O anjo das trevas

Pe. Julio Maria espiritualidade

Pe. Júlio Maria, descreve, mostra e refuta com muita clareza o anjo das trevas.

PADRE JÚLIO MARIA
Missionário de Nossa Senhora do SS. Sacramento

O Anjo das Trevas

O ESPIRITISMO

O PROTESTANTISMO

A MAÇONARIA

O DIVORCISMO

O COMUNISMO


Lampejos de doutrina, de ciência e de bom-senso

 

 

 

IV EDIÇÃO

1950


EDITORA VOZES Ltda, PETRÓPOLIS R.J.

RIO DE JANEIRO — SÃO PAULO

IMPRIMATUR

POR COMISSÃO ESPECIAL DO EXMO. E REVMO. SR. DOM MANUEL PEDRO DA CUNHA CINTRA, BISPO DE PETRÓPOLIS. FREI LAURO OSTERMANN O. F. M. PETRÓPOLIS. 17-4-1950

TODOS OS DIREITOS RESERVADOS

APROVAÇÃO

do Exmo. D. Carloto Távora


Meu caro Padre Júlio-Maria. Muito agradeço a remessa de seu novo livro: “Lampejos de doutrina, de ciência e de bom senso”.
Percorri estas páginas com um verdadeiro entusiasmo. Quantas coisas belas, admiráveis, há nestas páginas que parecem escritas com pena de fogo.
São verdadeiros Lampejos. Após a leitura de cada uma das suas teses, o leitor sente-se subjugado... e, queira ou não queira, fica convencido da verdade exposta.
Tudo é luminoso e convincente sob a sua pena ardente; e não se sabe o que mais admirar, se a segurança da doutrina ou o modo entusiástico e comunicativo de expor esta doutrina.
Quanto bem vai fazer este novo livro! Congratulá-lo-me consigo, pelo resultado, pois sei que a sua única meta é fazer o bem às almas, levando-as na senda da verdade — da única verdade, que é o ensino da santa Igreja católica.
Peço a nosso Senhor abençoar os seus trabalhos apostólicos, e abençoar, de modo particular, esta pena terrível que faz tremer os inimigos da religião, e dá uma imensa satisfação a todos os católicos sinceros, e de modo particular ao seu velho e dedicado bispo.

+ CARLOTO, Bispo de Caratinga

 

INTRODUÇÃO DA SEGUNDA EDIÇÃO

O anjo das trevas é conhecido por todos. É, no dizer de São João, aquela antiga serpente, que se chama o demônio e Satanás, que seduz todo o mundo e foi precipitado na terra... Ai da terra e do mar, continua o vidente de Patmos, porque o demônio desceu a vós, com grande ira, sabendo que lhe resta pouco tempo, para perder as almas (Apoc13, 9.12).
Eis um texto e uma figura apocalípticos, que se podem aplicar literalmente à época que atravessamos.
Parece que o fim dos tempos está se aproximando, e que o demônio, ou anjo das trevas, tem pressa em aproveitar o tempo para perder a humanidade.
Hoje, sentimos em cima e dentro da sociedade um sopro, devia se dizer, um furacão de revolta, de sensualidade, de ódio que seria misterioso, se não fosse diabólico. É! Mas é diabólico! É o anjo das trevas que se agita e se desdobra numa atividade febril, para fomentar as paixões humanas, esconder o ideal do homem e acender o ódio contra os sacerdotes, contra a Igreja e contra o próprio Deus.
É a obra do anjo das trevas. Mas o demônio não aparece pessoalmente, senão raras vezes e com licença de Deus. Ele tem os seus representantes, os seus emissários, conscientes ou inconscientes, a quem dita as suas vontades, e que lhe servem como escravos.
Quem recusa ser filho de Deus, torna-se escravo do demônio! Quem nega a luz fica nas trevas. Não há outra saída.
Sem entrar nos pormenores de uma enumeração completa, como conviria a uma obra didática, pode-se dizer que os autênticos representantes do anjo das trevas são as conhecidas seitas destrutoras:
1. O espiritismo, destrutor da inteligência;
2. O protestantismo, destrutor da união;
3. A maçonaria, destrutora da autoridade:
4. O divorcismo, destrutor da família;
5. O sexualismo, destrutor do pudor;
6. O comunismo, destrutor da liberdade.
Nas páginas que se seguem, sem ter a pretensão de fazer uma exposição completa, didática, quero tratar destes seis anjos das trevas, ou demônios, que atacam hoje o eterno rochedo da Igreja, procurando derrubar as suas instituições e abalar os seus princípios. E com que hão de substituir o que pretendem demolir? Estão mostrando diariamente o que fazem. Podemos julgá-los pelos seus frutos.
O espiritismo é um produtor de loucura;
O protestantismo é um produtor de ódio;
A maçonaria é uma produtora de revolta;
O divorcismo é um produtor de discórdia;
O sexualismo é um produtor de libertinagem;
O comunismo é um produtor de escravidão.
Este livro nasceu sem um plano premeditado. É o resultado de respostas a várias consultas. Estas respostas formavam dois volumes: Lampejos e Polêmicas, havendo em cada um destes volumes assuntos de refutação aos erros e de explanações de certas verdades religiosas.
Resolvi juntar num mesmo volume a refutação dos erros, em um outro a exposição de verdades religiosas.
Deste modo sairam estes dois volumes:
O Anjo das Trevas, contendo os artigos dos lampejos que se referem aos erros modernos.
O Anjo da Luz, contendo os outros artigos de teologia popular, que se referem à santificação das almas.

Pe. Júlio Maria


 

INTRODUÇÃO DA PRIMEIRA EDIÇÃO


Por que lampejos? Para ver melhor, ver mais alto e ver mais fundo. Estamos numa época em que a simples luz é insuficiente para impressionar a retina visual de certa gente. Para pessoas que querem ver, basta um vislumbre. Para quem não quer ver, é preciso relâmpagos. O relâmpago obriga a ver, faz ver tudo, manifesta tudo.
A verdade precisa hoje de relâmpagos!... e até de trovão! Não seria demais o trovão do Sinai, quando Moisés recebia a lei de Deus, enquanto os israelitas estavam dançando em redor do bezerro de ouro.
Não podendo reproduzir o trovão que manifesta a majestade divina, nem o relâmpago que é como um eco da luz divina, vão, pelo menos, estes pequenos lampejos.
Digo pequenos, porque saem de uma fonte pequena — o homem — mas são fulminantes, porque são compostos de verdades divinas.
Não são Lampejos de gênio; são lampejos de verdade. E precisamos muito deles!
O mundo está cheio de Diógenes modernos, andando, em pleno dia, de lanterna na mão, para iluminar a sociedade; porém a lanterna está sem luz, ou contém apenas uma vela fumacenta.
Os Diógenes são: o protestantismo, o espiritismo, a coligação pró-estado leigo, o divorcismo, o comunismo, etc. Quantos Diógenes de lanterna apagada querendo, ao meio-dia, iluminar o mundo, enquanto eles mesmos andam de olhos vendados.
Ó relâmpagos, ó trovão... do Sinai! onde está o vosso fulgor para iluminar os Diógenes cegos, o vosso ribombar para prostrar os dançadores em redor do bezerro de ouro...
Não é tempo de dormir; é tempo de agir. O demônio não dorme. São Paulo chama bem alto a todos os católicos: — Desperta, tu que dormes, e levanta-te dentre os mortos, e Cristo te alumiará (Ef 5,14).
A luz, a única luz, o relâmpago, é Cristo. O resto, são lanternas sem velas.
Escutemos, pois, a Cristo, pela voz de sua Igreja, de seu chefe, e deixemos correr os Diógenes modernos da impiedade para o abismo que os espera.
Os presentes lampejos dirigem-se a todos os que, sinceros e leais, querem conhecer a verdade inteira:
A verdade que ilumina as inteligências;
A verdade que estimula a vontade;
A verdade que orienta o coração;
A verdade que forma o caráter.
Há de tudo isto no presente livro. Não é uma tese única: é uma série de teses, de palpitante atualidade.
São assuntos tomados no flagrante da vida, das idéias e das circunstâncias, manifestadas por consultas de diversas pessoas.
Leiam estes lampejos e estou certo de que eles serão para muitos um clarão que permitirá distinguir e compreender o que talvez não tinham ainda distinguido, nem compreendido: — a verdade, no meio de múltiplos erros que o demônio vai semeando.
E tal é a única aspiração do autor.

P. Júlio-Maria

 

Primeiro anjo das trevas:

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O ESPIRITISMO

1. O que é o espiritismo.
2. Belezas da reencarnação.
3. O círculo esotérico.

PRIMEIRO LAMPEJO
O que é o espiritismo


Damos a seguir apenas noções sobre a doutrina espírita, pedindo aos estudiosos que recorram, para as explicações pormenorizadas, ao nosso livro: Segredos do Espiritismo, onde encontrarão uma exposição completa de tudo o que se refere à nefanda seita.

1. Definição do espiritismo
Espiritismo é a teoria (ou hipótese) que pretende explicar certos fatos anormais como produzidos pela ação dos espíritos, manifestada por intermédio dos médiuns.
Esta teoria data de meio século, tendo sido codificada por Alan Kardec, a propósito de embustes empregados pelas irmãs Fox, na América do Norte.
Não há fenômenos espíritas: primeiro, porque seria preciso, de acordo com a teoria espírita, que os fenômenos fossem produzidos pelos espíritos; segundo, porque os mesmos fenômenos observados nas sessões espíritas se repetem fora delas, desde que esteja presente o médium (sensitivo).
É essa uma denominação genérica que os espíritas dão a todos os fenômenos produzidos pelos sensitivos (médiuns) em suas sessões e que o vulgo repete, sem lhe dar sentido agógico, somente como sinônimo de fenômenos normais, fora ainda do domínio científico.
Daí aclamaram fenômenos espíritas até aos fenômenos mais naturais, como a suposta exteriorização de motricidade, produzindo (sic) raps, deslocamentos e transportes de objetos, levitação, etc., e a suposta exteriorização de sensibilidade, produzindo (sic) duplos, fantasmas, materialização, etc.
A própria natureza dada a esses fenômenos mostra claramente que independem de qualquer intervenção extranatural; são eles função do sensitivo (médium).
Não se confunda espiritismo com espiritualismo, Esses dois termos, que têm o mesmo radical, designam, entretanto, doutrinas opostas e contrárias. É o caso do asno vestido com a pele do leão.
O espiritualismo reconhece a existência de um Deus todo-poderoso, criador e providência do mundo, pessoal e absolutamente distinto de suas obras.
O espiritismo professa um grosseiro panteísmo.
Seu deus, se tal nome se lhe pode dar, é impessoal e confunde-se com a natureza. Adoram, como Haeckel, corifeu do materialismo, o Deus-natureza, síntese do verdadeiro, do belo e do bem. É nas piores doutrinas materialistas que o espiritismo vai ter.
O espiritualismo crê que o homem se compõe de um corpo e de uma alma, em uma só pesssoa; ensina que esta alma invisível, intangível, espiritual, em uma palavra, dotada de inteligência e vontade, é o princípio da vida, da sensibilidade e da motibilidade, a forma do corpo.
O espiritismo, ao contrário, não crê na alma espiritual, imortal e pessoal e professa que, fora dum espírito mais ou menos distinto do divino, não hã no corpo e em torno dele senão um fluido sutil, material, o perispírito, capaz de explicar as manifestações da vida e da alma. A alma verdadeira é claramente sacrificada a esse princípio hipotético que nenhum fato prestigia e toda a filosofia condena.
O espiritismo pretende estar de posse dos segredos da natureza e julga-se capaz de explicar todos os mistérios.
O espiritualismo defende, como seu nome o indica, os direitos da alma, as prerrogativas do espírito, sem desconhecer as exigências do corpo, sem negar a unidade substancial do homem.
Confundindo Deus e a alma, o espírito e o corpo, em uma substância única, o espiritismo nega-as igualmente e compromete absolutamente os interesses do espiritualismo.
Em face do espiritualismo definitivamente vencedor do materialismo, ergue-se, nos tempos presentes, o espiritismo, que pretende invadi-lo, corrompê-lo, destruí-lo e tirar-lhe o império das almas.
A alternativa entre elas se impõe; a escolha não é duvidosa.

II. A base do espiritismo
O espiritismo não é nem religião, nem ciência: é uma moléstia. Vou demonstrar isso claramente, numa série de estudos que pretendo publicar sobre o assunto.
A religião é necessariamente baseada sobre a revelação, sobre a palavra de Deus. A ciência forma-se pelos dados da experiência. A religião e a ciência nascem, pois, de pontos completamente diferentes, até opostos. A religião vem do céu; a ciência, da terra.
A primeira tem por princípio o próprio Deus; a segunda baseia-se na inteligência humana. O espiritismo não tem princípio, nem base; não é do céu, nem da terra. Nem a revelação o gerou, nem a ciência o quer perfilhar. Triste órfão! Donde veio? Para onde vai? Que quer? Que faz? Tudo é misterioso!
Considerando-o do lado do céu, é um corpo sem cabeça; do lado da ciência, é uma cabeça sem corpo; e, afinal, tudo desaparece num caos de absurdas contradições. Eis o espiritismo!
É bem assim que o compreenderam os sábios que se aplicaram em estudá-lo. Em 1920, a faculdade de medicina da Baía propunha como tese aos doutorandos a identidade do médium e do histero-epiléptico.
Há bem pouco, o doutor Geley, célebre professor, escreveu que os fenômenos ocultos carecem ainda de demonstração.
Dias depois, Carlos Richet escrevia no “Excelsior” que o resultado da metapsíquica (estudo da alma, ou das faculdades intelectuais) era nulo.
Em dando crédito a essas judiciosas palavras, o espiritismo não é nada, E, entretanto, é qualquer coisa.
Digamos, logo o que não é: Bíblico?... Não é.
Ao contrário: positivamente antibíblico, por desobedecer à bíblia,
Deus diz: Sereis para mim santos, porque o Santo sou eu, soberano Senhor, e vos separei dos outros povos, para que sejais meus. O homem ou a mulher nos quais se encontrar espírito pitônico (isto é, médium espírita) ou espírito de adivinhação, receba a pena de morte, seja apedrejado e sobre ele corra a próprio sangue (Lv 20,26).
Mais tarde, esta proibição divina foi confirmada pelo Senhor: Nem se encontre entre vós quem interrogue os aríolos e observe os sonhos, e os agouros, nem seja maléfico, nem encantador, nem quem consulte os pitões, nem os adivinhos, ou inquira a verdade dos mortos. Pois todas estas coisas abomina o Senhor (Dt 18,10-12).
E no profeta Isaías: Quando vos disserem: consultai os pitões e os adivinhos, respondei-lhes que o povo consulta o seu Deus e não precisa consultar os mortos em favor dos vivos (Is 7,9).
Ora, interrogar os pitões ou médiuns, observar os sonhos e inquirir a verdade dos mortos, são as práticas ordinárias do espiritismo. Portanto, os espíritas são transgressores deste tão claro preceito divino,
O espiritismo é anticristão, porquanto nega a divindade do Cristo, a quem avilta ao ponto de proclamá-lo um médium. Crer em Jesus Cristo é crer em todas as verdades por ele reveladas. Pois bem, os espíritas não admitem nenhuma destas verdades, não querem nem dogmas, nem mistérios, nem céu, nem inferno.
O espiritismo é anticatólico, porque repudia os sacramentos, o purgatório, o culto da Virgem e dos santos, os mistérios da santíssima Trindade e da encarnação, a autoridade de São Pedro, todo o culto católico.
O espiritismo é anticlerical: visa, sobretudo, a campanha sórdida contra a Igreja e os seus sacerdotes.
É antimoral, porque nega o livre arbítrio, uma fonte de responsabilidade.
Por fim, que é o que fica desta armaçon de negações? O espiritismo é, antes de tudo, e unicamente, a negação de tudo. E' o nada, é o vácuo...
Notem bem isto; nenhuma base, nenhum principio, nem do céu, nem da terra. Nada fica em pé.
Os seis mil anos que o mundo já viveu são nada...
Não deixaram nem uma lembrança, nem uma idéia que sirva... tudo, tudo há de ser novo.
O espiritismo não tem base... ou melhor, como diz muito bem o Padre Dubois: o espiritismo pousa sobre a religião, como certas aves sobre o cume das igrejas; para desarrumar as telhas, abrir goteiras e emporcalhar tudo.
Basta ver este princípio, para se compreender como o espiritismo leva tão fácil e diretamente à loucura.
Nossa inteligência não vive só de imaginações, de suposições; ela procura, antes de tudo, (e isso é seu elemento próprio), a certeza, a convicção. Não a encontrando, ela se perturba, agita-se e cai numa espécie de desespero que a paralisa, e, pouco a pouco, extingue-se, por via de inanição, de anemia, pois lhe falta o alimento próprio, de que vive e se fortalece: a certeza ou a verdade.

Conclusão: o espiritismo é uma ruína, é a dúvida, é a negação de tudo.
Ora, a negação não se sustenta; precisamos de qualquer coisa de positivo, de qualquer coisa que exista, seja na ordem material, espiritual, intelectual ou moral.
Quem já viu uma pura negação? Se me perguntarem:
que é o homem?... respondo pela parte negativa, dizendo que não é vegetal, nem mineral, nem puro animal!
Sim, mas que é, então? Queremos uma resposta positiva, que não diz simplesmente o que não é, mas ainda o que é.
O homem é uma criatura, racional, composta de um corpo e de uma alma!
Pois bem, no espiritismo, nada de positivo, tudo é negação, e estes novos cientistas de asilos querem que a nossa inteligência se contente com isso?
Pobres tresloucados!

