um ÚNICO PASTOR."

“Tal é o ensino da verdade católica, da qual ninguém pode afastar-se, sem perder a fé (Cons. dogm. Ecl., C., III).

Vê-se nestas palavras que a primazia de Pedro não é simplesmente de honra, mas, de AUTORIDADE:

Para vermos esta primazia de autoridade, basta abrir o Evangelho e os Atos dos Apóstolos, em cujas páginas ela refulge com todo brilho e a majestade de uma verdade básica.

Pedro aparece O PRIMEIRO, em toda parte.

Nada se faz sem Pedro... tudo se faz sob as ordens e conforme o exemplo de Pedro...

O PRIMEIRO, ele é sempre nomeado pelos evangelistas:

O primeiro é Simão, que se chama Pedro, diz S. Mateus. (10,2).

O PRIMEIRO, confessou ele a fé:

Tu és o Cristo, Filho de Deus vivo. (Mt.16,16).

O PRIMEIRO, é obrigado a exercer o amor:

Simão, filho de João, tu me amas mais do que estes? — Sim, Senhor tu sabes que eu te amo. (Jo21,15).

O PRIMEIRO, entre os apóstolos, viu o Salvador ressuscitado dos mortos.

Na verdade o Senhor ressuscitou e apareceu a Simão. (Lc24,34).

O PRIMEIRO, ele testemunhou perante o povo a ressurreição do Salvador.

Então Pedro, apresentou-se, com os onze e levantou a voz... (At,2,14).

O PRIMEIRO, aparece e fala quando foi preciso preencher o número dos apóstolos:

Naqueles dias, levantando-se Pedro, no meio dos Irmãos... (At1,15).

O PRIMEIRO, confirma a fé pelos milagres:

Mas Pedro disse: Não tenho prata e nem ouro, mas o que tenho, isso te dou: Em nome de Jesus Cristo Nazareno, levanta-te e (At,3,6).

O PRIMEIRO, recebe os gentios: Então Pedro respondeu: Porventura pode alguém impedir a água, para, que não sejam batizados estes que receberam o espírito Santo como nós? (os gentios). (At10,47).

O PRIMEIRO, ele converte os judeus:

Muitos daqueles que tinham ouvido a palavra (de Pedro) creram: e o número de homens elevou-se a cerca de cinco mil. (At4,4).

O PRIMEIRO, é citado perante os tribunais:

E chamando-os, intimaram-lhes que absolutamente não falassem mais, nem ensinassem em nome de Jesus. (At4,18).

O PRIMEIRO, castiga os prevaricadores da lei cristã.

Pedro, então, disse para ela: (Safira)

Porque vós combinastes para tentar o Espírito do Senhor? ... E imediatamente ela caiu a seus pés, e expirou. (At5,9).

O PRIMEIRO, é encarcerado em testemunho da fé.

E (Herodes) vendo que isso agradava aos judeus, mandou também prender a Pedro. (At12,3)

Sempre, em toda parte, encontramos Pedro O PRIMEIRO, de modo que tudo concorre para estabelecer a sua PRIMAZIA, tudo, até suas próprias fraquezas.

O poder dado a diversas pessoas, inclui uma restrição, na própria partilha.

O poder dado A UM SÓ e sobre todos, SEM EXCEPÇÃO, comporta a plenitude.

Todos recebem o mesmo poder, porém não recebem no mesmo grau, nem com a mesma extensão.

Jesus Cristo começa PELO PRIMEIRO, e, neste primeiro, desenvolve tudo, para ensinar-nos que a autoridade eclesiástica, primeiramente estabelecida NA PESSOA DE UM SÓ, não se ramifica, senão sob a condição de ficar ligada ao tronco, e de conservar a sua completa unidade.

E esta PRIMAZIA não é simplesmente de precedência e de honra, mas, sim, de JURISDIÇÃO e de AUTORIDADE.

É a Pedro, e só a Pedro que Jesus Cristo promete as chaves do reino do céu, com o poder de atar e desatar, isto é, de governar a Igreja universal. (Mt16,19).

Deste modo, o Papa não está mais, como os protestantes imaginam, perdido num longínquo inacessível, sentado num trono, onde recebe honras e manifestações; ele é o PASTOR, ele é o PAI DE CADA ALMA, de cada sacerdote, de cada bispo.

Entre o Papa e cada alma batizada ninguem pode interpôr-se como obstáculo.

É certo que, devido às extensões imensas da Igreja, o Papa não pode, em geral, comunicar-se pessoalmente com cada alma, mas ele o pode, cada vez que o quer.

Sem dúvida, ainda a sua palavra passa geralmente pelo canal do bispo, como a desse, último passa pelo canal do sacerdote, para chegar aos fieis; porém este canal é um MEIO e nunca pode tornar-se um obstáculo.

Por direito divino não há nem pode haver obstáculo; o Papa é o pai de todos e o pastor supremo do rebanho inteiro.

É a conclusão do Concílio do Vaticano, que diz ainda:

“Desta supremacia, que o Pontífice Romano tem de governar a Igreja universal, resulta para ele o direito de comunicar-se livremente, no exercício de seu cargo, com os pastores dos rebanhos da Igreja inteira, para que possam ser instruídos e dirigidos por ele, nos caminhos da salvação”.


VI. Conclusão

Primazia de autoridade e infalibilidade, doutrina, tal é a DUPLA AURÉOLA que cinge a cabeça do Sumo Pontífice.

Ele é O PRIMEIRO no poder, e é o ÚNICO na infalibilidade.

Como conclusão, determinemos estes último ponto.

A Igreja é infalível: é certo.

Esta infalibilidade concedida à Igreja reside na pessoa do Papa: é certo também.

A análise do texto evangélico revela-nos admiravelmente estes dois dogmas.

Tu és Pedro e sobre esta pedra (que é Pedro) edificarei a minha Igreja.

As portas do inferno (os vícios) nunca prevalecerão contra ela (contra a Igreja).

Tudo isso se refere à Igreja.

Mas, coisa curiosa! Jesus Cristo prometendo a sua ASSISTÊNCIA, não diz: Eis que eu estou COM ela (com a Igreja) todos os dias até a consumação dos séculos, como à primeira vista parece que devia dizer, mas diz: Eis que ESTOU CONVOSCO, todos os dias. (Mt28,18).

Ele promete estar com o chefe da Igreja, como recomenda escutar a voz deste mesmo chefe: Quem vos escuta a mim escuta. (Lc10,16).

Jesus Cristo fala de SUA Igreja, e de repente, por uma transição repentina, fala do chefe desta Igreja.

Porque isso?

Pela razão que a PRIMAZIA pertence a uma pessoa determinada, e que a infalibilidade desta Igreja se concentra sobre a cabeça daquele que está revestido desta primazia. Se tivesse falado só da Igreja, ter-se-ia podido concluir, como muitos sectários concluíram, de fato, que a primazia e a infalibilidade residiam no corpo docente da Igreja, isto é, NOS BISPOS, nos concílios, mesmos separados do Papa, o que seria um erro monstruoso.

O único PRIMEIRO, como o único INFALÍVEL é o Soberano Pontífice, é o Papa.

O CORPO dos bispos, unidos ao Papa, é infalível, não como corpo, mas como UNIDOS ao Papa. É o que já provamos supra (pág.163).

Os apóstolos receberam, TODOS eles, o dom da infalibilidade, necessário a cada um para pregar o Evangelho no mundo inteiro, e sobre esta base única, fundar Igrejas particulares.

Uma vez fundada a Igreja, não era mais necessária a infalibilidade, senão no CENTRO ÚNICO, para que se pudesse manter a unidade católica em todas as Igrejas do mundo.

É o que aconteceu.

Após a morte dos apóstolos a infalibilidade permaneceu na sede do príncipe dos Apóstolos, na sede de Roma, e é por esta razão e neste sentido, que a sede de Roma é a única “SEDE APOSTÓLICA”.

O seu bispo resume em si toda a autoridade do apostolado, a jurisdição suprema e universal, a infalibilidade no ensino da doutrina.

APOSTÓLICO é, pois, sinônimo de INFALIBILIDADE; e o Papa é infalível, só ele é infalível entre todos os bispos, porque só ele é o bispo apostólico, o bispo da Sede Apostólica.

Os bispos são os sucessores dos apóstolos, neste sentido, que a sua autoridade não é menos essencial, na Igreja, que a do Papa... pois ela foi estabelecida por Jesus Cristo... O Papa não governa a Igreja sem o concurso deles; unidos ao Papa, eles participam da sua infalibilidade, e deste modo encontra-se NO CORPO EPISCOPAL o privilégio da infalibilidade, que resplandecia no COLÉGIO APOSTÓLICO.

Os bispos são infalíveis como os apóstolos, porém, não o são SOB O MESMO TÍTULO.

Os apóstolos tinham recebido esta infalibilidade de Jesus Cristo, direta e imediatamente, enquanto os bispos não a recebem senão pelo Papa, e em virtude de sua união com o Papa.

Cada bispo não é infalível, como o era cada um dos apóstolos.

Cada um deles recebe a sua jurisdição do Papa, e só do Papa, enquanto cada um dos apóstolos recebeu-a imediatamente do Salvador.

Cada bispo tem uma jurisdição essencialmente limitada a este ou aquele território, enquanto cada um dos apóstolos tinha jurisdição sobre o mundo inteiro.

Cada bispo, tomado separadamente, pode perder o privilégio da infalibilidade, que fica fixado de modo INDEFECTÍVEL sobre a cabeça do Bispo de Roma, sucessor de S. Pedro, único representante de Cristo, único depositário da plenitude da graça apostólica.

Tal é a infalibilidade do Soberano Pontífice.

É um privilégio divino, necessário, indiscutível, negado apenas por aqueles que procuram caluniar a Igreja católica, ou então pelos que falam contra por ignorância, sem conhecer a Igreja; e destes só podemos repetir: “Tende compaixão, Senhor! porque não sabem o que dizem!”


CAPITULO X

O Doutor Supremo

Conhecendo bem a existência da infalibilidade, ser-nos-há fácil determinar rigorosamente a sua manifestação.

Muitos erros existem a esse respeito, e até entre os católicos, porque compreendem mal ou vagamente em que consiste o exercício de tal infalibilidade.

Há os dois extremos.

Há o extremo dos que não compreendem EM QUE CONSISTE a infalibilidade; e o extremo dos que a ESTENDEM A TUDO, sem distinção.

Conta-se que um dia, certo homem, após ter assistido a uma audiência do Santo Padre, ouviu de seus lábios, esta despedida: “Adeus, meu filho, até amanhã!”.

O homem concluiu que nem ele e nem o Papa podiam morrer nessa noite, mas haviam de ver-se no dia seguinte.

Isso é fanatismo ou ignorância.

Vejamos bem, pois, quando é que o Papa é infalível, ou melhor, O QUE É INFALÍVEL no Papa.


I. A manifestação da infalibilidade

A infalibilidade do Papa e da Igreja católica manifesta-se por palavras expressas, indicando em termos claros e precisos, que o Papa, ao dar uma decisão, nola dá, como Soberano Pontífice, gozando e usando neste momento da prerrogativa da infalibilidade, que lhe outorgou Jesus Cristo.

Para que uma decisão do Papa seja infalível, e obrigue a todo católico, sob pena de heresia, são exigidas as três condições seguintes:


1. — Que o OBJETO desta decisão seja a fé, a moral ou a disciplina geral da Igreja.

2. — Que esta decisão seja dada pelo Papa, não como Doutor privado, mas, sim, como Pastor e DOUTOR SUPREMO de todos os cristãos, sendo isto particularmente especificado.

3. — Que esta decisão seja dada pelo Papa, COMO OBRIGATÓRIA, para a Igreja universal.

Cumpridos estes três requisitos, diz-se que o Papa falou ex Cathedra, isto é, como estando sentado no trono de Pedro, definindo que a doutrina sobre a fé e sobre a moral deve acreditada pela Igreja universal. Eis a infalibilidade.

Ela não pertence propriamente À PESSOA do Papa, como tal, mas, sim, à sua FUNÇÃO, ou antes, ela é inerente a uma de suas funções, à de DOUTOR SUPREMO dos cristãos.

Para ser infalível, não é bastante ser Papa, nem exercer tal ou tal função do Papado: É mister exercer a função específica de falar ex Cathedra — super cathedram Petri, e falar à Igreja universal.

Há muitos papas que nunca usaram deste privilégio, embora exercessem os outros mistérios de chefe da Igreja, Não tiveram ocasião de exercê-lo.

Tais papas possuíam a infalibilidade como prerrogativa, sem exercê-la, do mesmo modo que São Francisco de Assis possuía o poder de consagrar o Corpo e o Sangue do Salvador, embora a sua humildade o conservasse afastado do Altar, sem que jamais tenha celebrado a Santa Missa.

Quantos médicos, advogados, engenheiros, são formados na respectiva arte, sem exercer as funções desta arte! Possuem a prerrogativa, sem entretanto exercê-la.

Tudo o que faz um médico, não pertence à medicina; nem tudo o que um advogado faz, pertence à magistratura. Assim, tudo o que o Papa faz e diz não pertence à infalibilidade;

são somente infalíveis aqueles ATOS DETERMINADOS, com os requisitos já mencionados.

Este ponto é importante e é necessário, blindá-lo, pois é aí que está a fonte dos erros que correm a esse respeito e das confusões que reinam em certos espíritos a respeito deste tema.

“O Papa não é infalível, nem como homem, nem como sábio, nem como sacerdote, nem como bispo, nem como príncipe temporal, nem como juiz, nem como legislador, diz muito bem uma Instrução pastoral, altamente aprovada por Pio IX.”

“O Papa não é infalível, nem impecável em sua vida, em seu comportamento, em suas vistas políticas, em suas relações com os príncipes, e nem sequer no governo da Igreja; ele o é única e exclusivamente, quando, em sua qualidade de DOUTOR SUPREMO da Igreja define assuntos de fé, de moral, decisões que devem ser aceitas e consideradas obrigatórias para todos os fiéis.

O cardeal Manning exprime-se do mesmo modo: Pelas palavras: ex Cathedra, acha excluídas da infalibilidade, diz ele, todos os atos do Pontífice como pessoa privada, ou como doutor particular, ou como bispo local, ou como sobrerano de um estado.

Em todos estes atos o Papa está sujeito está sujeito ao erro. Ele está isento de erro numa única circunstância, quando, como Doutor Supremo, ensina à Igreja universal, acerca da fé e da moral. (Hist, Conc. Vat.)

Podemos ir além, e restringir ainda mais a infalibilidade.

Eis um Papa assentado na Sé de S. Pedro, e que aí fala livremente, ex Cathedra, à Igreja universal a respeito de um ponto de fé ou de moral. Tudo o que ele diz não é, por isso, infalível.

Até nos decretos ou bulas dogmáticas, diz um teólogo secretário geral do Concílio do Vaticano (Dom. Fessler) não se deve considerar ludo indistintamente como decisão dogmática, e por conseguinte, como objeto da infalibilidade.

Em particular, não se deve considerar como infalível, o que é apenas mencionado de passagem, ou o que serve de introdução ou de consideração.

Todos os teólogos estão de acordo a esse respeito (Melchior Cano: De locis theol).

A única coisa infalível no Papa é o DOUTOR SUPREMO da Igreja universal, acerca de fé e de moral.

Tudo o que contém uma bula dogmática não é pois infalível.

As considerações, os diversos argumentos os diversos documentos que preparam o espírito estão excluídos ficando o ATO DE FÉ reservado às palavras próprias da definição: palavras claras, precisas, muito solenes, pelas quais o Papa afirma que tal ou tal verdade, é revelada por Deus, e que, deve ser aceita, sob pena de anátema, ou exclusão da Igreja.

Os termos das definições dogmáticas, são os seguintes: Eis porque, apoiando-nos fielmente sobre a tradição que remonta até ao começo da fé cristã, para a glória de Deus nosso Salvador e a salvação dos povos cristãos, nós ensinamos e definimos que é um dogma devidamente revelado: a saber:... Docemus et divinitus revelatum dogma esse definimus:

Aplicando estes termos à própria definição da infalibilidade, temos a seguinte declaração de fé:

Que o Pontífice romano, quando fala ex Cathedra, isto é, quando preenchendo o cargo de Pastor e Doutor de todos os cristãos, em virtude de sua autoridade apostólica, define que, uma doutrina sobre a fé ou a moral deve ser acreditada pela Igreja universal, goza plenamente, pela assistência divina, que lhe fora prometida na pessoa do bem-aventurado Pedro, desta infalibilidade de que o divino Redentor quis dotar a sua Igreja, definindo a respeito da fé ou moral; e que, por conseguinte, tais definições do Pontífice Romano são irrevogáveis por si mesmas, e não em virtude do consentimento da Igreja.

Se alguém, que Deus não o permita, tivesse a temeridade de contradizer a nossa definição, seja ele anátema”.

Eis um ato emanando do Doutor Supremo, sobre um ponto determinado da doutrina católica: tal ato é, pois, uma sentença da infalibilidade.


1. 4 extensão da infalibilidade

O Papa sendo infalível, a Igreja inteira o é igualmente, não por si, mas pela sua inseparável união com o Papa.

A Igreja compõe-se da parte DOCENTE e da parte DISCENTE: a primeira ensina e a segunda é ensinada.

Ora, a parte docente é infalível ATIVAMENTE, isto é, ensinando sem poder enganar-se, A Igreja discente ou ensinada é infalível PASSIVAMENTE, isto é: escutando a voz do Papa e dos bispos, nunca pode ser induzido em erro.

Deste modo, a Igreja inteira é infalível: uma parte pelo ensino, outra parte pela obediência,

Eis porque Jesus Cristo disse: Foi me dado todo poder no céu e na terra; ide, pois, e ensinai todas as nações, batizando-as em nome do Pai, do Filho e do espírito Santo ,ensinando-as a observar todas as coisas que vos dei; e eis que eu estou convosco todos os dias até a consumação dos séculos. (Mt26,18-20).

Examinai bem este texto e vereis que tem uma extensão que, à primeira vista, não aparece.

Eis que eu estou convosco; estas palavras resumem e encerram tudo: não há exclusão de poder, nem de auxílio nenhum.

Jesus Cristo é a parte infinita de tudo.

Como diz o apóstolo, há n’Ele escondido os tesouros da Sabedoria e da ciência. (Cl2,3).

Dizer que ele está com a Igreja é dizer que todos estes tesouros estão também com ela; pois não se pode separar os tesouros divinos d'Aquele que é a sua fonte e o seu princípio.

Eis que eu estou convosco. Note esta nova disposição. Jesus Cristo fala de seu PODER, de seus apóstolos e de todas as NAÇÕES e, reunindo estes três elementos, Ele diz que estaria COM ELES até ao fim dos tempos.

É a infalibilidade completa da Igreja docente e discente como acabamos de explicar.

Estarei convosco, isto é, com todos eles.

Com aqueles que desejam ser ensinados ou batizados, pois eles estando convosco, e eu estando também convosco, estarei igualmente om eles.

Até a consumação dos séculos. Não é somente convosco, com quem estou falando; a minha promessa se estende além, atinge todos os vossos sucessores, pois deixareis herdeiros e a vossa raça nunca terá fim; e eu, que não morro, eu a verdade infalível, ficarei sempre com esta raça.

Eis o princípio da infalibilidade da Igreja.

Tal princípio é a base da paz e da tranquilidade que deve reinar no espírito de todo católico.

Não é preciso ser cientista para logicamente o católico concluir a verdade absoluta da religião que professa.

Pode e deve dizer:

A minha religião aprendi-a eu dos lábios de MEU VIGÁRIO que depositou em minhas mãos e me explicou um pequeno livro: o catecismo.

O que o vigário me ensina remonta ao BISPO, que o mandou com este livrinho.

Por meio do bispo, este ensino remonta ao PAPA, que enviou o bispo.

Pelo Papa, este mesmo ensino remonta, de Papa em Papa, até S. Pedro, que o recebera de Jesus Cristo.

A minha religião é a mesma que S. Pedro recebeu de Jesus Cristo e ensinava.

Ora, se o vigário que me ensina mudasse qualquer coisa na doutrina católica, os outros sacerdotes, e até os próprios fiéis, o denunciariam ao bispo.

E se o bispo mudasse qualquer coisa, os outros bispos e até os padres e os simples fiéis o denunciariam ao Papa, guarda vigilante da fé, e este o separaria da Igreja.

Uma mudança na fé é pois impossível hoje como o foi em todos os tempos, pelas mesmas razões.

A minha religião é pois a religião que Jesus Cristo ensinou.

O católico mais instruído pode raciocinar do seguinte modo:

Negar um único artigo da minha fé seria negar a infalibilidade da Igreja.

Negar a infalibilidade da Igreja seria negar a eficácia da palavra de Jesus Cristo.

Negar a eficácia infalível da palavra de Jesus Cristo seria negar a sua divindade, que provou pelos milagres.

Negar a divindade de Jesus Cristo seria negar o próprio Deus.

Negar a Deus seria negar a razão humana que reconhece invencivelmente a sua existência.

Ora, não se pode, sem loucura, negar a razão humana.

Tenho pois absoluta certeza de que tudo o que a Igreja me ensina, é o próprio Deus quem mo ensina, de tal modo que se, — o que é impossível — a Igreja me fizesse errar, teria eu o direito de dizer a Deus, como o disse um doutor:

"Sois vós, Senhor, que me enganastes!”.

Temos a conclusão prática:

Devemos ESCUTAR a Igreja, como escutamos o próprio Jesus Cristo, si Ele nos falasse.

Devemos CONSULTAR a Igreja, quando qualquer dificuldade ameaça romper a ordem

e a harmonia da família cristã.

Devemos obedecer à Igreja, firmes na persuasão de que ela tem missão para levar-nos ao céu.

Devemos amar à Igreja e no seu chefe, o Soberano Pontífice, personificação da Igreja, e até, se necessário fosse, dar a nossa vida para defendê-lo.


III. Umas objeções

Após a exposição da verdade, respondamos a umas objeções que o protestantismo levanta contra a infalibilidade.

A primeira e a mais absurda é que a infalibilidade é uma invenção romana, que não figura na Bíblia.

Basta examinarmos os textos já citados, para convencer-nos de que tal INFALIBILIDADE figura em mais de 15 lugares do Evangelho.

Ali não se encontra a palavra: INFALÍVEL, pela razão muito simples que o Salvador não falava português, mas sim aramaico, hebraico, e que nestas línguas a palavra infalível tem necessariamente outro termo, equivalente na significação, embora diferente na expressão.

Seria abuso repetir uns tantos textos já citados diversas vezes.

Reflitam um instante os objetantes protestantes.

— Que quer dizer: Não poder faltar? (Lc22,32).

Não é: ser infalível?

— Que significa: Ser o fundamento da Igreja infalível? (Mt18,18)

Não é: ser infalível?

— Que exprime a palavra: que o erro nunca prevalecerá contra Pedro? (Mt16,18)

Não é: ser infalível?

— Que é que se entende por: confirmar outros na fé? (Lc22,32).

Não é: ser infalível?

— Que quer dizer Jesus dizendo a Pedro: Apascenta os meus cordeiros e minhas ovel (Jo21,16).

Não é: ser infalível?

E assim adiante...

Há no Evangelho inúmeros textos exprimindo textualmente e sob diversos aspectos: a infalibilidade do Papa.

Basta querer ver... e compreender.

Os pobres amigos protestantes podem torcer, romper, desviar e massacrar os textos do evangelho, mas a verdade ficará sempre a mesma; e esta verdade num breve e lúcido silogismo nos diz:

O Cristo é infalível, e infalível é aquele a quem Ele transmitir este privilégio.

Ora, Jesus Cristo transmitiu este privilégio a Pedro e a seus sucessores.

Logo: Pedro e os papas são infalíveis.

Quem negará a primeira parte?

E a segunda parte?

Negando-a, é preciso rejeitar este texto luminoso como o sol ao meio dia: Assim como meu Pai me enviou, também eu vos envio a vós.

- Recebei o espírito Santo. (Jo20,21-22).

- Quem vos escuta, a mim escuta. (Lc10,16).

O Papa é infalível, porque é o sucessor de Pedro infalível... Está no Evangelho, em próprios termos, para quem sabe ler, e para quem acredita na palavra de Deus, em vez de acreditar na interpretação de qualquer ignorante feito pastor.

Passemos à segunda objeção, de valor igual ao da primeira.

O Papa é homem, bradam os protestantes; como pode ele ser infalível?

Que pedrada formidável!

É como se alguém dissesse: O Presidente da Republica é homem, como pode ele ser presidente?

É presidente, porque foi eleito pela nação e, como tal, tem nas mãos as rédeas do governo.

O Papa é homem?

Perfeitamente! Que queria que ele fosse? Anjo, diabo, ou animal... são as espécies fora do homem.

ANJO?

Mas a terra não é para eles.

A pátria dos anjos é o Céu.


DIABO?

Deus nos livre!... A terra também não é deles, apesar dos muitos representantes e emissários dele que correm neste mundo afora. A pátria deles é o inferno.


HOMEM?

Sim... deve ser homem, porque deve guiar e instruir os homens... deve viver no meio dos homens, deve morar na terra dos homens.

O Papa deve ser homem... e homem como os outros homens, pois, só há uma espécie de homens.

E este homem é infalível.

Sim: como o homem eleito para o cargo presidencial é presidente.

Não é o homem que é infalível, — Todo homem é mentiroso, diz a Bíblia: Omnis homo mendax. (Rm3,4). O que é infalível é O OFÍCIO PRÓPRIO de um homem escolhido

por Deus, como ficou explicado no parágrafo primeiro do presente artigo:

E o Papa, falando ex-cathedra, sobre dogma ou moral, para a Igreja universal.

E porque Deus não poderia fazer um homem infalível?

Será isso mais difícil que fazer circular a voz humana em redor do mundo, e fazer captá-la, milhares de vezes, pelo rádio?

Será mais difícil outorgar a infalibilidade DOUTRINAL a um homem, do que confiar

uma espécie de infalibilidade CIENTÍFICA nos estudiosos, aos inventores

Mil vezes, não!

Aquele que dá uma quase infalibilidade ao gênio, ao artista, para as coisas da terra, porque não daria uma completa infalibilidade ao seu representante, para as coisas do céu?

Devia fazê-lo... e Ele o fez.

Para falar, em todo o rigor, o que é infalível no Papa não é o homem. É JESUS CRISTO, é Deus, que o ilumina com a sua verdade, para que não possa ensinar o erro ao povo cristão.

Do mesmo modo, o homem eleito, para ser presidente da Republica, não governa o país como homem, mas como presidente.

O médico é homem, como os demais homens, mas não é como homem que ele trata cura os enfermos, é como médico.

Pouco importa que ele seja homem, — deve sê-lo; é o médico que cura.

Pouco importa que o Papa seja homem, — ele deve sê-lo. Não é como homem que ele ensina, guia e governa, é como representante de Jesus Cristo infalível: e é NESTA FUNÇÃO que ele goza do privilégio da infalibilidade.


IV. Mas, houve maus papas!

Queira provar que os houve!

Não basta repetir as calúnias inventadas pelos protestantes; temos o direito de exigir provas.

E estas provas não existem... existem apenas suspeitas e calúnias.

No capitulo V, (pag. 118) já respondemos a tais objeções e mostramos o que valem perante a sinceridade e a crítica desapaixonada.

Mas suponhamos um instante, por condescendência e compaixão, que tenha havido maus papas, que provaria isso?

Será um argumento contra o Papado ou contra a Igreja?

Absolutamente não! Seria um argumento EM FAVOR; e um argumento de primeiro valor.

Examinando a história da Igreja, notamos que ela vai sempre de progresso em progresso.

Sempre combatida, caluniada, perseguida, às vezes banhada no sangue de seus filhos, mas nunca vencida, nunca abalada, sempre triunfante, quer reine nos palácios dos imperadores, quer nade no sangue de seus mártires.

Donde vem este eterno triunfo?

Será destes maus papas, bispos, ou padres?

Não pode ser... tais elementos deviam dar-lhe a morte; pois sendo combatida fora pelos seus inimigos, e dentro pelos seus próprios filhos, como pode ela firmar-se e progredir?

“Todo reino dividido contra si será destruido, diz o Salvador. (Mt,12,25)

Como é que a Igreja não é destruída?

É o argumento de um velho professor de história Eclesiástica. Ao começar o seu curso ele repetia sempre: Meus filhos, a Igreja é divina...

Se não o fosse, há muito tempo que os maus bispos, padres e maus católicos a teriam sepultado.

ela resistiu e resisto sempre:

Logo, ela é divina.

Admitindo, pois, que haja deveras maus papas, maus bispos, maus padres, deve-se concluir que a Igreja dividida deste modo não poderia resistir ao choque e deveria perecer, se não fosse divina.

A sua vitória constante, sem o apoio de seus filhos e contra as forças coligadas da maçonaria, do protestantismo, do espiritismo, liberalismo, do materialismo e do epicurismo, seria À PROVA MAIS CABAL e mais autêntica da sua divindade.

A Igreja é uma sociedade divina, composta de homens, e governada por homens, elevados a uma dignidade divina, como são o Sacerdócio, o Episcopado e o Papado: Estes homens são todos chamados à santidade... deviam ser santos; porém Deus não pode tirar-lhes o livre arbítrio, de modo que, apesar dos altos cargos que ocupam, os próprios papas podem faltar aos divinos preceitos, ou por outra: NÃO SÃO, IMPECÁVEIS.

A Igreja deixará de ser divina por isso?

Absolutamente não!

São Pedro caiu, negando por três vezes o Mestre. Judas, chamado pelo próprio Jesus, caiu no maior dos crimes, no crime de traição, manchando a si mesmo, mas não manchando a Igreja, que continuou, serena e impassível, a seguir os seus destinos, guiada por Jesus Cristo.

Se um magistrado deixa de cumprir a sua obrigação, tornando-se parcial e injusto, deixará ele, por isso, de ser magistrado... ou deixará a justiça de existir?

Se um médico abusa da medicina, dever-se-à desacreditar de toda a classe médica, e dizer que a medicina deixou de existir?

Deus quis que os seus representantes fossem simples homens e não anjos do céu, para mostrar mais claramente que a Igreja é d'Ele... só d'Ele e que só depende d'Ele e não dos homens.

As obras divinas dependem de Deus; as obras humanas dependem dos homens.

A Igreja é obra divina... e os homens nada podem contra ela.

***

Uma outra objeção apresenta-se: É outra pedrada protestante.

A Infalibilidade do Magistério papal foi proclamada em 1870, no Concílio do Vaticano.

Logo, é uma novidade... uma inovação...

Não existia antes.

A ignorância é inventora fecunda de tais objeções.

Então, uma coisa só começa a existir depois de ter sido proclamada?

PROCLAMAR não é inventar, mas dizer oficialmente que tal coisa existe: logo existia antes de ser proclamada.

Dionisio Papini, em 1710, proclamou a lei da pressão do vapor... Então não existia tal pressão antes daquela data?

Ramsden, em 1709, proclamou a existência da eletricidade... Então não existia antes?

O Padre Procópio, em 1759, proclamou a atração do para-raios. Então, antes não nem relâmpago nem trovão?

O venerável Padre Beda proclamou a Lei dos mares e o Padre Guido D'Arezzo as notas musicais... Então antes não havia nem um ré, nem música?

O Padre Noltet proclamou a eletricidade das nuvens e o Padre Copérnico o movimento dos planetas em volta do sol... Então não havia eletricidade nas nuvens, nem movimento planetário?...

Inventar é uma coisa... proclamar é outra.

A Igreja nada inventa: 0 tesouro das invenções está encerrado na Sagrada Escritura e na tradição... O que ela faz é PROCLAMAR que tal verdade existe verdadeiramente, embora tenha talvez passado um tanto despercebida.

É deste modo que o Papa Pio IX proclamou A INFALIBILIDADE do Papa, em 1870, para reagir contra a revolta de Lutero, que procurara rebaixar a autoridade do chefe da Igreja.

Contra a negação do heresiarca opôs o papa a PROCLAMAÇÃO da verdade evangélica.

Nada mais simples, nada mais lógico.

A infalibilidade existia desde S. Pedro sempre foi acreditada, e sendo aceita por todos, era pois inútil proclamá-la antes.

Tal proclamação tornou-se necessária quando a impiedade pretendia negar a verdade.

Eis porque a proclamação demorou até 1870.


V. Conclusão

O Papa é o Doutor Supremo da Igreja.

Como tal, é o legítimo sucessor de S. Pedro, é o representante do próprio Cristo.

Como tal, é INFALÍVEL em suas decisões acerca do dogma e da moral, quando, se dirige ex-cathedra à Igreja universal.

É certo:.. é irrefutável.... é evangélico:

É preciso admitir este dogma ou rejeitar a palavra de Deus.

Pedro, eu roguei por ti, para que a tua fé não falte. (Lc21,32).

Quem vos escuta, escuta a mim. (Lc10,16).

Eis que estou convosco até ao fim dos séculos. (Mt27,20).

De duas uma! Ou Jesus Cristo sabe falar e compreende a significação dos termos, ou então fala sem compreender, Ele mesmo, o que diz.

Jesus Cristo é Deus... a sua palavra não passa... e esta palavra é vida:

Quem ouve a minha palavra e crê naquele que me enviou, tem a vida eterna. (Jo5,24).

Para que torcer, desviar ou desvirtuar o que é positivo e luminoso?

A Igreja é infalível na pessoa de seu chefe.

É um raciocínio sem saída, a não ser para a hipocrisia e a mentira.

Sim, dirá talvez alguém, mas se o Papa tivesse de um lado, e a Igreja de outro, que aconteceria?

Suposição absurda.

Se numa carroça uma roda fosse para um lado, e a outra para o outro lado, que aconteceria?

Mas é impossível: AS DUAS RODAS TEM O MESMO EIXO.

E se no homem a cabeça quisesse ir para um lado, e os pés para o outro, que aconteceria? É impossível: todos têm a mesma alma.

Digamos a mesma coisa do Papa e da Igreja. Eles têm a mesma alma motora; são dirigidos pelo mesmo espírito Santo.

E não somente tal suposição é absurda, e denota em seu prolator uma ignorância profunda; mas o contrário é oposto à fé.

É de fé que a cabeça da Igreja, como tal, nunca pode ser separada, nem da Igreja DOCENTE, nem da Igreja DISCENTE, isto é, nem, do episcopado, nem dos fiéis.

Supor que tal separação seja possível seria negar a intervenção do Espírito Santo na Igreja, em virtude da qual o corpo místico acha-se estreitamente ligado em todas as suas partes: a cabeça com o corpo, o corpo com a cabeça e os membros entre si.

Seria desligar Jesus Cristo de seu corpo místico; seria destruir a simetria perfeita e organização que o apóstolo chama o corpo de Cristo: Ita multi, nunm corpus sumus in Christo. (Rm11,5).

Vós sois o corpo de Cristo e membros de seus membros. (1Co12,27).

O próprio Cristo é a cabeça do corpo da Igreja. (Cl1,18).

Tudo isso, tão belo e tão expressivo, seria uma mera utopia: o corpo místico de Cristo deixaria de existir, não passaria de UM CADÁVER, pois a separação entre a cabeça e os membros produz necessariamente a morte.

Negando-se a divindade da Igreja, considerando-a uma instituição humana, neste caso é possível supor que o Papa possa estar de um lado e a Igreja do outro. Poderia pensar tudo, pois sem o espírito Santo, a Igreja seria humana, perecível como qualquer outra sociedade humana.

Mas, se sois cristãos, se acreditais na palavra de Jesus Cristo e da Bíblia, deveis acreditar que a Igreja é OBRA DIVINA, obra de Jesus Cristo, animada pela ação do espírito Santo, que lhe dirige todas as pulsações, e neste caso a dúvida é impossível.

A Igreja e o Papa formam uma única e mesma coisa, Ubi Petrus, ibi Ecclesia, dizia Sto. Ambrósio: onde está Pedro, aí está a Igreja.

Como se vê, todas as objeções nascem um ponto de vista falso, de uma assimilação impossível entre a constituição divina da Igreja, tal qual foi feita por Jesus Cristo, e as monarquias terrestres.

O que ilumina estas últimas é O GÊNIO do homem.

O que ilumina a Igreja é O ESPÍRITO SANTO.

É a infalibilidade divina que lhe é própria, que lhe pertence por direito e de fato.

Os homens podem apenas comunicar suas instituições e prerrogativas humanas.

Deus outorga as suas obras e prerrogativas divinas.

E a prerrogativa fundamental de sua obra divina, que é a Igreja, é a verdade imutável e infalível.

Sendo a Igreja a depositária e a guarda da verdade divina, ela deve necessariamente ser INFALÍVEL.

é o que temos procurado fazer compreender claramente nestes dois capítulos.


CAPÍTULO XI

Pedro no Evangelho

Oh! Igreja de Cristo, com tu és bela, radiante de luz e de amor!

Sinto-me impelido a prostrar-me de joelhos, com a fronte em terra, para te venerar, aclamar e exaltar!

Queria prostrar-me diante de teu representante na terra, o Salvador adorado, beijar com ternura e regar com minhas lágrimas os pés daquele que o mundo proclama: O SANTO PADRE.

Sentado neste trono imortal, que é o trono de Pedro, tendo a mão levantada para abençoar como o Cristo, o olhar sereno como o azul do firmamento, o pé estendido sobre o rochedo granítico dos séculos, vejo, neste ancião vestido de branco, a cabeça coroada da tiara simbólica e o coração coroado de espinhos, com o sorriso nos lábios e as lágrimas nos olhos, vejo em ti o REI dos séculos, o PAI da Cristandade, o FAROL da verdade, o HERÓI das lutas titânicas, o VENCEDOR do mundo.

Tu és Pedro!... És pedra... Tu és rochedo... És um granito eterno!....

Oh! Santo Padre, para ti se dirige toda minha veneração! a ti o meu amor... a ti a minha vida.

Pedro... tu és A VERDADE divina neste mundo.

Beijo os teus pés; são os pés do Papa, pés de Cristo... os pés dos milhares de santos e de mártires da Igreja católica.

Salve, ó Pedro!... Salve, ó Santo Padre!

Retomemos um instante as palavras Salvador, dirigidas a Pedro, fazendo dele a pedra fundamental, o centro de sua Igreja.

Temo-las estudado em particular, palavra por palavra, frase por frase; é preciso agora reuni-las num feixe luminoso, ou numa SÍNTESE concreta, para descobrirmos em seu conjunto novas verdades e novas belezas, que fazem da dinastia de Pedro o grande e inefável mistério deste mundo.


I. O olhar de Jesus Cristo

A vida de Jesus Cristo é toda de ensinamentos.

Não são simplesmente as suas palavras, mas até os seus gestos, o seu olhar, a ligação dos fatos, a sucessão dos acontecimentos, tudo isso é ensino...

Tudo é divino em Jesus Cristo, porque tudo emana de sua Pessoa, que é divina.

Há n’Ele uma ciência EXPERIMENTAL, outra INSTRUTIVA, outra BEATÍFICA... mas pertencem todas à mesma pessoa.

Há nEle uma vontade humana, e outra divina, mas ambas são da PESSOA DIVINA.

Por isso, há uma unidade perfeita entre as diversas cenas do Evangelho.

À primeira vista, quer nos parecer existir ali até uma certa incoerência... quase um descuido...

É porque nós só vemos o lado exterior e material das coisas.

Deus enxerga mais alto e mais longe.

O espírito Santo já o disse: O homem vê o que aparece; Deus perscruta o coração. (1Re,16,7).

Percorramos um instante o conjunto das diversas palavras e gestos do grandioso acontecimento da ESCOLHA e da INVESTIDURA de Pedro, como chefe da Igreja, e veremos centelhas de luz, que talvez não tenhamos percebido até hoje.

Era logo depois do batismo do Salvador.

O espírito Santo repousara sobre a sua cabeça e uma voz ecoara das alturas do Céu: Este é o meu Filho amado, no qual pus as minhas complacências. (Mt3,17).

Era a divindade que aclamava Jesus Cristo.

A humanidade, representada por João Batista, o indicara com o dedo: Eis o Cordeiro de Deus, eis aquele que tira os pecados mundo. (Jo1,29).

Todos os véus se rasgam ao mesmo tempo: os do Céu e os da terra, para anunciar a obra que Jesus vai começar.

Ele não tinha ainda discípulos.

Apenas dois lhe faziam companhia: João e André.

Mas nem a ternura virginal de João, nem o caloroso entusiasmo de André, atraíram seu olhar divino.

De repente, um terceiro se apresenta; este não viera espontaneamente: tinham ido procurá-lo.

Jesus pára; fita-o... fixa-o demoradamente, segundo o texto sagrado: Jesus examinando-o disse: Tu és Simão, filho de João: tu serás chamado Kephas, que quer dizer Pedro. (Jo1,42).

Notai bem a sublime gradação da cena.

Jesus FIXA-O, diz o Evangelho: Intuitus eum.

Há sobretudo três palavras, em latim, para graduar o olhar: videre — aspicere — intuere.

Isto é: ver... como se vê qualquer objeto.

Considerar... é ver com atenção... distinguir entre outros.

Examinar... é penetrar através do exterior até o interior.

Daí a palavra intuição, espécie de olhar transcendental, que pertence ao gênio. É a palavra do Evangelista: Intuitus eum.

Tal o artista contemplando o bloco de mármore donde vai surgir uma obra-prima, Jesus examina Simão.

Ele não vê simplesmente o pescador...

Ele enxerga além... enxerga Pedro: O PAPA.

Não lhe basta ver somente.

ele vê Simão...

Enxerga Pedro.

Examina o Papado... a sucessão vinte vezes secular dos sucessores de Pedro!

Oh! Jesus, o mundo pode agitar-se agora...

O demônio pode rugir...

A DINASTIA SAGRADA está prevista, ordenada... Cada Papa está escolhido... a lista se seguirá do primeiro até o último Pedro: Tu és Petrus...

É uma linha reta que nada desviará... é uma CORDILHEIRA DE ROCHEDOS, contra a qual abater-se-ão, impotentes, todas as tempestades.

É o que indica a continuação das palavras de Jesus Cristo: Tu és Simão, tu serás Kephas.

E para mostrar que tudo isso é OBRA DIVINA, e não uma simples apresentação, Jesus não pergunta quem é o novo candidato, ou quem é filho. Não!

Ele o examina, e mostra que o conhece por INTUIÇÃO DIVINA: Intuitus eum.

Sem nada indagar, Ele diz logo quem é o recém-chegado: O seu olhar divino lhe revelou tudo.

Tu és Simão, filho de João — VEJO o passado, ENXERGO o presente, PENETRO o futuro, não julgo pelas aparências; julgo pelo coração... Por isso, Simão, tu deixarás o teu ofício antigo, como deixarás o teu ofício antigo tu serás chamado Kephas, que quer dizer Pedra, ou Pedro, (Jo1,42).

A cada Papa Jesus Cristo repete:

Tu és Joaquim Pecci... tu serás Leão XIII.

Tu és José Sarto... tu serás Pio X.

Tu és Giacomo dela Chiesa... tu Bento XV.

Tu és Achilles Ratti.. tu serás Pio XI.

Tu és Eugenio Pacelli... tu serás Pio XII.

E a lista seguir-se-á: de S. Pedro... até o último Papa.

Cada um deles deixará o seu primeiro nome, para tomar o nome de sua transformação em PEDRO.

Não é isso divinamente belo...

É divinamente grande e significativo!

Duzentos, sessenta e seis papas, sucedendo-se e mudando o seu nome secular, para usar única e exclusivamente o nome do Papa!


II. A primeira definição

O olhar, o gesto e a escolha de Pedro, como base da Igreja, exige dele uma resposta, uma profissão de fé... ou melhor, O EXERCÍCIO DE SUAS FUNÇÕES sublimes.

Qual é a função de Pedro, e de todos os papas?

É apresentar ao mundo O Cristo, Filho de Deus vivo, como centro e foco de toda a verdade.

É uma nova cena evangélica, já descrita, (pag.153), mas que devemos resumir aqui, para contemplá-la sob outro ponto de vista.

Um dia os apóstolos examinaram o conflito de opiniões que se cruzavam em redor de seu divino Mestre.

Uns dizem que é Elias, outros, João Batista ou qualquer outro profeta.

Jesus interpela-o bruscamente: E quem dizeis que eu sou? (Mt16,15).

Cabe a Pedro, como chefe da Igreja, dar a primeira DEFINIÇÃO DE FÉ da pessoa de Jesus Cristo.

Ele vai dogmatizar… sente a inspiração do espírito Santo.

É o Papa que vai falar... o Papa assistido por Deus... o Papa infalível, o Papa lançando através do mundo, à convite de Jesus Cristo, a sua PRIMEIRA DEFINIÇÃO DOUTRINAL.

Jesus Cristo ali está… os apóstolos, os primeiros bispos, estão ali também.

Todos escutam.

É o primeiro ato de autoridade que Pedro vai exercer, sob o olhar de seu Mestre… quem sou eu? pergunta Jesus.

E sem hesitação... refulgente como o relâmpago... majestoso como o trovão.

fulminante como o raio... Deus fala pela boca de Pedro… Pedro é o canal infalível da verdade divina.

Ele responde: Tu és o Cristo, filho de Deus vivo!

Está feito: a Igreja está fundada… Deus escolheu Pedro como o primeiro chefe desta Igreja... e na mesma ocasião esse chefe lança a sua primeira proclamação dogmática, perante seus colegas, os apóstolos.

Ele, Pedro, é a pedra fundamental, e sobre esta Pedra está colocado o trono do Cristo Filho de Deus vivo.

Pela primeira vez a proclamação do Papa ecoa através do mundo e continuará a ecoar através dos séculos. Todos os papas serão os continuadores deste brado de fé... todos continuarão a ser o rochedo, sobre o qual o Cristo, Filho de Deus vivo, fixou par sempre o seu trono.

Eis que estou convosco até a consumação dos séculos. (Mt26,20).

***

Eis agora a CONFIRMAÇÃO divina do primeiro decreto dogmático do primeiro Papa.

Nada falta nesta sublime cena.

Pedro falou... o Cristo confirma a sentença de Pedro, como confirmará as sentenças doutrinais de todos os papas.

Bem-aventurado és tu, Simão, filho de João: porque não foi a carne e o sangue que l'o revelou, mas meu Pai que está no céu. (Mt15,17)

Pode haver coisa mais clara e mais positiva?

É impossível!

Jesus Cristo não quer proclamar, Ele mesmo, esta verdade! Ele deixa, ou melhor, ordena que o chefe infalível da sua Igreja defina a verdade de sua DIVINDADE, e Ele mesmo aprova esta proclamação, declarando que não é ele, Pedro, composto de carne e sangue, que fez esta declaração, mas, sim, o Pai Celeste que lho revelou, sendo ele, Pedro, o canal infalível da doutrina divina.

Para mostrar que esta proclamação não é um fato isolado na Igreja, Jesus Cristo continua: E eu te digo que tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei a minha Igreja e as portas do inferno não prevalecerão contra ela. (Mt16,18).