III. O homem no conceito espírita
Para, bem compreender o jogo espírita e explicar os numerosos fenômenos charlatanescos dos seus adeptos, é de toda necessidade saber o que eles pensam do homem. Que é, pois, o homem no conceito espírita?
Deixo a resposta ao pai da seita, o conhecido Alan Kardec: “O homem, diz ele, é formado de três partes essenciais: corpo material e sensível, análogo aos dos outros animais e animado pelo mesmo princípio vital; a alma, espírito encarnado, cuja habitação é o corpo, e o perispírito, substância semimaterial que serve de envoltura ao corpo. A alma tem duas envolturas: uma sutil e leve, que é o perispírito, e a outra material e pesada, que é o corpo. A morte não é mais que a destruição do corpo, não do espírito” (Livro dos Espíritos, cap.2,ns.135, 141, 155).
Notem bem estas primeiras e básicas elucubrações do espiritismo.
A religião nos ensina que o homem é composto de um corpo mortal e uma alma espiritual, imortal, criada por Deus, à sua imagem e semelhança.
E claro, é lógico, é sublime, esse doutrinamento, no seu princípio e em todas as suas consequências.
Mas os espíritas preferem, antes de tudo, as trevas, a dúvida e a contradição, a todas as verdades existentes e conhecidas.
O que é velho não pode ser novo; o que é positivo não pode ser negativo; o que é claro não pode ser misterioso, e o espiritismo quer coisa nova, negativa e misteriosa. Como obtê-lo? Destruindo o castelo da sabedoria universal, da revelação e do bom senso. Pobres tresloucados!
E, não querendo aceitar o homem, tal qual no-lo legou a revelação divina, a doutrina cristã, a idéia e o bom senso dos séculos, eis um novo homem que o espiritismo constrói.
O homem, para ele, é um composto de alma, perispírito e corpo.
A alma é espiritual, não é criada por Deus. É simplesmente um espírito encarnado, um espírito qualquer, daqueles que voam pelo espaço, esperando encontrar um corpo para nele se adaptar melhor. Este espírito, para o corpo é tal qual uma crisálida para o casulo.
Este não faz parte essencial daquela.
Assim, conforme a doutrina espírita, o corpo humano não faz parte essencial do homem: é como um fato que vestimos até se rasgar. Rompido este, procura-se outro.
Assim, inutilizado pela morte o corpo humano, rejeita-se esse invólucro e toma-se outro reencarnado.
Tal é, segundo o espiritismo, a natureza do homem, Noção absurda perante a sã filosofia.
Nós não somos apenas matéria, nem simplesmente espírito, somos constituídos na nossa própria essência por essas duas substâncias, essencialmente distintas, pela sua união, formando uma nova substância, que é o homem. Assim como de dois gases distintos, oxigênio e hidrogênio, devidamente combinados, resulta uma nova substância — a água. A água é essencialmente distinta dos seus dois componentes. Assim, o homem, do corpo e da alma, Destruir esta noção é destruir a mesma filosofia, a religião e o bom senso.
Mas, se o espiritismo nada quer saber de filosofia, de religião, nem de bom senso...
O casmurro Alan Kardec entendeu melhor que tudo isso, Imaginou o perispírito — do grego: peri, em redor — o que se deve traduzir “em redor do espírito”, com que entendia fizesse o espírito adaptar-se ao corpo.
E o mesmo Kardec, que sabia filisofia como os urubus entendem grego, explica a natureza desse perispirito, dizendo que é semimaterial, sutil e leve...
Mas, homem de Deus! A filosofia, até hoje, só descobriu o corpo material e a alma espiritual. Como esse perispírito pode ser semimaterial? Não pode!
Mas no mioleiro de Alan precisa sê-lo, pela razão muito simples de que deve colar um corpo material e uma alma espiritual...
Uma substância material, é claro, se adaptaria ao corpo material, e uma outra espiritual só poderia ajustar-se à espiritual, Então o finório criou a substância semimaterial, sutil e leve!
É demais! Não sei se devo rir de tanta cretinice, chorar de tanta insolência, ou altear os ombros diante de tanta ignorância...
Mas continuemos o estudo, ou, melhor, a análise do trecho citado do respeitável deus do espiritismo.
O mestre lembrou-se de que não nos livramos da morte, tanto os espíritas como os católicos.
E que é a morte? A destruição do corpo, não do espírito, diz ele.
Nós, católicos, dizemos que é a separação do corpo e da alma.
O mestre Alan não podia adotar uma fórmula tão clara; aliás seria uma contradição aos seus princípios.
Descolando-se o corpo do espírito, teria sido obrigado a dizer onde iriam pairar corpo e espírito.
O espertalhão escapa e diz que o corpo se destrói pela morte, desaparece, e o espírito voa pelo espaço, para a lua, donde veio.
Mas, ilustre mestre, e o perispírito? Onde ficará?
Escondido nas asas do espírito ou ajustado ao corpo?
Essa substância semimaterial se destrói também ou ficará acompanhando o espírito?
Vou ler com atenção o livro dos espíritos, para descobrir este enigma.
E depois da morte, que acontece?... O mestre Alan já o disse: o corpo é destruído, nada mais, é um animal morto, que se decompõe, e só...
Quanto ao espírito adaptado ao corpo, voa, voa, até encontrar qualquer couro de lobo ou de asno que o queira agasalhar, para dar começo à nova vida. Eis o que é o homem, na doutrina espírita. Notai-o bem...
É um nada...
O corpo destruído, o espírito que não era seu, mas de um corpo qualquer, alou-se, nada ficou do conjunto que era o homem. Nada. É a destruição. É a ruína.
E dizer que há homens que tomam isso a sério, gue acreditam que há nisso ciência, ou religião! A ignorância não pode chegar a este ponto. Só mesmo a loucura!
Compreende-se a frase do eminente Dr. Carlos de Laet: “Assistir a uma sessão espírita é tomar um bilhete de entrada no asilo de loucos”.
Diga-me, agora, o leitor que me lê, se vale a pena um homem assistir a uma pantomima espírita, para aí aprender que não é homem, mas simplesmente qualquer espírito ajustado no couro de um bobo?
Eu já tinha certeza disso, mas aposto que os médiuns espíritas não sabiam disso.
Pois bem, agora fiquem sabendo.

IV. A personalidade espírita
Afinal, percorri o Livro dos Espíritos, de Alan Kardec, sem nada encontrar. Mas, com perseverança de frade, procurei em outro volume do mestre, deparando-se-me nas Obras Póstumas esta expressiva frase: “Na encarnação, o espírito conserva seu perispírito, que é o órgão da transmissão de todas as sensações, e com o perispírito, ainda unido ao corpo, a alma retém a sua individualidade (Obr. post. Cap.2, nº11).
Este curioso perispírito, continua o mestre, é o órgão da transmissão de todas as sensações.
Chama-se sensação a impressão produzida em um órgão dos sentidos pelos objetos exteriores.
A substância semimaterial que envolve o espírito serve, pois, de fio condutor, estabelecendo relações dos órgãos à alma, Assim, a vista, o olfato, a audição, realizados pelos órgãos do corpo, são transmitidos ao espírito pelo invólucro aderente.
O mestre continua dizendo que o espírito, destarte unido ao corpo, retém a sua individualidade. Isto quer dizer, claramente, que não há união substancial e pessoal da alma com o corpo, formando a pessoa humana, o nosso “eu” interior.
Ora, isto está em completo desacordo com a verdade. A religião, a ciência e o bom senso nos ensinam que cada um de nós tem a sua personalidade própria, o seu eu, e esta personalidade, que faz que eu seja mesmo eu, não um outro, que fulano de tal é distinto de sicrano e de beltrano, esta personalidade, dizia, provém da união substancial do corpo e da alma, formando, assim, uma substância nova que é o homem — o homem tendo a sua mesma personalidade.
No espiritismo, nada disso, O espírito do espaço encarna-se, apodera-se do corpo, ajusta-se-lhe pelo perispírito, sem perder a sua individualidade, dominando-o completamente, enquanto perdurar a vida, para depois abandoná-lo como nós abandonamos a casa que ameaça ruína. O corpo, enfim, reduz-se ao aniquilamento do sepulcro.
E o espírito, para onde irá ele? O espírito demandará o espaço afora, borboleteando em redor de nós outros, como certas aves sinistras voam em redor de um animal em decomposição.
Voará até pela metempsicose, migração da alma, de um corpo para outro, no tempo e no espaço, a um indefinido número de corpos dos três reinos da natureza, sem jamais a nenhum pertencer, pois conserva sempre a sua individualidade e continuará pela transmigração a perpetuar-se, neste ou noutros planetas, até atingir a eternidade feliz.
Paremos. Para compreender tais elucubrações é preciso refletir, repetir e comparar. O ensino evangélico reluz, porém, porque é divino, é a expressão simples e positiva da verdade.
O ensino espírita é ambíguo, vaporoso, pois repousa sobre a negação, a destruição, sobre o nada, enfim.
Procuremos, entretanto, elucidar a idéia do mestre.
A alma, ou antes, o espírito, tem a sua individualidade.
Isto quer dizer que é tal por si mesmo, pela natureza.
Desde a eternidade existe uma incalculável quantidade de espíritos, de diversas qualidades, uns puros, outros impuros, uns sérios, outros zombeteiros, uns pacatos, outros algozes, uns calmos, outros coléricos, uns rezadores, outros guerrilheiros.
Estas almas, um ou outro dia, se devem encarnar num corpo. Pouco importa qual seja esse corpo. A encarnação é feita. A alma é adaptada a este corpo pelo Perispírito, e eis o homem formado, pois a alma dominando o corpo ajusta-o conforme a sua individualidade.
Se o espírito encarnado for um espírito vaidoso cruel, destruidor, eis um homem vaidoso, destruidor ou cruel; queira ou não queira, tem necessariamente que seguir a individualidade da alma, sendo o corpo E simples máquina por ela acionada, É a horrível conclusão que se deve tirar do ensino de Kardec. Logicamente, os espíritas devem afirmar, como faz o mestre: "O homem bom é a encarnação de um espírito bom”, “e o homem perverso é a encarnação de um espírito impuro”.
Portanto, o animal-homem (o corpo) procede sempre e necessariamente como uma máquina movida pelo espírito encarnado. É a negação do livre Arbítrio, da responsabilidade moral, a destruição do fundamento de todas as leis sociais e morais e de toda a doutrina católica, para dar lugar a um fatalismo absoluto.
Compreende-se, pois, o que significa uma tal doutrina, mais do que diabólica. Pois se o demônio nega, procura, pelos menos, construir um edifício no meio de  suas ruínas. O espiritismo derruba, aniquila, pulveriza atê chegar ao nada... E a doutrina do desespero.
Para a nossa inteligência o nada não existe, mas concretiza-se no desespero ou na loucura. É bem a jornada da seita que entre nós tenta fazer prosélitos.
Mas estudemos as consequências de tais princípios. A ser espírita sincero, um homem deve assim raciocinar: “Eu não tenho uma alma que é minha; aquela, que agora está no meu corpo é talvez a alma de Judas, de César, de Salomão ou de Caim. Depois de mim, passará a outrem, Nada tenho que fazer por ela; pois não é minha. Para que então as boas obras, a vida honesta?
Porque não matar, roubar, assassinar, gozar na lama e no ouro? A vida passa. Quem expiará as minhas culpas não serei eu, mas aquele que receber a alma que me fez agir. Para que pensar num céu ou num inferno? Para mim não existem. Destruído o meu corpo, a alma que o anima voará para outrem e continuará a mesma vida de irresponsabilidade. Ninguém poderá repreender-me nem castigar-me, pois não sou eu quem faz o mal: é o espírito alheio que age em mim”.
Tudo isso é horrível, e, entretanto, é lógico. O espírita convencido e lógico deve renunciar à sua personalidade. A personalidade espírita é a alma, só a alma... sendo o corpo apenas uma máquina pesada.
E há homens que se prezam de dignidade que subscrevem tais atrocidades. E há outros que levam a cretinice a ponto de proclamar que o espiritismo é científico, é moralizador!
O nosso século, orgulhoso das suas invenções, é rebaixado pela mais estúpida depressão que se pode imaginar.

V. O deus dos espíritas
Os espíritas acreditam em Deus? Qual será o seu deus, se o espiritismo presume-se acima do Todo-poderoso?
Abrindo o catecismo, para saber quem é Deus, encontramos esta breve e profunda afirmaçon: Deus é um espírito perfeitíssimo, eterno, criador do céu e da terra.
Eis a verdade que o mundo inteiro aceita, — digo o mundo inteiro, não os espíritas, pois eles não são nem deste, nem do outro mundo: são do espaço, do reino das nebulosas e das aves.
O Deus verdadeiro, único, é aquele que, sendo um na sua essência, é trino nas pessoas. Eis o Deus do cristianismo.
O espiritismo não reconhece este Deus: Despreza-o, ridiculariza-o. Ora, outro Deus verdadeiro não há.
Rejeitando o único, ficam os espíritas sem Deus: serão ateus.
Os espíritas falam, sem cessar, no nome de Deus, nos atributos de Deus, mas em prática negam a Deus, os seus atributos e até a própria essência divina.
Os pagãos também falam do seu deus: seja Baal, Baco, Júpiter, Brama, ou outro qualquer.
Quando o espiritismo teima em se mostrar crente em Deus, ora descamba para o panteísmo, ora para o politeísmo.
Havendo Kardec perguntado, um dia, ao seu espírito familiar, que mentirosamente dizia ser a verdade, se “é Deus um ser distinto, ou resultante de todas as forças e inteligências reunidas do universo”, teve esta resposta: “Deus existe; não podeis duvidar; isso é essencial: crede-me, não vades mais além; não queirais meter-vos num labirinto, donde não podereis sair” (Livro dos espíritos, c.1, no.14)
Ora, afirmar simplesmente a existência de Deus, sem ir mais além, indagando a essência e perfeições infinitas, é abrir larga estrada ao panteísmo.
A isto é arrastado o espiritismo, pela “verdade mentirosa” do seu mestre Kardec.
Este mesmo mestre de mil patranhas ensina que “os espíritos são eternos e que, embora imperfeitos na sua origem, são aptos para atingir a perfeição, e quando o espírito humano não estiver mais obscurecido pela matéria e se tiver aproximado de Deus, poderá vê-lo e compreendê-lo”.
Portanto, o espírito do homem pode chegar a ser onisciente; sendo eterno e onisciente, é Deus.
Os espíritos perfeitos serão outros tantos deuses.
Neste caso, o espiritismo pode ter um número incalculável de deuses: o deus Caim, o deus Judas... talvez até mesmo um deus Trotski, Lenine, Calles.
Está, pois, bem claro: — O espiritismo não admite o fato da criação dos seres, por Deus tirados do nada.
Para ele, tudo quanto fora de Deus existe, são simples modificações do Ser absoluto.
“A humanidade, diz Kardec, não se limita à terra, nem ao tempo. Antes que a terra existisse, outros mundos havia, nos quais os espíritos encarnados (os homens) percorriam as mesmas fases que “ora percorrem os espíritos de mais recente formaçon”.
Ora, isto é positivamente absurdo. É negar a criação do homem à imagem e semelhança de Deus, no tempo, e não desde a eternidade.
É negar a unidade da espécie humana. É negar a distinção real entre os seres criados e o supremo Criador. É, afinal, esbarrar na absurdo panteísmo. Consequência lógica, irrefragável!
O espiritismo nega a verdadeira origem do homem, a sua natureza e o seu último destino; deve, pois, negar também, e nega de fato, a sua nobreza, a sua elevação acima de todos os outros seres irracionais e insensíveis, e bem assim a sua suprema e completa felicidade, depois da gloriosa ressurreição.
Tudo isso cai, desaparece, como desaparece um edifício se lhe solaparmos os alicerces.
No conceito espírita, não há neste mundo senão evolução. Evolução de espíritos que vão se aperfeiçoando, ou se pervertendo cada vez mais.
Donde se segue que o homem não se distingue do bruto; o espírito não se distingue da matéria.
Ora, esta! Onde iremos parar? O homem, então, é a mesmíssima coisa que os seres irracionais, com, apenas, levíssima diferença na sua conformaçon exterior?
Reconheço, agora quão inferiores são os espiritistas! Tenho pena deles e começo a compreender um pouco porque assim se fizeram.
Dizer que a bicharada é modificação do Ser absoluto! Coitados! Como essa doutrina me está, proporcionando espanto e calafrios!

VI. Conclusão
Os espíritas ensinam que “se o homem não atingir à sua perfeição numa só existência, para vir a ser eternamente feliz, terá de reencarnar uma ou mais vezes”.
Não sei se todos compreendem bem este negócio de reencarnações através duma existência mais feliz que a que vivemos, ao contacto de sábios e doutrinadores baratos e insultuosos.
Enfim, que fale o mestre dos que, na tribuna ou na imprensa, se constituem os campeões da mentira.
Diz Kardec que as almas ou espíritos existem desde a eternidade (primeira asneira). Estas almas, acrescenta, voam no espaço como bandos de aves de arribação (segunda asneira). Vir uma alma a tomar um corpo é encarnar (terceira asneira). Deixar ess'alma o corpo é morrer ou desencarnar (quarta asneira).
Se ess'alma não atingiu à perfeição nas existências anteriores, reencarna, tomando outro corpo, até se tornar espírito perfeito (quinta asneira). Eis a doutrina espírita,
A estas cinco tolices ajuntaríamos as que temos aqui rebatido, com as armas da verdade e da boa fé.
Sigamos, agora, por um instante, o desenrolar destes princípios, examinando-os à luz do bom senso e da ciência sadia.
As almas existem desde a eternidade, não sendo criadas por Deus, pois o Senhor vem após, sendo ele apenas um espírito aperfeiçoado. Ora, a existência precede o aperfeiçoamento; logo, os espíritos existiam antes de Deus.
E donde vêm eles? Saberão dizê-lo? Teriam crescido num ser vegetal, feito encarnação de um espírito inferior?
Mas tais espíritos não são completamente “espirituais”. Lembremo-nos do perispírito de invólucro semimaterial e olhos de lince... que, nos espaços, procura descobrir a formaçon de qualquer corpo, a fim de se apoderar dele... Penetram em tudo e em toda a parte.
Não se pode viver em sossego, cercado de espíritos maus, zombeteiros, tagarelas, blasfemadores, etc. etc.
O mundo está cheio, e nós, pobre humanidade, pensamos ainda viver sozinhos! Que horror! que vida! que suplício!
São verdadeiros micróbios, pois eles se apresentam debaixo de todas as formas; ou melhor, não há mais micróbios: só há espíritos: espírito da tuberculose, espírito da lepra, espírito da loucura, espírito da febre, de estegomia e de anofelinas, etc.
E esta descoberta chama-se ciência espírita. Isso lembra-me a história do intendente de um município do norte, no Estado do Pará. Era um homem honesto, bondoso, rico pelo trabalho perseverante, no tempo em que a borracha era ouro, era a mãe dos pobres. Um belo dia foi nomeado intendente municipal, O bravo do homem o merecia na verdade, mas, infelizmente, não sabia ler. Após a eleição, os vogais fizeram entender que em vista de sua alta dignidade convinha que aprendesse a ler um pouco e a assinar o nome. O intendente não se fez derogado, e eis que no dia seguinte, sob a batuta do mestre-escola, em aula particular, estava o homem a soletrar o abc. Fez sérios progressos e em poucos dias sabia de cor todo o bá, bé, bi, bó, bú, até zá, zé, zi, zó, zú.
Ficou radiante, Percorrendo as ruas da cidade, repetiu a todos: Olhe, seu compadre, é bom você estudar; a ciência é uma coisa admirável! A gente sabe tudo, compreende tudo! É uma nova vida que começa para os velhos... Custou, mas, enfim, eu já sei. E lá começa a soletração monótona e repetida de bá, bé, bi, bó, bú, até zá, zé, zi, zó, zú.
E os compadres ficaram olhando para o azul do firmamento, boquiabertos, extasiados diante de tanta sabença. Seu compadre, é admirável!... e você aprendeu tudo isso?... Que bom governo vai você fazer!...
Cada vez que falam dos improvisados tribunos e escrivinhadores espíritas, o velho do frade também lacrimeja de suave comoção e mal recalca os soluços de alegria que lhe sacodem o tórax, ao pensar no b-a-ba do espiritismo, repetindo, sob o bigode embranquecido: Como agora se vai viver feliz, agora com tantos espíritos sabichões que nos cercam sob o clarão científico das preleções encomendadas e dos rebates maçudos e descorteses!
Continuará a lição, pois isso é apenas o abc da ciência espírita...