Eis a perpetuidade da autoridade e da infalibilidade prometidas a Pedro.

Ele proclamará a verdade, e as portas do inferno, isto é, os vícios, as paixões, as violências, as hipocrisias, as traições, nunca prevalecerão contra a proclamação doutrinal de Pedro, e de seus sucessores.

Notem agora a conexão lógica, admirável, entre estas diversas partes, a sucessão divina, entre cada parte da cena e das palavras.

E, para completar a cena inefável e grandiosa, o Salvador, que acaba de construir a sua Igreja, comparando-a a um edifício, continua falando das chaves que fecham os edifícios.

Eu te darei as chaves do reino dos céus.(Mt16,19).

Pedro tem as chaves.

Ninguém entrará senão por seu intermédio...

Ninguém terá autoridade, senão por ele...

Não Ninguém terá direitos, senão por ele...

Apresenta-se as chaves de uma fortaleza a um rei, para confessar publicamente a sua soberana autoridade.

Entrega-se as chaves a um proprietário, para reconhecer que a casa é dele.

E Jesus Cristo dá as chaves do reino dos céus a Pedro, só a Pedro, exclusivamente a Pedro, para mostrar que o proprietário, o Senhor, o dono do reino dos céus é Pedro, e que, sem ele, contra a vontade dele, Ninguém ali penetrará.

É claro... é irrefutável!

E para que não exista nenhuma dúvida, como que para anular, de antemão, qualquer falsa interpretação, Jesus completa:

Tudo o que ligares sobre a terra, será ligado também nos céus; e tudo o que desatares sobre a terra, desatado será também nos céus.

(Mt16,19).

TUDO: note a repetição da palavra; TUDO. Jesus nada excetua.

Depois de ter feito de Pedro o FUNDAMENTO de sua Igreja, depois de lhe ter dado AS CHAVES que fecham e abrem soberanamente, Ele lhe dá a ADMINISTRAÇÃO inteira e absoluta, de todos os tesouros que nela estão depositados.

É manifestadamente um desígnio de Cristo que TUDO na Igreja repouse sobre ele só. Não pode haver nada mais usado, mais claro e mais sublime que esta divina investidura, seguindo-se a primeira definição dogmática de Pedro.


III. À joeira de Satanás

Vamos adiante...

Tudo é divino na instituição da Igreja e na investidura de Pedro.

Há ali cenas demais desconhecidas como há aspectos inexplorados.

Pedro lançou a sua primeira definição dogmática, proclamando o Cristo, Filho de Deus vivo.

Jesus Cristo, presente, confirma esta proclamação.

Pedro lançou o primeiro motu próprio, a grande BULA dogmática do catolicismo.

Jesus, com seu próprio punho, assina este documento, proclamando BEM-AVENTURADO a Pedro, por ter falado por inspiração divina (Mt16,17).

Tudo isso é divinamente belo e grandioso!

Mas eis aqui o que não o é menos.

O Cristo veio destruir a obra e os manejos de Satanás... É pois natural que este último dirija o seu ódio e a sua vingança contra a de obra de Jesus Cristo, contra a Igreja e contra o seu chefe.

Apenas o Salvador investira o primeiro Papa, de sua eminente dignidade, e já o seu divino olhar, até aqui radiante e como que entusiasta, parece velar-se... a sua voz onipotente, que, com entonação firme acaba de proclamar Pedro o chefe de sua Igreja, parece tremer de emoção, e lançando sobre Pedro um olhar compassivo, enternecido, Ele exclama: Simão, Simão!

Por duas vezes Jesus repete o nome de Pedro, o nome familiar, como para melhor mostrar-lhe a sua ternura, e prepará-lo a qualquer confidência terrível.

Simão, Simão! eis que Satanás vos reclamou, como instância, para vos joeirar como trigo. (Lc21,31).

Que comparação estranha... horrível!

Joeirar-vos... sacudir-vos, triturar-vos como o trigo no moinho... que horrível ameaça do ódio de Satanás!

É Satanás que reclama este poder... e o reclama com instância... quer triturar-vos!

Pobre Pedro... que visão horrível!... Mas logo, para tranquilizar Pedro, Jesus ajunta: mas eu roguei por ti, para que a tua fé não falte. (Lc,21,32).

Notai bem o texto, Satanás pediu para joeirar a todos... há de joeirá-los: Judas cairá, será esmagado; Pedro cairá triturado, mas se levantará, convertido, mais forte do que antes.

O Salvador emprega O PLURAL, para indicar que Satanás queria joeirar todos os apóstolos, como os joeirará de fato; e, dirigindo: se especialmente a Pedro, Ele emprega O SINGULAR: Eu roguei por ti, para mostrar que só Pedro tinha as promessas da INFALIBILIDADE que a fé que animava os outros podia faltar, mas que a de Pedro nunca faltaria.

Como já disse acima, cada um dos apóstolos gozava do dom de infalibilidade pessoal, mas não com transmissão a seus sucessores; Jesus Cristo rogou só por Pedro e para os seus sucessores, em que devia ficar concentrado a infalibilidade de Doutor Supremo.

Eu roguei por ti, Pedro, para que não sejas esmagado, moído como os outros, para que à!

joeira de Satanás não te fira nem te abata.

Tudo pode desfalecer em Pedro e em seus sucessores afora a fé.

A virtude pode desfalecer nele: a virtude, É PESSOAL.

A fé não pode desfalecer nele; a fé é da Igreja, das almas.

Joeirados, feridos, tentados, triturados, encarcerados, moribundos, os papas transmitir-se-ão, de geração em geração o farol sempre aceso e refulgente que nenhum sopro do inferno poderá apagar.

Eu roguei por ti, para que a tua fé não falte!

É a prece d'Aquele que disse: Eu sei, meu Pai, que vós me atendeis sempre (Jo11,42)

***

E porque o Salvador fez uma tal prece favor de Pedro?

A continuação do Evangelho no-lo explica:

E tu, uma vez convertido, confirma os teus Irmãos.

Não é para Pedro, como pessoa, que Jesus orou; é para Pedro, COMO PAPA, como chefe da Igreja, no ofício de confirmar os seus irmãos na fé.

Et tu conversus confirma fratres tuos.

Que resposta sublime!

Todos serão triturados, joeirados...

O bispo será triturado e ferido em sua diocese.

O sacerdote será humilhado, caluniado e triturado em sua paróquia.

O papa estará ai para sustentá-los, confirmá-los.

Do mesmo modo que todos recebem dele a jurisdição, a luz, eles receberão a FORÇA.

O triturado sustentará o triturado, O ferido consolará o ferido.

O Salvador sustentará diretamente UM SÓ, e por ele sustentará todos os outros.

É o que estamos presenciando todos os dias.

Em pé, no centro do mundo entre os muros seculares do Vaticano, neste reino pequenino, o Papa sustenta seus irmãos.

Ele encoraja os bispos perseguidos.

Consola os sacerdotes caluniados.

coroa as vítimas.

Faz tremerem os algozes.

Quem não se lembra do onipotente czar Nicolau e do Papa Gregório XVI?

O czar quis esmagar a Polônia... o humilde ancião do Vaticano fez tremer o potentado que desceu dali cabisbaixo, pálido e abatido tinha ouvido a voz da justiça, a voz daquele que confirma os perseguidos.

O Rei da Itália, em frente a Pio IX, treme e chora... sente-se pequenino diante deste ancião vestido de branco, cuja voz é um eco da justiça eterna.

Napoleão pretende humilhar o Papa, seu prisioneiro... e a voz do representante de Cristo rompe a espada nas mãos do onipotente Bonaparte, e faz cair de sua fronte a coroa imperial.

Pedro é eterno.

Tudo se inclina diante de seu trono.

E ele, com uma mão afasta o demônio, os algozes e os vícios, enquanto com a outra enxuga as lágrimas, reconforta os ânimos e coroa os que caem na arena da luta.

O demônio não pode abater aquele representa o trigo fecundo no meio do joio estéril das paixões humanas.


IV. O amor de Pedro

Não termina aí a admirável formação de Pedro.

Jesus Cristo não faz obras incompletas.

E a obra da Igreja é a sua obra de predileção; por isso, deve revestir-se de todas as prerrogativas da firmeza, da verdade, do sofrimento e do amor.

Já percorremos as três primeiras qualidades, admiravelmente manifestadas NO OLHAR de Jesus, na definição dogmática de Pedro e na predição tremenda das perseguições de Satanás, que completaremos no capítulo seguinte; resta-nos percorrer um instante a inefável cena do amor recíproco de Jesus e de Pedro.

A cena evangélica, a que nos referimos, já foi descrita acima e é citada por S. João. (21,15-19).

É a investidura solene e majestosa de Pedro, como chefe supremo da Igreja.

Consideremo-la aqui como continuação dos textos já citados: O Salvador lançou sobre Pedro um tríplice olhar, sendo cada um como a manifestação de uma nova prerrogativa.

O primeiro olhar era um olhar de ENTUSIASMO, de firmeza, de poder criador — intuitus eum”.

O segundo era um olhar de TRISTEZA, ao pensar nos sofrimentos contínuos de seu representante: Simão, Simão... disse este tão expressivo como as palavras: eis que Satanás vos reclamou com instância para vos joeirar como trigo.

E Jesus viu através do espaço e dos séculos a joeira de Satanás pisar, ferir e triturar o representante, como o trigo na mó dos moinhos.

Mas há um terceiro olhar, mais belo ainda que os dois precedentes, que acaba de mostrar-nos como é que devemos contemplar o Papa.

Era depois da ressurreição, no momento de investir definitivamente Pedro do governo da Igreja.

Pedro, tu me amas mais do que estes? Perguntou-lhe o Mestre. (Jo21,15).

E três vezes o Salvador renova a mesma pergunta.

Mas não basta das palavras; é preciso reconstituir a cena com o olhar e com o gesto que acompanharam estas palavras.

Jesus está cercado dos apóstolos, tendo em sua frente São Pedro; Ele o fita, fixa no semblante do apóstolo um destes olhares que mais que as palavras... Ele o fita longamente, TERNAMENTE, quase tristemente.

Pedro, tu me amas mais do que a estes? (Jo21,15) e Pedro, como fulminado, e ao mesmo tempo reconfortado por este olhar, baixa à cabeça, enquanto murmura em tom firme: Sim, Senhor, tu sabes que eu te amo!

E assim até três vezes.

Na terceira vez as lágrimas de Pedro completam as suas palavras: Ficou Pedro triste, diz o Evangelista.

E o olhar de Jesus continua a penetrar até no fundo da alma de Pedro, e este olhar lhe parece dizer:

Oh! Pedro, ama-me, ama-me muito, ama-me ardentemente, pois só o amor é capaz de dar-te a força para carregar a cruz, que vou pôr nos teus ombros.

A cruz das responsabilidades.

A cruz do sofrimento físico e moral.

A cruz das perseguições.

Ama-me, oh! Pedro, pois só um grande amor é capaz de grandes sacrifícios.

Simon Joannis, diligis me plus his?

Eis o terceiro olhar de Jesus Cristo sobre Pedro.

Como é terno este olhar!

Mas como ele é triste!

Como se sente que, sob a imensidade das grandezas, há ali um homem fraco, enfermo, pecador, capaz de ser tentado, de ser triturado, de vergar sob o peso a cruz!

O Mestre sente-se comovido.

A FRAQUEZA do Papa! oh! ela tem qualquer coisa de comovedor, de venerável.

AS LÁGRIMAS do Papa! elas são sagradas! Ai daqueles que as fazem correr!

OS GEMIDOS do Papa! É preciso aplicar-lhes o que a Sagrada Escritura diz dos gemidos de uma mãe: Ouvem-se com uma espécie de terror; nunca ficam esquecidos. (Ec6,29).

AS FALTAS do Papa! Oh! sim: as faltas de Papa: deve haver faltas, pois o Papa não deixa de ser homem.

Nós temos as nossas misérias, na vulgaridade da nossa vida; porque o Papa não as teria na sublimidade de sua grandeza?

Mas é preciso não vê-las.

O Papa é um Pai: e a paternidade é sagrada.

O maior dos crimes e o menor perdoável é aquele de um filho que tem a dor de ver faltas de seu pai, e que comete a infâmia de zombar delas.

O exemplo dos filhos de Noé é típico.

Deus amaldiçoou Cam por ter zombado da fraqueza de seu pai, e abençoou os que souberam com dignidade encobrir esta falta.

Os inimigos desta religião julgam rebaixar a grandeza do Papado, assinalando uns exemplos menos dignos de certos papas.

Cegos! São cegos que não enxergam umas faltas, (aliás não provadas) de uns papas, são como as sombras que dão maior relevo ao quadro divino do Papado.

Sobre 266 papas, 82 foram canonizados; 45 levaram o hábito religioso sobre o trono pontifício; mais de 50 foram eleitos contra a própria vontade, procurando, pelas suas vivas suplicações, afastar de si esta honra suprema.

Que haja nesta lista de 266 papas, dois, ou três ou quatro, em tempos tempestuosos e de decadência geral, que sejam, ou que pareçam menos dignos de seu caráter, que prova isso?

Prova a liberdade humana, que foi tão bem empregada em mais de 260 papas, e parece apenas (e com grande exagero) diminuída em dois ou três outros.

Oh! censores, quem de vós lançará a pedra à gloriosa falange de santos, de heróis, que são os papas?

Todos eles, após dezoito séculos completos, podem repetir a palavra de Pedro, sem receio de ser desmentidos: Sim, Senhor, tu conheces tudo, tu sabes que eu te amo! Domine, tu omnia nosti, tu seis quia amo te. (Jo21,17.)


V. Conclusão

Compreendeis, após o que dissemos, a grandeza divina, tão admiravelmente descrita nos Evangelhos, do trono de São Pedro.

Os protestantes vêm lançar seu ódio contra o rochedo, onde o Cristo colocou o trono de seu representante; pobres cegos que são, eles não veem que a lama que lançam contra o papado, não alcança nem o pedestal desta divina instituição.

As vagas do oceano que banha este pedestal e lavam-no continuadamente do lodo e da poeira que os inimigos de Deus procuram lançar contra ele.

Oh! por favor!... leiam eles o Evangelho!... leiam as paginas sublimes e ternas que acabamos de analisar aqui, e, em vez de protestarem, prostrar-se-ão de joelhos, mudos de admiração e de gratidão, diante desta obra-prima da bondade divina, que é o Papa.

Ubi Petrus, ibi Ecclesia.

“Todos querem conhecer à Igreja verdadeira: ela é sumamente conhecível: Procuram Pedro... Pedro é a pedra fundamental da Igreja de Cristo; e encontrando Pedro estarão em frente do edifício construído pelo próprio Cristo:

Tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei a minha Igreja.

A Igreja e o Papa são UMA COISA SÓ!

A Igreja não repousa simplesmente sobre o Papa, como sobre um fundamento; neste caso seria um edifício morto; mas é o Papa que cria a Igreja, infiltrando-lhe incessantemente a vida divina.

É o Papa que faz a Igreja UNA, SANTA, católica, APOSTÓLICA, que a marca com estes grandes distintivos, reservados e incomunicáveis.

O Papa é o princípio da unidade da Igreja.

É a ALAVANCA da sua catolicidade.

É a FONTE da sua santidade.

É o TRONCO da sua apostolicidade.

Tudo repousa sobre ele, a tal ponto, que (o que é impossível) se a Igreja viesse a perecer, o Papa a criaria de novo, sem que Deus, por assim dizer, tivesse precisão de intervir.

o Papa refaria tudo, em virtude da paternidade que nele está.

Vê-se logo quais são os sentimentos que os católicos devem nutrir para com o representante de Jesus Cristo.

Uma dedicação inviolável: ele é invencível; a terra pode tremer, sem comovê-lo

Oh! Pedro! oh! Papa! a quem iriamos nós?

Vós tendes as palavras da vida divina.

O Papa é INVENCÍVEL,.. ele é IMUTÁVEL.

Tudo neste mundo pode desfalecer, exceto a fé e a doutrina de Pedro.

Poderá haver teólogos mais profundos... mais penetrantes... cientistas mais perspicazes... oradores mais eloquentes, gênios mais refulgentes que o Papa; nunca porém haverá VERDADE mais segura, FÉ mais luminosa do que a do Papa.

Os homens erram; os gênios mais profundos têm o seu lado fraco: só o Papa é que fica VIRGEM de todo o erro.

As águas de um novo dilúvio, mais horrendo que o primeiro, poderão submergir as alturas; NUNCA ALCANÇARÃO O VATICANO donde o Papa as dominará, calmo e sereno, na majestade de sua INFALIBILIDADE e na firmeza de sua INDEFECTIBILIDADE.

Impõe-se nos a conclusão:

A quem apegarmo-nos neste mundo?

Sobre quem apoiar-nos na vacilação?

A quem servir nas trevas da vida?

Ao Papa... ele é o farol... é o rochedo. Tudo passa, e ele permanece...

Apeguemo-nos, pois, a ele.

Apoiemo-nos sobre ele.

Sigamo-lo, com uma segurança, uma confiança e um amor tão firmes, tão absolutos, que nenhum acontecimento, nenhuma catástrofe, nenhuma desgraça, possa separar-nos dele.

Se o Papa nos perguntasse, como Jesus Cristo perguntou aos apóstolos no meio

dúvida que invade o mundo: — Quereis vós também retirar-vos? — Ah! repitamos logo o brado de Pedro, que lhe dirigiremos hoje:

Senhor, para quem havemos nós de ir? Tu tens as palavras de vida eterna, e nós acreditamos e conhecemos que tu és o REPRESENTANTE de Cristo, Filho de Deus. (Jo6,68-69).


CAPÍTULO XII

Fraqueza e força do Papa

Há na Igreja, ou no Papado, um fenômeno divino que o mundo não enxerga bastante, ou não quer enxergar: — A sua força divina na fraqueza humana.

Tal é aliás o princípio de todas as obras divinas neste mundo: Escolher o que há de mais fraco para confundir o que há de forte.

É o segredo de Deus... é a manifestação de seu poder.

S. Paulo formulou admiravelmente este princípio das obras divinas, dizendo: Deus escolheu as coisas loucas segundo o mundo, para confundir os sábios; e escolheu as coisas fracas segundo o mundo, para confundir os fortes e escolheu as coisas vis e desprezíveis segundo o mundo, e aquelas que não são para destruir as que são, para que nenhum homem se glorie diante Dele. (1Co1,27).

Eis a fraqueza humana tornando-se for divina.

Este aspecto do Papado é admirável e de um eloquência divina; eis porque vamos estudá-lo aqui, frisando bem o contraste desta fraqueza e desta força na pessoa do chefe da Igreja, no santo padre, no Santo Padre, o Papa.


Um trono de sangue

Um trono de sangue: e este trono é o de S. Pedro.

Quase não tenho a coragem de escrever uma tal verdade, pois é capaz de escandalizar as almas simples, pouco á parte da história do mundo e do Papado, e entretanto é uma verdade e um fato histórico.

Mas, para que se escandalizar?

Basta refletir um instante e verão que deve ser assim.

O Cristo disse que o discípulo não está acima do mestre, (Mt10,24).

Ele é o mestre. (Jo12,14).

S. Pedro é o primeiro de seus discípulos.

Jesus Cristo veio fundar a sua Igreja... e onde a fundou Ele?

Não foi na humildade de Belém, no suave aconchego de Nazaré, nem sequer em seu fecundo apostolado de Galileia. Foi em seu sangue no alto do Calvário.

Hic sanguis testamenti, quod mandavit ad vos Deus. (Hb9,20).

É de seu peito aberto, de seu coração ferido, que jorra em ondas divinas o sangue redentor que forma a base e a glória da Igreja (Jo19,34).

A Igreja foi fundada no sangue de seu divino Fundador.

Esta Igreja devia ser a prova suprema do amor de Deus para com os homens, e Jesus disse: “Não há maior prova de amor do que dar a vida por aqueles que se ama. (Jo15,13)

E Ele nos deu o seu sangue, até a última gota.

É deste sangue fecundo e expiatório nasceu a sua Igreja.

O Calvário é o centro; é ali que a Igreja nasce no sangue do Salvador.

Há um princípio geral biológico que tem aqui a sua aplicação: Um ser vive e se desenvolve pelo que lhe deu a vida.

A Igreja nasceu no sangue do Salvador; é preciso que este mesmo sangue lhe sustente e lhe desenvolva a vida.

E este sangue é, sem duvida, aquele que Jesus Cristo nos faz beber, dizendo: Se beberes o meu sangue, não terás a vida eterna em ti. (Jo6,54), mas é também aquele que deve, através dos séculos, inundar o trono de Pedro, o trono do representante de Jesus Cristo.

Jesus Cristo fundou a Igreja em seu sangue.

O discípulo não estando acima do Mestre, é preciso que o Representante de Jesus Cristo mantenha e vivifique a Igreja, em seu próprio mangue.

Se Tertuliano pôde dizer que o sangue dos mártires é uma semente de cristãos — Sanquis martyrum, semen christianorum, com muito mais razão deve dizer-se que o sangue dos papas é a vida da Igreja.

Meu Deus! será possível?...

Sim! É uma realidade,

O trono de Pedro foi construído por Jesus isto em seu próprio sangue.

Pedro regou-o com seu sangue.

Os 31 primeiros papas, sucessores de Pedro, juntaram o seu sangue ao sangue de Pedro e de Cristo, formando, deste modo, uma dinastia sangrenta... um trono ensanguentado, o trono do amor e da verdade.

De cada Papa é preciso que se possa dizer o que S. João disse de Jesus Cristo: Eis aquele que veio pela água e pelo sangue. (1Jo5,1) e cada Papa, como o Salvador, deve adquirir a Igreja pelo seu sangue quam acquisiit sanquine suo. (At20,28).

A história do Papado, considerada sob este aspecto, reveste-se de uma majestade tão grandiosa que parece deslumbrar.

Ele não deve ver!...

A profecia do Salvador deve continuar a realizar-se, até ao fim dos séculos: Simão, Simão, eis que Satanás vos reclamou, com instância, para vos joeirar como trigo. (Lc21,3).

Examinai a lista dos papas, durante 18 séculos.

Foram 266, e qual é aquele que não foi triturado, joeirado como trigo?

Já citamos na pagina 98 a lista dos 100 primeiros papas, formando uma corrente ininterrupta, durante os 8 primeiros séculos.

Examinai esta lista.

Os 31 primeiros regaram com o sangue de suas veias o trono de Pedro.

São trinta e um papas em seguida...

Todos eles foram decapitados, apedrejados, precipitados nas águas, lançados às feras do anfiteatro.

Receber a investidura papal era dar um PASSO PARA O MARTÍRIO.

Morria um Papa, inundando com seu sangue a tiara que apenas colocara sobre a cabeça... e logo um outro lhe sucedia, cingindo a tiara ensanguentada e levantando o baculo supremo de pastor, ainda úmido do sangue de seu predecessor.

Que heroismo!

Satanás pediu, reclamou com instância para joeirar a Pedro como trigo.

E Deus permitiu que ele fizesse este trabalho de apuração, para melhor e mais perfeitamente assemelhar Pedro a si mesmo.

E Satanás fez um trabalho bem feito.

Desde S. Pedro até Pio XII a joeira de Satanás não parou um instante.

Todos os papas são triturados pela joeira como o trigo na mó dos moinhos, derramando o sangue de suas veias ou o sangue de seu coração, para uni-lo ao sangue do Salvador, e aureolar a sua fronte com o nimbo do martírio.


II. A dinastia sangrenta

Devemos provar o que acabamos de dizer.

E esta prova é uma das mais gloriosas mais sublimes da história do papado.