 

SEGUNDO LAMPEJO
Belezas da reencarnação

Vir uma alma a tomar um corpo — é encarnar, diz Kardec. Examinemos à luz da razão e do bom senso esta falsa asserção.
O espaço é povoado de almas ou espíritos, e como já o indiquei pelas próprias palavras de Kardec, estes conservam a sua personalidade distinta do corpo, que é apenas um invólucro material, transitório, que os envolve. Esta união opera-se pelo perispírito, substância semimaterial, em virtude de ter que se reunir a alma espiritual a um corpo material.
E para isso o genial Kardec inventou a sua célebre cola semimaterial. Notemos, de passagem, a cretinice da invenção. Só existem duas ordens de estados verdadeiros: o estado espiritual e o estado material.
Kardec, porém, entende de obter um invólucro, ou perispírito, que constitui um terceiro estado e toda a base da ciência espírita.
Agora, vem a encarnação... Tais espíritos devem encarnar-se, isto é, “meter-se em carne.
Mas, notemos bem, que tal encarnação se pode fazer (é Kardec quem o diz) nos três reinos da natureza, isto é, no reino mineral, vegetal ou animal; em outros termos, o espírito pode encarnar-se nas pedras, nas plantas ou nos animais...

I. A ciência espírita
Chega a hora de encarnação. — Notem o absurdo: encarnar-se, meter-se na carne de uma pedra, ou de um pau, na carne de uma formiga, barata ou peixe. O bom Kardec podia ter inventado os termos de empedrar-se no mineral, emadeirar-se no vegetal, empeixar-se nos aquáticos, zoofitar-se nos animálculos, etc., etc.
e encaixotar-se no bípede humano...
Enfim, em questão de ciência, as suposições precedem as experiências, as experiências fazem nascer os fatos, aos quais se adotam os termos...
O velho frade vem trazer a sua pedrinha para o monumento espírita, a proclamada ciência da loucura.
Por ora fique o termo encarnar-se na pedra, no pau ou no asno!
Eis, pois, um espírito bruto que só merece pedra...
pois, boa pedra não falta, e eis que o maroto do espírito procura uma pedra para meter-se nela...
Aí está. Batida pelas ondas, lavada pelos mares, insensível, fria, inerte, mas, num momento dado, o espírito desce, penetra na pedra, fixa-se nela por meio de seu perispírito, e eis a pedra, inerte e bruta, feita um ser vivo, inteligente, pois todo espírito é inteligente.
A pedra aí fica, mas vê, ouve, sente, cresce e se desenvolve, pois o fim da encarnação é o desenvolvimento, o aperfeiçoamento do espírito.
Não objetem nada! Isto é científico na sabedoria espírita, onde a gente deve crer tudo e nada examinar — não objetem, pois que uma pedra não tem olhos paraver, ouvidos para ouvir, nem órgãos para crescer.
Cala a boca, homem, tu não entendes de espiritismo... Tens olhos para ver e ouvidos para ouvir. Isso é cretinice do católico romano, que ainda acredita em Deus; os espíritos emancipados, libertados do jugo de Deus, de Cristo, do Papa, dos bispos, e da “sombra das batinas” dos sacerdotes, tais espíritos estão muito acima de tamanha ignorância.
O espírito — qualquer deles — tem a sua personalidade perfeita, fora e dentro da matéria. Logo, o espírito vê, ouve e cresce na pedra.
Aliás, tudo o que vive deve alimentar-se e crescer, A pedra vive pela encarnação do espírito, logo, deve alimentar-se e crescer.
De que se alimenta? Como cresce uma pedra?
Até hoje, julguei, porque assim me ensinaram em quimica, que uma pedra aumentava por adição, de fora para dentro. Mas isto é católico. Kardec faz crescer a pedra de dentro para fora...
Francamente, eu fico com medo das pedras. Até ontem o homem se supunha o rei da criação, em paz e harmonia com todos, julgando-se seguro na sua alçada e poder, e eis que, de repente, à luz da lâmpada espírita, tudo mudou, cobrindo-se as pedras de olhos e ouvidos, de boca e dentes para destruir o reinado.
Só agora começo a compreender as vantagens do espiritismo. Estou vendo como a ciência espírita é uma grande coisa, — uma coisa sublime, luminosa! E até ontem eu nada tinha compreendido disso. Foi preciso que a lamparina espírita dissipasse as sombras da minha inteligência de frade. Só tenho que agradecer...

II. A reencarnação espírita
Continuemos as nossas pesquisas científicas, no campo espírita. Após a encarnação dos espíritos, conforme os maravilhosos ensinamentos Kardecistas, nas pedras do mar, da estrada, das rochas e das habitações, há a encarnação nos vegetais.
— Mas, como isso se operará? Manuseei os comentadores da tal doutrina, sobre o caso, e concluí estarem os mesmos inclinados à hipótese de não prevalecer a dos outros reinos sobre o vegetal.
Da semente cresce a árvore e quando de certo tamanho, eis que alguns espíritos delas se enamoram. Se estiver o espírito em progresso, isto é, após haver completado a sua primeira existência, num mineral qualquer, depois de desencarnar-se da pedra, certo, meter-se-á no cerne da árvore.
Aqui há vida; é melhor, não há dúvida. E eis que o nobre espírito se dilata, respira, alça a cabeleira viçosa para os céus, estende os braços no espaço, firma os pés na terra... e assim, firme e elegante, abrirá os olhos, os ouvidos, a boca, para ver, ouvir e comunicar as suas impressões aos viajantes dos caminhos.
Ao ver passar um católico, indigna-se, como é natural, e, dirigindo-lhe um olhar de desdém, sussurrará: “Que ignorante, este homem!”
E ao passar uma batina? Que horror! Uma sombra de batina!!!!...
Mas, quando divisa, em meio do concerto florestal, um doutrinador vulgar, despejando impropérios kardecistas, estenderá os largos braços verdes, num fraternal amplexo de ternura. Alegres soluços sacudir-lhe-ão o tórax arboriforme, uma lágrima cintilará nos olhos foliculares, enquanto doces palavras cairão de seus lábios verdejantes: — Salve, mil vezes, salve!
E, continuando em latim, (pois os espíritos também sabem latim), a árvore continuará: hodie mihi, cras tibi!... Aqui hoje estou, amanhã tu estarás!
Ó doce colóquio! Um espírita nunca deveria passar indiferente diante de um vegetal. Com um suave sorriso aos lábios, deveria abraçá-lo, corpo material de um espírito imaterial, osculá-lo afetuosamente, e murmurar-lhe umas palavras de consolação.
Nós, católicos, cumprimentamos os nossos amigos e conhecidos, quando com eles nos encontramos. Oferecemos-lhes união, sempre um aperto de mão, pelo menos um olhar de bondade, um sinal de afeição. E os espíritas, tão superiores, tão afeiçoados, quedam-se indiferentes diante dos maninhos da estrada, do mato e dos quintais! Que negra ingratidão!
Mas, há pior que isso. Espíritos que decepam o próprio vegetal, que lhe cortam a madeira, que lhe queimam a lenha... Tudo são uns tantos corpos de espíritos!
Derramam-lhes o sangue, rasgam-lhes as veias, ferem-lhes as carnes, dissecam-lhes as entranhas, e estes membros, ainda palpitantes de vida espirítica e radiantes de fluidos semimateriais, são lançados ao fogo, para aí, pela sua morte, sustentar a vida de outros espíritos!
Os espíritas tornam-se, destarte, verdadeiros antropófagos, em meio do século XX!
E ao contacto do machado que o destrói, o espirito sacode as asas, e quase paralisado pela cola semimaterial do perispírito, levanta o voo para os espaços azuis do firmamento, esperando que possa voltar, um dia, para encarnar-se novamente, em qualquer árvore mais aperfeiçoada... frutífera, talvez, para depois de haver produzido pelo seu sopro e pelo fluido das suas entranhas saborosos produtos vegetais, poder de novo deixar o cárcere verde e tornar a encarnar-se em qualquer corpo animal.
Mas, nada se faz por saltos na natureza, diz a filosofia. Não pode ser de repente que o espírito, após a sua estada nas árvores, possa tomar posse do corpo de um animal superior.
Há de passar, antes, pelo reino animal inferior, pela história natural chamado dos zoófitos.
Eis, pois, o espírito no fundo do mar, agora feito polipeiro, onde milhares de pólipos se desenvolverão, crescerão e hão de morrer, sendo cada um deles um espírito aquático... Que legião de espíritos nos corais e nos espongiários que povoam o fundo do oceano!
E a transição é um progresso, pois na casca da madeira o pobre espírito nem se mover poderia; nem daria um abraço no espírito vizinho, nem castigaria o garoto que lhe roubara os frutos...
Agora, sim, armado de tentáculos, eis que conseguirá sublevar os mundos superiores...
Ei-lo armado no fundo do oceano, até que um dia qualquer cetáceo, perturbando-lhe a vida espirítica, ou qualquer âncora férrea de navio, ou qualquer submarino, arrancá-lo do seu pedestal secular, enviando para o firmamento os milhares de outros espíritos, ajustados às cavidades de seus polipeiros...
Tornam-se corpos sem alma, sem espírito... Mas, breve caindo no mar qualquer marinheiro imprudente, que não soube cumprir com o seu dever, eis que o polipeiro se reanimará pela reencarnação do espírito do marinheiro, que ficará feito erva do mar.
Não se riam! Pois isso mesmo afirma a ciência espirita e gente educada deve sempre respeitar ciência e cientistas. Nada de admiração. Isso explica certos fatos que são do domínio da seita Kardecista...

III. Exércitos de reencarnados
Sempre avante, sempre em progresso! Tal é a divisa da ciência. O espiritismo, também, para poder progredir, meteu-se até no fundo do mar, e, após lutas imensas, chegou aonde nós estamos, nós, os homens da terra. Lembrem-se, porém, que os espíritos não são da terra, vêm da lua, do espaço, lá das altas regiões onde só penetra a visão telescópica do astrônomo ou o olhar perscrutador de certos improvisados “cientistas”.
Para ficarmos sempre imparciais na exposição das teorias espíritas, é preciso, vez por outra, lembrar as palavras de Kardec, que formam a base da reencarnação: —“O homem, diz ele, é formado de três partes essenciais: o corpo material e sensível, análogo ao dos outros animais e animado pelo mesmo princípio vital; a alma, espírito encarnado, cuja habitação é o corpo, e o perispírito, substância semimaterial, que serve de envoltura ao corpo. A alma tem duas envolturas: uma sutil e leve, que é o perispírito, e a outra material e pesada, que é o corpo” (Livro dos Espíritos, Cap. 2, n.135,141),
Eis o que convêm rememorar, para conceber o plano espírita na mais absurda das suas invencionices que é a reencarnação.
“O espírito é eterno, mas imperfeito, e apto para atingir a perfeição”. Isto é ainda de Alan.
Até aqui, temos seguido o aperfeiçoamento progressivo de um espírito inferior, imperfeito, através das vicissitudes da metempsicose, ou transmigração da alma de um corpo para outro. Continuemos este curioso estudo, até chegarmos ao homem perfeito. Sucessivamente, o tal espírito foi se aperfeiçoando, passando de pedra a árvore, e de árvore a polipeiro... Saímos do reino mineral e vegetal e penetramos, enfim, entre os animais inferiores da terra, do mar ou do firmamento.
Eis, pois, o espírito que alcançou o grau do reino animal; eis o espírito feito bicho. Mas, para evitar os saltos, deve ele passar uns anos na pele dos animais inferiores: formigas, saúvas, enfim, moscas, baratas, besouros, etc.
Não se espantem! Isto é ciência espírita — e no espiritismo, quanto mais uma asneira é crassa e bisonha, tanto mais deve ser aceita cegamente.
Eis, pois, o incalculável exército subterrâneo de formigas e saúvas, o exército aéreo de moscas e besouros e o exército caseiro do cupim e das baratas, todos animais de espíritos reencarnados!
Há espíritos de todos os lados; e entre eles há espíritos bons e maus, destruidores, zombeteiros e impuros.
Grande Deus, que perigo! Enquanto nós, pobres bípedes, incautos e sorridentes, estamos sonhando com planos do futuro, de paz, de união, de ordem e de progresso, eis que debaixo dos nossos pés agita-se um exército inimigo, maior do que o da grande guerra européia, que cava, que rói, que solapa, que destrói, abrindo verdadeiros subterrâneos, cavando vulcões e abismos...
E isso tudo é feito por espíritos inteligentes, cujo fim é a destruição da humanidade, para realizar outras reencarnações.
E se fosse somente isso! Mas, enquanto solapam o único apoio das nossas bases pedestres, eis que a casa que nos abriga está sendo abatida pelo cupim-espírita, enquanto outros espíritos, em casca de barata, destroem, sujam e envenenam os alimentos que devem sustentar a nossa vida...
Grande Deus, vamos casa afora... É um perigo!
E, enquanto o pobre do homem procura, no sítio vizinho, escapar aos olhos e aos dentes dos espíritos roedores, eis que outro exército espírita lhe arranca o cabelo, fura a pele, chupa o sangue, excita os nervos, inflama a epiderme e faz do homem, o mais pacato, um verdadeiro bailarino, saltimbanco ou... orador espírita.
Grande Deus, que vida... Só espíritos! Espíritos em toda parte: espíritos na terra... espíritos no ar, espíritos em casa e no sítio, espíritos até na roupa e na pele da gente, pois até ai penetram certos parasitas, mais atrevidos que o pulex penetrans, e mais ferozes que os maribondos.
É uma vida de canibais... Os espíritos inferiores sugam, ferem, alimentam-se dos espíritos superiores que somos nós!
No sítio, estamos cercados de perigos. Qualquer espírito zombeteiro e carrasco, encarnado num coqueiro, é capaz de lançar-nos no abdômen um coco fenomenal, enquanto um cajueiro nos esmaga o nariz com o seu fruto, ou uma mangueira nos quebra o mioleiro com uma  manga.
Corre, homem, corre! Mas, eis que na fuga as pedras se animam, e outro espírito zombeteiro e bruto assenta-lhe nas costas um rochedo, enquanto outro espirito ferino, escondido no ferrão de um maribondo, penetra-lhe na testa o seu dardo envenenado...
Corre, homem, salva a tua vida! Ei-lo aqui, na areia branca da praia! Aí, pelo menos, encontrará a paz.
Do interior das areias surge, porém, de mansinho, o espírito pulex penetrans, o bicho do pé, que, sem preâmbulos, mete-lhe um exército de outros animálculos sob as unhas, enquanto moscas, besouros, mosquitos e gafanhotos, todos animados por espíritos ferinos e algozes, invadem-lhe o rosto e as mãos.
Corre, amigo, corre, talvez encontres nas margens dos lagos algum alívio. Qual nada! Apenas chegado, o homem lança-se na água, para refrescar a fronte queimada e o coração ofegante. Mas, que horror! A água não é senão uma aglomeração de espíritos horríveis, encarnados nos milhões de insetos, de vermes, de peixinhos, de rãs, de sapos que aí se banham e fixam morada, Desta vez, o homem caiu mesmo nos braços espíritas de um exército armado...
Melhor a morte que uma tal vida! Só se fazendo espírita, para poder voar para o espaço... Mas vai, homem, não desanimes: um espírito mata outro. Para vencer tantos espíritos do mal, engula um copinho de espírito do espírito... da cana. Contra os grandes males, os grandes remédios!
Eis a ciência espírita... Digam-me, amigos leitores, não é esplêndida uma tal invenção, e não merecem os inventores uma entrada gratuita nos asilos de alienados?
É o que podemos concluir dos rigorosos princípios enunciados pelo fundador da seita e que mui de indústria se encobre sob o pseudônimo de Alan Kardec.

IV. Os poetas de além-túmulo
Diria, talvez, alguém que estou exagerando, e que os espíritas não ensinam tal encarnação sucessiva?
Não há nenhum exagero. Eis uns versos publicados pelos vivos, mas ditados pelos mortos.
Ultimamente, os espíritas publicaram um volume de versos pelos espíritos, intitulado: “Parnaso de além túmulo”, e aí encontramos versos, sonetos, de todos os poetas mortos, que eles fizeram, voando pelo espaço, ou reencarnando-se em qualquer arara.
Eis um espécime curioso, feito pelo poeta Augusto dos Anjos, e intitulado: Vozes de uma sombra. Lá em cima, na lua, a própria sombra fala, canta e faz até versos! É para romper a monotonia da lua! Mas escutemos bem:


Donde venho? das eras remotíssimas, Das substâncias elementaríssimas, Emergindo das cósmicas matérias, Venho dos invisíveis protozoários,
Da confusão dos seres embrionários, Das células minúsculas das bactérias.
Venho da fonte eterna das origens.
No turbilhão de todas as vertigens,
Em substanciações fundas e enormes,
Do silêncio da mônada invisível;
De tétrico e fundo abismo, negro e horrível, Vitalizando corpos multiformes.
Sei que evoluí e sei que sou oriundo Do trabalho telúrico do mundo,
Da terra no vultuoso e imenso abdômen; Sofri desde as internas torpitudes
Das larvas miscroscópicas e rudes,
A infinita desgraça de ser homem.