Infelizmente, esta página é demais desconhecida; Deus permite, talvez, que fique ignorada, para não interrompê-la; pois, se os inimigos da religião a conhecessem, compreenderiam a inutilidade de seus esforços e calunias contra o papado; e veriam que, em vez de abater este trono divino, estão a exaltá-lo, juntando-lhe mais uma pedra e pondo mais um diadema sobre a fronte ensanguentada do representante de Jesus Cristo.

Onde já se viu uma dinastia começando por trinta e um condenados à morte?

Percorramos apenas a lista, destacando os mártires mais conhecidos.

Passemos por cima dos corpos trucidados dos trinta e um primeiros: são todos mártires.

De S. Pedro, o primeiro, até S. Marcello, 31º, o 309... houve perto de 3 séculos de martírio, repletos de mártires.

É um lago de sangue!

Este lago brotou do Coração do divino mártir, aberto pela lança, e do Calvário, foi derramando sobre o mundo, para purificá-lo e regenerá-lo.

Após esta legião de 31 papas martirizados vai-se sucedendo outra legião de heróis, exteriormente menos martirizados, mas sempre imolados, com o mesmo furor, pelos inimigos de Deus.

Percorramos esta lista, divinamente heroica, como é heroicamente divina.

Ao lado do sangue das veias dos papas corre o sangue rubro e fecundo de seus corações:

— O Papa Libério (352-363) é exilado e morre mártir, na Bereia, em Trácia.

— O seu sucessor, FELIX II, dá a sua vida pela fé que professa.

— INOCÊNCIO I e LEÃO MAGNO estão expostos ao furor de Alarico e de Genserico.

— SÃO SÍMACO é atacado nas ruas de Roma, e seus sacerdotes estrangulados aos seus pés.

JOÃO I é encarcerado e morre em consequência de maus tratos.

— AGAPITO morre exilado.

SILVERIO é preso pelos emissários dos imperadores, e vai morrer de fome numa ilha deserta.

— VIRGÍLIO é arrancado do Altar e vai morrer no exílio.

— PELÁGIO cai vitimado pela peste, em seu palácio transformado em hospital.

— GREGÓRIO MAGNO chora o império romano que morre afogado na corrupção.

— SÃO MARTINHO é arrancado de Roma, carregado de ferros e exilado na Chersonesa.

— SÉRGIO I é exilado durante 7 amos.

— João VI teria seguido o mesmo caminho, se não fosse a revolta do povo contra as ordens do imperador.

— Os papas CONSTANTINO, GREGÓRIO I e GREGÓRIO III vivem cercados de conspirações da parte dos imperadores, e veem as suas vidas em continuo perigo.

— ESTEVAM II escapa à morte pelo auxílio de Carlos Martelo, Pepino e Carlos Magno.

— SÃO LEÃO II é arrancado do trono pelos sediciosos e, semi-morto, lançado no cárcere.

Aqui termina a época dos 100 primeiros papas e começa uma segunda não menos sangrenta.

É Satanás que continua a sua missão de joeirar o sucessor de Pedro.


III. Sangue... e mais sangue

SÃO LEÃO terminou o século oitavo na glória de seu pontificado, e abre o século nono no cárcere do martírio. (795-816).

— SÃO PASCOAL I vê seus sacerdotes trucidados em redor de si e não escapa à morte, senão por milagre.

— SÃO GREGÓRIO IV vê o seu palácio cercado pelos sarracenos que profanam e despojam a Igreja de São Pedro.

— SÃO LEÃO IV os faz recuar à Ostia.

— JOÃO VII os vê voltar, fica encarcerado na Igreja de São Pedro, e morre de tristeza ao ver tantas calamidades.

— ESTEVAM VI encontra Roma em ruínas, as Igrejas queimadas, os monastérios saqueados e milhares de cativos a recolher e alimentar.

— LEÃO V morre de miséria no fundo um cárcere.

— JOÃO X morre sufocado por ordem Marozia e Guy, duque de Toscana.

— JOÃO XI fica até à morte preso no Castelo de Santo Angelo.

— BENTO V é sitiado em Roma por Othon e morre no exílio.

— BENTO VI morre estrangulado no Castelo de Santo Angelo.

— JOÃO XIV morre no cárcere, de fome e de miséria.

— GREGÓRIO V é despojado de tudo e expulso de Roma.

— SILVESTRE II morre envenenado.

— JOÃO XIX é obrigado a abdicar.

— BENTO VII é forçado a fugir de Roma e refugiar-se no Saxe.

— GREGÓRIO VI vê os sediciosos perverterem Roma e prepararem guerras atrozes sob a instigação de Henrique III, rei da Germânia.

— SÃO LEÃO IX é feito prisioneiro pelos normandos.

— VICTOR II foi duas vezes ameaçado de envenenamento.

— ALEXANDRE, perseguido por Henrique IV, rei da Germânia, morre miseravelmente em fuga.

— GREGÓRIO VII, protegido em vão por ter a auréola de gênio e de Santo, morre exilado em Saverna, dizendo: “Amei a justiça e odiei a iniquidade, eis porque morro em exílio."

— VICTOR II morre, envenenado, por ordem, dizem, de Henrique IV.

— URBANO II fecha-se no Coliseu, como numa cidadela, e ali espera a morte de seus perseguidores para poder continuar o seu reino.

— PASCHOAL II não querendo sagrar Henrique II imperador da Alemanha, que recusara o juramento de respeitar a liberdade da Igreja, é arrastado por este último, ligado com cordas, como um criminoso, e expira, em Benevento, de tristeza e de fadiga.

— GELASIO II, encarcerado, escapa através de mil dificuldades e vai morrer em Cluny.

— INOCÊNCIO I é feito prisioneiro por Rogério, duque de Cecília, e exposto à morte.

— LUCIANO II, ferido com pedras numa sedição popular, morre mártir por sua coragem em defender os direitos da Igreja.

— ALEXANDRE II, para escapar às violências de Frederico Barbaroxa, foge para a França, asilo acostumado dos papas perseguidos.

— LUCIO III morre em caminho do exílio.

— URBANO III morre de desgosto ao da tomada de Jerusalém, por Saladino.

— INOCÊNCIO III abre o século décimo terceiro (1198-1216). Uns dias de paz interrompem as provações e o martírio da Santa Sé, mas, apenas morto este Papa, eis que o sangue continua a correr, cada vez mais rubro é abundante.

— GREGÓRIO IX vê do alto do forte de Sant'Angelo as Igrejas e os mosteiros de Roma, incendiados pelos sarracenos, excitados por Frederico II, e morre de dor e de desgosto, em vista do procedimento tão odioso de um príncipe cristão.

— INOCÊNCIO IV não escapa aos atentados do mesmo Frederico, senão refugiando-se em França.

— ALEXANDRE IV morre desterrado em Viterbo.

— BONIFÁCIO VIII recebe a bofetada de Luiz o Belo.

— BENTO XI morre envenenado, e, dizem, pela mesma razão.

— CLEMENTE V é obrigado a exilar-se em Avinhão, onde o Papado fixa o seu trono durante os anos de cativeiro.

— ADRIANO VI, de volta à Roma, vê nascer o grande cisma do Ocidente e exprime sofrimentos de todas as espécies.

— Terminando o cisma do Ocidente, surge o protestantismo.

— LEÃO X vê aparecerem as primeiras ameaças, e a sua alma fica amargurada pela revolta de Lutero.

— ADRIANO VI, vendo o rápido progresso dos erros protestantes, cai doente e morre de desgosto.

— CLEMENTE VII é sitiado em Roma pelo condestável de Bourbon, cujo exército, —composto de protestantes, saqueia as Igrejas e proclama Lutero papa, na própria Basílica de S. Pedro.

— Sob o reino de PAULO II, JÚLIO III, PAULO IV, o Papado é crucificado entre os dois criminosos que são o protestantismo e o islamismo.

— SÃO PIO V vence este último na batalha de Lepanto, pelo rosário.

— XISTO V vendo separarem-se da Igreja a Inglaterra, a Suíça e a Alemanha, tem a alma torturada pelo receio da apostasia da França.

— URBANO VIII vê nascer o jansenismo e sofre imensos desgostos.

— ALEXANDRE VII asiste ao nascimento do galicanismo que devasta a França.

— INOCÊNCIO XI é horrivelmente traído por Luiz XIV, em 1682.

Nesta época as provações mudam de aspecto. INOCÊNCIO XII abre o século (1699-1700).

Não é mais a espada, o veneno, o exílio; é o encarceramento moral, a humilhação, o esmagamento da dignidade pontifical, tormento mais doloroso de que o próprio martírio.


IV. Os últimos mártires

Será preciso acabar o quadro sanguinolento do Papado nos dois últimos séculos?

É a continuação da profecia de Jesus Cristo: Simão, Simão, eis que Satanás vos reclamou, com instância, para vos joeirar como trigo. (Lc22,31)

Em 1691 sobe ao trono de São Pedro o Papa INOCÊNCIO XII... Um levante de deístas amargura o coração do Pontífice.

— CLEMENTE XI e INOCÊNCIO XII assistem a uma como insurreição geral contra Deus e contra a Igreja.

Os papas são encerrados nos muros de Roma.

Suprime-se-lhes as bulas. Em Paris, Madrid, Nápoles, Viena, etc, a palavra pontifical não pode mais entrar, sob pena de horríveis castigos.

— BENTO XII e CLEMENTE XII são contemporâneos de Voltaire que se intitulara o Zomba-Cristo, tratando a Igreja de “infame” e lançando contra ela os seus sofismas e o seu ódio.

Os papas sofrem um martírio moral, mil vezes mais doloroso que o suplício das fogueiras, vendo o mundo em peso levantar-se contra a Igreja de Cristo.

— CLEMENTE XII tem a dor de ver os grandes pioneiros da fé, os Jesuitas, expulsos de toda a parte.

— CLEMENTE XIV sente sobre a garganta o punhal dos inimigos da Igreja, que querem obrigá-lo a suprimir os Jesuítas.

— PIO VI, o peregrino apostólico, diante de si o imperador-sacristão, José II á da Áustria, que pretende sujeitar a Igreja ao estado. O Papa vai à Viena para pacificar o perseguidor, mas tudo é em vão, pois a luta continua até á morte do desgraçado imperador.

Morto o imperador sacristão, Pio VI vê levantar-se contra a Igreja o fogoso Napoleão que pretende escravizá-la e se julga superior ao próprio Papa.

Arrancou por isso a Pio VI o estado Pontifício, saqueou Roma, e levou o santo e velho Pontífice para Valença, onde morreu, perdoando e abençoando os seus inimigos.

— PIO VII abre o século dezenove, que devia ser um século de lutas e de sangue para o mundo e para o Papado.

Não podendo fazer a vontade do onipotente Bonaparte, o Papa é arrastado, encerrado e tornado prisioneiro primeiramente em Savona e depois em Fontainebleau.

A viagem do Papa foi um martírio prolongado... O povo chorava ao passar o triste cortejo que levava o venerando prisioneiro, mas algozes tinham ordem de não poupar súplicas ao chefe da Igreja.

Napoleão é vencido em Waterloo, converte-se no exílio de Santa Helena, enquanto o Papa, de volta á Roma, torna-se o protetor do seu perseguidor e de sua família decaída.

— PIO VIII, que começava a gozar um pouco de tranquilidade, sente a sua velhice amargurada pelas horrendas perseguições dos protestantes ingleses na Irlanda, morrendo estes últimos de miséria e de traição.

— GREGÓRIO XVI vê a perseguição invadir a Rússia, sob as ordens de Nicolau L.

— PIO IX, o Papa da Imaculada Conceição, assiste à horrenda revolução francesa que derruba o trono de Luiz Felipe e proclama a república.

A demagogia apodera-se do patrimônio de São Pedro. Pio IX é obrigado a fugir, e refugia-se em Creta.

A paz restabelece-se, em 1870. Napoleão III retira as forças francesas de Roma. As tropas de Victor Emanuel aproveitam a ocasião e se apoderam covardemente dos estados Pontifícios, deixando somente o Vaticano em poder do Papa, no qual fica encerrado como prisioneiro.

— LEÃO XII sucede ao Santo Pio IX, mas, no meio das perturbações, nem pode ser coroado em S. João de Latrão, nem em São Pedro.

PIO X entra em cena, condena o modernismo, que começava a infiltrar-se na Igreja, e após esforços titânicos para afastar a guerra mundial, sente-se traspassado de dor, por ver esta luta fratricida; e morre santamente, implorando do Senhor o perdão e misericórdia pelos povos que se degladiam.

— BENTO XV governa a Igreja nos anos calamitosos da grande guerra europeia, e, quando três anos depois vê a suspirada paz sobre a terra, ensopada de sangue e coberta de cadáveres, o venerando Pontífice da Paz voa para céu (1922).

— PIO XI, gloriosamente reinante, sucede-lhe sobre o trono de S. Pedro.

É um dos pontificados mais gloriosos e mais fecundos em frutos espirituais.

É bem o Papa do tempo presente, de olhar perspicaz, de visão elevada, de uma atividade incomparável e de um espírito conciliador sem igual, apesar energia que o distingue e o coloca entre os grandes vultos de nosso século.

Mas ele também tem o seu calvário, e Satanás procura joeirá-lo como joeirou os seus predecessores; triturá-lo, como tritura os mártires.

Em nossos dias a Igreja é combatida pela maçonaria, sociedade secreta, que procura destruí-la, sob a capa de sociedade de beneficência.

As centenas de seitas protestantes vão espalhando os seus erros nos países católicos.

Como os judeus deram a Judas trinta moedas para lhes entregar Jesus, assim os protestantes oferecem dinheiro a quem queira passar da Igreja católica para os seus erros... E sempre há qualquer infeliz que tem mais amor ao ouro do que a Jesus Cristo.

O espiritismo, com as suas palhaçadas diabólicas, penetra nos espíritos, arrancando as almas do seio da Igreja, para arrastá-las para os manicômios.

O comunismo, com a sua miragem de liberdade, desune a família e a sociedade, semeando nas massas populares o ódio e a vingança.

E, do alto de seu trono imortal, o sublime ancião do Vaticano, o Papa dos séculos, vê tudo isso, sente tudo isso, sofre à vista de tudo isso, um verdadeiro martírio..

E assim continuará a história do Papa, até fechar o ciclo dos tempos, e quebrar-se para sempre a joeira de Satanás, para ceder lugar ao triunfo final dos eleitos.


V. Conclusão

Uma conclusão se impõe.

Esta conclusão devia ser: A Igreja sempre perseguida, vendo seus papas triturados pelo demônio, estrangulados pelos chefes das nações, decapitados pelos algozes de todos os tempos, envenenados pelas paixões e pelos vícios, uma tal Igreja, nadando no sangue de seus próprios chefes, não pode subsistir HUMANAMENTE.

É impossível... absolutamente impossível!

Os impérios e os reinos, atacados por inimigos poderosos, perecem, são destruídos... e não deixam senão ruínas, como única lembrança de sua glória; e como poderia resistir um governo sem exército, sem armas, atacado de todos os lados, por dentro e por fora, sem tréguas e sem descanso?

É impossível... humanamente impossível!

E entretanto é um fato! é um fato público, multi-secular, visível para todos.

O que acabamos de ver da história sangrenta do Papado é historicamente certo.

E, apesar disso, o papado existe! Que digo: não somente existe, mas nunca foi abalado e é sempre triunfante.

Os impérios desaparecem. O Vaticano está em pé, firme, inabalável.

A ciência progride, a civilização se desenvolve, a inteligência humana cria asas e voa, enquanto a impiedade incansável e feroz cava abismos nas almas e nos corações.

E o Vaticano, eterno farol, projeta uma luz divina sobre o mundo; enquanto o humilde ancião do Vaticano, vestido de branco, estende a mão para perdoar e para abençoar... sempre triunfante, sempre glorioso, sempre inabalável, incólume sobre o rochedo de Pedro.

Oh! digam-me: não é isso divino?

Digitus Dei est hic!

Do alto do seu trono, o Papa, sempre calmo e sorridente, através das lágrimas de seus olhos e do sangue de seu coração, pode continuadamente repetir a palavra do Salvador: Eu venci o mundo — Ego vici mundum. (Jo16,33).

Não sei qual o escritor que disse: A Igreja Católica é UMA BIGORNA que tem gasto todos os martelos.

É uma frase que resume o triunfo da Igreja no mundo.

A Igreja não é somente uma instituição triturada, perseguida, sofredora; ela é sobretudo uma instituição triunfante, mas triunfante na luta e na dor.

Ela é uma BIGORNA DE AÇO.

Batam os martelos: eles se gastam, mas a bigorna fica.

De fato, foram famosos martelos os TIBÉRIOS, os NEROS, os DIOCLECIANOS, os DÉCIOS, e todos os imperadores romanos, com todo o poder de que dispunham, como senhores do mundo.

Poderosos martelos foram os imperadores de Bisâncio; todos os JULIANOS passaram, caíram, e ainda raivosos, na sua impotência, clamavam: Venceste, ó Galileu!

Outros martelos pesados eram os imperadores do santo império: HENRIQUE IV, Frede

rico, o Barba-roxa, Frederico II, todos eles à frente de poderosos exércitos.

Não menos pesados eram os FILIPE I, Filipe o Belo, Luiz de Baviera, João sem terra, Henrique VIII da Inglaterra.

Estes eram à força, eram o poder, eram exércitos aguerridos que se moviam, e por onde iam passando, derramavam o terror e a desolação.

— Para Roma! bradaram eles!

— Vamos ver quem vence, repetiam os outros!

E, enquanto a terra ia devorando os seus cadáveres desonrados, enquanto os corvos devoravam as suas entranhas nos campos de batalha, O ANCIÃO DE ROMA, vestido de branco, o Papa do Vaticano, domina o mundo, governa o mundo, e o seu sorriso consola, reconforta e estimula todas as almas de boa vontade.

E não há somente os martelos dos inimigos da Igreja que se gastam sobre a bigorna do Vaticano; há também os martelos ciclópicos de seus próprios filhos, como são os ARIOS, Nestórios, os Luteros, os Calvinos, os Jansenios.

Herculeos martelos forneceu o seculo dezoito, nos famosos enciclopedistas.

Só VOLTAIRE escreveu cerca de 60 volumes! O filosofismo deste século gastou toneladas de papel para espalhar o seu grito de guerra: Esmaguemos a infame!

Famosos martelos eram eles, mas todos se gastaram e quebraram de encontro à eterna bigorna do Vaticano.

Possantes martelos foram ainda os POMBAL, Combes, Calles, Lenine, Trotski, que pretendiam pulverizar a bigorna, mas foram por ela esmagados.

Formidáveis martelos têm sido forjados e temperados nas oficinas maçônicas, martelos manejados por braços herculeos como os NAPOLEÃO, Bismark, Cavour, Mazini, Garibaldi e Crispi.

Todos bateram...

Todos se cansaram de bater. .

Todos gastaram os seus martelos...

E a eterna bigorna está firme, segura, vencendo os homens, as armas, os elementos e o tempo.

Mister é que seja de boa liga, e forjada por mãos divinas, a bigorna que tem resistido durante vinte séculos a tão poderosos martelos.

Ah! sim, a Igreja sofre... O seu chefe é UM mártir; mas triunfa; é um eterno vencedor. Ele pode repetir: Ego vici mundum: — Eu venci o mundo.

Querem outras provas da divindade da Igreja católica, e da assistência divina de que goza o seu chefe, o Santo Padre, o Papa?

Há muitas outras mas não pode haver mais forte, mais decisiva, mais refulgente que esta.

O Papa SOFFRE, mas TRIUNFA.

O Papa MORRE, mas RESSUSCITA.

O Papa é ETERNO, como é eterno Aquele a quem representa.

É a força na fraqueza!

Deus escolheu o que é fraco... para confundir os fortes!

É a fraqueza humana, feita força divina!

É divinamente belo!...

Basta disso para ver a sua origem e a sua marcha divina!


CAPITULO XIII

O Papa de Roma

Os amigos protestantes, no intuito de amesquinhar a grande, a sublime, a única, a divina Igreja de Jesus Cristo, que é a Igreja Universal, ou CATÓLICA, em oposição às igrejolas locais, ou regionais que eles possuem, lançam-nos em rosto o que eles julgam uma ofensa: A Igreja romana, os romanistas, os papistas.

Não é um insulto... longe disto... é uma honra; e, sem dirigir-lhes a resposta veemente do grande O'Connell, o libertador irlandês, devemos mostrar-lhes que ser ROMANO OU PAPISTA é ser discípulo de S. Pedro... como ser protestante é ser discípulo de Lutero, Calvino, Zwinglio, Knox, Henrique VIII, etc.

A resposta de 0'Connell é a seguinte:

Um dia, certo protestante inglês encontrando-se com Daniel O'Connel, o grande libertador da Irlanda, pensou humilhá-lo em rosto — conforme o seu modo de ver — o irônico insulto de “papista” Mas Daniel O'Connell, enfrentando-o altivamente, respondeu com toda a sua firmeza de católico convicto:

"Miserável, crês tu que me injurias e, ao contrário, me fazes uma grande honra. Sim eu sou papista e me glorio disto, porque 'papista' significa que a minha fé, por uma sucessão ininterrupta de papas, chega até Jesus Cristo ao passo que a tua não vai além de Lutero, ou de Calvino. Se tivesses ainda um pouquinho de bom senso, compreenderias que, em matéria de religião, vale mais depender do Papa que de um monarca, da sotaina que de um renegado!”

E o destemido católico continuou a sua magnífica profissão de devotamento ao Papa, diante da admiração do pobre protestante que, todo mortificado, sob a força esmagadora do lógico e tremendo raciocínio de tão eloquente réplica, teve que se calar e se convencer, quiça de que palmilha a estrada tenebrosa do erro, cujos marcos miliários são pontos de interrogação, sem uma projeção sequer de luz a balsamizar o coração e a alma.


I - Roma e o Papa

Roma é do Papa... e o Papa é de Roma.

Estes dois nomes ficarão para sempre e inseparavelmente unidos.

A história desta união tem qualquer coisa de divinamente grande, que, infelizmente, muitas pessoas ignoram, porque ignoram a história da Igreja.

Porque razão a morada do Papa é Roma, e não qualquer outra cidade importante do mundo civilizado?

A resposta é muito simples: É porque Deus o quis; e Ele mesmo, com a mão onipotente que dirige os acontecimentos deste mundo, tudo preparou e tudo dispôs para que assim fosse.

Parecer-nos-ia natural se Pedro houvesse fixado a sua residência em Jerusalém, e que dali do alto da montanha, onde morrera o seu divino Mestre, o Vigário de Jesus Cristo ensinasse o mundo.

Haveria neste projeto uma beleza enternecedora, capaz de atrair o mundo, e de dar à palavra do Chefe Supremo da Igreja uma autoridade, que parece cair diretamente dos lábios d'Aquele que ele representa.

Porém, o que Pedro ignorava, o Cristo o sabia: o mundo ia mudar o CENTRO.

Babilônia, Alexandria, Antioquia e Jerusalém, perderiam em breve qualquer influência sobre o movimento geral da humanidade.

A luz ia passar do Oriente para o Ocidente.

No tempo de Pedro esta luz dourava, apenas com seus primeiros raios, as Gálias, a Espanha, a Inglaterra, a Germânia... porém, após uns séculos, é neste lugar que deveriam concentrar-se a atividade e o progresso dos homens.

Que teria podido fazer o Papa em Jerusalém?

Teria vivido afastado do mundo.

Não teria residido no centro do mundo.

Eis porque, logo após a morte do Salvador, uma força invencível desviou Pedro de JERUSALÉM, e o impeliu para ANTIOQUIA, que era então a capital do mundo oriental, a cidade cosmopolita, mundial.

Pedro assenta ali o seu trono, para melhor agir sobre o Oriente.