Augusto dos Anjos.

Paremos aqui. É o bastante para provar que os espíritos, sem juízo neste mundo, não mudaram no outro.
O nosso grande poeta já foi larva microscópica, incluída no abdômen da terra.. e foi evoluindo... até ser mônada invisível depois protozoário, depois ovo de rã, depois sapo, rato, gato, cabra, boi, cavalo, macaco, e, enfim, homem. É ele mesmo que o conta... e por que não acreditá-lo? Ele não diz se, sendo macaco, já fazia versos.
E hoje, que será ele? Em que animal ou pássaro se terá ele reencarnado? Corvo, rouxinol, bem-te-vi, ou canário?
E estes pobres espíritas contam tais loucuras com uma serenidade, como se acreditassem.
Pobre poeta... é melhor voltares ao reino dos protozoários, e esconder-te nas células minúsculas das bactérias! Deve ser a melhor morada para um espírito poeta!
O leitor está vendo que nada exagero, descrevendo a série das reencarnações, e a minha narração deste mundo concorda perfeitamente com a do poeta do outro mundo! A única diferença é que escrevo rindo, e que ele canta chorando.

V. Acha de lenha científica
É tempo de estudarmos as reencarnações dos espíritos superiores.
A medida que eles vão se aperfeiçoando, pelas sucessivas reencarnações, diz Kardec, vão reencarnar-se em corpos superiores.
Isto quer dizer, em clara exposição espírita, que o espírito, depois de ter passado pela pedra, pelo vegetal, pelos insetos inferiores, chega, enfim, a reencarnar-se nos animais de maior importância na escala zoológica.
Tendo sido formiga diligente, barata imunda, rato voraz, cupim destruidor, ou até pulga dos pés, eis que o espírito, cada vez mais belo, após uns dias de férias no azulado firmamento das aves, reencarna na pele de qualquer gato, cão, cabra, macaco, bezerro, vaca, boi, jumento, mula ou cavalo.
Convenham que é um progresso imenso! O espírito, que mal sabia gemer, já sabe uivar, ladrar, berrar, relinchar, miar, ou ganir. O espírito que não sabia senão ferrar, sugar ou inocular veneno, já se acha munido de uma queixada regular, de dentes seguros e de unhas agudas... Não há dúvida, isso já é progresso!
Eis, pois, os luminosos espíritos do espaço aéreo destinados, como diz Kardec, a se tornarem um dia iguais a Deus. Pois Deus, para os prosélitos de Alan, não passa de um vulgar espírito aperfeiçoado.
Ei-los, agora, um no couro de um gato, a caçar baratas, gafanhotos e ratos; outros na pele do cão, a devorar entranhas de animal morto, ou a roer ossos apodrecidos; outros, ainda, na pele caprina, a estragar plantas e árvores, roendo-lhes as folhas novas... Outros, até, encourados no jumento, a transportar pedras, areia e lenha, talvez para os católicos odiados; outros, enfim, a pastar nos verdes prados e campinas...
Tudo isso são espíritos imperfeitos, mas em pleno aperfeiçoamento, por meio da metempsicose..
Se aí parasse a balbúrdia espírita... Mas, não; vai além, vai sempre adiante... Um dia, quando o gato, o cão, a cabra, o jumento, o boi, ou o cavalo sucumbirem, por causas diversas, (coisa admirável!), eis que o espírito, luminoso e radiante, abandonando a casa alugada que era esse corpo, arroja-se para os espaços, e após uns dias de descanso, por ter ficado assim apertado no pobre animal, descerá, olhará, examinará, e em recompensa de ter sido cabra leiteira, boi carnudo, cão vigilante, ou gato caçador, poderá reencarnar-se na pele de qualquer bobo ou de qualquer néscio.
Antes de poder tornar-se um homem ilustre (um orador ou médico espírita), é preciso que passe anos e anos a constituir-se no bestunto de qualquer idiota, no cocuruto de qualquer chinês, ou no apêndice caudal de qualquer chimpanzé.
Só depois dessa formaçon preliminar, conseguirá penetrar no corpo de um homem regular, digno deste nome.
Eis a evolução espírita dos espíritos. “Se a alma não atingiu a perfeição, nas existências anteriores, diz Alan, reencarna, tomando outro corpo, até tornar-se espírito perfeito”.
Notai que aqui supomos que tal espírito seja sempre fiel à sua finalidade e possa, deste modo, avançar progressivamente.
Tais são as conclusões das teorias espíritas.
Não devemos omitir a última conclusão, mais acessível ao espírito daqueles que pouco se dedicam aos estudos e que se refere aos pais de famílias.
Sois pais! Sois mães! Em vossos braços, sobre os vossos joelhos, agita-se, brinca e ri, o pequeno ser, franzino, a quem chamais “meu filhinho, minha filhinha”; a quem cobris de beijos quentes, porque é pedaço de vosso coração, de vosso corpo; o sangue do vosso sangue; a carne de vossa carne, irradiação do vosso amor conjugal.
Esta criancinha, que amais como a vós mesmos, cujos sorrisos e cuja primeira fala vos encantam e valem para a vossa ternura todas as harmonias da terra; que vos faz esquecer o suor do rosto, os calos das mãos e as feridas dos pés, para trazer-lhe o pão de cada dia e o conforto da educação; esta criancinha, doce, meiga, bela e radiante, a quem chamais os nomes mais ternos e mais comovidos, a quem cobris com o calor do vosso coração, mais ainda do que do sorriso dos vossos lábios — ó pais, ó mães, perdoai-me, queria calar-me, sinto o meu coração revoltar-se contra a minha pena, perdoai-me, mas o espiritismo infame vos grita:
— Pais, mães, esta criança não é o que pensais, não como a chamais, meu bem, meu anjinho, meu coração, minha vida; tudo isso é falso; tudo isso é católico; mas, não, esta criança é simplesmente o espírito de um gato, de um cão raivoso, de um assassino... Lançai-a fora, bem longe, no estrumeiro da casa; pode ser espírito imundo, a alma de um Judas, de um Caim, de um celerado. E vós a beijais? Ó pai insensato! Vós a apertais contra o vosso seio? Ó mãe tresloucada! Trabalhais para vê-la feliz? Sacrificais-vos por ela?
Pais, mães, esposos, se um homem fosse em vossa casa dizer-vos tudo isso, que responderíeis? Eu o sei!...
Não diríeis nada... porém, pegando numa acha de lenha, a faríeis descrever uma leve circunferência, para terminar, em linha reta, nas costas do perturbador de vossa felicidade... experimentaríeis se o couro espírita serve de pele de tambor, ou se é apenas o invólucro de um bobo.
E estaríeis em vossa legítima defesa. A acha de lenha faria as vezes de um argumento científico, irrefutável. São só estes argumentos que os espíritas compreendem. Religião e ciência espírita resumem-se para eles na “acha de lenha”.
Pois bem, é o que estão dizendo, ensinando, proclamando em face de todos, os oradores espíritas que vos exploram. Estão vos insultando naquilo que tendes de mais sagrado na terra, após a religião de Cristo.
E o que poderão eles merecer, afrontando o vosso amor, a vossa reconhecida, bondade? — “Acha” de lenha, certamente, e de lenha científica.

VI. Ciência diabólica
Chegamos ao centro do nosso estudo sobre a reencarnação, o posto onde melhor aparece a caducidade, a insânia dos seus princípios.
Há seitas religiosas, como há ciências ocultas por este mundo afora, que carecem de base, de princípios e de bom senso, mas não há seita tão néscia e idiota como o espiritismo.
Os princípios das ciências novas são necessariamente incompletos e falhos, mas nunca podem repugnar ao bom a senso e contradizer princípios certos e irrefutáveis de outras ciências.
Ao contrário, uma ciência deve servir de base, de apoio e de guia a outras. As matemáticas servem de base à geometria, à engenharia, à agronomia, à cosmografia, etc.
A química, de base e de fio condutor à terapêutica.
A anatomia conduz à fisiologia, à histologia, à patologia e à higiene. O desenho serve de fudamento à pintura; a gramática, à literatura, etc.
Nenhuma destas ciências, cujos princípios estão sólidos e provados, pode estar em oposição uma com as outras. Isto é admitido por todos que entendem de ciência e pretendem penetrar os seus segredos.
Uma só elucubração persiste em querer ser religião e ciência; quebrando todas as leis divinas e naturais, e contra tudo e contra todos, destruindo a religião, pretende ser religião... e abjurando todos os dados e princípios da ciência, que ser ciência.
Mas, paciência, senhores espíritas, não estamos no regime do a bolsa ou a vida, ou crê, ou morre!
A sociedade moderna não é uma aglomeração de bobos, de idiotas, que não sabem distinguir nem cores, nem formas, nem princípios, nem conclusões.
O próprio Deus respeita a inteligência humana por ele criada, e constituindo a parte mais nobre e mais elevada da nossa alma imortal. Deus revelou-nos a religião verdadeira, mas não a impõe, sem que possamos, sem que devamos estudá-la, examiná-la, ponderá-la à luz da razão, como à luz da revelação.
Deus nos deu a religião com os seus dogmas e mistérios divinos, onde tudo é harmonioso, profundo, concorde com nosso espírito, nosso coração e nosso corpo.
Sentimos que os próprios mistérios que nos revela, e a fraqueza de nosso espírito limitado não pode compreender, estão acima de nossa inteligência, nunca em contradição à nossa inteligência.
Deus respeita a nossa libertade, e tu, Ó espiritismo, tu tens a ousadia de querer impor-nos os teus mistérios ridículos que repugnam ao bom senso, que contradizem a nossa inteligência, e tratam como farrapos imundos as invenções, os estudos de vinte séculos de civilização.
Tu rejeitas a Deus, ao homem, à vida eterna, às ciências humanas, ao bom senso universal, e tu tens o topete de gritar que és a luz, a verdade, o progresso, a perfeição!
“Vade retro, Satanas!” Para trás! Tu és o demônio; és o anticristo, és a ruína, a desolação! Tu és a loucura! Não, nunca aceitaremos os teus dogmas, os teus mistérios porque contradizem a nossa inteligência e todas as ciências adquiridas! Queremos ver e estamos vendo.
E que vemos? É a loucura em seu mais alto expoente... Loucura nos espíritos, e loucura na audácia doentia com que se apresenta à face de um povo educado.

VII. Conclusão
O que temos exposto sobre as reencarnações é o bastante para um homem inteligente levantar-se contra tais elucubrações doentias, que só podem germinar no cérebro dos loucos, dos fascinados, dos possessos ou dos subjugados.
Esta divisão, aliás, já foi feita pelo próprio Kardec, prevendo, sem dúvida, que até ali iam descer os seus adeptos.
Resumamos, em poucas palavras, os erros expostos, para melhor compreender a beleza das concepções espíritas. Mas, não, prefiro citar aqui uma passagem clara de um órgão espírita, citação que terá a vantagem de mostrar que nada inventei, mas interpretei, imparcialmente, os ensinos espíritas.
Tenho diante de mim uma “profissão de fé espírita”, feita por um dos corifeus da seita. Não é uma profissão de fé cristã, é puramente espírita, panteísta e materialista...
Enumera os principais ramos da criação — obra do Onipotente, e diz: “E a alma dorme na pedra e no peixe do oceano, e desperta, por fim, dentro do corpo humano”.
Eis o que é bem claro e o que resume todo o meu estudo sobre a reencarnação, precedentemente exposto.
De modo que, segundo tal profissão de fé, a alma humana, substância simplíssima, espiritual, essencialmente livre, antes de tomar o seu respectivo corpo, já “dormia na pedra”, passando, depois, a dormir nos insignificantes protozoários, para seguir a evolução até constituir o homem.
Ora, afirmar a alma-pedra, a alma-peixe, antes de ser a alma humana, é destruir a distinção essencial entre o espírito e a matéria; é cair no materialismo e tornar-se suspeito do absurdo panteísmo; suspeição tanto mais fundada, quanto é certo que muitos espíritas professam esta doutrina.
Alerta, católicos brasileiros! Não vos deixeis iludir com as patranhas do diabólico espiritismo. Esses desgraçados pregoeiros, que dele fazem propaganda, são homens já fascinados pelo espiritismo mau, que lhes iludiu e paralisou o entendimento e a vontade.
Caídos, pelos seus vícios, neste lastimoso estado, são guiados como cegos, são subjugados como escravos.
Dizem e escrevem tanto e tamanhos disparates, que logo se vê o cérebro mal parafusado. Presumem-se de sábios e tornam-se estultos. Alardeiam-se cristãos e mostram-se idólatras. Tomam a aparência da caridade e da beneficência e arrastam os seus adeptos para os asilos de alienados.
Não, não, mil vezes não. O espiritismo não tem nada de ciência; é a destruição, a negação da ciência...
pois é a negação da inteligência humana, base de toda ciência. Solapada a base, deve ruir o edifício; contrariando o bom-senso e jogando aos pés os fatos verdadeiros à luz da inteligência e da revelação divina, o homem é abatido do seu pedestal de “rei da criação” para tornar-se um vil animal.
Tal ciência contradiz todas as ciências humanas, como contradiz as doutrinas do divino Mestre.
É o bastante para ser julgada. É sua sentença de morte: Mentita est iniquitas sibi!
Tem razão: deveras uma “ciência diabólica”, nunca humana, para perder os homens e preparar o reino do anticristo!

 

TERCEIRO LAMPEJO
O círculo esotérico: A comunhão de pensamento

A medida que a fé vai diminuindo nas almas, a superstição se desenvolve nos espíritos. O homem não pode viver sem fé. Queira ou não queira, tem de acreditar em qualquer coisa.
Monsenhor Bougaud disse em qualquer parte: “O homem tem de curvar a fronte, e não querendo prostrar-se diante de Deus, num gesto de adoração suprema, prostra-se diante de uma criatura, na atitude de um animal”.
É o que estamos vendo diariamente; aliás, é a aplicação do adágio dos filósofos antigos: Corruptio optimi pessima.
A nossa sociedade hodierna eleva-se a alturas fantásticas, pela inteligência que perscruta, analisa e inventa; mas, quando esta sociedade pretende emancipar-se de Deus, então, sim, desce de seu trono glorioso e envolve-se no mais nojento dos lamaçais.
O espiritismo é o ferrete da ignomínia que a decadência moral imprime sobre o nosso século de progresso material. É como o contrapeso do progresso, porque este progresso, não se apoiando sobre Deus, e não se deixando guiar pela religião, torna-se um progresso materialista, exaltando a matéria e rebaixando o espírito.
O espiritismo é o anticristo moderno. Segue seu caminho, atacando e blasfemando, e, vencido num terreno, refugia-se noutro. Arrancando-lhe a túnica, com que se cobre um dia, reveste-se de outros farrapos, de modo a poder apresentar-se continuadamente em trajes novos, e sob aspectos renovados.
Uma destas túnicas novas é o círculo esotérico ou zótico. E é este novo aspecto do espiritismo que quero estudar aqui.

I. O que é o esoterismo
O tal círculo esóterico é um ramo do espiritismo, é o próprio espiritismo, que pretende atribuir aos homens um poder criador.
O espiritismo, pelos seus princípios, é deísta, quer dizer que admite a existência de Deus, mas não a providência de Deus.
Ultimamente, o espiritismo, pelo progresso que vai fazendo, progresso que prova apenas que é humano e não divino, cai no panteísmo ou sistema dos que pretendem que Deus é tudo.
Desde que alguém se afasta da única verdade, vai caindo de erro em erro, pois a verdade é uma e os erros são muitos.
O círculo esotérico é como que o panteísmo da seita espírita. O seu princípio é que o homem, pela sua natureza íntima, é divino, ainda que a sua divindade se conserve oculta pelo véu da carne. São as suas palavras textuais.
Na doutrina católica, ensina-se que o homem é um composto de corpo e alma, de corpo material e de alma espiritual, criada por Deus à sua imagem e semelhança.
Sendo a alma criada por Deus, ou obra de Deus, é claro que tal alma não é de Deus e nada tem de Deus, senão a semelhança espiritual.
O operário é necessáriamente distinto da obra.
O operário é Deus. A obra é nossa alma, Um deve, pois, ser essencialmente distinto do outro.
Os amigos espíritas-esotéricos acham melhor confundir operário e obra, e dizer que tudo isso é Deus. O homem, segundo eles, é Deus oculto pelo véu da carne.
A carne não passa de um vestido de Deus. Aqui veste-se com a carne alva e rósea do europeu; acolá veste-se com a carne preta do africano; mais além, enfia-se na carne amarelada do chinês. — E sempre Deus, mas Deus que muda de vestido, conforme o tempo, os países e as moléstias. Cada homem é um vestido de Deus.
Que bela invenção!... E vieram descobrir isto no século XX... Enfim, quem é incapaz de inventar a pólvora, inventa, pelo menos, um vestido para Deus. E Deus tem que revestir-se deste vestido, seja este a pele de um zulu ou de qualquer idiota, pele de um espírita ou de um turco.
Deste princípio esotérico, os aderentes tiram esta admirável conclusão, que copio aqui textualmente do seu manual.
Hi-lo: “No futuro, a filosofia será alguma coisa mais do que uma ginástica mental; a ciência suprirá o materialismo; a religião será anti-sectária; o homem agirá então com toda a justiça e amará o seu irmão como a si mesmo, não porque espere uma recompensa, ou tema uma punição post mortem, ou pelas leis humanas, mas sômente porque reconhecerá, que ele é uma parte de seus semelhantes, e que ele e seus semelhantes são partes de um todo e que o todo é Uno”,
Como se vê, o homem vai subindo... No principio era um véu de Deus, um vestido de Deus; agora já é um pedaço do próximo; e ele com todos os próximos são o próprio Deus.
Que bela teoria, mas não para os dias de calor, para a gente não adormecer diante de tanta pretensão.
Vê-se logo que tudo é puro panteísmo. O espírita é deísta; o esotérico é panteista.

II. O objetivo do esoterismo
O objetivo do esoterismo é juntar um pedaço de Deus a outros pedaços de Deus, que são os homens, e, pela reunião destes diversos pedaços, construir o Deus completo e inteiro. Deus, assim dividido em partes, perde naturalmente a sua força total, como tudo o que é dividido. É preciso juntar e unir estas partes, para, deste modo, ter o Deus completo.
E como fazer isso? É muito simples, dizem eles.
Estabelece-se a comunhão do pensamento. O pensamento, para os esotéricos, é a força da alma.
Por meio desta força interior, dizem eles, e só eles o poderiam dizer, porque um homem sensato sentiria arrepios ao dizer tais absurdos. Por meio desta força interior, o homem vencerá a indolência, libertar-se-á da ignorância no reino da sabedoria! É mesmo admirável!...
e seria sublime, se não fosse bobo demais.
Cada parcela de Deus, que é o homem, — são sempre os mestres esotéricos que falam, — é um pedaço de bobo... mas todos estes pedaços de bobos indolentes, ao juntarem-se, vão formar a força suprema, a força divina, o reino da sabedoria.
É o mesmo que dizer que a reunião de cem analfabetos formará um corpo científico, ou que duzentos roceiros formarão uma junta médica, ou então que mil pretos formarão um batalhão de brancos(!).
Por amor de Deus, caros esotéricos, deixem de asnices; sejam, se não sábios, pelo menos, gente, e isto não é de gente.
A acumulação de zeros nunca dará um algarismo, como a comunhão de pensamentos nunca passará de pensamentos. O pensamento não é uma força, é uma noção, uma compreensão.
É a vontade que é uma força no homem. O homem pode ser sábio pelo pensamento, mas só pode ser forte pela vontade. Dizer o contrário, é asseverar que o homem é hábil em trabalhos de mão, quando sabe bem correr com os pés. Não confunda tudo, gente!...

III. Mensagem da alma
Para que a idiotice seja aceita, é preciso dar-lhe um nome pomposo.
É a história do roceiro que queria para os seus filhos nomes retumbantes, que chamassem atenção; por isto chamou o primeiro,para seguir a ordem alfabética,com o nome de Amancebado, ao segundo apelidou Bombardino, e ao terceiro enfim chamou Cavalgadura. Os espíritas usam o mesmo proceder. Um epiléptico ou histérico, chama-se médium. Um ataque histérico ou nevropata é um transe. Uma fanfarronada sem nexo é uma mensagem.
E a reunião de pensamentos de um certo número de nevropatas chama-se uma mensagem da alma. É preciso conhecer o vocabulário espírita que vale quase o dicionário maçônico.
Para receber tais mensagens da alma, o espírita indica uma hora, recolhe-se, une seu pensamento ao pensamento desconhecido de outros espíritos, e pronto, lá vem a força, a luz, tal um radiograma através do espaço. Está feita a mensagem da alma!...
E há idiotas que ainda acreditam nisso! Haveria mesmo? Eu duvido... Mas, é um meio de vida, e hoje, neste tempo de crise, o cavador da vida aproveita tudo. Os espíritas evocam os mortos, fazem calar os vivos e falar os defuntos.
Os exotéricos, tendo perdido o pensamento por falta de inteligência, invocam o pensamento dos outros, julgando receber desta evocação luz, calor e amor!
Que fazer então? Nosso Senhor aí o disse:stultorium infinitus est numerus - o número dos doidos é infinito. (Ecli 1,15). Os espíritas de hoje na maioria acabam na loucura, dando, deste modo, uma solene afirmaçon às palavras divinas.
Do mesmo modo que há loucos que acreditam serem imperadores, reis, generais, o pobre esotérico, na hora marcada, através do espaço, em ondas silenciosas, imperceptíveis, julga receber o influxo do pensamento dos outros. É um pobre doente... é uma mania como qualquer outra...
O fim do esoterismo é, como eles mesmos o confessam, o estudo do ocultismo. Basta-nos esta indicação, para ver que tal esoterismo não passa de uma grande superstição, de uma superstição ridícula, absurda e grosseira.
Escutem mais este pedacinho do manual esotérico: “O ocultismo levantou sempre, até onde permite o grau de adiantamento de seus iniciados, o véu que encobre os grandes mistérios do universo, cujas leis e forças somente são conhecidas pelos grandes iniciados”.
Abaixo o chapéu... ó Brasil, e avante a música!... Os esotéricos encontraram, enfim, a pedra filosofal, que muda as trevas em luz, a miséria em riquezas, a ignorância em sabedoria.
E, para obter tudo isso, não é necessário nem estudos, nem pesquisa, nem Deus, nem demônio. Basta mandar ao centro esotérico o nome, endereço com R$30,00 de contribuição, enviando depois anualmente outros R$20,00, e pronto...
O céu abre-se, o horizonte recua, as trevas dissipam-se, e o novo associado vive nadando no ouro, na luz, no amor, na fraternidade, enquanto os diretores espíritas embolsam majestosamente o cobre, acendem o cigarro, cruzam as pernas e dão uma alegre gargalhada, a desfrutar da saúde dos bobos que lhes fornecem meios de vida e de divertimento.
É o céu na terra!... É o céu para os exploradores esotéricos. Mas fica a terra para as pobres vítimas esfoladas. Coragem, senhores, é preciso muita coragem!... Mas não desanimem: a coragem é transmitida em ondas etéreas, em frascos etéreo, à vontade do esotérico. Basta abrir a boca e engolir o precioso e misterioso fluido invisível, impalpável, inodoro.
E como funciona o tal centro esotérico? É coisa muito simples. Cada um pode experimentá-lo, sem ser obrigado a pagar uma anuidade de R$30,00.
O segredo esotérico é o seguinte: Em dado momento, a gente recolhe-se, e diz em voz alta e clara o que deseja e que não tem, mas diz isso como se realmente o tivesse. Por exemplo, estando na miséria, não tendo pão para os filhos que choram, nem trabalho com que ganhar pão de cada dia, o pobre dirá, virado para o oriente: Eu sou um homem feliz, sou rico, nada me falta!...
E este pensamento esotérico irá unir-se ao mesmo pensamento de outros esotéricos, na mesma condição, e estas forças individuais, unindo-se, formarão uma força criadora, tão criadora, que logo aparecerá na mesa o pão suculento, na cozinha arroz e feijão, para o operário serviço e dinheiro... Não é belo isso?.
Se não der resultado, pelo menos pouparão os R$30,00 da inscrição no centro... E se der resultado, é só continuar... Aí vai a receita esotérica. Eis a mensagem da alma. Eis a atividade esotérica.

V. A força criadora
Isto chama-se a força criadora. Vejamos. Uma mãe perde o filhinho querido; a morte barbaramente lho arrancara de seu seio e de seus braços. A mãe chora, lamenta-se, e beija com dolorosos transportes a face da criancinha querida... reza... e resigna-se sob o olhar de Deus.
O esotérico, porém, tem outro meio e outra linguagem. Se a mãe for inscrita no círculo esotérico da comunhão de pensamentos, ela deverá proceder de outro modo. Ficará em pé, o rosto voltado para oriente, e com um sorriso nos lábios e olhos cheios de lágrimas luminosas, ela bradará: — Eu sou uma mãe feliz! O meu filho que acaba de morrer está cheio de saúde e de vida, está-me sorrindo, estendendo-me os seus bracinhos e pedindo-me um beijo... E este brado irá também unir-se ao brado de outras mães que choram igualmente com invencíveis saudades o filhinho morto. E cada brado, sendo uma parcela divina, criadora, fortificada pela parcela das outras, desenvolver-se-á, fortificando-se mais e mais, até tornar-se uma potência divina, e, num lance, em um abrir e fechar de olhos, ressuscitará a criança
morta. Beijando-lhe a cabeça e olhando para o leito, que antes era mortuário, este leito se terá mudado em trono de vida e de saúde... e aí estará o filho cheio de saúde, alegre, sorridente, oferecendo a rósea fronte ao calor dos beijos maternos...
Como tudo isto é sublime!... Haverá gente que duvide? Eu não duvido, pois tenho a absoluta certeza que é uma grandíssima palhaçada, e onde há certeza não pode haver dúvida.

Mas, enfim, qualquer espírito fraco pode duvidar. Pois bem, para este, basta experimentar. Não é preciso, para isto ficar no centro esotérico, pois o tal centro não tem em mão o botão de interrupção de tais ondas etéreas, e nem lhes pode facilitar nem impedir a circulação, de modo que não há necessidade de tal inscrição, nem sequer o dispêndio dos R$ 30,00.

Tal é a prática do esoterismo. Como vê, o leitor, é uma prática de idiotismo, de espiritismo, de supersticões, e nada mais; é uma prática que faz rir a um homem de bom senso, como faz chorar ao que acredita nesta prática.

Mas hoje o mundo é assim mesmo — quer ser enganado.

VI. A chave de harmonia

Descobrir a palhaçada é desmascará-la. É o que quero fazer com tal centro esotérico, que é antes um centro zótico, (zote em castelhano significa pateta, idiota).
Tal esoterismo é apenas a manifestação de um espírito de idiotismo, ou talvez de embrutecimento. Pode ser também o produto da histeria e da epilepsia. O certo é que nunca pode ser o produto do pensamento sadio, inteligente.

Encontramos nova prova de desequilíbrio no modo como tal hora esotérica deve ser executada. A sociedade esotérica entrega aos seus iniciados um pequeno manual de instruções reservadas para uso pessoal do irmão, o qual é chamado chave de harmonia... que não passa de uma chave de desarmonia e donde vou extrair uns pedacinhos autênticos.

A hora esotérica é às seis horas da tarde. É a hora do plantio da semente mental ou psíquica, diz o manual. Interessante plantio!

É nesta hora que todos os zóticos se unem para, pelo pensamento zótico, construir uma força criadora!... criando o zotismo.
“Este é um estado de abstração completa (diz o manual) em que o indivíduo não dá a menor atenção aos fenômenos que se passam dentro e fora de si”.

É bem o idiotismo ou zotismo. Isto não figura no manual; é de minha autoria.

O livro continua: Assentai-vos comodamente... (Isto é fácil!) Relaxai a mente e o corpo, fechai os olhos e ficai perfeitamente quietos por alguns minutos. Deixai vosso corpo amolecer por si mesmo e sem fazerdes esforço. Entrareis, assim, na calma e paz absoluta. Dizei então à Chave de harmonia (E sempre o manual que fala, o manual esotérico. Eis a fórmula a recitar, nesta
doce beatitude de idiotismo): “Desejo harmonia, amor, verdade e justiça, a todos os meus irmãos do círculo esotérico da comunhão de pensamentos. Com a força reunida das silenciosas vibrações de nossos pensamentos, somos fortes, sadios e felizes, formando assim um elo
de fraternidade universal. Estou satisfeito, em paz com o universo inteiro e desejo que todos os seres realizem suas aspirações mais íntimas. Dou graças ao pai invisível por ter estabelecido a harmonia, o amor, a verdade e a justiça entre todos os seus filhos. Assim seja”.

Tal é a grande prece zótica. Recitando isso, não há mais males neste mundo. É uma espécie de cocaína que adormece a fome como o sofrimento. Não há mais Deus nem demo, só há o pai invisível, e este pai não é Deus, é a reunião de todos os iniciados de tal zotismo.
Pobre Deus! Pobre gente! Poderá um homem sensato tomar a sério tais superstições? Não pode. Infelizmente, há gente insensata, e para estes tal esoterismo, ou idiotismo, vale mais que religião e Deus, porque é o produto de um cérebro desequilibrado e coitados daqueles que são desta categoria.

Há nesta prática um elemento de auto-sugestão. Nada mais. Tal auto-sugestão pode ser um estimulante, porém não pode ser um princípio, nem uma semente, nem um estado, nem uma criação. Os pobres esotéricos tomam o efeito pela causa, a moléstia por saúde, o sonho por realidade.

O pensamento pode estimular-nos a agir... porém por si mesmo ele é estéril... longe de ser criador. É o grande erro, o absurdo de tais pensadores esotéricos.

VII. O panteísmo

Se a prática de tal comunhão de pensamento é sumamente ridícula, a fonte de onde ela brota é soberanamente ímpia. E este lado anti-religioso e ímpio é o que convém salientar aqui, para mostrar a sua perversidade e as suas consequências perversoras.

Tal prática é uma emanação do panteísmo. Que é o panteísmo? E' a doutrina de certos sonhadores que dizem que tudo é Deus.

O demônio tem vários caminhos que levam à sua torre de Babel, ou à mentira. Toma os homens com as suas inclinações próprias e lhes apresenta uma religião que combine com as tendências próprias. Desde que pode enganá-los e afastá-los da única verdade, está satisfeito,
pouco lhe importando como e por que meios.

Aos homens que creem em Deus ele apresenta o deismo. Deus existe, mas não se ocupa deste mundo.

Aos amigos das ciências positivas ele oferece o empirismo, fazendo acreditar que Deus, embora exista, não pode contudo ser atingido, nem sequer conhecido.

Aos sensuais ele alicia pelo materialismo, que diz: Não há Deus, só existe matéria.

Aos espíritos refletidos, filosóficos, que procuram ir mais além da matéria, ele apresenta o caminho especulativo do panteísmo, mostrando-lhes que Deus existe e que este Deus indentifica-se com o universo, de modo que tudo é Deus.

Deste tronco falso e mentiroso brotaram dois ramos panteísticos, para satisfazer os sonhos de todos, e afastar a todos da única verdade cristã: A teoria da emanação, que ensina que a substância divina irradia, emana com necessidade todas as coisas. À teoria da imanência,
que atribui a Deus realidade, exclusivamente enquanto ele existe no mundo e pelo mundo.

É esta última teoria da imanência que o círculo esotérico adotou como fundamento de sua louca elucubração da comunhão do pensamento.

Para eles cada pensamento é uma força, e esta forca é uma parcela de Deus, parcela diminuta, mas que adquire força pela junção de outros pensamentos. Esta união lhe dá ou lhe restitui uma força criadora. Esta força criadora realizou os belos milagres acima descritos, que não passam de fantasmas, de sonhos e alucinações.

Basta indicar estes erros grosseiros, para o bom senso refutá-los de chofre. Deus existe, é certo. Deus é o ser supremo, o criador de tudo o que existe. Ora, o artista deve ser distinto de sua obra.

Deus é eterno, perfeito, imutável, infinito; o mundo é finito, limitado, imperfeito, mutável. Ora, Deus não pode ser ao mesmo tempo infinito e finito, perfeito e imperfeito, criador e criado, imutável e mutável, o que aconteceria se Deus não fosse distinto deste mundo. É erro grosseiro que repugna ao bom senso, como repugna à nossa consciência.

Apoiando-se sobre tal princípio, o circulo esotérico é, pois, um erro absurdo, uma prova de ignorância, uma loucura e um sinal de desequilíbrio, como aliás o é o espiritismo inteiro.

VIII. Conclusão
O círculo esotérico da comunhão de pensamento é um dos ramos do espiritismo; é uma espécie de introdução ao espiritismo. Todos os anos o centro de São Paulo publica o Almanaque do Pensamento, que seria mais exato intitular o almanaque dos doidos. É uma lenga-lenga de espiritismo, de superstições, de astrologia, de magia e de tudo o que pode servir para semear no espírito humano a dúvida e o embrutecimento.

A acreditar em tais elucubrações, tudo estaria determinado na vida, e o homem tornar-se-ia uma máquina inconsciente. Este mundo seria regido pela lua, e por isso os homens não passam de um bando de lunáticos.
E seriam os espíritos que dirigiriam o sol e a lua... Pobre humanidade, para onde vais?

Anos atrás tais absurdos teriam sido repelidos e desprezados; hoje, porém, há gente que nisso acredita e que antes de sair de casa ou de fazer negócio, consulta sem pestanejar o “Almanaque do Pensamento”,

Todos os meses o círculo distribui um folheto de infâmias contra Deus, contra a religião e contra a Igreja católica. .
Entretanto, a seita supersticiosa, pois é uma verdadeira seita, escreve no cabeçalho de sua instituição que “não se põe em conflito com qualquer religião, seita ou credo”.

É a eterna camuflagem do demônio. Quer mostrar-se inocente, neutro, para melhor propagar o veneno e semear o ódio a Deus e à sua santa Igreja.

Pode um católico entrar neste centro esotérico?
— Não pode, de nenhum modo. O círculo zótico é uma instituição perversa, anticristã, toda baseada sobre a superstição e sobre o condenado espiritismo.

É uma baixa e miserável exploração, uma mentira, e, como eles mesmos confessam, é uma seita de ocultismo e feitiçaria.

E bastaria isso para atrair-lhe o desprezo de todo homem sensato.

Longe, pois, de nós os círculos esotéricos, os escritos de tal centro, a sua revista do pensamento, o seu grosseiro almanaque... pois tudo isso não passa de baixo e vergonhoso espiritismo.

A verdade é uma só. O espiritismo é condenado pela Igreja, como anticristão, anti-social e anti-religioso.
E' uma verdadeira praga. Fujamos dele, qualquer que seja a forma sob a qual se apresente. Com fogo não se brinca!... Com loucos não se discute.


Segundo anjo das trevas:

O PROTESTANTISMO

1. O tinteiro de Satanás.
2. O bible-ball protestante.
3. Antes de tudo... mentira.
4, Conversões protestantes.

QUARTO LAMPEJO
O tinteiro de Satanás: As origens do protestantismo


Conta-se na história de Lutero — é ele mesmo que narra o fato — que um dia, no castelo de Wartburgo, enquanto o frade revoltoso estava traduzindo a bíblia, apareceu-lhe Satanás. O rei dos infernos quis pessoalmente vir agradecer a Lutero a obra de demolição e de perversão começada, e talvez tencionasse dar a Lutero um abraço de amigo, ou até um beijo de confraternização.
A carapinha de Satanás era tão repelente e o cheiro tão nojento, que Lutero ficou espantado, horrorizado, e em vez de dar ao pai Satanás um abraço tão merecido, lançou-lhe na cara o tinteiro de que se estava servindo.
O conteúdo do tinteiro, por preto que fosse, não sujou a carapinha de Satanás... já tão suja... porém tal tinteiro ficou histórico e até historiador.
O tinteiro de Lutero virou tinteiro de Satanás...
e deste tinteiro diabólico saiu a seita protestante, com suas mil ramificações, divisões e subdivisões de protestantes luteranos, calvinistas, evangelistas, batistas, sabatistas, presbiterianos, uns tão pretos e tão perversos como os outros.
É tudo a tinta do mesmo tinteiro... do tinteiro de Satanás.