O movimento tornou-se imenso, e foi que pela primeira vez os discípulos de Jesus receberam o nome de CRISTÃOS.

A decadência de Antioquia estava próxima, embora, ainda invisível para os homens; mas Deus a via e a conhecia.

A mesma força invisível arranca Pedro Antioquia e o conduz à ROMA.

A perseguição rebenta, violenta, sanguinária.

Pedro quer abandonar a grande metrópole.

A tradição nos mostra Pedro saindo, à noite, da cidade, encontrando às portas de Roma, o salvador carregando a cruz.

Pedro pára, quase desfalece, e de seus, lábios trêmulos caem as palavras: Magister,quo podis?

O olhar de Jesus, este olhar misterioso, profundo, que prostrou Pedro no átrio de Caifás, fita o fugitivo, e doces como o carinho de uma mãe, ressoam as palavras do Mestre: Vou para Roma, para ser crucificado uma segunda vez.

Pedro compreendeu...

Não, Mestre adorado, sou eu que morrerei crucificado por ti.

É uma piedosa tradição... mas tão suave é que, mesmo sendo lendária, exprime as disposições do Mestre e de Pedro.

Pedro volta e fixa em Roma o seu trono imortal.

Vê-se melhor, no meio destas hesitações de Pedro, os desígnios da Providência divina.

Pedro pertence a ROMA.

Roma deve pertencer a PEDRO...

É uma nova cena que se desenrola, dirigida pela mão divina.


II - Roma para o Papa

Anotemos bem o fato seguinte que explica os mistérios da história romana daquela época remota: A mesma força invencível que conduz o Papa à Roma... dele afasta os imperadores.

Os césares aí estão no explendor de sua glória e nos louros de seus triunfos. A sua capital é o centro do mundo civilizado, e eles o centro, a mola viva de tudo.

Construíram palácios suntuosos.

Acumularam neles os tesouros das nações conquistadas.

Roma é a cidade mais bela, mais rica, mais próspera do mundo.

De repente César desce de seu trono... e abandona a capital de seu império.

Segue para Milão, para Pavia, para Ravena, para Treves, para Constantinopla.

Porque isso?

Qual é o braço que o impele e o afasta de seu palácio, de seu ouro, de seu trono, de seus arcos de triunfo, de seus templos e das cinzas de seus antecessores?

É o braço de Deus, que preparara Roma para ser a morada do Vigário de Jesus Cristo.

Mas havia mais do que a força do braço divino; havia também a veneração dos homens, dos convertidos, dos primeiros cristãos.

Os imperadores compreendiam que, por conveniência, o Papa não podia ser o SÚDITO, deles, que eram os SEUS FILHOS.

Este mesmo sentimento de conveniência, respeitosa penetrava em todas as almas.

No começo da Igreja todos os bispos, e sobretudo os patriarcas, eram chamados com o doce nome de Pai: PAPA, nome suave e paternal, que ilumina com um doce sorriso os anais eclesiásticos dos primeiros séculos.

Havia o Papa de Antioquia, o Papa de Alexandria, o Papa de Jerusalém.

E, coisa curiosa, se não fosse divina, pouco a pouco os bispos, e os patriarcas deixam cair no esquecimento este belo título, ficando ele só e exclusivamente reservado ao PAPA DE ROMA.

Não houve, a esse respeito, nem declaração, nem concílio... nem combinação: é a veneração e a conveniência que inspiram os bispos a deixarem o TITULO à sede de Pedro, como inspirara os imperadores e o povo a lhe entregarem a CAPITAL do mundo.

O Bispo de Roma, o sucessor de Pedro, fica sendo o único PAPA, a única SANTIDADE, porque sobrepuja toda a paternidade e toda a dignidade dos outros.

Cenas mais sublimes vão se sucedendo.

Pedro é e ficará o PAPA DE ROMA. Roma será do Papa; mas o Papa ficará pobre... como o seu divino Mestre.

Os Atos dos apóstolos contam-nos a bela cena, conhecida mas não bastante compreendida.

Pedro encontra um pobre e, colocando-lhe a mão sobre a cabeça, lhe diz; Não tenho nem ouro, nem prata, mas o que tenho, isso te dou: em nome de Jesus Cristo, Nazareno, levanta-te e anda! (At3,6).

À vista deste milagre, pareço ouvir os recém-convertidos exclamarem, cheios de entusiasmo, dirigindo-se a Pedro: Ó Pai, (Papa) não tens nem ouro, nem prata, mas tens a autoridade de Jesus Cristo, e em nome dele, curas os enfermos, restituis a vista aos cegos, faz andarem os paralíticos.

És pobre, ó Vigário de Cristo!... mas és nosso Pai, és o Pai do mundo, és o PAPA UNIVERSAL; eis o nosso ouro a teus pés, serve dele; é teu como é nosso.

E todos que possuíam campos ou casas, vendendo-os, traziam o preço do que vendiam e depunham-no aos pés dos apóstolos, e distribuía-se por cada um segundo a sua necessidade, (At4,34-35). Et offerebant et ponebant ante pedes Apostolorum.

III. A cidade do Papa

Já notaram os leitores esta passagem admirável e a sua repercussão na história da Igreja? Talvez que não!

Pois bem, ela é a base da formação do VATICANO, da morada secular dos papas.

O que fizeram os fieis de Jerusalém, os cristãos do império romano o fazem por sua vez.

Durante três séculos Pedro e seus sucessores foram hospedados pela caridade, vestidos pela caridade, sustentados pela caridade.

Até hoje, mostram-se ainda, em Roma, as casas, em que os cristãos se julgavam honrados em poder oferecer a sua mesa e hospedagem ao Vigário pobre de Jesus Cristo pobre.

Entretanto, este pobre continuava a obra começada pelo seu divino Mestre:

ele semeia a luz,

Espalha a virtude,

Remodela as almas.

Reforma as famílias.

Transfigura o mundo.

E, um belo dia, o mundo transfigurado, que Pedro tinha baptizado, na água, no espírito de Deus, como o batizara em seu amor, em suas lágrimas e em seu sangue, este mundo reformado, tomado de gratidão e de amor prostrou-se aos pés de Pedro e lhe disse:

Tu és nosso pai; nós somos teus filhos, Não queremos que continues a ser hospedado pela caridade!

E como se vê muitas vezes filhos amorosos, desejando terem perto deles o seu velho pai, construíram-lhe uma casa, no meio de suas propriedades, onde possa viver em paz e com honra, as nações cristãs juntaram-se e deram ao Papa, AO PAI UNIVERSAL, uma cidade como morada: e esta cidade é ROMA.

Oh! protestantes, deixai de blasfemar: Isto é belo; isto é generoso; isto é sublime. O Mestre podia dizer: As raposas têm as suas covas e as aves do céu, os seus ninhos: porém o Filho do Homem não tem onde reclinar a cabeça. (Mt7,20).

Mais tarde, quando se tratou de instituir a sua Eucaristia divina, ele procurou e aceitou um grande Cenáculo, todo ornado. (Lc11,12).

Pedro, no início de sua missão, ao exemplo, de seu divino Mestre, não tinha, nem ouro, nem prata, (At3,6), mas, estabelecendo O CENTRO da Igreja, ele precisava de um lugar apropriado. de uma cidade sua, onde pudesse gozar da liberdade e da tranquilidade necessárias para o governo da Igreja.

E o Cristo inspirou aos príncipes das nações e aos povos que dessem ao Papa a cidade DE ROMA e construíssem ali a CASA DO PAPA, o grande Cenáculo da Verdade Eterna, representada pelo Sucessor de Pedro.

Oh!... isto é belo, é sublime!

É o dedo de Deus!

Os protestantes nunca se lembraram disso, e nunca ofereceram um tal cenáculo a seus chefes, porque sabem que tais chefes nada são e nada representam.


IV. Doação e conquista de Roma

O que completa a beleza desse dom é o modo pelo qual foi feito.

Roma foi dada ao Papa, não em bloco, de só vez, por uma nação, ou por um soberano, mas, sim, sucessivamente, pouco a pouco e POR TODOS.

Ontem foi um terreno, hoje é uma casa.

Amanhã será um palácio.

Depois de amanhã, uma cidade.

Depois uma região.

No fim, um REINO INTEIRO.

Nos arquivos de Roma figuram os atos de muitas destas doações e todos começam mais o menos pelas seguintes palavras: querendo honrar o bem-aventurado Pedro, na pessoa de seu sucessor...

É uma série de testamentos que demonstram admiravelmente a devoção do mundo cristão para com o Vigário de Cristo,

Vieram os bárbaros, invadindo os impérios do Ocidente, e com eles, a pilhagem das cidades, dos campos e o morticínio geral.

O povo romano implora os imperadores de Constantinopla, das Gálias, da Germânia, todos impotentes para defenderem Roma e a Itália.

DOAÇÃO DE veneração.

PROPRIEDADE de conquista, no meio da ruína geral, que avassalava a Europa pela invasão dos bárbaros.

Eis como Roma foi doada ao Papa.

Nada ali foi comprado.

Nada foi pedido.

Nada foi TOMADO.

O Papa recebeu tudo.

Durante longos anos o sucessor de Pedro persistiu na recusa das doações, pedindo auxílio às nações, aos imperadores e aos generais romanos.

Durante mais de um século o Papa governava Roma, sem exército, sem administração civil, nem política, como um simples pai governa a sua casa.

Ele foi levado ao trono, como que pela mão de Deus, mau grado seu, pela piedade entusiasta de uns, pelos brados angustiados dos outros, pela devoção católica de todos.

Qual é a soberania que se reveste de tal caráter, tão isenta de ambição e de vanglória?

Não existe.

E após estes fatos, depois de Roma ter sido dada ao Papa, depois de o Vigário de Jesus Cristo ter cingido a coroa real, como cingira a coroa pontifical, houve uma jovem nação, recentemente batizada, que desembainhando virilmente sua espada gloriosa, exclamou e jurou: enquanto eu viver, Ninguém tocará no trono de Pedro.

Foi a filha primogênita da Igreja: a França de Clóvis e de Carlos Magno.


V. A cidade predestinada

Em tudo isso vê-se claramente o dedo de Deus. Roma é à cidade escolhida entre todas, para ser o centro do governo da Igreja de Jesus Cristo.

E devia ser Roma.

Somente Roma satisfaz a todos os requisitos de um CENTRO MUNDIAL.

Se os homens tivessem podido escolher entre as diferentes cidades do mundo, para eles ser a morada do representante de Deus na terra, após vistas as comparações, vantagens e desvantagens, Roma teria tido a PRIMAZIA.

A Posição geográfica da Itália já é um objeto digno da escolha divina.

A Itália é um país CENTRAL, situado com distancia igual entre o Ocidente e o Oriente, e tocando a todas as praias dos outros países.

Não é uma ilha como Malta... de acesso demasiadamente difícil.

Não está perdida nas profundezas da terra como Paris, Berlim ou Viena.

Deus estendeu-a como PENÍNSULA, no meio dos mares, tendo de um lado o Mediterrâneo, que banha as praias da França, da Espanha, da Africa e do Egito, e do outro, o mar Adriático, que confina com todo o Oriente, pelo estreito dos Dardanelos e pelo mar Negro.

Deitada deste modo, entre dois mares, a Itália tem a cabeça apoiada sobre as altas montanhas que a ligam à França, e a Suíça, à Áustria e, por estes países, à todo o continente europeu.

No mesmo tempo ela conserva os seus pés, banhados pelo mar que a une à África e ao Egito.

Seu flanco esquerdo, dourado pela aurora do dia, abre seus golfos encantadores, desde Veneza até Brindisi, aos navios do Oriente.

O flanco esquerdo, banhado pela luz crepuscular do fim do dia, ostenta com orgulho os incomparáveis golfos de Gênova, de Livornia, de Gaeta e de Nápoles, que chamam os navios do Ocidente.

Nenhuma terra, disse Napoleão, está tão admiravelmente colocada, para ser centro do mundo civilizado.

Nem Jerusalém, Antioquia, Babilônia, Atenas, no mundo antigo, nem Paris, Londres, Berlim, Viena, Madrid, ou Lisboa, no mundo moderno, podem comparar-se com Roma.

Roma é uma cidade PREPARADA POR DEUS para ser a morada de seu representante.

Ele preparou a Posição geográfica, as montanhas que a cercam, o firmamento que a envolve, o sol que faz cintilar o mar, as ondas e o cume de suas montanhas, enquanto a cristandade preparará o PALÁCIO que o Papa ali deve habitar.


VI. São Pedro de Roma

Roma está preparada par ser de São Pedro. O mundo católico, em correspondência

com a vontade de Deus, colocará ali São Pedro de Roma.

Passaram-se 18 séculos, depois que mãos piedosas, despregando São Pedro de sua cruz, sepultaram-no no silêncio do subterrâneo, onde repousa até hoje.

A devoção mundial para com o primeiro Papa, edificou ali uma Igreja, embelezou-a, reformou-a, aperfeiçoou-a, até que pela ousadia de seu plano, suas proporções grandiosas e sua imponente magnificência, ela se tornou o mais belo e mais rico templo do mundo.

É a BASÍLICA de São Pedro, de Roma. No começo, era um simples túmulo, escondido

numa cripta escura, coberta de uma Pequena abóbada de pedra.

No interior ha umas pinturas alusivas.

Uma lâmpada de óleo ilumina a catacumba.

É sob esta abóbada que são sepultados os papas dos três primeiros séculos.

Aparece Constantino Magno, e um de seus primeiros cuidados é retirar este sepulcro glorioso das trevas que o envolvem.

Sem tocar no sarcófago, sem mudá-lo de lugar, o Imperador o faz revestir de bronze de chypres, sobre o qual domina uma cruz de ouro puro.

Acima de uma nova abóbada murada,

Constantino faz levantar à imensa Basílica sustentada por cem colunas, e ornada de mosaicos e de mármores preciosos.

Este sarcófago, que contém o corpo de São Pedro, está pois na base da Igreja, é como seu clemento gerador.

Nunca se tocou nele.

Até hoje ele está como Constantino o fizera.

Ali via-se, no centro, a CONFISSÃO de São Pedro.

Começou-se então a venerar o pequeno trono de madeira, enfeitado de figuras de

ébano, sobre o qual se sentara S. Pedro, para ensinar a doutrina nas catacumbas.

Ali, desde o quinto seculo, vinham os fiéis para beijar o pé da estátua de bronze, antiga estátua de Jupiter capitolino, refundida por ordem de São Leão, na efígie de São Pedro.

Ali, os papas foram sepultados e são sepultados até hoje, estando repleta a cripta subterrânea pelos corpos dos primeiros papas.

E é para aquele lugar que até hoje acorrem todos os romeiros do mundo inteiro, para honrar e invocar o primeiro Papa, S. Pedro.

Carlos Magno, tendo sido coroado imperador por Leão III, na noite de Natal, diante da CONFISSÃO de S. Pedro, como prova de gratidão e devoção para com o príncipe dos apóstolos, resolveu completar a grande obra de seu antecessor na fé e na dignidade: Constantino resolveu fazer construir uma imensa cúpula, pintada de azul e de ouro, e terminada por uma cruz.

Os séculos vão se sucedendo, e chega o século decimo sexto.

Um gênio inigualável, com que suscitado por Deus, para terminar esta grande obra, forma o plano de uma remodelação: É MICHELANGELO, de Toscana, talvez o maior gênio conhecido pela originalidade de suas concepções, e pelo caráter grandioso e sublime de suas obras.

Michelangelo, num lance genial, levanta a cúpula de São Pedro a uma altura em que arte nenhuma se tinha elevado.

São Pedro de Roma é um pequeno mundo, pelas suas dimensões formidáveis e pela riqueza de seus adornos.

Nunca foi e nunca será igualada em arte e majestade.

Tudo é mármore, bronze dourado e mosaico.

Sente-se a majestade e a perpetuidade da Igreja, na imensidade e na glória desta Basílica do Chefe dos apóstolos.


VII. O túmulo e o trono de Pedro

Ao lado de uma das quatro colunas, que sustentam a cúpula, está a antiga estátua de S. Pedro.

É de bronze e de tamanho natural.

Pedro está sentado sobre um assento antigo de mármore branco, sob um baldaquino mosaico vermelho e de ouro.

É a antiga estátua de Júpiter, mandada fundir por São Leão, como já disse acima,

O pé direito do apóstolo está um pouco à frente, de modo a poder ser beijado pelos fiéis.

Depois de ter beijado o pé de São Pedro chega-se diante da CONFISSÃO, ou túmulo do apóstolo.

É aí que repousa, há quase 1.900 anos, é corpo de São Pedro, cercado de glória, de honras, de lágrimas de amor e de ternuras virginais.

Eis onde repousa o pequeno pescador da Galileia, que veio, a perto de 1900 anos, de seu pequeno país, fixar-se em Roma, e que ali morreu amarrado em uma cruz sobre o Janiculo.

Procurai o túmulo de César, de Augusto, de Nero, de Napoleão, e comparai-os!

Na abside da Igreja um novo espetáculo se apresenta.

E a sede de S. Pedro, a sede de madeira em que se sentava o apóstolo ensinando o povo nas Catacumbas.

Hoje, para não estragar a relíquia tão preciosa, ela está envolta num revestimento de bronze, cercado de anjos, encimada por uma pomba que paira sobre ela, e coroada com uma tiara, a sede repousa sobre as mãos dos grandes Doutores da Igreja: Santo Ambrósio e São Crisóstomo, Santo Atanásio e Santo Agostinho.

Estas quatro estátuas de bronze dourado seguram com mão sólida e numa atitude varonil, firme, a sede do primeiro Papa, imagem tocante da grandeza divina desta sede apostólica, apoiada sobre a SANTIDADE, a SABEDORIA, e coroada pela INFALIBILIDADE do espírito Santo.

Diante desta cena inefável, que faz verter lagrimas aos olhos mais secos, e arrancar brados de emoção aos corações mais duros, o romeiro observa instintivamente.

Eis um trono que não pereceu... e que não perecerá.

Em comparação deste trono de madeira simples, humilde, onde está o trono de Augusto?

Onde está o trono de ébano de Nero?

Onde está o trono encrustado de pérola dos Faraós, dos Alexandres, dos Cesares? Que foi feito do trono soberano destes grandes imperadores e generais que esmagavam o mundo?

Tudo desapareceu, tudo foi destruído... nem uma lasca existe ainda... só continua a existir e a ser glorificado o TRONO DE MADEIRA em que se sentava Pedro, no fundo das catacumbas.

Qual é o segredo desta sobrevivência?

Levante os olhos o romeiro e leia o que está escrito na larga banda de mosaico

que acompanha a base da grande cúpula.

Ali resplandecem grandes letras em ouro, de 7 pés de altura: Tu és Pedro, e sobre Pedra edificarei a minha Igreja!

Eis o que conta o imenso edifício de S. Pedro... eis o sentido de toda a sua magnificência!


VIII. Conclusão

Como tudo isso é grande e sublime!

Mais que isso: tudo isso é DIVINO!

Deus preparou Roma para o Papa.

O mundo inteiro preparou a Basílica para ser o templo de S. Pedro.

Roma é de Pedro.

Pedro é de Roma.

E nós católicos, nós nos ufanamos de ser de Roma, pois sendo de Roma, somos de Pedro; sendo de Pedro, somos de Cristo.

Chamando-nos de ROMANISTAS, julgando ofender-nos, os pobres protestantes nos dão o mais glorioso dos títulos; mostram que a nossa fé, sendo baseada sobre Roma, o é sobre Pedro e sobre o Cristo.

Sim, somos romanistas, como somos cristãos. É o mesmo TÍTULO!

É a mesma GRANDEZA!

É a mesma RELIGIÃO!

São Pedro é a morada do Papa.

Ele ali habita, como outrora o grão sacerdote dos judeus habitava o templo.

E ali que, nos dias festivos, ele pontifica solenemente, carregado sobre a sédia, cercado dos embaixadores de todas as nações, seguido de ondas de povo.

É ali também, que ele vai orar em segredo, só, sem aparato, beijando os pés de São Pedro, e ajoelhando-se aos pés da CONFISSÃO, para aí pedir luz e força, nas dificuldades que a Igreja atravessa.

Ali estão os ossos sagrados do primeiro Papa.

Ali repousam os restos mortais de quase todos os papas, sobretudo dos últimos, dos papas das grandes tribulações.


CAPITULO XIV

O Vaticano dos papas

O Vaticano... o tão propalado e misterioso Vaticano... que é um fantasma para os protestantes e uma bandeira de revolta para os comunistas, é a continuação da Basílica de São Pedro.

É a moradia profana do Papa, como a Basílica de S. Pedro é a sua moradia sagrada.

É a casa do Papado, e não simplesmente do Papa. É o palácio DOS PAPAS.

É ali que o Soberano Pontífice recebe os embaixadores de todas as nações.

É ali que ele trata com os bispos católicos dos negócios de Igreja em geral, e de suas dioceses em particular.

É ali que os simples fieis tem, às vezes, a felicidade de ver o representante de Deus, de beijar-lhe as mãos ou os pés, e receber a bênção do sucessor de São Pedro.

O Vaticano é a moradia do Papa, e uma moradia adaptada à vida e às necessidades administrativas do Papa.

Percorramo-la rapidamente. É um edifício material...qual se irradia a espiritualidade nele concentrada.


1. A residência do Papa

O homem faz a sua morada; fazendo-a para si, ou seguindo o plano traçado por ele, grava nesta moradia a sua própria efigie.

Sob este ponto de vista, o Vaticano merece ser estudado.

A grandeza do Papado, o seu poder, a simplicidade de sua vida, a elevação e a nobreza, de seus gestos, o amor do belo e da arte aparecem ali, a cada passo, e fazem do Vaticano um palácio ÚNICO no mundo.

A designação de Vaticano provém dos romanos, porque, antes de Jesus Cristo, havia neste logar uma casa de oráculos, de vaticínios de predições feitas por qualquer Sibila, com encontramos nos tempos antigos.

De Vaticinium foi feito VATICANUM.

É provável que, desde os primeiros tempos o Papa fixou ali sua residencia.

São Leão III (em 800) recebeu ali o imperador Carlos Magno.

Foi ao voltarem de Avinhão, que os papas começaram as imensas construções que existem até hoje, e que foram impostas pela necessidade de hospedar os cardeais, os bispos, e todos es auxiliares do Papa, no governo da Igreja.

Se a Basílica de São Pedro é o maior templo do universo, o Vaticano é o maior palácio do mundo.

A sua frente não mede menos de 250 metros.

Há nele 13.000 quartos com 20 pátios, 200 escadarias de serviço que dão acesso aos quartos, e 8 escadarias de honra.

É um pequeno mundo, mas que tem a sua utilidade, e até a sua NECESSIDADE nas grandes reuniões dos cardeais e bispos que vão tratar dos negócios da Igreja.

O Vaticano é a obra dos maiores e mais habilitados arquitetos, que ali trabalharam durante 400 anos.

Foi o papa Nicolau que foi o poderoso iniciador deste grandioso empreendimento.

Em 1447, ele fez executar por Bernardo Rossellini um plano geral do imenso edifício.

No Ano seguinte Alberti começou a obra e executou uma pequena parte do conjunto, cercada de altas muralhas, que foram destruídas mais tarde.

Em 1473, Baccio Pintelli, juntou-lhe a Capela Sistina.

Em 1506, Bramante começou as construções em redor do pátio São Dâmaso, podendo apenas terminar o rez de chão.

Em 1508, Rafael, sobre este rez de chão, levantou três andares de galerias superpostas, mas ele também morreu antes de terminar a sua obra; terminou apenas uma das três partes de que é composto o edifício.