I. A carniça e os vermes
Lutero foi o pai da ninhada, ou melhor o vovô, pois os seus filhos encarregaram-se de multiplicar os filhotes, como os vermes se multiplicam numa carniça apodrecida. A carniça não gera os vermes, mas tudo o que há de micróbios e de germes malsãs nela se desenvolve rapidamente.
Gloria peccatorum stercus et vermis est, diz a Biblia (1Mac 2,62).
Assim na carniça luterana. Tudo o que havia de malsã, de viciado, de perverso, foi logo atraído pelo cheiro nauseabundo da carniça de Lutero... e num abrir e fechar de olhos, os micróbios desenvolveram-se, multiplicaram-se no meio da podridão do apóstata.
O tinteiro de Satanás tornou-se um viveiro de seitas protestantes. O mundo dividiu-se em duas partes: A parte católica, unida, coesa, firme, invariável; a parte protestante, composta da podridão moral do mundo.
Quem era incapaz de ser católico, tornava-se protestante; mas, como a verdade é uma só, e os erros numerosos, tais protestantes dividiram-se em centenas e centenas de seitas errôneas.
São Paulo disse admiravelmente: quem não adere à verdade, deve crer na iniquidade (Rom 2,8). A carniça luterana serviu assim de alimento e de ninho para o desenvolvimento de todos os erros, de todos os vícios e de todas as paixões; como a carniça animal serve de pasto a todos os micróbios, vermes e animais pestíferos.
Lutero foi o pai dos luteranos, Calvino dos calvinistas, Zwínglio dos huguenotes, Henrique VIII dos anglicanos, João Huss dos hussitas, Wicleff dos wicleffitas, Knox dos presbiterianos, Russel dos russelistas, etc., etc. tantas opiniões quantas cabeças havia.

II. Uma religião negativa
É um nunca acabar: um verdadeiro tinteiro de tinta preta, donde saem, não verdades, mas manchas pretas,sujas, que constituem o caráter próprio do protestantismo. Pelos frutos se conhece a árvore, disse o divino Mestre (Mt7,16). O fruto do protestantismo é a divisão, a desunião, a fragmentação, o protesto... e tudo isso é negativo. Ora, a religião não pode ser uma negação, deve ser uma afirmaçon. É o Saulus affirmans... hic est Christus, dos Atos (At9,22).
O protestantismo só sabe negar o que a Igreja católica afirma, de modo que a sua religião é a negação do catolicismo; nada mais. E São Paulo, escrevendo a Timóteo, indica muito bem esta disposição de espírito: Roguei-te de ficares em Éfeso, para notificar a alguns que não ensinassem de outra maneira, e não se dessem a fábulas e genealogias intermináveis, as quais servem mais para brigas, do que para a edificação de Deus, que se funda na fé... aberrando das quais, alguns se entregaram a discursos vãos; querendo ser os doutores da lei, sem entenderem, nem o que dizem, nem as coisas de que fazem a afirmaçon (1Tim1,3-8).
Eis bem a imagem dos falsos pastores protestantes. São ignorantes ou são perversos, como temos provado centenas de vezes. Ignorantes, porque deviam estudar o catolicismo tal qual ele é, e não tal qual se lhes representa por escritos protestantes caluniosos; perversos, porque fazem do pastorato um meio de exploração, perdendo as almas e proclamando-se doutores da lei.
Em vez de ver o lado negativo de sua seita, deviam examinar o lado positivo; e este cuidado nem existe. São incapazes, tais doutores da lei, de expor uma tese religiosa sem atacar a religião católica.
E por que não atacam o espiritismo, o comunismo, o divórcio, etc.? Estes, sim, merecem pau, por serem elementos perversores da religião e da sociedade.
Mas a Igreja católica, que mal fez ela? Só faz o bem, como o confessou Carlos Pereira, em seu: “América latina”. Por que, pois, estar a lançar-lhe a pedra?...
Por que, ó pastores? Porque a vossa seita é de ódio, de rancor, de perseguição e de calúnia, Ora, se tais vícios são condenados nos indivíduos, quanto mais num sistema religioso!

III. Multiplicação de seitas
Vamos ao lado prático da questão, ao tinteiro de Satanás, para vermos, tanto o seu conteúdo como as garatujas que dele saírem. De um tinteiro diabólico, só podem sair coisas diabólicas. Tal árvore, tal fruto, disse o Mestre. Tal tinteiro, lançado por Lutero contra a carapinha de Satanás, é já um desequilíbrio. Este desequilíbrio físico produz um desequilíbrio orgânico e inevitável: o que tem sido sempre a fisionomia própria do protestantismo. A diagnose histórica da seita revela claramente este desequilíbrio orgânico, que se manifesta pela fragmentação em seitas.
Mal Lutero congregara na Alemanha um manípulo de sequazes sob a sua bandeira, e eis que Zwinglio, na Suíça, a rufo de caixa, levanta outra seita, enquanto Calvino, na França, recruta nova seita, inimiga da Igreja e inimiga dos seus irmãos protestantes mais velhos. A Inglaterra, por sua vez, julga-se com direitos de inovação; Henrique VIII, enforcando as suas esposas, para poder recomeçar a comédia, funda o anglicanismo.
Cada seita pretende possuir o evangelho puro, odiando-se umas às outras, e só tendo um traço comum: é o seu ódio à verdade católica. Luteranismo, calvinismo, zwinglianismo e anglicanismo, quatro nomes, quatro partidos e quatro facções, apoiados todos sobre a Bíblia, que nunca souberam caldear num todo coerente na sua unidade doutrinal. Para todos eles a Bíblia é clara (dizem eles), é a palavra de Deus, é a base de sua seita, e com isso professam doutrinas completamente opostas.

Donde vem tal balbúrdia e tal divergência? Unicamente da falta de verdade. Afastaram-se da verdade única e foram caindo nos mil erros que cercam esta verdade.
Em cada uma destas grandes secções pululam as seitas menores. Anabatistas, antinomistas, socinianos, episcopalianos, presbiterianos, digladiam-se em todos os países protestantes.
Daí por diante, cada século viu surgir dezenas e até centenas de novas facções. O tinteiro de Satanás tornou-se uma fonte inexaurível de dissensão, de discórdia e de seitas.
Qualquer cabeça desequilibrada, fanática ou histérica que se sentia com vigor de rasgar novos horizontes religiosos à humanidade, reunia adeptos, construía um barracão, e fundava uma igrejola.
Na Alemanha registavam-se há poucos anos 37 igrejas regionais, sem contar as igrejas livres.
Na Inglaterra contavam-se, em 1900, perto de 300 seitas. Só na cidade de Londres há para cima de 100.
E em cada seita as confissões de fé se sucedem como as folhas numa árvore!
Os Estados Unidos levam a palma, e batem o recorde da multiplicação sectária. Os relatórios oficiais fecham a cifra pasmosa de 288 seitas. Os seus adeptos mudam de seita, como se muda de loja: onde se vende mais barato.
Já ninguém mais pensa numa Igreja verdadeira...
o erro está em toda parte... e cada seita não passa de um clube de futebol ou de touring clube. Os americanos deixaram o título de igreja, para adotar o nome de denominação evangélica.
Tudo aí é evangélico: Deus, diabo, São Miguel, Satanás, Caifás, Pilatos, Judas, Barrabás, São João Batista, como Holofernes... tudo é denominação evangélica.
Até a torre de Babel entra na dança.
E há gente que toma isso a sério!
É preciso muita coragem.

IV. Perto de 900 seitas (em 1950!)
A título de curiosidade, e para distinguir melhor o produto do tinteiro de Satanás, percorramos um instante a lista de tais seitas. Só o nome indica a origem e o erro.
A paciência de acompanhar-me e contar: — luteranos, calvinistas, zwinglianos, anglicanos, metodistas, anabatistas, batistas regulares, batistas de seis princípios, batistas do 7º dia, batistas de comunhão livre, adamitas, (os que andam em trajes de Adão), antinomistas, trinitários, antitrinitários, socinianos, latitudinários, gomaristas, episcopalianos, presbiterianos, huguenotes, hussitas, quakers, adventistas, unitários, metodistas livres, metodistas primitivos, ocidentais, africanos e independentes, nova Jerusalém, reformados, presbiterianos regulares e da velha escola, espiritualistas, cristãos bíblicos, wesleianos, estercorários, mamilários, pastorecidas, mormões, pentecostais, supralapsários, adventistas, congregacionalistas, colegianos, facientes, lagrusiantes, indiferentes, multiplicantes, beamentes, labatistas, scaqueros, sumpers, gloaners, milenários, wifeldenianos, racionalistas, generacionalistas, sonteiístas, adiaforistas, entusiastas, pneumáticos, interimistas, berboristas, evangelistas, lutero-calvinistas, batistas, menicerianos, puritanos, sabaritanos, armeniossocianos, colônio-zwinglianos, osiandianos, lutero-osiandianos, estanerianos, antipresbiterianos, lutero-zwinglianos, sincretinianos, sinerginianos, ubiquistianos, pietestianos, bonaquerianos, versecorianos, cesederianos, cameronianos, filisteus, mariscalianos, hofinsianenses, necessarianos, edivarianos, priestianos, viliefcedrianos, ambrosianos, morávios, monasterianos, antimonienses, anomênios, munsterianos, clanculares, grubembários, estabérios, baculários, nudípedes, sanguinários, confessionários, impecáveis (que felizes!), austeros, taciturnos, alegres, demoníacos, chorões, livres, espirituais, concubinos, apostólicos, oleiros, conformistas, episcopais, contra-remontantes, anticonvulsionários, brownistas, evangelistas, místicos, conscienciosos, remontantes, calvinistas, menovistas, socialistas, puscistas. Até aqui 134. Quem resiste em contar o resto?
Querem mais? Faltam ainda umas 760 seitas.

V. Despedaçamento
Como é possível tomar a sério a Bíblia protestante, desde que faz multiplicar-se o número das seitas, assim como as línguas na confusão de Babel! 900 Babéis em lugar da unidade mundial do catolicismo!

Quando o protestantismo se desligpu da Igreja católica, sofreu imediatamente as maiores confusões bíblicas, e produziu-se a geena das contínuas digladiações
entre as primeiras seitas.

E de recontro em recontro vão se despedaçando as seitas mais novas em seitinhas novíssimas, como se vê da seguinte amostra da seita do metodismo, a qual, para
comprovar a sua fragilidade, se despedaçou em 10 fragmentos, que sãos 1. metodistas independentes; 2. metodismo do Canadá; 3. metodismo episcopal; 4. metodismo do sul; 5. metodismo protestante; 6. metodismo; 7. metodismo de cor; 8. metodismo africano; 9. metodismo congregacionalista 10. metodismo episcopal africano Zion.

Quanta divergência em vez da unidade da fé. E por que ainda hoje desprezam o convite do papa Pio XI, dirigido aos cristãos dissidentes para que voltem à fé
católica?

Quem quer que estude as inúmeras variações do protestantismo na sua milagreira proliferação, ficará convencido de que esta Babel anti-evangélica nunca poderá ser a lei nova e o farol divino nos mares trevosos da vida.

Não! A fé, na análise de todas as doutrinas, deve, categoricamente, apresentar como conceito inalienável e fundamental, a unidade intangível e a perfeita coerência de todos os seus artigos.

É tão grande o desespero dos próprios protestantes por causa, das confusões babélicas de uns “900 evangelhos puros”, que já pretendem alguns considerar a verdade das crenças como “coisa inútil”, conforme aconselha o autor protestante, Paulo Stapfer: “Já que tantas vezes caducaram crenças, deixemo-las cair e não as substituamos. Façamos melhor; abandonemos sobretudo este erro de que a verdade das crenças religiosas é essencial ao cristão”.
É como se alguém dissesse em matemática: “Embora alguém ensine que o círculo seja quadrado, e outro o considere como triangular, é bastante, cultivarmos a matemática porque a verdade do ensino não importa”.
No turbilhão das doutrinas contraditórias em que fazem as seitas as suas danças e contradanças, encontram-se, de fato, centenas de afirmações e negações, — redondas, quadradas, triangulares — a respeito de Deus, de Jesus Cristo, da bíblia, de Lúcifer, da eternidade etc.

VI. Discórdias e divergências
Para não fatigar o leitor com citações inúmeras sobre estas divergências entre os pastores biblistas, apresentamos, apenas como curiosidade, o inquérito, aberto por um americano, o sr. Betts, entre os “missionários” protestantes. Fez um questionário a ser respondido por 700. E obteve o seguinte resultado:
Sobre Deus. — 13% dos missionários e 36% dos estudantes seminaristas protestantes negam ou põem em dúvida a onipotência de Deus; 12% dos missionários e 62% dos seminaristas, a imutabilidade; o mesmo fazem, com a criação, contada no Gênesis, 58% dos ministros e 95% (!) dos estudantes.
Sobre Jesus Cristo. — Dele falam melifluamente, mas dizem que teve pai e mãe como os outros mortais, 29% dos ministros e 75% dos seminaristas; que seja igual ao Pai, negam 24% dos ministros e 56% dos seminaristas.
Sobre a Bíblia. — Quando começaram, afirmaram os protestantes que para eles a Bíblia era tudo. Hoje negam ou põem em dúvida a inspiração divina da mesma, 2% dos luteranos, 34% dos evangélicos, 38% dos batistas, 60% dos episcopais, 70% dos metodistas e 92% dos seminaristas. É um pavor! Que a Bíblia contenha historietas, como lendas mitológicas, sustentam 21% dos luteranos, 44% dos batistas, 63% dos evangélicos, 82% dos presbiterianos, 87% dos metodistas, 96% dos seminaristas.
Do diabo são muito inimigos a ponto de lhe negarem a existência. Pouco dano farão a Satanás com tal negação. Pelo contrário, tocam água para os moinhos lá de baixo. Dos metodistas 65% não dão confiança ao diabo e duvidam de sua existência... Idem, 32% dos batistas e 83% dos congregacionalistas.
Há ainda alguns que negam até a outra vida.
Paremos aqui. As enumerações dadas são mais do que suficientes para se avaliar a tormentosa ascensão do protestantismo às culminâncias da maior confusão, que já houve no mundo: “a Babel bíblica”.
O doloroso aspecto da desorganização no mundo das heresias, se deve encher o nosso coração de compaixão pela sorte dos nossos irmãos errantes, também nos oferecerá sobejas razões para bendizermos a inefável bondade de Deus que deu à Igreja verdadeira o sistema da infalibilidade pontifícia, pela qual 400 milhões de católicos conservam a claridade da mesma fé, no sentido doutrinário e moral, unidos em redor da rocha de S. Pedro, aonde as maldades das seitas nunca poderão subir!

VII. Onde está a unidade?
Nem figuram na lista os conhecidos satanistas, que são os tais EX que viram protestantes por causa de uma saia: exemplo: Oscar Oliveira, de Campinas, o Jóia, e não Gioia, de S. Paulo.
E não digam, como fazem certos pastores, envergonhados da sua decadência protestante, que há entre estas seitas uma unidade fundamental nos credos, sendo estes nomes apenas variedades denominacionais de sua vida histórica. Isso é argumento de ignorante.
Quem conhece um pouco as várias seitas protestantes, sabe que não há entre elas nenhuma ligação nem acordo doutrinal. Muitas entre elas são completamente opostas umas às outras, e professam dogmas radicalmente contrários.
Onde estará a unidade protestante? Não existe, nunca existiu, nunca existirá, porque é o erro, e o erro é múltiplo, como a verdade é uma só. Unus Dominus, una tides, unum baptismum. Um só Senhor, uma só fé, um só batismo, diz São Paulo (Ef4,5). Eis o que é fundamental.
O protestantismo está todo dividido: rejeitou o único Senhor, por agregar-se a uma das seitas de Lutero, Calvino, Knox, etc. que são tantos senhores, quantas seitas representam.
Rejeitaram a Fé única, pois, entre as 900 seitas, não se encontram duas que professem a mesma fé.
Rejeitaram o Batismo único, pois há entre eles mais de cinquenta batismos diferentes, e diversas seitas chegaram a suprimir o batismo.
Como podem eles estar com a verdade? Ou São Paulo está enganado, dizendo que a unidade é o distintivo da verdadeira fé, ou os amigos protestantes estão iludidos na mixórdia de suas crenças!
A conclusão é, pois, rigorosa: Onde está a unidade, aí está a verdade. Tal unidade não está no protestantismo: é, pois, uma seita errônea. Ela está na Igreja católica; é, pois, aí que está a verdade... a única verdade.
A Igreja católica, no mundo inteiro, e em todos os séculos, professa o mesmo Senhor, conserva a mesma fé, administra o mesmo batismo: — a unidade é o selo da verdade. Devemos procurar conservar a unidade do espírito no vínculo da paz, diz ainda São Paulo (Ef4,3). "
As 888 seitas protestantes não conservam nenhuma unidade e nenhuma paz, pois procuram continuamente guerrear a Igreja católica: — estão, pois, erradas.
A unidade da fé é a imagem da unidade de Deus, e o característico dos filhos de Deus, diz ainda São Paulo (Ef4,1-14). As diversas seitas protestantes não possuem nenhuma unidade; estão, pois, separadas de Deus, enquanto a Igreja conserva integralmente e sem restrição este caráter divino. Ela é, pois, a única Igreja verdadeira.
O resto não passa de garatujas saídas do tinteiro de Satanás.

VII. Conclusão
Pobres protestantes, que vos deixais iludir por baixos exploradores, que se intitulam pastores, mas que nada são, senão uns ignorantes, uns viciados ou uns fanáticos obcecados; abri os olhos... e tende a coragem de ver a verdade: ela é uma só.
A Igreja católica vos aparece, através das calúnias e dos preconceitos de vossos pastores, como um monstro, como um algoz, como uma Babilônia.
São palavras ocas de baixos caluniadores; a verdade é diferente. Examinai de perto, e por vós mesmos, o que é a Igreja, e a encontrareis bela, majestosa, santa, divina, tal farol luminoso, que ilumina todo homem que chegou a este mundo.
Pobres protestantes, sois dignos de dó e compaixão, pois sois uns iludidos; a culpada é esta casta miserável, decaída, exploradora, que vós chamais de pastores, e que, na linguagem bíblica, são lobos devoradores (Mt7,15), lupi rapientes.
Não vedes que aqueles que a Igreja rejeita, como indignos, tornam-se os vossos guias?
São ex-padres, viciados, decaídos, indignos, incapazes de guardar a castidade, seduzidos pela saia, que se tornam os vossos altos mestres!
Pobres mestres! São homens sem fé, e sem moral unicamente preocupados em acumular dinheiro sem trabalhar; rábulas de advocacia, incapazes de ganhar a sua vida, que se tornam os chefes do protestantismo.
Os católicos decaídos viram protestantes... os protestantes sérios, instruídos, tonam-se católicos como diariamente os jornais no-lo mostram.
Pobres protestantes, é tempo de sacudirdes o jugo que tais mestres vos impõem, e de retomardes o jugo suave e doce de Jesus Cristo, que a Igreja católica, apostólica, romana, conserva e representa.