As duas outras partes foram terminadas pelo Papa Gregório XIII.

Em 1546, São Gallo construiu a Capela Paulina e a sala real que lhe serve de vestíbulo, assim como a Capela Sixtina.

Em 1660, emfim, Bernini faz a escadaria real, por onde desce o Papa, nas festas solenes, para a Basílica de São Pedro.

Eis uma das principais construções; muitas outras foram construídas depois, pouco a pouco, conforme as necessidades.

Sob o reinado de Clemente XII, Pio VI é, Pio VII por exemplo, foram construídos os grandes Museus, que são a admiração do mundo.

 

II. As pinturas do Vaticano...

Ao mesmo tempo que os maiores arquitetos exerciam ali o seu gênio, os maiores pintores vinham sucessivamente decorar o palácio dos papas.

O Papa Nicolau V chamou o bem-aventurado Frei João Fiesole, chamado Angélico, por causa da grande pureza de sua alma é de suas pinturas, e o encarregou de pintar os afrescos de, sua capela.

Angélico trazia já na fronte a dupla auréola de grande santo e pintor incomparável.

Os afrescos pintados por ele, e que cobrem as paredes da capela, representam a vida de Santo Estevão e de S. Lourenço.

É difícil imaginar grupos compostos com mais arte, personagens, vestidas com mais nobreza e elegância, e rostos com mais suavidade e inocência.

Há, nestes quadros de arte pura, uma expressão celeste que encanta e deslumbra.

Pouco depois, em 1503, Pio III mandou vir o Perugino, o príncipe e chefe da escola umbriana, mestre de Rafael.

Perugino pintou diversas salas do Vaticano.

Um outro artista, Domenico Ghirlandajo, chegava quase ao mesmo tempo que Perugino e cobria com pinturas admiráveis o coro de Santa Maria Novela, onde representou a história de S. João batista e da Sma. Virgem com uma grandeza e uma simplicidade de estilo, uma beleza de colorido e expressão de rosto, que encantam e sobrepujam todas as obras da- quelia época.

Deve-se juntar a estes dois grandes artistas Pinturricchio, imitador e amigo de Perugino.

Pio III encarregou-o de pintar, em afrescos, os muros de Santa Maria do Povo, que são a sua mais bela obra prima.

Luca Signorelli é o autor do grande afresco do “Juízo final” na Catedral de Orvieto, tão notável pela beleza da expressão, e que excitava a admiração do próprio Miguel Angelo.

Boticelli distinguiu-se pela beleza delicada e sofredora de suas virgens e seus santos.

Seguiram-se ainda Filippino Lippi, Antonio Razzi e outros artistas de renome e de extraordinária capacidade.

Diversos entre estes grandes artistas trabalhavam ali juntos, quando o Papa Julio II encontrou em Perusa um jovem artista, cujos esboços excitaram a admiração universal.

Era Rafael... tinha apenas 27 anos de idade e já havia, produzido obras-primas que ultrapassaram tudo o que se havia visto até aí.

O Papa confiou-lhe, em 1511, um salão e ali fez pintar a contemplação e a adoração do SS. Sacramento.

O jovem artista terminou em poucos meses o afresco imenso onde figuram 65 personagens, santos do céu, papas, bispos, religiosos da terra, unindo-se numa mesma adoração.

À vista desta obra poderosa, um longo e piedoso brado de admiração levantou-se no Vaticano.

O Papa Julio II, ao contemplar esta obra prima, encarregou Rafael de pintar todos os apartamentos do Vaticano.

Nesta mesma época, igualmente chamado pelo Papa, chegou ao Vaticano um outro artista incomparável: Miguel Angelo, que foi encarregado das abóbadas da Capela Sixtina.

Rafael e Michelangelo são dois gênios sublimes, mas de natureza absolutamente oposta.

O primeiro é um improvisador sublime; o segundo, um trabalhador pertinaz e nunca satisfeito de sua obra.

Rafael, com uma facilidade extrema, quase brincando, acabava as obras mais perfeitas, enquanto Michelangelo mudava, retocava, sem chegar a realizar o seu ideal.

Rafael, feliz, sorridente, morreu com 37 anos, na beleza de sua mocidade e na plenitude de seu gênio.

Michelangelo apagou-se, após uma interminável velhice, triste, ferido pelas dores de sua pátria.

A grande obra de Michelangelo, que só foi terminada após a morte do Papa Julio II, é a cúpula da Capela Sixtina, toda cheia de cenas bíblicas, de poderosa interpretação artística.


III. Museus e Biblioteca

A obra artística do Vaticano, como arquitetura e como pintura, é insuperável, e ficará para sempre, como um museu de arte, onde os grandes mestres irão haurir a inspiração para as suas obras.

E estas não são as únicas maravilhas do Vaticano; há uma outra que, se não supera as primeiras, iguala-as pelo menos. É a magnífica coleção de estátuas antigas.

Esta coleção, começada pelo Papa Julio II e Leão X, foi completada por Clemente VII e Paulo III, e emfim esplendidamente instalada por Clemente XIV, Pio VI e Pio VII.

Foi Clemente XIV quem construiu o pátio do Belvederio com os seus QUATRO MUSEUS nos ângulos, tão bem dispostos para uma contemplação silenciosa das obras primas neles encerradas.

Foi Pio VI quem construiu as grandes salas das Musas, dos Bustos, da Bigue, etc., etc, e que as enriqueceu com 2,000 estátuas.

Foi Pio VII quem terminou esta magnifica, instalação, pela construção de uma nova ala de incomparável grandeza.

Mas o que sobrepuja tudo é a extensão das salas, é a sua disposição artística, é a quantidade e o valor das obras artísticas que ali figuram.

O espírito fica confundido com o numero e a beleza das obras ali expostas.

É sem duvida, diz Taine, o maior tesouro de escultura antiga que existe no mundo.

O museu do Vaticano, diz Ampére, é o primeiro do mundo, e o que inclui o maior número de obras primas antigas.

Notemos que há vários museus, todos igualmente extensos e ricos pelo seu conteúdo: há o Museu ETRUSCO, o Museu EGÍPCIO, o Museu PROFANO, o Museu SACRO, o gabinete dos PAPIROS, a vasta galeria das INSCRIÇÕES pagãs e cristãs, etc., etc.

A Biblioteca é outra maravilha que se deve assinalar.

O fundador da BIBLIOTECA Vaticana foi o Papa Nicolau V, que chegou a reunir 9,000 manuscritos.

Sisto V construiu o edifício atual, em 1588.

Em poucos anos, pelo esforço dos papas, a Biblioteca conquistou o primeiro lugar entre as congêneres.

Aqui também foi afastada a vulgaridade.

Os bibliotecários tomaram a peito adquirir e conservar o que havia de mais raro e de mais precioso.

Chegou-se a 23.570 manuscritos, tanto orientais como gregos e latinos, todos de primeira ordem.

O número dos impressos é mais ou menos de uns 60.000 volumes, mas todos obras e coleções de grande valor.

É ali também que se encontra a mais bela e mais completa coleção de incunábulos ou obras impressas, no século em que foi descoberta a imprensa.


IV. Grandeza e humildade

Tal é o Vaticano, o palácio glorioso do mais, glorioso dos soberanos.

Neste palácio imenso o Papa ocupa apenas uns quartos, os mais modestos de todos,

Chateaubriand, tendo feito uma visita ao Santo Padre, escreveu: “Gregório XVI recebeu-me em um pequeno quarto, estreito, sentado diante de uma mesa, encimada por um grande crucifixo. Mostrou-me que lia: “O Gênio do cristianismo”, pois tinha um volume aberto sobre a sua mesa. É impossível imaginar-se um homem mais bondoso, um prelado mais digno e um príncipe mais simples”.

“Vi Pio IX, como vi Leão XIII, escreve num prelado francês, e esta simplicidade na grandeza e esta pobreza em meio de tamanhos tesouros dados ao mundo, à arte a à ciência, imprimiram em minha alma a fisionomia do papado, tal qual a minha fé a compreendia, como a queria encontrar o meu coração.” (Mgr. Bougaud).

O Papa reside em um palácio, enquanto Cristo não teve onde reclinar a cabeça, bradam os protestantes, procurando rebaixar majestade do Pontífice Romano.

Sim, perfeitamente; o Papa reside num palácio, e deve residir no palácio mais belo do mundo, porque é o representante da mais alta autoridade deste e do outro mundo.

Jesus Cristo era pobre: o Papa o é igualmente... pobre como o Cristo, pois o palácio que habita não é dele, como pessoa civil, não é do Papa, é do Papado, como as Tuilerias de Paris, e o Catete do Rio de Janeiro não são do presidente destas nações, mas sim da Presidência.

Os presidentes ali residem. sucedem-se, vêm e desaparecem sem levar ou vender o palácio que habitam.

Os papas sucedem-se, vêm e desaparecem também, sem levar ou sem vender o Vaticano que habitam, mas que não lhes pertence.

E quereriam os inimigos da religião, que o REPRESENTANTE DE DEUS na terra habitasse uma miserável choupana ou qualquer mansarda em ruínas?

Mas porque negam eles ao Papa um direito que concedem a qualquer comerciante?

O Papa, como sacerdote, como bispo, e muitas vezes como homem de sociedade, pois muitos dentre eles são da nobreza, merece um palácio, e não o mereceria como bispo dos bispos, como pai da cristandade, como delegado de Cristo?

Por favor, calai-vos, blasfemadores!

Se o representante do Brasil, em qualquer nação, habitasse uma choupana e andasse mal trajado, o Brasil inteiro se sentiria ofendido, porque o tal representante não representaria a dignidade, o brio e a honra dos brasileiros. E quereriam que o representante de Deus fosse um pobre, um homem mal trajado, mal hospedado... ah! então... o mundo inteiro indignado deveria revoltar-se, pois um tal Papa não responderia nem à DIGNIDADE de Deus, nem aos SENTIMENTOS do mundo católico.

Seria um absurdo!

O Papa deve ser digno da grandeza de Deus, da bondade de Jesus Cristo e do brio religioso de seus milhões de súditos.

E para isso deve apresentar-se na majestade de seu CARGO, na humildade de sua VIRTUDE, e na pobreza de sua PESSOA.

Tal é o Papa... grande, sublime, bondoso, mas pobre no meio desta grandeza como ele é bondoso no meio de sua solicitude que abrange o mundo.


V. O poder temporal do Papa

Uma última questão se nos apresenta.

O Papa é o Pai do mundo, como Jesus Cristo, à quem representa, é Pai do universo.

Tu, Domine Pater noster, redemptor noste, podemos dizer do Papa, como o dizemos do Salvador. (Is63,16).

E, como o profeta Malaquias, o Papa podia perguntar-nos:

Si ergo pater ego sum, ubi est honor meus? (Ml1,6).

Tu és o Senhor, nosso pai, e o Salvador do mundo!

Mas se eu sou pai, onde está a honra com que me cercais?

E o mundo responderia: Tu és Rei, pela vontade da cristandade, como és Pai pela vontade divina.

Daí nasceu o poder temporal do Papa.

Jesus, estando diante de Pilatos, disse: O meu reino não é deste mundo.

Muitas pessoas interpretam estas palavras em sentido errado.

Jesus diz: o meu reino NÃO É DESTE mundo; mas não diz: o meu reino NÃO É NESTE mundo.

O sentido é todo diferente.

“Regnum meum non est de hoc mundo”, significa que o reino que Jesus Cristo possui não lhe é dado pelo mundo, mas por seu Pai.

É um reino diferente do de César.

O reino de César é deste mundo; e Me é dado pelo mundo.

O reino de Cristo é NESTE mundo, mas não lhe é dado pelo mundo; é um reino celeste, divino, independente dos poderes dos homens.

E este reino que é neste mundo, mas não deste mundo, é a Igreja.

É este o reino que, como Rei Supremo e Pai do Universo, Jesus Cristo entregou a seu representantes, a Pedro e a todos os papas, seus sucessores.

Este reino não é deste mundo, mas está NESTE mundo.

É um reino... e Jesus Cristo é Rei.

Logo, tu és Rei? — perguntou Pilatos.

E Jesus respondeu:

Tu o dizes, eu sou rei. (Jo16,37).

Ora, todo reino, para merecer este nome, deve ter a independência, senão é um feudo, uma colônia.

Se a Igreja católica, fundada por Jesus Cristo, é um reino, e se Jesus Cristo é Rei, o Papa, seu representante, deve ser igualmente REI, deve poder governar o reino que lhe é confiado, e governá-lo com liberdade e independência.

Ora, mesmo para governar a Igreja na ordem espiritual, é preciso que o Papa tenha LIBERDADE SOCIAL, uma independência material, senão ele dependeria da vontade e capricho dos outros, e não poderia mais administrar a Igreja católica mundial.

O poder temporal é uma garantia do poder espiritual.

O Salvador afirma que o seu reino vem de Deus. — Não o ordena, mas também não proíbe que este reino seja garantido por um PODER TEMPORAL que lhe assegure a inteira independência.

O poder temporal do Papa não se confunde com a realeza espiritual, como o hábito não se confunde com a pessoa que dele se reveste.

Os papas receberam, desde o triunfo do Cristianismo, um poder temporal, porque assim o exigiu o livre exercício de seu ministério pontifical.

Durante os primeiros séculos eles não possuíam este poder temporal; também os 52 primeiros foram martirizados.

Nesta época das perseguições os papas dependiam dos imperadores romanos que os trataram e maltrataram, segundo os seus caprichos, exilando-os, lançando-os ao fundo do cárcere, quando o Pontífice recusava fazer-se o seu cortesão.

Pepino e Carlos Magno, grandes príncipes e grandes cristãos, acabaram com esta situação intolerável e tiveram a honra, em 800, — faz, pois, desde então mais de mil anos - de serem os instrumentos da providência divina para darem à Sede de Pedro a paz e a liberdade, sem as quais é impossível governar a Igreja.


VI. Conclusão

O simples bom senso nos dita que o Papa deve ser independente, completamente livre, para poder governar com justiça o mundo católico.

Desde que o Papa não possua mais um estado temporal para garantir a sua independência, ele há de ser necessariamente súdito do príncipe, a quem pertencer a cidade de Roma da qual o Papa é sempre o Bispo.

O Papa será, deste modo, piemontês, ou francês, napolitano ou austríaco, alemão ou inglês.

Quem não compreende as mil inconveniências de uma tal situação para o exercício de seu seu poder espiritual?

Não falando das influências e das pressões ocultas do soberano de Roma, este poderia em um dado momento suprimir a correspondência do Papa com o episcopado, interceptar suas encíclicas e bulas, reduzindo-o, deste modo, silêncio, e até impedindo a reunião de um Concílio.

Neste estado, os fiéis, os bispos e os soberanos de outras nações estariam necessariamente numa perpétua e legítima suspeita quanto aos atos emanados de um Pontífice sujeito a um príncipe estranho.

E que aconteceria, sei o tal príncipe fosse um inimigo politico?

Que seria se fosse um herege? um perseguidor?

E não tomaria as necessárias medidas, este príncipe e senhor de Roma, de modo a fazer nomear um Papa de sua nação e de sua política?

Não seria isso arruinar a confiança do mundo católico e político?

Não é o que aconteceu após a invasão de Roma pelos Garibaldinos, até ao contrato de Mussolini com a Santa Sé, cedendo-lhe de novo a cidade de Roma com plena e inteira liberdade de ação?...

E Roma, a própria Roma, a capital espiritual do mundo... da qual o Papa é necessariamente o pastor e o guarda, como ficaria preservada da invasão da heresia, da imprensa imunda, da corrupção dos costumes, dos escândalos públicos e das instituições destrutoras da fé, se o Papa não fosse Senhor e Rei desta cidade?

É preciso, pois, que o Papa possua um reino temporal. É uma necessidade: o próprio Napoleão a reconheceu.

“A autoridade do Papa, dizia ele, não seria tão forte como é, se ele residisse num país que não lhe pertencesse, e estivesse sob o domínio de um poder de estado estranho.

O Papa não está em Paris; e é um bem.

Nós veneramos a sua autoridade espiritual exatamente porque ele não reside, nem em Madri, nem em Viena.

Em Viena e em Madri, diz-se a mesma coisa.

É um bem para todos que ele não residir nem entre nós, nem entre os nossos inimigos mas, sim, na Roma antiga, longe dos imperadores germanos e longe dos reis franceses e espanhóis; conservando o braço da balança em linha horizontal entre os soberanos católicos, inclinando-se um pouco para o lado do mais forte, mas levantando-se acima dele, quando este se torna perseguidor.

É a obra dos séculos; e a fizeram muito bem!

É a instituição mais sabia e mais vantajosa que se possa imaginar no governo das almas”. São palavras geniais deste gênio que chama Napoleão, que tinha como que a intuição das obras grandes e sólidas.

E é esta obra que Napoleão III e Victor Emanuel, ajudados pela Prússia e pelos revolucionários Garibaldinos, destruíram em 1870 mas que felizmente o grande Papa Pio XI e Mussolini restabeleceram definitivamente em 1930.

Hoje o Papa é de novo o Rei de Roma...

É o estado menor do mundo; mas este estado dá a liberdade e a independência ao maior Rei do universo.

Jesus Cristo é Rei.

O seu representante o é pelo mesmo título.

É o reino do rochedo indestrutível da Igreja.

E este reino nunca terá fim, porque este rochedo é eterno!


CAPÍTULO XV

O Cristo, o Papa e Maria

Após termos percorrido a história, triste mas consoladora, sangrenta e gloriosa, humana e divina do Papado, devemos tirar umas conclusões que se impõem pelo peso de seu valor e pela extensão de suas consequências.

Como provei nos capítulos precedentes, O Cristo, O PAPA E A Igreja é a sublime, Trindade que perpetua no mundo a grande fundação divina do Salvador.

É uma escada luminosa, cujos pés se apoiam sobre a terra e cujo topo vai perder-se na glória eterna.

Nunca se deviam separar estes três elementos constitutivos da obra redentora.

O Cristo é a cabeça do Papa, como o Papa é a cabeça da Igreja — Ipse (Eilius) est put corporis Ecelesiae, (Cl1,18).

A Igreja é a pupila dos olhos do Papa, como o Papa é a pupila dos olhos de Jesus Cristo: — Quasi pupillam oculi tui. (Pv7,2).


Insultar a Igreja, — é insultar o Papa, é insultar o Cristo.

Amar a Igreja, — é amar o Papa, é amar Jesus Cristo.

É uma Trindade inseparável!

O Cristo, sem o Papa, não seria o REI DOS séculos.

O Papa, sem o Cristo, não seria INFALÍVEL.

A Igreja, sem o Papa, seria um CORPO SEM CABEÇA.

O Papa, sem a Igreja, seria uma CABEÇA SEM CORPO.

Embora estas três entidades sejam realmente distintas, constituem, entretanto, uma ENTIDADE MORAL perfeita, coesa, inseparável, e esta entidade é a Igreja.

Procuremos penetrar e compreender a UNIDADE divina da Igreja, assim como o lugar particular que o Papa ocupa nesta unidade: — será a digna e sublime conclusão deste trabalho.


I. O Cristo no mundo

Jesus veio a este mundo, para salvá-lo, pelo sacrifício do calvário, e perpetuar a sua presença no meio dos homens.

É o resumo da Redenção.

Memoriam fecit mirabilium suorum. (Sl,110,49)

Mas Jesus Cristo, imolando-se e permanecendo no meio dos homens, não podia dar-se pela metade, mas devia ficar na terra, através dos séculos, tal qual Ele passou na terra durante a sua vida mortal.

São os dois infalíveis mistérios da encarnação e da redenção continuados através dos séculos.

Num estudo sobre a invocação Nossa Senhora do SS. Sacramento, no primeiro capítulo, como ponto de doutrina inicial, tratei a relação íntima e inseparável que existe entre a eucaristia, a Virgem Santíssima e o Papa, e mostrei que estes três mistérios, unidos, formam a personalidade perfeita e completa de Jesus Cristo no mundo.

Ao terminar este trabalho, como síntese doutrinal, devo citar este mesmo capítulo e mostrar a relação divina que existe entre o Papa, a Eucaristia e a Virgem Imaculada. (1).

Esta união salienta melhor a grandeza do Papa na Igreja, como destaca a fonte de toda grandeza, a divina Eucaristia, e o canal desta grandeza, a Virgem Sma.

A Eucaristia, sendo a pessoa divina de Jesus Cristo, é o CENTRO de tudo.

(1) Cf. Nosso livro: Maria e a Eucaristia, obra teológica que estuda a fundo as relações entre Maria e a Eucaristia.

É aí que devemos estudá-lo, e cercá-lo do que divinamente o completa, para reconstituir o Jesus de outrora, o Jesus de Belém, de Nazaré, de Jerusalém, da Galileia, do Calvário, em outros termos, o Jesus comunicando aos homens FORÇA, LUZ E AMOR.

É um estudo interessante que, penetrando fundo os mistérios, neles descobre a unidade perfeita da obra de Deus.


II. Um Cristo morto

A Eucaristia é o prolongamento da Encarnação, não somente NO MODO DE SER, mas também no MODO DE OPERAR, e NO FIM que se propõe nesta operação.

Porque Jesus Cristo se fez homem?

Para poder sofrer, morrer pelos homens e salvá-los. Para ensinar-lhes a verdade. Para trazer-lhes o amor.

Tríplice razão, simples e fecunda de ensinamentos. O amor é o móvel divino de tudo: Sic enim Deus ditexit mundum. (Jo3,16).

Encarnou-se por amor, imolou-se por amor. (Gl,2,20). Dar-se-á em alimento, por amor. (Jo,6,56). Será a luz de todo homem, por amor. (Jo1,9).

Como em sua Encarnação, Jesus Cristo, na Eucaristia, deve ser: ALIMENTO, LUZ E AMOR. ele deve continuar este prolongamento da Encarnação, alimentando a nossa alma, iluminando o nosso espírito, acendendo em nossos corações as chamas do amor. Não disse ele, de fato, que vinha trazer o fogo à terra, e que o seu desejo era que ele se acendesse em todos os corações? — Ignem veni mittere in terram. (Lc11,49). E Tal é a obra de Jesus na Eucaristia. Assim deve ser. O contrário seria um contrassenso. Então Jesus Cristo teria vindo a este mundo, os judeus teriam tido a felicidade de vê-lo, de ouvi-lo, eles, judeus endurecidos e ingratos, e nós, que chegamos 19 séculos depois, não teríamos mais senão a lembrança deste Jesus?

Não poderemos então vê-lo, ouvi-lo, tocá-lo, sentir o calor de seu coração e o ardor de suas palavras?

Ele teria falado, e sua palavra chegaria até nós através das brumas de dezenove séculos?

Ele teria amado tão ternamente os seus apóstolos, os arrependidos, os sofredores, e o calor do seu coração não chegaria até nós senão através da frieza de dezenove séculos?

O povo, nas estradas da Palestina, nas areias do deserto e á beira dos lagos, teria beijado os seus pés, suas vestes, e até os traços de suas pisadas; e nós, que vivemos longe da Palestina e longe desses tempos remotos, não poderíamos mais encontrar nem sequer um objeto que ele teria tocado, para beijá-lo e apertá-lo contra o nosso coração?

Oh! não! É impossível! Isto seria cruel, isto seria injusto! Emfim, por pobre que sejamos, o nosso desejo de vê-lo, de ouvi-lo e tocá-lo, bem vale o ardor e as aspirações dos judeus, que o cercavam.

Não! não! É impossível... Isto seria um Cristo MORTO, um Cristo sepultado, um Cristo esquecido!

O meu coração protesta, como protesta o mundo inteiro.

O que quero é um Cristo vivo, um Cristo que ama, um Cristo que fala! — Um Cristo escondido, se quiserem, mas visível de qualquer modo.