QUINTO LAMPEJO

O Bible-ball! protestante


O protestantismo é um verdadeiro clube de divertimento e de briga. Existe hoje o futebol, basquetebol, voleibol, etc. Existe também o bible-ball, isto é a bíblia feita bola (bible: bíblia) nas mãos dos protestantes, para se divertirem e brigarem uns com os outros.

I. Saúde e moléstias
Cada seita protestante é necessariamente inimiga da Igreja católica, como o erro é inimigo da verdade. Mas o que é pior para os protestantes, é que cada seita é inimiga de outras — combatem-se, odeiam-se, insultam-se, mordem-se, até não poder mais.
É briga de compadres. Se a Igreja interviesse na briga, ah!... então todas se uniriam por política; dar-se-iam dois dedos — não a mão inteira, para atacar o inimigo comum.
Isto é natural: A verdade é uma só, Os erros são muitos; e todos os erros são opostos à verdade, absolutamente, como a saúde é uma só, e as moléstias são muitas, todas opostas a esta saúde,
Quando um cristão cai doente, as moléstias unem-se para combater-lhe a saúde e tirar-lhe a vida. Uma moléstia é, muitas vezes, oposta à outra; combatem-se até, mas para perturbarem a saúde única, todas combinam admiravelmente e formam um exército, que, muitas vezes, dá cabo da ciência, da boa vontade e dos esforços dos médicos mais afamados.
O protestantismo não é uma religião; é uma negação da religião, como a doença é uma negação da saúde.
O protestantismo é uma moléstia; cada seita é uma doença; e do mesmo modo que há muitas moléstias para destruir uma única saúde, assim também há muitas seitas protestantes para atacar a única verdade católica.
Esta noção, muito exata, explica como as seitas vão se multiplicando ao infinito.
Cada dia vemos surgir uma nova, como na medicina, cada ano, vemos surgirem novas moléstias; praticamente são as mesmas, mas dá-se-lhe um nome novo, uma túnica nova... prescreve-se um remédio novo e pronto: isto chama-se o progresso.
Os antigos diziam que alguém sofria do peito; os sucessores diziam que era tuberculose; os modernos dizem que é tísica; amanhã dirão que é desagregação pulmonar.
Antigamente falava-se em febre cerebral: hoje é meningite; — outrora sangrava-se do nariz: hoje a gente tem uma epistaxe; a doença de olhos virou oftalmia, a dos rins, lumbago; os humores frios, escrófulos; e catarro, coriza.
É a lei do progresso, em nome, pelo menos.
Outrora o inimigo de religião era ímpio, ateu, herege; hoje chama-se protestante, socialista, bolchevista, comunista, etc. Não passam de protestantes: todos eles, tais as moléstias que atacam a saúde, são erros queprotestam contra a verdade única: — são protestantes.
E estes protestantes, conforme o erro mais saliente, tomam nomes diferentes, como a moléstia, conforme o modo com que ataca um órgão, toma nomes diferentes.
O estômago é um só, porém, conforme o mal que o perturba, a sua moléstia é gastrite, gastralgia, indigestão, embaraço gástrico, hematêmese, câncer, etc.
Os pulmões são um único órgão, entretanto, o mal que os ataca pode ser bronquite, pneumonia, pleurisia, tísica, congestão pulmonar, hemoptise, enfisema, asma, coqueluche, etc.
Assim acontece com o protestantismo. É a negação do catolicismo, como a moléstia é a negação da saúde.
A Igreja católica é uma só, como a saúde é uma só. A grande moléstia, conforme o órgão, ou a verdade católica, que ataca, torna-se batistas, evangelistas, presbiterianos, metodistas, sabatistas, adventistas, etc., etc. É todo um só, no fundo, porém um ataca o batismo, outro, o domingo, outro, a eucaristia, outro, o papa, outro, as boas obras e assim por diante.
São moléstias, filhas da, grande moléstia protestante, tendo todas um único fim: destruir a saúde ou a verdade.
Pouco importa o nome: é uma moléstia, basta. Toda moléstia é ruim e arruína a saúde.

II. Briga de compadres
Mas é tempo de assistirmos, por uns instantes, a uma briga entre os presbiterianos e batistas.
As duas seitas estão em “campo”. É interessante a briga dos dois compadres.
Escutem lá o resumo da briga feito por um protestante “ex-presbiteriano, e hoje batista” do partido do bible-ball.
O documento foi-me enviado por um católico. Escutem isto: “A igreja batista teve que passar, apesar de professar ter unicamente a bíblia como plena regra de fé, e não ensinar doutrinas contrárias, repito, teve que passar por duros e desconsoladores embaraços, quando, no ano de 1925, a igreja presbiteriana, pelo seu órgão oficial “O Puritano”, de 7 de Maio de 1925, respondeu a um ataque feito pelo jornal batista contra um dos seus ensinamentos e desafiou, ao mesmo tempo, a igreja batista, pela maneira seguinte: “Nosso colega, “O Jornal Batista”, há poucos dias... deixou entrever o desejo de dar a esplêndida quantia de mil contos de réis por um só caso de batismo de criança que fosse achado no novo testamento, de modo positivo”...
“Se, pelo fato de não termos na Bíblia uma prova absoluta para o batismo infantil, isto tira o valor da doutrina, diga-nos aqui à puridade o bom do jornal “em que fica o colega com a guarda do domingo e não do sábado?” Pode o colega mostrar no novo testamento ou em qualquer parte da bíblia, de modo positivo, um mandamento para a guarda do domingo? Damos dois mil contos de réis ao colega se no-lo apresentar”.
Quanto à prova do batismo infantil, a igreja presbiteriana não recebeu o prêmio oferecido de mil contos de réis porque não conseguiu mostrar um só caso, dentro da Bíblia, de batismo de crianças.
E os batistas não receberam, tão pouco, os dois mil contos de réis oferecidos, porque não puderam e não podem achar, em nenhuma parte da Bíblia, que o domingo haja sido guardado por qualquer servo de Deus na velha dispensação; e, na nova, por Jesus ou qualquer dos discípulos e apóstolos, antes ou depois da morte e ressurreição do grande Mestre e Salvador”.

III. 3.600 contos de prêmio
Esta gente protestante possui rios de dinheiro! Os batistas prometem 1.000 contos aos presbiterianos se estes últimos provarem, pela bíblia, que uma criança pode ser batizada.
Os presbiterianos, mais ricos ainda, prometem 2.000 contos aos batistas, se eles provarem, pela bíblia, que o sábado não é o dia do Senhor.
O caso é sério! É capaz de fazer lamber os beiços a qualquer faminto. Verdade é que muito pobre é quem não pode prometer. Eu também vou fazer um repto aos batistas e presbiterianos, prometendo-lhes o prêmio de 3.000 contos. Prometer não custa nada, como eles fazem.
E para ganhar estes 3.000 contos, não é preciso ser muito sagaz, nem exegeta. Eu quero, apenas, que me provem, pela Bíblia, que a gente pode raspar a barba, porque leio no Levítico (21,5): “Não farão calva a sua cabeça e não rasparão a ponta de sua barba, nem darão golpes em sua carne".
Isto é claro e positivo. Entretanto, vejo os pastores protestantes, que deviam ser os sucessores dos levitas da Bíblia, andarem uns calvos, outros acalvados, outros de barba raspada, empoados, perfumados, e até com golpes de navalha na carne, o que é absolutamente proibido.
Eu acho que os bons e verdadeiros biblistas, como eu, deviam deixar crescer a barba e o cabelo, e interdizer-se o uso de navalha. Isso, sim, é que é bíblico.
Peço aos dois compadres brigadores examinarem bem as Escrituras e citar-me o texto que retrata esta ordem do Levítico, de não cortar a ponta da barba.
Eu ofereço um prêmio de 3.000 contos. Vamos lá, caros amigos, neste tempo de crise, por 3.000 contos, vale a pena gastar os dedos, saliva e uma bíblia, para descobrir o passo pedido. 3.000 contos para os batistas e os presbiterianos.
Estes 3.000 contos serão pagos imediatamente pelos 1.000 contos dos batistas e os 2.000 dos presbiterianos, que eu vou ganhar, provando-lhes que ambos têm razão, um contra o outro, como uma moléstia tem razão contra a outra; mas, que ambos andam errados em relação à saúde ou à verdade.
É como se os pulmões exigissem do estômago a prova de que eles não têm razão de ser tísicos; e o estômago de provar, pela Bíblia, que eles não têm razão de ter uma gastrite.
Ambos têm o mesmo direito, ambos matam o homem.
Ambos os protestantes têm também razão, mas matam a verdade.

IV. 1.000 contos dos batistas
Os batistas querem uma prova de que se devem batizar as crianças? Sim; eu também quero uma prova de que se pode cortar a ponta da barba.
Mas toda questão tem um lado positivo e outro negativo.
O há, na Bíblia, um texto positivo; mas não haverá textos negativos? Se não há uma ordem, não há também uma proibição.
Ora, in dubiis libertas, dizem os teólogos. Não há ordem de fazer; não há proibição; podemos e devemos e agir neste caso como prescreve a autoridade legítima.
Os batistas têm razão: não há na Bíblia um texto positivo; mas não haverá textos negativos? Se não há uma ordem, não há também uma proibição.
Ide, ensinai a todas as nações, diz Cristo, batizando-as em nome do Padre e do Filho  do Espírito Santo(Mt28.19).
As crianças não pertencem então à raça humana?
Não são uma parte das nações? Se o são, podem e devem ser batizadas.
A Igreja católica, intérprete fiel da Bíblia e das tradições dos primeiros séculos, adotou o batismo das crianças. Eis por que os batistas, como bons protestante, são, rejeitam-no.
Escute Dionísio Areopagita (do século I): É uma tradição que vem dos apóstolos, que as crianças devem ser batizadas (Eccl. Hier. cult.).
Santo Irineu (do século II), diz também: Todos aqueles que são regenerados em Jesus Cristo, isto é: crianças, jovens, velhos, serão salvos (Sup. S. Lucas) o São Cipriano (do século III), escreve por sua vez: Parece-me bem e a todo o concílio, que as crianças sejam batizadas mesmo antes de oito dias (lev. III epist. ad fid).
Tradições do século II, tão perto dos apóstolos, são argumentos suficientes para resolver uma dúvida doutrinal.
Nenhuma prescrição positiva e nenhuma proibição existe. É preciso, pois, recorrer à história e às tradições dos primeiros séculos para ver o sentido das palavras batizar, todas as nações. É o que a  Igreja católica faz e pratica.
Quem tem razão? A Igreja católica só. Dê-me cá os 1.000 contos, caro batista, para pagar àquele que encontrar o texto pedido, que me dá licença de raspar a barba, já bem comprida.

V. 2.000 contos dos presbiterianos
Os presbiterianos, fundados pelo libertino e assassino Knox, metem-se a cavalo sobre o texto da bíblia.
O sétimo dia será o sábado do descanso (Lv 23,3).
Eles querem santificar o sábado, enquanto os batistas adotam o domingo.
Entre eles os presbiterianos têm razão. Está na Escritura, e tal ordenança não foi retratada por Deus: “Guardai o meu sábado, porque é um dia santo” (Ex 31,14).
É lei, e lei positiva! Os presbiterianos têm, pois, razão contra os batistas, e os batistas têm razão contra os presbiterianos.
Vejamo-lo bem. Somos nós cristãos ou judeus? Se os presbiterianos são judeus, têm razão: O sábado é o dia do Senhor (Lv 23,3). Se são cristãos, não têm razão.
O domingo é o dia do Senhor, para os cristãos, porque Jesus Cristo ressuscitou neste dia. A Igreja católica, seguindo os ensinos do evangelho, interpretou muito bem a lei e os fatos.
A lei é que o sétimo dia seja um dia de descanso, o dia do Senhor. Mas, para conhecer o sétimo dia, é preciso conhecer o primeiro.
Ora, eu queria que os amigos presbiterianos me mostrassem, na Bíblia, que o domingo era o primeiro dia e o nosso sábado era o sétimo dia.
Procurem bem este texto, sim? Não encontrarão.
A questão resolve-se, pois, pelo primeiro dia, que deve ser o domingo.

VI. O sábado
A palavra sábado não exprime o dia determinado da semana, mas, em hebraico, quer dizer: cessação, repouso (shabath). Quando deve ser este dia de repouso?
— O sétimo dia.
— E qual é o sétimo? Deus nunca o determinou.

O que Ele quer é que, após seis dias, o sétimo lhe seja consagrado.
O sábado era o dia dos israelitas por três razões, que a Bíblia assinala:
1) Em lembrança da criação: Em seis dias o Senhor criou o céu e a terra... e abençoou o dia do sábado (Ex 20, 11).
2) Em lembrança da libertação do Egito: O Senhor teu Deus te tirou do Egito... por isso te ordenou que guardasses o sábado (Dt 5,15).
3) Como sinal de aliança entre Deus e o povo de Israel: Guardarão o sábado por conceito perpétuo (Ex 31, 16).
Estas três razões, como se nota, são particulares aos judeus, e como tais entram nas cerimônias, e não na dogmática, moral, ou legislativo universal. Como tal, o sábado é, antes, uma convenção, que um preceito positivo.
Uma palavra de nosso Senhor confirma esta interpretação: O sábado foi feito para o homem, e não o homem para o sábado, diz ele (Mt12, 12), mostrando deste modo que o sábado tinha sido instituído para as necessidades espirituais e físicas do homem, e não como preceito perpétuo.
Conhecendo um pouco de Bíblia e de exegese, ou arte de interpretação, a questão resolve-se com toda a clareza.
Na lei antiga distinguem-se quatro espécies de preceitos: o dogma, a moral, as cerimônias e as leis nacionais.
Destes preceitos, só ficaram em pé no novo testamento o dogma, completado por Jesus Cristo, e a moral, aperfeiçoada por ele.
Quanto às cerimônias, eram figurativas, e as figuras desaparecem diante da realidade. As leis nacionais e locais, próprias dos judeus, desaparecem igualmente, diante da legislação universal do evangelho. Isto é certo e admitido por todos: católicos e protestantes.
Agora urge saber em que categoria se deve se deve colocar a observação do sábado. Não pode haver discussão, se houver sinceridade.
O sábado não pertence ao dogma: e só indiretamente pertence à moral. Deus quer um dia de descanso - isto pertence à moral... mas, qual é este dia? esta parte é cerimonial.
Ora, a parte cerimonial do antigo testamento, não foi confirmada por Jesus Cristo, ficou ficou abolida.
Como todos os outros preceitos da lei cerimonial, esta parte começou cair em desuso durante a vida do Salvador, e cessou pela sua morte, tornando-se ilícita para os cristãos, desde que o evangelho fora bastante promulgado.
Desde então a sinagoga estava como que sepultada., e era culpado quem observasse as legálias ou lei cerimoniais dos judeus.

VII. Ou tudo, ou nada
Sendo o sábado uma prescrição cerimonial, claro é que cai, e pode ser substituído por outra lei, pela autoridade da Igreja. Sustentar o contrário é completamente absurdo e ilógico.
De fato, querendo manter as prescrições cerimoniais, é preciso mantê-las todas; não havendo razão de conservar uma e desprezar outra.

Os presbiterianos, que conservam a prescrição do sábado, devem também conservar a circuncisão (G 17,10), as neomínias ou dias lunares (Sl 113,19), os sacrifícios (Lv 5,14), os holocaustos (Lv 7,8) as oblações (Lv 2,1), as libações (Nm 10,1) a páscoa com suas cerimônias (Ex 14), a festa das primícias (Nm 28,26), dos tabernáculos (Lv 23,39), da expiação, com o bode expiatório Azabel (Lv 16), sem falar em nenhuma das mil prescrições particulares que dizem respeito ao jejum, às purificações legais, (Lv3;11,13; Dt 14,21), o direito civil (Js 17,14), e criminal (Dt 16,18), empréstimos (Dt 15,7), depósitos (Lv 6,2), propriedades (Ex 21, 33), salários (Lv 19,13).
Por que, entre as múltiplas prescrições cerimoniais ou nacionais, os presbiterianos conservam o sábado, só o sábado, e rejeitando todo o resto?
A Bíblia é sagrada, ou não é? Se o é, deve ser aceita integralmente: se não o é, então é preciso rejeitá-la completamente, pois não tem mais autoridade.
Por que, meus caros presbiterianos, conservais o sábado e rejeitais tantas outras prescrições de igual valor, até o preceito dado aos levitas de não cortar a barba? Isto é ilógico, é até absurdo.
Eis o bastante para provar que o sábado pode ser mudado, como foram mudadas milhares de outras prescrições cerimoniais. Pode ser mudado e foi mudado pela * Igreja católica, por motivos justificados.

VIII. O domingo
A observação do domingo, na nova lei, não é prescrita, nem pela natureza, nem por lei divina positiva, mas por lei eclesiástica, baseada sobre o exemplo dos primeiros cristãos e a tradição dos apóstolos.
Vejamos agora a razão desta mudança. A razão é tríplice, como tríplice é a razão da instituição do sábado.
1º) Para os judeus: lembrança da criação. Para os católicos: lembrança da ressurreição de Jesus Cristo, que é como que o termo da redenção.
2º) Para os judeus: libertação do Egito. Para os católicos: libertação do pecado, que é a grande missão do Salvador.
3º) Para os judeus: sinal de aliança. Para os católicos: sinal de amor, representado pelo pentecostes ou descida do Espírito Santo sobre os apóstolos, o que se fez num domingo.
Esta mudança foi feita pelos próprios apóstolos, como no-lo mostra o Apocalipse, onde o domingo é cha- mado dia do Senhor (Kyriaké heméra).