Se isto fosse impossível, Jesus Cristo teria mentido.

Porque disse ele então: Não vos deixarei órfãos — non relinquan vos orphanos? (Jo14,18).

Porque, então ele exclamou com tanto ardor: Eu amarei a quem me ama? Qui diligit me... el ego diligam eum. (Jo14,21).

— Oh! não! é impossível que isso não seja verdade; sendo-o, nós temos direito a um Jesus Cristo vivo, amante, cujo olhar nos converta como converteu a Pedro, e cuja voz nos ensine, como ensinava às multidões de outrora.


III. Onde está o Cristo completo?

Onde estás, ó grande Deus, ó Deus amoroso? — Magister, ubi habitas?

Será possível que Deus habita com os homens sobre a terra? (2,Paral.VI,18).

ele está na divina Eucaristia. É aí que, ele nos chama.

Magister adest et vocal tel, dizia Marta a Madalena, e assim repete a Igreja a cada um de nós. Entro num templo católico: Vejo ali um altar, um tabernáculo dourado, humilde; porém, o silêncio que o cerca e a pequena lâmpada acesa dão-nos quase a impressão de um quarto fúnebre... se alguém fala, é com voz baixa e abafada; tudo é solene...

O Tabernáculo toma o aspecto de um sepulcro; os panos sagrados parecem-se com lençóis fúnebres, e o próprio sacerdote, digno, venerando, de olhos baixos, parece estar perto de um ataúde, onde jaz um defunto. E no meio, deste silêncio impressionante a Igreja repete o seu convite, que se encontra, muitas vezes, bordado no antependium do altar: — Magister adest et vocat te. — O Mestre está ai e te chama. (Jo,11,28).

Olho para o Tabernáculo; o sacerdote apresenta-me uma Hóstia branca e de seus lábios trêmulos caem estas palavras: Ecce agnus Dei = Eis o cordeiro de Deus, eis aquele que perdoa os pecados do mundo: (Jo1,29).

Sinto a minha alma comover-se.

Oh! sim, eu preciso de perdão; a minha alma soluça aos pés do divino Misericordioso. Mas não basta! O perdão apaga o passado e quem me garante O FUTURO?... Preciso de força, de coragem, de anelo!

Há uma metade de ti, meu Deus, que procuro aqui e que não encontro neste Tabernáculo mudo, onde tu não falas e onde não sinto o teu amor!...

E o sacerdote continua estendendo-me, de mão trêmula, a hóstia divina: Corpus Domini… que o corpo de Jesus Cristo conserve a tua alma para a vida eterna. (Liturg.)

Oh! promessa e realidade divinas! A minha alma perdoada e fortalecida adquire o direito à aliança divina — Quem come deste pão viverá eternamente. (Jo6,59).

Como tudo isso é divinamente belo! Mas não estou satisfeito ainda.

Fixo meu olhar ardente e prolongado sobre a Hóstia Santa como para penetrar através do véu misterioso, que esconde o meu Deus e parece-me que há um Jesus Cristo que não está aí.

É Jesus... É Ele... é certo. — Ego sum… mas o Jesus do Tabernáculo está mudo, não fala.

Ó Jesus, onde está a tua palavra? Porque não a conservaste através do véu que te encobre?

É isso verdadeiramente prolongar a tua Encarnação, o ficar mudo entre nós?

E não somente Jesus NÃO FALA no altar, mas ele aí NÃO GOVERNA; alimenta as almas, mas não as dirige, Falta-lhe o seu sagrado ministério, espiritual, como lhe falta a palavra.

Ó Jesus, que fizeste do teu báculo de pastor? — Ego sum bonus pastor, e porque, ficando entre nós, deixaste a metade de ti?

E, continuando a examinar o Sacramento eucarístico, acho a Hóstia Sagrada tão Fria, tão insensível! Porque, ó grande Deus, não está ela cercada de um nimbo de luz? Porque não se irradia dela uma chama de amor?

Ó Jesus, não é a Eucaristia o mistério do amor? Cum dilezisset suos... (Jo12,1) Onde escondeste este amor?

Ó Jesus, encontro aqui no teu Tabernáculo apenas uma metade do Jesus que a minha fé procura, que a minha esperança implora e que meu amor adora e quer apertar contra o peito.

E como é grande a metade que falta! eu, poderia quase dizer que é a mais importante,

Este Jesus que percorria as cidades da Galileia, ensinando publica e infalivelmente a todos, onde está Ele?

Esta palavra infalível que, só, é capaz de impedir as almas de serem flutuantes e levadas ao sabor de todo o vento de doutrina; (Ef4,14) esta autoridade e esta jurisdição, sem as quais nos parecemos como ovelhas sem pastor, (Mt9,36), onde estão elas?

E este amor tão doce e tão suave, que converteu a Madalena, que fez soluçar São Pedro, que atraiu as multidões, que prostrava os pecadores e que fazia dizerem os próprios fariseus: Vejam como ele o amava; (Jo11,36), onde está este Jesus? Onde está este coração que se comovia, que chorava e que murmurava palavras tão doces aos ouvidos daqueles que sofriam: Mulier, noli flere (Lc7,13); onde está tudo isto, ó Jesus?

É certo, Jesus Cristo é tudo isto na Eucaristia; mas ele está ali como Deus; mas, como homem Deus, parece estar incompleto... ter dividido estes atributos, entretanto essenciais.

A Eucaristia é UM VÉU, bem o sei, mas o véu é transparente, e se Ele não me permite penetrar até o fundo do mistério, ele deixa-me entrever, entretanto, Jesus completo.

O mistério veda-me a porta do COMO ISSO SE FAZ, mas permite-me a entrada no objeto que ele esconde, e este objeto é Jesus, é sua palavra, é o seu amor.

A minha fé mostra-me a pessoa de Jesus escondido: creio, Senhor... és tu mesmo; e adoro de joelhos, mas quero ouvir tua palavra, quero sentir o calor de teu coração, quero como que sentir o beijo dos teus lábios divinos.

O véu esconde-me a tua PESSOA. E a tua PALAVRA onde está? E onde refulge o teu AMOR?

Ó véus, rasgai-vos!... Como o véu do Templo, na hora do sacrifício do Calvário, rasgai-vos, de alto a baixo, e deixai-me ver!

“Santo dos Santos”, o Jesus de minha fé, minha esperança, de meu amor, o Jesus completo. Et velum templi scissum est medium. (Lc21,45).


IV. Os três véus misteriosos

São três mistérios!

Sem dúvida, Jesus Cristo teria podido perpetuar e universalizar sua presença real num único mistério. Não o quis. Porque?

Há muitas razões, e por isso necessário seria escrever um livro para expô-las; reservemo-las para mais tarde, Não o quis; é o bastante: Dominus est.

Preferiu esconder-se sob este tríplice véu.

Para satisfazer a inclinação do coração que aspira a não se separar daqueles que ama, ele

constituiu para si uma TRÍPLICE PRESENÇA entre nós, todas três completamente distintas, embora inseparáveis. Talvez seja uma imagem da SS. Trindade: o Pai, o Filho, o espírito Santo, isto é, poder, luz e amor: todos três inefáveis e que, unidos, constituem a extensão total da Encarnação, a sua irradiação perfeita através do tempo e do espaço!

Mistério admirável dos três véus, sob os quais Jesus Cristo se esconde!

Tríplice eixo, que serve como base a todo o Cristianismo! Quem me dera compreender- vos, para mais amar aquele que escondeis!

E quais são estes três véus admiráveis? O vosso coração tê-los-á nomeado, antes que a minha pena os pudesse escrever!

O primeiro véu são as espécies sacramentais, são as aparências da Hóstia, que encobrem a Pessoa divina de Jesus Cristo.

O segundo véu é o PAPADO, é o Pontífice infalível de Roma, que encobre a voz infalível de Jesus Cristo.

O terceiro véu é a SMA. VIRGEM MARIA, é o coração da Virgem e da Mãe, medianeira universal de todas as graças, que encobre o amor infinito de Jesus Cristo para com os homens.

É o Cristo completo... é o Cristo, não simplesmente vivo, mas o Cristo que fala, o Cristo que ama, o Cristo que salva o mundo, derramando sobre ele os tesouros de sua misericórdia.

É Deus comnosco: Vocabunt nomen ejus Emmanuel... nobiscum Deus.

É o Cristo ALIMENTO, LUZ e AMOR, É o Pai Eterno que cria, é o Filho que resgata, é o espírito Santo que santifica.

É a continuação da Encarnação: Et incarnatus est de Spiritu Sancto, ex Maria Virgine (Symbolo).


V. Comunhão — Papa — Virgem Maria

Eis três coisas que pareciam, à primeira vista, completamente distintas, quase opostas, e que podemos — digo melhor — devemos unir num mesmo amplexo de amor, porque o próprio Deus as uniu inseparavelmente.

A Comunhão, o Papa, a Virgem Maria.

É um único mistério; são três faces do mesmo mistério; são TRÊS VÉUS que nos escondem o mesmo Jesus Cristo.

Quão pouco conhecida é esta verdade!

Parece quase uma novidade, e é uma instituição divina!

São três dogmas de fé, que se unem, que se completam, que se explicam um pelo outro:

A presença REAL e substancial de Jesus Cristo no Sacramento do Altar, — a presença infalível de Jesus Cristo no Papa, — a presença amorosa de Jesus Cristo na Sma. Virgem Maria, como Mãe de Deus e Medianeira de todas as graças.

A terceira presença, referindo-se à MEDIAÇÃO UNIVERSAL da Sma. Virgem, é uma verdade certa, embora não seja ainda dogma de fé.

É o mesmo Jesus Cristo, considerado em sua PESSOA divina, em sua PALAVRA, em seu AMOR. A Virgem Santa é Mãe de Jesus e distribuidora de suas graças, passando todas as suas graças POR ela.

Ora, a graça é uma participação à natureza divina: — divinae consortes naturae. (2Pd1,4), é toda a graça sendo uma comunicação do amor divino, e este amor passando pela Sma. Virgem, podemos dizer que ela é a representação e o canal do amor divino.

Ela não é a FONTE do amor, como o Papa não é a fonte da verdade; tudo vem de Jesus, enquanto Maria Sma. é o canal deste AMOR, o Papa é o canal da VERDADE. Ambos estão ligados à fonte, que é Jesus Cristo.

Jesus Sacramentado, em seus acidentes, não fala, não ama. O pão não é para isso, é um alimento. A sua pessoa divina, escondida no mistério do Altar, é a fonte de tudo; e desta fonte ele derrama sobre as almas: força, pela Comunhão; luz, pelo Santo Padre, o Papai; amor, ou graça, pela Sma. Virgem.

Adorável mistério de União! A Hóstia é o véu que encobre a sua pessoa divina. O Papa o véu que esconde a sua infalível verdade, Maria Sma, é o véu que nos transmite o seu amor.


VI. União inseparável

Continuemos a perscrutar o mesmo mistério, e chegaremos a conclusões teológicas, de uma exatidão rigorosa, por todos aceitas, mé que poucos compreendem, por não lhes conhecerem a base doutrinal.

Começamos a conhecer a Jesus Cristo Sacramentado, mas não conhecemos bastante a doutrina que faz o Papa nem a que faz a mãe de Deus.

São três faróis, mas o foco luminoso é um só: Jesus Cristo: é Jesus Cristo dando-nos o seu corpo e a sua alma como alimento das almas, pela Comunhão; dando a sua doutrina, pelo Papa; dando as suas graças, pela Sma. Virgem.

São três canais: A COMUNHÃO, pela qual passa a sua pessoa. O PAPA, pelo qual passa a sua doutrina. A VIRGEM SANTA, pela qual passam as suas graças.

A vontade recebe da Comunhão uma FORÇA DIVINA. A inteligência recebe do Papa a LUZ DIVINA. O coração recebe de Maria Santíssima o AMOR DIVINO.

Pela Comunhão o homem fortifica-se. Pelo Papa o homem eleva-se. Pela Virgem Santa o homem transfigura-se.

A Comunhão mostra-nos O BEM. O Papa mostra-nos A VERDADE. Maria Sma, mostra-nos O AMOR.

É a realização da doutrina tão divinamente exposta pelo Salvador a S. Tomé: Ego sum via, veritas et vita (Jo14,6) — Eu sou o caminho, a verdade e a vida.

Pela Eucaristia Ele é a VIDA das almas: Eu sou o pão da vida. (Jo6,85). Pelo Papa Ele é a VERDADE dos espíritos: Quem vos escuta, escuta a mim (Lc10,16).

Pela Sma. Virgem ele é o CAMINHO do amor: Eu sou a Mãe do puro amor. (Ecl24,24).

Jesus Cristo é tudo para nós... tudo emana dEle; tudo volta a Ele.

Esta mesma verdade foi admiravelmente sintetizada pelo espírito Santo, nos Provérbios; Lex, Lux, Via, (Pv6,23).

A Eucaristia é a LEI do amor.

O Papa é a LUZ do amor.

Maria Sma. é o CAMINHO do amor!

A Igreja aplica à Sma. Virgem este texto da Sagrada Escritura: Em mim há toda a graça do caminho e da verdade. — In me omnis gratia viae et veritatis. (Ecl24, 25).

É sempre a mesma união divina: a GRAÇA, o CAMINHO, a VERDADE.

A graça é Jesus Cristo.

A verdade é o Papa.

O caminho é Maria Sma.

No ensino da Igreja, como na explicação espiritual da Bíblia, encontramos sempre essa tríplice união.

Uma dificuldade se apresenta.

A presença de Jesus Cristo na Eucaristia é um fato da ORDEM DA NATUREZA, no sentido que as aparências que O encobrem continuam a pertencer a esta ordem, embora a substância tenha sido mudada.

A presença de Jesus Cristo na palavra do Papa é um fato da ORDEM DA GRAÇA, no sentido que é uma preservação de todo o erro dada ao Papa, falando “ex-catedra”.

A presença de Jesus Cristo na Sma, Virgem, como Medianeira das graças, é um fato

da ORDEM DA GLÓRIA, no sentido que Maria Sma. já pertence a esta ordem, e não está mais corporalmente na terra.

Será uma dificuldade?....

Não, não! É um novo jato de luz divina, um relâmpago... é uma nova síntese da verdade exposta.

São Paulo, em sua linguagem nervosa, diz: Christus heri et hodie: ipse et in secula. (Hb12,8). Isto é: o Cristo abrange tudo, o passado, o presente, e o futuro — em outros termos: a natureza, a graça, a gloria — A terra, o céu, a eternidade.

E encontramos isso em Jesus Cristo, considerado sob o TRÍPLICE VÉU que o esconde a nossos olhos.

Seu corpo natural, na Eucaristia.

Sua palavra espiritual, no Papa.

Seu amor glorioso, na Virgem Santa.

A natureza alimenta.

A graça transforma.

A glória coroa.

É o Cristo... o Cristo em tudo... é o seu reino universal, no mundo, na graça, na gloria: omnia et in omnibus Christus. (Cl3,11).

Divina e incomparável união, que devemos compreender, para lhes darmos, aos três, o valor que merecem.

Assim unidos, compreenderemos melhor:

O valor da Comunhão.

A docilidade ao Papa.

O culto de Maria Sma.

Não são mais três devoções separadas, mas uma única devoção: a devoção católica, central, racional, teológica, a devoção a Jesus Cristo, à sua Pessoa, à sua palavra, ao seu amor!

Almas queridas, precisais de força?

— Ide ao Altar, comungai!

Precisais de luz?

Ide ao Papa, escutai-o!

Precisai de amor?

— Ide a Maria, invocai-a!


VII. A Trindade terrestre

A ideia enunciada merece maior desenvolvimento, porque exprime o que de mais divino há na religião e ao mesmo tempo de mais forte e fraco, mais visível e de mais escondido, mais profundo e ao mesmo tempo mais alto.

Eis a religião inteira, em sua base, em seu desenvolvimento, em sua glória.

Sem a Eucaristia, Jesus Cristo ficaria um desconhecido, um incompreendido; cristianismo ruiria da base até o cume.

Sem o Papa, Jesus Cristo seria um Deus mudo, um Deus sem governo; o cristianismo por completo.

Sem Maria Santíssima, Jesus Cristo seria um Deus de majestade e de poder; não seria mais o Pai querido, o Esposo das almas puras.

São três verdades básicas, essenciais, uma verdadeira TRINDADE TERRESTRE formando num único mistério, três mistérios distintos mas inseparáveis, como são inseparáveis e distintas as três pessoas divinas da Trindade celeste.

A Igreja católica é uma sociedade visível, é um corpo perfeito, como diz o apóstolo: Ita multi, unum corpus sumus in Cristo. (Rm12,5).

Este corpo deve ter uma cabeça que transmita as suas ordens à inteligência, à vontade e ao coração — as três grandes faculdades da nossa alma.

A cabeça é Jesus Cristo: Qui est caput Christus. (Ef4,15).

O Cristo, pela Comunhão, comunica a sua força à vontade: Ut servi Christi, facientes voluntatem Dei. (Ef6,6); transmite, pelo Papa, a sua luz à inteligência — sum luz mundi. (Jo8,12), e, pela Sma. Virgem, inflama os corações com seu amor: — Inflammatum est cor meum. (Sl72,21).

É o corpo completo, mas não lhe pode faltar nenhuma destas partes essenciais, porque seria a ruína.

A história aí está, para provar esta verdade. Onde falta um destes elementos, a religião vai decaindo.

Sem Comunhão, a VIDA CRISTÃ desaparece.

Sem obediência ao Papa, a DOUTRINA se corrompe.

Sem amor à Sma, Virgem, a santidade vacila.

Viu-se no século XVI um exemplo memorável desta verdade.

Quando Lutero desertou da Igreja, pretendeu não se separar de Jesus Cristo (pelo menos ele assim o dizia, e podemos acreditar nele neste particular!) pretendeu apenas rejeitar o Papa, cuja autoridade o obrigava a trilhar o caminho da verdade, condenando os seus erros.

Rejeitou, pois, o Papa, revoltou-se contra, ele. Pretendeu limitar-se a esta supressão, mas não sabia o infeliz que a Eucaristia, o Papa e a Virgem Santa são inseparáveis. Os espíritos da Reforma dividiram-se; os erros multiplicaram-se; Lutero quis intervir. Em vão ele se intitulou profeta, apóstolo, enviado de Deus, reformador; tudo caiu e a anarquia aumentou.

Entretanto, Jesus Cristo estava ainda presente sobre os altares da Reforma.

Havia padres, havia bispos legítimos que consagravam validamente, porém era um, Cristo MUDO, impotente para se defender e defender a doutrina.

A Eucaristia ficou abandonada.

Pouco a pouco, o próprio Tabernáculo ficou deserto... A Sma. Virgem, que Lutero pretendia conservar como última lembrança da grandeza perdida, também desapareceu, como que arrastada na onda revoltosa, e com ela o Cristo desapareceu definitivamente da Reforma de Lutero.

Hoje o protestantismo conserva apenas uma Bíblia, uma letra morta! O Cristo desapareceu da seita, porque haviam desaparecido o Papa, à Eucaristia e a Mãe de Deus. O que aconteceu com a Reforma, sempre ha de acontecer.

Jesus Cristo completo está escondido atrás deste TRÍPLICE VÉU; rasgando um, todos os outros se rasgam, e Jesus Cristo desaparece.

Onde há Comunhão frequente, docilidade ao Papa, amor à Sma. Virgem, aí há também a plenitude da religião, a virtude e a santidade.

Onde desaparece um destes elementos, a religião vacila, corrompe-se e desaparece.

É um fato histórico, como é uma verdade teológica. — Qui vos spernit, me spernit. (Lc10,16). Quem vos despreza, a mim despreza, tinha dito o Salvador ao primeiro Papa, e por ele ao Papado de todos os tempos.


VIII. A única fonte divina

As obras de Deus são de uma simplicidade e de uma unidade que desnorteiam, às vezes, a inteligencia humana.

O homem, vendo as obras divinas tão belas, tão imensas, tão profundas, começa necessariamente a analisá-las, a dividi-las, para melhor distingui-las; porém, se tal divisão é necessária, tem sempre o inconveniente de romper a UNIDADE DO PLANO DIVINO e a unidade das verdades doutrinais.

É o que tem acontecido com a divina Eucaristia.

Os teólogos distinguem a presença real, Sacramento, o Sacrifício, a Comunhão, quatro aspectos da Eucaristia.

Falando do Papa impõe-se duas distinções: o Papa como homem, e o Papa como autoridade, mostrando-nos o seu magistério infalível com o tríplice poder doutrinal, legislativo e judiciário, representado pela tiara pontifical.

Falando da Sma. Virgem, impõe-se outras distinções como: a predestinação, a dignidade, privilégios, papel, virtudes, méritos, glória, culto e mediação universal.

Cada assunto absorve o teólogo que, procurando salientar a doutrina especial, é obrigado, muitas vezes, a sacrificar a DOUTRINA GERAL, a síntese admirável, a ligação das diversas partes da doutrina num único fecho central.

É, deste modo, que um mistério fica isolado de outro, com o qual tem, entretanto, uma conexão necessária.

A Eucaristia, estudada isoladamente, é divinamente bela; o Papado, mesmo isolado, tem um esplendor sem igual; a Sma. Virgem possui um encanto incomparável, porém, colocados estas três devoções uma ao lado da outra, como emanadas de um princípio único, adquirem elas uma beleza e uma firmeza tal que não teriam se ficassem separadas deste centro.

A Eucaristia é o centro único, vital, a fonte, mas deste centro comum emanam estes dois raios luminosos que são o PAPA e a SMA, VIRGEM: O Papa, como sendo a palavra de Jesus Cristo; a Sma. Virgem, como sendo o canal de seu amor. A Eucaristia torna-se, deste modo, a síntese do plano divino e a vida da Igreja.

E Jesus Cristo, como princípio e fim, como alfa e ômega; tudo vem dele, e tudo volta a ele. É Ele que alimenta, pela Comunhão; é ele que ensina pelo Papa; é ele que derrama o seu amor pela Sma. Virgem.

Isto fazia Santo Agostinho exclamar:

O Sacramentum pietatis. O vinculam unitatis. O pineulum caritatis!

É o Cristo completo, sob o tríplice aspecto, que abrange toda a doutrina cristã.


IX. Conclusão

Muitas e grandes verdades teológicas têm passado ante o nosso olhar, neste curto estudo!

Muito fica a dizer ainda; o que precede tem apenas por fim raspar o véu do horizonte eucarístico, e mostrar às almas ardentes os aspectos novos e menos conhecidos do grande Sacramento do amor.

O que tenho procurado mostrar é que a Eucaristia não é um Sacramento isolado, que vem colocar-se na linha, no lado dos seis outros Sacramentos.

Todos os Sacramentos são necessários para a plenitude da vida cristã, mas a Eucaristia, além desta necessidade particular, tem conexão com a vida de toda a Igreja. Podia-se dizer que os outros sacramentos, excepto a Ordem que, se relaciona com a Eucaristia, e o Matrimonio que se refere à raça humana, os outros, digo, são como PESSOAIS, enquanto a Eucaristia é um SACRAMENTO GERAL, donde emanam a vida da Igreja e a vida das almas. É um estudo a fazer-se ainda, e que por certo há de fazer-se, para mostrar como na Igreja tudo se relaciona, tudo se liga à Sagrada Eucaristia.

Tenho, aqui, procurado mostrar esta ligação, deixando a outros a iniciativa e o trabalho de mostrar, nos pormenores, as minúcias desta síntese divina. A religião católica, assim estudada, tomará um aspecto de unidade incomparável, que será a glorificação da divina Eucaristia, do Papa e da Sma. Virgem — tríplice glorificação, que, mais do que nunca, se impõe em nossos dias.

Em frente da impiedade que blasfema, diante da maçonaria que solapa, no meio do protestantismo que desorganiza, cercada pelo espiritismo que desequilibra, e sob as ameaças do bolchevismo que mata, a Igreja católica deve erguer a fronte, sempre radiante, porque é eterna, e mostrar a sua admirável coesão, a sua força divina e o seu amor heroico até á morte.

É preciso MOSTRAR o Cristo reinando sobre as almas e sobre o mundo — O CRISTO- REI.

É preciso EXALTAR o Cristo ensinando e governando as almas e as nações: o Cristo na pessoa do PAPA.

É preciso GLORIFICAR o Cristo amando e salvando pela sua graça: — o Cristo, na pessoa da Medianeira Universal das graças: a SMA. VIRGEM MARIA.

Deste modo, o Cristo Salvador parece aproximar-se de nós, baixar até nós, para continuar a sua vida mortal, vida de apostolado, de consolação e de amor.

O Papa eleva-se até à altura que lhe compete como sendo o representante e VIGÁRIO de Jesus Cristo. .. e compreende-se melhor, vendo-o como o véu do próprio Cristo, em que consiste o seu magistério infalível. A Sma, Virgem, por sua vez, nos aparece numa luz, que é a de seu Filho, mas que o é também da sua própria dignidade e da grandeza de seu papel de MEDIANEIRA.

Maria Sma. deixa de ser, como o é para certas almas pouco instruídas, um adorno, um enfeite da religião; ela se torna uma peça constitutiva, e, na ordem atual das coisas, uma peça essencial; é a manifestação do amor infinito de Deus, na ternura, na misericórdia, no desvelo que salienta tão bem a sua condição de mulher, de Virgem e de Mãe.

Maria mostra-se em toda a plenitude de seu poder de Medianeira Universal das graças.

É o conjunto deste sublime mistério. A Eucaristia, fonte de FORÇA.

O Papa, fonte de LUZ.

A Virgem Sma,, fonte de AMOR.

Em meu livro: “Maria e a Eucaristia”, estudei a Eucaristia e a Virgem Sma. em suas relações eucarísticas; para ser completo, era necessário estudar também o Papa, a sua grandeza, o seu papel na Igreja de Jesus Cristo.

Deste modo, um estudo completa o outro, e pela leitura destes dois volumes, o leitor poderá abranger, num único relance, os grandes mistérios do Filho do homem, a Encarnação e Redenção, continuados através dos séculos.

É Jesus Cristo vivendo entre nós, na Eucaristia.

É Jesus Cristo falando-nos pelos lábios de seu representante, o Papa.

E é Jesus Cristo cercando-nos de amor de carinho, pela Virgem Sma., a sua e nossa Mãe querida.

Foi o que pretendi e procurei mostrar neste capítulo.


CAPITULO XVI

Os papas através dos séculos

No capitulo IV, $ IV, dei a lista dos papas desde São Pedro até Estevam V. Isto é, do Ano 38 até ao ano 817, tendo havido neste intervalo 100 papas.

Para os leitores poderem ver a sucessão admirável e ininterrupta dos papas, quero completar aqui a lista, citando a continuação dos papas até os dias atuais; isto é, do 8º seculo até hoje.

Para os estudiosos é um documento interessante.

Para os vacilantes é m argumento de firmeza.

Para os protestantes é a refutação aos seus erros.

Para os católicos é um estandarte de glória.


SECULO IX

101 — Gregorio IV, romano 827-844

102 — Sergio II, romano 844-847

103 — S. Leão IV, romano,847-855

104 — Benedito III, romano,855-858

105 — S. Nicolau I, o Grande, romano,858-867

106 — Adriano II, romano,867-872

107 — João VIII, romano,872-882

108 — Marino I, de Gallese (Itália),882-884

109 — Adriano III, romano,884-885

110 — Estevão V, romano,885-891

111 — Formoso, de Ostia,891-896

112 — Bonifacio VI,,896-896

113— Estevão VI, romano,896—897

114 — Romano de Gallese,897-897

115— Teodoro II, romano,897-897


SECULO X

116 — João IX, de Tivoli, 898-900

117 — Benedito IV, romano, 900-903

118 — Leão V, de Ardea, 903-903

119 — Cristóvão (Cristophoro), romano, 903-904

120 — Sergio III, romano, 904-911

121 — Anastácio III, romano, 911-913

122 — Landão, Sabino, 913-914

123 — João X, de Ravenna, 914-928

124 — Leão VI, romano, 928-928

125 — Estevão VII, romano, 929-931

126 — João XI, romano, 931-935

127 — Leão VII, romano, 936-939

128 — Estevão VIII, romano, 939-942

129 — Marino II, romano, 942-946

130 — Agapito II, romano, 946-955

131 — João XII, romano, 955-964

132 — Leão VII,, 964-965

133 — Benedicto V, romano, 965-965

134 — João XIII, romano, 965-972

135 — Benedicto VI, romano, 973-974

136 — Benedicto VII, romano 974-983

137 — João XIV, de Pavia, 983-984

138 — Bonifacio VII, romano, 984-985

139 — João XV, romano, 985-996

140 — Gregorio V, alemão, 996-999


SECULO XI

141 — Silvestre II, francês, 999-1003

142 — João XVII, romano, 1003-1003

143 — João XVIII, romano, 1003-1009

144 — Sergio IV, romano, 1009-1012

145 — Benedicto VIII, romano, 1012-1024

146 — João XIX, romano, 1024-1033

147 — Benedicto IX, romano, 1033-1044

148 — Silvestre III,, 1045

149 — Gregorio VI,, 1045-1046

150 — Clemente II, saxonio, 1046-1046

151 — Damaso II, da Baviera, 1048-1048

152 — Leão IX, alemão, 1049-1049

153 — Victor 11, de Suevia, 1055-1057

154 — Estevão IX, alemão, 1057-1058

155 — Benedicto X,,1058-1059

156 — Nicolau II, francês, 1059-1061

157 — Alexandre II, milanês,1001-1073

158 — S. Gregorio VII, de Soana, 1073-1085

159 — Victor III, de Bevenuto, 1085-1087

160 — Urbano II, de Reims, 1088-1099


SECULO XII

161 — Paschoal II, de Bieda, 1099-1118

162 — Gelasio II, de Gaefa, 1118-1119

163 — Calixto II, Borgonhez, 1119-1124

164 — Honorio II, Bolonhez, 1124-1130

165 — Innocencio II, romano, 1130-1143

166 — Celestino TI, da cidade de Castello, 1143-1144

167 — Lucio TI, Bolonhez, 1144-1145

168 — Eugenio III, de Montemagno, 1145-1153

169 — Anastacio IV, romano. 1153-1154

470 — Adriano IV, inglês, 1154-1159

171 — Alexandre III, Senez, 1159-1181

172 — Lucio III, de Luca, 1181-1185

173 — Urbano III, de Milão, 1185-1187

174 — Gregorio VIII, de Benevenio, 1187-1187

175 — Clemente III, romano, 1187-1191

176 — Celestino III, romano, 11191-1198

177 — Innocencio III, de Anagni, 1198-1216


SÉCULO XI

178 — Honorio III, romano, 1216-1227

179 — Gregorio IX, de Anagni, 1227-1241

180 — Celestino IV, milanez, 1241-1241

181 — Innocencio IV, de Genova, 1243-1254

182 — Alexandre IV, de Anagni, 1254-1261

183 — Urbano IV, de Toyes, 1261-1264

184 — Clemente IV, francês, 1265-1268

185 — B. Gregorio X, de Placença, 1271-1276

186 — Inocencio I, Saboiano, 1276-1276

187 — Adriano V, de Genova, 1276-1276

188— João XXI, de Lisbôa, 1276-1277

189 — Nicolau III, romano, 1277-1280

190 — Martinho IV, francês, 1281-1285

191 — Honorio IV, romano, 1285-1287

192— Nicolau IV, de Ascoli, 1288-1292

193—S. Celestino V,, 1924


SECULO XIV

194 — Bonifacio VIII, de Anagni, 1294-1303

195 — B. Benedicto XI,de Treviso, 1303-1304

196 — Clemente V, francez, 1305-1314

197 — João XXII, francez, 1316-1334

198 — Benedicto XII, francez, 1334-1442

199 — Clemente VI, francez, 1342-1852

200 — Innocencio VI, francez, 1352-1362

201 — B. Urbano V, francez, 1362-1370

202 — Gregorio XI, francez, 1370-1378

203 — Urbano VI, de Napoles, 1378-1389


SECULO XV

204— Bonifacio IX, napolitano, 1389-1404

205 — Innocencio VII, de Sulmona, 1404-1406

206 — Gregorio XII, veneziano, 1406-1409

207 — Alexandre V, bolonhez, 1409-1410

208 — João XXIII, de Napoles, 1410-1415

209 — Martinho V, romano, 1417-1431

210 — Eugenio IV, veneziano, 1431-1447

211 — Nicolau V, de Sarzana, 1447-1455

212 — Calixto III, espanhol, 1455-1458

213 —Pio II, senez, 1458-1464

214 — Paulo II, veneziano, 1464-1471

215 — Sixto IV, de Suvona, 1471-1484

216 — Innocencio VIII, genovez, 1484-1492


SECULO XVI

217 — Alexandre VI, espanhol, 1492-1503

218 — Pio III, senez, 1503-1503

219 — Julio TI, de Savona, 1503-1513

220 — Leão X, florentino, 1513-1521

221 — Adriano VI, de Utrecht, 1522-1523

222 — Clemente VII, florentino, 1523-1534

223 — Paulo II, romano, 1534-1549

224 — Julio III, toscano, 1550-1555

225 — Marcello II, Montepulciano, 1555-1555

226 — Paulo IV, napolitano, 1555-1559

227 — Pio IV, milanez, 1559-1565

2285, Pio V, de Bosco, 1566-1572

229 — Gregorio XIII, bolonhez, 1572-1585

280 — Sixto V, da Marca, 1585-1590

281 — Urbano VII, romano, 1590-1590

282 Gregorio XIV, cremonez, 1590-1591

283 — Innocencio IX, bolonhez, 1591-1591


SECULO XVII

234 — Clemente VIII, florentino,1592-1605

285 — Leão XI, florentino, 1605-1605

236 — Paulo V, romano, 1605-1621

287 — Gregorio XV, bolonhez, 1621-1623

238 — Urbano VIII, florentino, 1623-1644

239 — Innocencio X, romano, 1644-1655

240 — Alexandre VII, senez, 1655-1667

241 — Clemente IX, de Pistoia,1667-1669

242 — Clemente X, romano, 1670-1676

243 — Innocencio XI, de Como, 1676-1689

244 — Alexandre VIII, veneziano, 1689-1691SECULO XVIII

245 — Innocencio XII, de Napoles, 1691-1700

246 — Clemente XI, de Urbino, 1700-1721

247 — Innocencio XIII, romano, 1721-1724

248 — Benedicto XII, romano, 1724-1730

249 — Clemente XII, florentino, 1730-1740

250 — Benedicto XIV, de Bolonha, 1740-1758

251 — Clemente XII, veneziano, 1758-1769

252 — Clemente XIV, de Sant'Angelo in Vado, 1769-1774

258 — Pio VI, de Cesena, 1775-1799


SECULO XIX

254 — Pio VII, de Cesena, 1800-1823

255 — Leão XII, de Spoleto, 1823-1829

256 — Pio VIII, de Cingoli, 1829-1830

257 — Gregorio XVI, de Beluno 1831-1846

258 — Pio IX, de Senigallia 1846-1878


SECULO XX

259 — Leão XII) de Carpinelte 1878-1903

260 — Pio X, de Riese 1903-1914

261 — Bento XV, de Pegli 1914-1992

262 — Pio XI, de Desio 1922-1939

263 — Pio XII, de Roma, gloriosamente reinante desde 1939.


Os principais Concílios Ecumênicos

325 — Niceia — Condena a heresia de Ario.

381 — Constantinopla — Condena as heresias de Manés e de Macedônio.

481 — Éfeso — Condena as heresias de Nestório e de Pelágio.

451 — Calcedônia — Condena a heresia de Eutyches.

558 — Constantinopla — Condena a heresia dos três capítulos.

680-681 — Constantinopla — Condena os Monotelistas.

787 — Niceia — Condena os Iconoclastas.

869-870 — Constantinopla — Excomunga o patriarca Focio.

1123 — Latrão (Igreja de S. João, em Roma) — Ratifica a concordata de Worms.

1139 — Latrão — Condena Arnaldo de Bréscia.

1179 — Latrão — Condena os antipapas que Frederico Barba-roxa opusera a Alexandre III. Resolve a eleição dos pontífices, pelos cardeais.

1215 — Latrão — Condena os Valdenses e os Albigenses. — Declara obrigatória para todo o cristão a confissão e a comunhão durante a Páscoa.

1245 — Lião — Condena o imperador Frederico como herético, como espoliador da Igreja e como culpado de convivência com os Muçulmanos.

1274 — Tentativa de União com a Igreja grega.

1311-1312 — Viena — Abolição da Ordem dos Templários.

1439-1442 — Florença — Nova tentativa de união com a Igreja grega.

1512-1517 — Latrão — Reforma disciplinar da Igreja.

1545-1563 — Trento — Condena Lutero, Zwinglio e Calvino.

1669-1670 — Vaticano — Proclama o dogma da infalibilidade do Papa.

papas de todas as classes e condições sociais ocuparam a cadeira de São Pedro


PONTÍFICES SANTOS

A história da Igreja registra 77 pontífices santos, que são os primeiros 33 nas 10 perseguições e quatro que padeceram o martírio pelos hereges, Felix II, João I, Silvério, e Martinho I, formando 37 mártires, e mais 40 confessores, num conjunto de 77.


PAPAS DE ORDENS RELIGIOSAS

Beneditinos — A Ordem de São Bento conta com cerca de 30 pontífices, citamos: Pelagio II, Gregorio I, II, III, IV e VII, Bonifácio IV, Adeodato, Agaton, Zacarias, Estevão IV e X, Pascoal I, João II e IX, Leão V e IX, Sergio IX, Victor III, Silvestre II, Gelasio II, Alexandre IV e Clemente VI. dos beneditinos de Cluni, S. Gregório VII, Pascoal II, Urbano II e V. dos beneditinos de Cister, Eugenio III, Alexandre III, Urbano IV, Benedito VII. Os beneditinos celestinos foram fundados pelo Papa Celestino V.

Cônegos regulares de Santo Agostinho: Leão I, II, III, IV e VII, Gelasio I, Felix III, Estevão IV, que logo foi beneditino, Honório I, II, III, Sergio I e II, Pascoal I e II, Benedito III e IV, Urbano II, que também foi beneditino, Formoso, London, Alexandre II e III, Inocêncio II e III, Calixto II, Lucio II, Eugenio II e IV, Anastácio IV, Adriano IV.

Os eremitas de Santo Agostinho: — Gelasio I e Clemente VII e também o anti-papa Felix V, que por algum tempo acreditou de boa fé na legitimidade de sua função.

Carmelitas: — São Telesforo, S. Dionísio e Benedito XII.

Dominicanos: — Inocêncio V, Benedito II, Pio V (Santo) e Benedito XIII.

Franciscanos: — Nicolau IV, Alexandre V, Sixto IV, Sixto V. Contam também como seus Gregório IX, que quis ser enterrado com o hábito de franciscano; Martinho IV, que procedeu da mesma forma; Julio II, que foi noviço; Gregório XI, que morreu no mesmo dia de sua eleição, e o antipapa Pedro Corbario, chamado Nicolau V. Entre todos, contam-se 70 papas das ordens regulares.


PAPAS DE VARIAS NAÇÕES

Sírios, 7; gregos, 14; italianos, 192; africanos, 3; sardios, 2; calmatas, 2; de Tracia, 1; espanhóis, 4; (S. Damaso, João XXI, Calisto III e Alexandre VI. Os dois últimos eram valencianos. Alguns contam também como espanhol o Papa Melquiades). Franceses, 14; borgonhezes, 2; Alemães, 6; entre eles dois saxões e dois bávaros; ingleses, 1; (Adriano IV); belga, 1 (Adriano VI).


PAPAS DE ILUSTRE LINHAGEM

Clemente 1, da família imperial; Caio e Celestino I, Virgílio, João III, Gregorio Magno, Adriano I, Sergio III, João XI e XII, Benedito VII e VIII e João XX, dos condes de Tusculo, Leão IX, conde de Ausburgo; Victor II, conde de Claver; Estevão X, dos duques de Lotarigia: Gregório VII, dos condes de Petiliani, Victor III, filho do príncipe de Benevento.


PAPAS DE FAMÍLIAS HUMILDES

S. Pedro, pescador; S. Dionísio; João XVII; Damaso II, filho de um pobre comerciante; Adriano IV, cuja mãe pedia esmola; Urbano IV, filho de um guardador de porcos; Benedito XI, filho de uma lavadeira; Benedito XII, filho de um padeiro; Bonifácio IX, clerigo humilde; Alexandre IV, paupérrimo; Nicolau V, cuja mãe vendia, no mercado, ovos e aves; Gregório VII, era filho de um carniceiro; Sixto IV, filho de um pescador; Adriano VI, filho de um marinheiro; Sixto V, filho de um pastor e em sua mocidade guarda de porcos; Pio X, cujos pais eram modestos agricultores, etc.


PAPAS QUE GOVERNARAM POUCOS DIAS

Sisinio, 20 dias; Estevão II, 3; Bonifácio VI, 15; Damaso II, 23; Celestino IV, 17; Pio III, 26; Marcelo II, 22; Urbano VII, 12; Leão XI, 25.

Não chegaram a um ano: Sixto II, S. Marcos, Sabiniano, Bonifácio III, Leão II, Benedito II, Conon, Estevão V, Romano, Leão V, Cristobal, Landon, Benedito V, Bonifácio VII, João XIV, XVI e XVII, Silvestre III, Clemente II, Estevão X, Benedito X, Celestino II, Lucio II e alguns outro.


PAPAS QUE REINARAM MAIS DE 20 ANOS

Adriano, 23 anos e meio; Leão VI, 20 anos e alguns meses; Alexandre III, 22; Silvestre I, 21 anos e 10 meses; Urbano VIII, 21 anos e 1 mês; Leão I, o Magno, 20 anos e cerca de 2 meses; Clemente XI, 20 anos e 3 meses; Pio IX, 31 anos, 7 meses e 2 dias; Leão XIII, 25 anos e 5 meses. Também reinaram mais de 18 anos, Inocêncio III, Pascoal II, João XXI e Zeferino. Pio XI reinou 17 anos.


PAPAS DO MESMO NOME

João, 23; Gregório, 15; Benedito, 15; Inocêncio, 13; Clemente, 14; Leão, 13; Estevão, 10; Bonifácio, 9; Alexandre e Urbano, 8; Pio, 12 (incluindo o atual reinante); Adriano, 6; Celestino, Martino, Nicolau, Paulo e Sixto, 5; Anastácio, Eugênio, Felix, Honório, Sérgio, 4; Calixto, Júlio, Lúcio, Victor e Silvestre, 3; Agapito, Dono, Damaso, Marcelo, Pascoal, Gelasio, Pelágio e Teodoro, 2.


Conclusão final

Está terminada a tarefa que me impôs o meu amor à Igreja, minha mãe, — refutar as calúnias lançadas contra ela pela ignorância e a impiedade.

Procurei refutar os erros, desmascarar as calúnias e demonstrar a verdade sobre um ponto de doutrina, infelizmente muito ignorado e muito deturpado.

Ao começar o trabalho, disse que este livro seria, para muitos, uma verdadeira REVELAÇÃO.

Ao terminar a última página, repito ainda a mesma asserção, e digo altamente que esta obra veio revelar segredos, mistérios, verdades e horizontes por muitos ignorados.

A Igreja católica é tão pouco conhecida!

É tão caluniada...

É tão vilipendiada.

É tão deturpada...

Melhor conhecida, esta Igreja divina será, necessariamente mais venerada e amada.

Ela deve ser amada.

Pois ela é o centro do amor.

Ela é o amor!

Há na composição de certas palavras uma significação que muitas vezes nos escapa, e que é entretanto de uma realidade tão palpável, ao ponto de parecer quase impossível não se distinguir nelas o dedo de Deus.

No dia em que o divino Salvador esteve diante de Pilatos, este lhe perguntou:

Que é a verdade?

E a verdade estava diante dele. Esta verdade é Jesus Cristo.

Fato curioso: os estudiosos descobriram nas letras da pergunta de Pilatos um anagrama que dá a resposta á mesma pergunta.


Quid est veritas? — perguntou o Governador.

Est vir qui adest — diz a própria pergunta, invertendo-se umas letras.

É o homem que está aqui presente!

É Jesus Cristo.

***

A alma humana, criada à imagem de Deus, é a expressão mais alta do amor do Criador, como o é da suprema grandeza do homem.

E, cousa singular: A este termo mais alto da grandeza corresponde o termo da ultima baixeza: a lama.

A palavra: lama, é a inversão da primeira sílaba de alma.

São os dois extremos da dignidade humana: alma—lama.

***

O termo que exprime de um modo sintético a religião de Jesus Cristo é a palavra ROMA, por ser a cidade onde reside o chefe supremo da Igreja: o Santo Padre, o Papa.

ROMA, palavra mágica que, por desígnio especial de Deus, exprime o que ele deve inspirar-nos: O AMOR.

Lida às avessas, a palavra Roma é amor.

Admirável coincidência, que é talvez mais do que uma coincidência, mas sim o dedo de Deus.

Roma é a cidade do amor, não como cidade, sem dúvida, mas pela pessoa sagrada, que a imortaliza: o Papa.

A palavra: PEDRO, por anagrama dá: PODER.

Pedro é o representante e o detentor, na terra, do poder de Deus.

ROMA é AMOR.

Pedro recebe de Deus o PODER.

Ele deve receber dos homens O AMOR.

Devemos amar ao Papa, como os filhos AMAM aos seus pais.

Devemos defender o Papa, como os filhos DEFENDEM seus pais.

Devemos obedecer ao Papa, como os filhos OBEDECEM nos seus pais.

Pedro, amas-me? — perguntou o Salvador ao primeiro Papa, antes de o investir da dignidade suprema.

E a resposta de Pedro foi positiva: Tu sabes, Senhor, que eu te amo!

O Papa, representante de Jesus Cristo, como sucessor de São Pedro, também pergunta a cada um de seus filhos, espalhados por milhões e milhões neste mundo afora: FILHO, AMAS-ME?

É preciso que cada católico possa repetir a palavra de São Pedro: Santo Padre, tu sabes que eu te amo!

Esta palavra resume todos os nossos deveres para com o Papa.

AMAR — é venerar, é obedecer, é defender aquele que se ama.

Tal deve ser o culto que tributamos ao Santo Padre, o Papa, no eterno representante da verdade eterna. ;

Veritas manet in aeternum!

***

Querido leitor: Eis o fim do novo livro anunciado.

Depois de o terdes lido, agora, dizei-me se não é deveras novo?

Não sei porque; mas parece-me ser este o melhor livro que tenho escrito.

Escrevendo estas páginas, senti-me tão sensivelmente assistido e consolado... senti estas páginas tão acima da minha própria capacidade que, involuntariamente, exclamei diversas vezes: Digitus Dei est hic!

Deus ajudou-me a fazer este livro.

Lede-o... Ele vos revelará segredos sublimes, maravilhas encantadoras.

Lede-o com CALMA e AMOR.

A calma abre os horizontes.

O amor abre os céus!

São, pois, horizontes do céu.


Padre Júlio Maria.