Os presbiterianos perdem, pois, o repto e o cobre.
Dê-me cá, caro amigo, os 2.000 contos, para eu pagar "ao protestante presbiteriano ou batista, que descobrir o texto que me permite cortar a barba.
1.000 e 2.000 contos perfazem 3.000 que eu prometi.
Não se esqueçam do texto bíblico: “Não rasparão a ponta de sua barba” (Lv 21, 5).
3.000 contos de prêmio, a serem pagos pelos batistas e os presbiterianos.

IX. Conclusão
A conclusão é aquela que coloquei na frente desta discussão. Os protestantes fazem da Bíblia um verdadeiro jogo, e cada seita não passa de um clube. É o bi- ble-ball.
Dão pontapés na Bíblia, dão-lhe murros; é uma bola, e esta bola tem que voar, para o lado que o mais forte empurrar: bible-ball.
Tomam um texto, interpretam-no a seu talante, e julgam possuir a verdade. O batista empurra a bíblia no batismo de imersão. — O anabatista chuta a bola bíblica, negando o batismo. O presbiteriano empurra a Bíblia para o sábado; enquanto centenas de outros bolistas empurram-na para o domingo. É um clube de bible-ball.
Como, acima destas brigas, destaca-se bela, solene, majestosa, e divina, a Igreja de Jesus Cristo, fundada pelo Cristo, sobre São Pedro. Ela não discute, mas, assistida pelo Espírito Santo, que prometeu estar com ela, até ao fim dos séculos (Mt 28,20), conserva íntegro e inviolável o tesouro divino das sagradas Escrituras.
Com um cuidado infinito, ela compara os textos, manuseia os originais, compara, consulta os antigos dos primeiros séculos, e apresenta a seus filhos a verdade uma, santa, imutável dos seus dogmas e de sua moral, sempre apoiados sobre a palavra de Deus escrita.

Pobres protestantes! quando é que compreendereis que a palavra divina está na Bíblia e não em vossas cabeças? que a verdade da Bíblia é objetiva e não simplesmente subjetiva? que ela deve ser ministrada por uma autoridade competente, infalível, e não pela cabeça própria de qualquer ignorante?
Compreendendo isto, deixareis a seita vil e mentirosa a que pertenceis, para seguirdes o estandarte glorioso de Cristo, que a imortal Igreja católica, apostólica, romana, desfralda.


SEXTO LAMPEJO
Antes de tudo... mentira


Resposta a um Jornal evangelista
São Paulo, em sua linguagem enérgica, falando das lutas que sustentava para a glória de Deus, diz que corre, não à ventura, combate, não como quem açoita o ar, mas castigando o seu corpo, para que não suceda que, tendo pregado aos outros, venha a perder-se a si mesmo (1Cor 9,26).
Estas palavras me vêm ao espírito, ao ler um jornal protestante, que um católico me mandou, pedindo que refutasse um artigo nele contido. O jornal chama-se “O Evangelista”, para mostrar que não tem nada de evangélico, como certas pessoas de cor bem retinta prezam-se com os nomes de Branca das Neves, Cândida Leite, Alvinha dos Lírios, Aurora Clarinha, Belinha das Graças.
É a mania das oposições. É também mania dos protestantes. O pobre protestante, não tendo mais do evangelho senão a capa, chama-se evangelista; não sendo mais presbítero, chama-se presbiteriano; não conhecendo S. João Batista, chama-se batista; sendo boêmio da vida, chama-se chorão, e ficando paralítico, chama-se pulador; não querendo trabalhar no sábado, chama-se sabatista, e querendo levar a vida de libertino, torna-se impecável...

I. Antes de tudo...
Mas vamos agora ao artigo do tal “O Evangelista”, intitulado: Antes de tudo. Ignoro a significação do título.
Talvez seja Antes de tudo... mentira.
O rabiscador não rabiscou nada; foi plagiando objeções velhas e bolorentas, mil vezes refutadas, e ficou, na expressão de São Paulo, açoitando o ar, gesticu- lando, berrando contra coisas que não existem...
Ataca a Igreja católica, que nem sequer conhece; fala de abusos, que nunca existiram; reprova usos, que os católicos ignoram... grita e blasfema sem saber contra que e contra quem, somente pelo prazer de formular objeções.
Pobre protestante... não vale a pena. À gente não combate um inimigo desconhecido, nem ataca um nome, mas, sim, uma realidade. Antes de tudo, um pouco de conhecimento e de bom senso.
Para satisfazer ao amigo que me enviou o jornaleco ignorante, percorramos as formidáveis objeções plagiadas pelo pai do artigo. É uma eterna repetição... Mas, enfim, serve ao menos para gravar as verdades na mente: — Ars studii repetítio, diziam os antigos.
Percorramos um instante o tal artigo, assinalando-lhe as contradições, os erros, e mostrando, clara e irrefutavelmente, que o biblismo protestante é contrário à Bíblia,
O primeiro parágrafo começa com uma formidável mentira biblista.
O articulista escreve: “O arcebispo D. Duarte Leopoldo e Silva, quando vigário de Santa Cecília, em São Paulo, disse: “Por muito tempo, força é confessá-lo, o Evangelho foi, para os católicos, um livro fechado, um livro desconhecido, e, por isso também, o Deus do Evangelho se vai tornando um Deus desconhecido. Introduzir o Evangelho em uma casa é fazer entrar nosso Senhor Jesus Cristo no seio da família, pondo a família inteira em comunhão com o verbo de Deus”.
É um simples dizer... Eu garanto que S. Excia. D. Duarte Leopoldo não disse isso, pela razão muito simples de que o Evangelho nunca foi um livro fechado para os católicos; ao contrário, é o livro constantemente aberto, lido, meditado e praticado. Não falo daqueles que são apenas católicos de nome, mas, sim, daqueles que professam e praticam a sua religião.
O evangelho é lido e comentado pelos vigários, em todas as igrejas, na ocasião da missa dominical, As revistas, boletins paroquiais e os jornais publicam e explicam o mesmo evangelho. O catecismo, que é o resumo do evangelho, é ensinado em todas as igrejas e escolas católicas, como no interior das famílias.
Há uma diferença entre o método católico e o biblista, e esta diferença já está marcada na própria Bíblia. O profeta Malaquias disse: Os lábios dos sacerdotes devem guardar a ciência, e o povo deve aprender a lei de sua boca, porque ele é o anjo do Senhor dos exércitos (Mal 2,7).
Obedecendo a esta lei bíblica, os católicos, em vez de perderem o seu tempo e o bom senso, em querer compreender por si uma ciência que, muitas vezes, ultrapassa a sua capacidade e estudos, recorrem ao sacerdote e dele recebem a ciência divina, a lei, a regra de vida, enquanto os protestantes, rejeitando a autoridade divina deste “anjo do Senhor”, arvoram-se em mestres, preferindo, deste modo, as suas próprias ideias às ideias da Bíblia, São biblistas sem Bíblia!...
Os pobres protestantes ficam lendo a bíblia, isto é, os textos, sem nada compreenderem, tal o cômico etíope de Candace, a quem o Senhor mandou Filipe explicar os textos (At 8,27). A eles também pode-se perguntar: Compreendes o que Iês? E eles deveriam responder — se o orgulho não lhes obcecasse o espírito: — Como poderei eu compreender, se não houver alguém que mo explique? (At 8,31).

II. A letra e o espírito
Os católicos recorrem aos sacerdotes para ouvir a explicação; os protestantes querem dar a si mesmos a tal explicação, julgando-se inspirados pelo Espírito Santo que, entretanto, por uma singular contradição, não quis inspirar ao eunuco de Candace. Por que estas preferências do Espírito Santo? Todos os homens não serão então filhos de Deus? Ou Deus é pai para uns e padrasto para outros? Tudo isso é sumamente ridículo.
O evangelho não é, pois, um livro desconhecido para os católicos. O livro pode ser desconhecido para os analfabetos, como o é para os protestantes sem letras, mas para nenhum católico a lei em espírito do evangelho é ignorada.
Ora, o que convém conhecer é menos a letra que o espírito. A observação é de São Paulo. A letra mata, diz ele, mas o espírito vivifica (2 Cor 3, 6). Deus fez o sacerdote ministro do espírito e não da letra, diz ele ainda (2 Cor 3,6).
Os pastores protestantes são ministros da letra, e não do espírito, são biblistas sem bíblia...
Outra confusão ridícula. Introduzir o evangelho em uma casa é fazer entrar nela Jesus Cristo, diz o panfletista. Pobre homem! Então introduzir um livro de contabilidade numa casa é fazer entrar nela o guarda-livros?
Um livro é um objeto morto em si; Cristo é vivo.
Não basta ter o livro, é preciso saber interpretá-lo. O eunuco de Candace é um exemplo bíblico: — tinha o livro, mas não o compreendia.
Jesus Cristo, meu caro protestante, não é um livro, não escreveu nenhum livro, nem recomendou livro algum; ele é uma autoridade, e a autoridade não se trans- mite pelo livro; só as ideias são transmissíveis; a autoridade deve ser uma palavra falada, e esta palavra é a intérprete autêntica da palavra escrita, que nós católicos chamamos a Igreja docente, ou autoridade do chefe da Igreja, a quem Cristo disse: Quem vos escuta a vós, a mim escuta (Lc 10,16).
Em parte alguma Cristo disse: Quem ler este livro, conhecerá a minha vontade.
A Bíblia do Antigo Testamento existia no tempo de Jesus Cristo; entretanto, ele nunca recomendou aos seus apóstolos a leitura da Bíblia; nem que adquiris sem uma Bíblia; mas recomendou a todos que escutassem àqueles que lhes explicavam a Bíblia, de modo autêntico, fossem eles até homens perversos e viciados, desde que constituem a autoridade legítima: Sobre a cadeira de Moisés se assentaram os escribas e os fariseus; observai, pois, e fazei tudo o que eles vos disserem; mas não imiteis as suas ações (Mt 23,2).
É claro e irrefutável: O Mestre não recomenda ler a Bíblia; manda praticá-la, conforme as explicações dos chefes, capazes de interpretá-la.
Eis o que fazem os católicos e o que não fazem os protestantes. Os primeiros, embora não possuam a letra da Bíblia, procuram conhecer com os sacerdotes as obrigações da letra ou o seu espírito.
Os segundos limitam-se à letra, lendo e compreendendo conforme querem e conforme às suas disposições, sem indagarem se o sentido que eles entendem é bem o sentido verdadeiro de Deus.
E nenhuma autoridade legítima pode resolver-lhes a dúvida, em vista de todos serem iguais: pastores e crentes, intelectuais e analfabetos.

III. O Deus desconhecido
O amigo protestante, com voz melíflua, e a vesícula biliar a transbordar, continua: Todo aquele, pois, que se diz cristão e não lê as Escrituras sagradas, adora um Deus desconhecido...
É fenomenal!... mas isso chama-se sabedoria protestante!... Então, antes de a Bíblia existir — e ela foi começada por Moisés no XV século antes de Jesus Cristo — os homens durante 25 séculos ou 2.500 anos adoravam um Deus desconhecido.
Os nossos primeiros pais Adão e Eva não possuíam as Escrituras, e em consequência não podiam lê-las.
Então adoravam eles um Deus desconhecido?
Os patriarcas Noé, Abraão, Isaac, Jacob, José e outros até Moísés, não possuíam a Bíblia e não podiam lê-la; adoravam então um Deus desconhecido?
A Bíblia diz e repete que adoravam o Deus verdadeiro — Et adoravit Dominum (Gn 24,26), mas o nosso protestante, mais perspicaz que a própria Bíblia e mais sábio que o Espírito Santo, vem nos contar que todos eles adoravam um Deus desconhecido.
E no Novo Testamento a coisa é pior ainda. Antes da invenção da tipografia, por Gutenberg, em 1430, havia muito poucas cópias da Bíblia, além de a grande maioria do povo ser analfabeta, de modo que sobre cem havia talvez um que possuísse ou pudesse ler a Bíblia.
A quase totalidade do mundo cristão adorava um Deus desconhecido.
E hoje ainda podemos dizer, que, tomando a população global do mundo, a metade não sabe ler — e isso no século XX — de modo que a metade do mundo adora um Deus desconhecido!
Só o nosso bravo protestante adora um Deus conhecido, e este Deus é um deus de papel: é a própria Bíblia, Ele despreza o Deus da Bíblia, mas adora a Bíblia de Deus. É uma verdadeira idolatria!

IV. O segundo mandamento
Não podia faltar a bolorenta objeção da adoração das imagens. Isto é uma pedra que esmaga a consciência do protestante, que só pode respirar depois de retirá- la e lançá-la contra os católicos.
Ele continua, sempre melífluo: “Caro leitor, não conheceis a Bíblia? Não permaneçais nesta ignorância.
Pedi... mesmo ao sacerdote, que vos mostre em primeiro lugar o capítulo 20º do livro do Êxodo, onde se encontra o decálogo e prestai bem atenção no que diz o 2º. mandamento em que se proíbe fazer imagens, adorá-las e prestar-lhes culto”,
Agora, sim, caiu a pedra... o bom protestante pode respirar a pleno pulmão. Então é proibido fazer imagens, no capítulo 20º do Êxodo? Mas, para quem é a tal proibição?... E” para todos, ou é só para os católicos?
É para todos?... Então como é que os protestantes tem imagens em suas casas e em não seus livros? Tenho aqui diante de mim uns 20 volumes de obras protestantes,
volumes ilustrados, com capa ilustrada, representando cenas bíblicas, patriarcas, e até a sagrada família, Jesus, Maria e José. Como é isto, caro protestante?... É proibido fazer imagens ou não?
Quanto ao adorar imagens, isto já cheira a uso antiquado de 20 séculos. É tão ridículo que nem merece resposta. O amigo nem sabe o que é adorar... Se o soubesse, não diria adorar imagens... como não se diz: comer um copo d'água. Não se adora uma imagem, como não se come água. Pode-se venerar uma imagem, como se pode beber um copo d'água. Adorar e imagem são dois termos que se excluem como se excluem os termos comer e água. Enfim, deixemos o nosso protestante dizer: como um copo d'água e bebo um prato de arroz.
Na linguagem doutrinal, adorar quer dizer: prestar um culto supremo a alguém. Ora, o Ser Supremo é um só: — Deus. Só Deus pode ser adorado. Ora, quem já viu um homem civilizado prestar culto de adoração a uma estátua, ou a uma imagem?
Antigamente os selvagens e pagãos, destituídos de qualquer noção religiosa, eram capazes disto; mas hoje, o mais tolo e atrasado da sociedade civilizada sabe distinguir entre Deus e uma estátua, entre Deus vivo e uma imagem morta. Só mesmo um protestante, para vir ainda falar em tais absurdos.
Deus é o único Ser Supremo; só ele pode ser adorado de modo absoluto. As imagens são apenas representações mortas, e como tais não merecem nenhum culto; só têm valor religioso — fora o valor artístico e material — pela pessoa ou o objeto que representam.
Nunca uma imagem pode ser adorada; pode, apenas, ser honrada, em lembrança da pessoa que representa, e ainda sempre de modo relativo. Adorar uma imagem inclui, pois, o mesmo antagonismo que comer água, ou beber carne. Só um fanatismo obcecado para dizer isso.
Quem é idólatra, não é o católico, que adora a Deus em espírito e em verdade, mas, sim, o protestante, que adora a Bíblia como um Deus, desprezando a palavra de Deus que ela encerra. Isso, sim, é a verdade!

V. Em espírito e verdade
Mais uma balbúrdia protestante... Escutem o sábio biblista: “O culto racional que devemos prestar a Deus é aquele que o evangelista São João recomenda no cap. 4,24: Deus é espírito e importa que os que o adoram o adorem em espírito e verdade. Pedi ao vosso orientador religioso que vos explique o fato de algumas religiões ensinarem o contrário do que está escrito na Bíblia. Interrogai-o se a Bíblia é ou não é a palavra de Deus”.
Se eu perguntasse ao meu amigo protestante o que é adorar em espírito e verdade, ele ficaria tão atrapalhado como uma criança a quem se perguntasse o que é trigonometria. Os amigos protestantes embaralham e confundem tudo.
Escute, pois, uma pequena ligação de catecismo para compreender o sentido das palavras. Adorar: — já está explicado: “É prestar um culto supremo a alguém”.
Em espírito e verdade, quer dizer: interiormente e exteriormente. Interiormente, pelo espírito: é o culto interior. Exteriormente, pelo corpo: é o culto exterior.
Deus quer ser adorado por meio deste duplo culto, porque, sendo o homem um composto de corpo e alma, é necessário que estes dois elementos, que são obras de Deus, entrem nas homenagens que ele presta a Deus. A alma adora em espírito, e o corpo, manifestando exteriormente os sentidos da alma, adora em verdade.
Ninguém vê a nossa alma, e em consequência, a nossa adoração interior, de modo que pode parecer mentirosa para o próximo, e só se torna certa, verdadeira, quando é manifestada publicamente.
Eis o que os amigos protestantes ignoram completamente, pois julgam encontrar neste texto uma objeção contra a religião católica, quando encontram nestas palavras a condenação formal de sua seita.
De fato, os protestantes não possuem um culto exterior... nem sequer interior, porque todo o seu culto e adoração consistem em ler ou ouvir ler a Bíblia, cantar uns hinos e comer um pedacinho de pão, a que chamam ceia.
Os católicos possuem um culto interior e exterior de adoração, manifestado pelas majestosas cerimônias do serviço religioso, ou liturgia.
O nosso amigo crente “foi buscar lã e voltou tosquiado”! Terá ele a coragem de reconhecer a sua calvície?
É duvidoso... O demônio é teimoso e segura bem aqueles que lhe caem nas unhas.

VI. Língua estrangeira na Igreja
Outra pedra formidável! O amigo protestante, que nada pesca em latim, acusa a Igreja católica de rezar em latim. Está errado, caro amigo, a Igreja é a reunião dos fiéis, e estes rezam cada um em sua língua própria.
O brasileiro e o português rezam em português; o francês, em francês; o alemão, em alemão; o russo, em russo, etc... e o protestante não reza em língua nenhuma, só faz objeções, e procura pedras para quebrar o teto da Igreja romana, Felizmente, a Igreja tem alicerces, paredes e tudo de pedra, contra os quais nada podem as pedradas do inferno, conforme as palavras do Mestre.
Mas, enfim, por que a Igreja católica usa o latim em suas cerimônias e preces sacerdotais... e não a língua do povo?
A razão é muito simples. A religião católica é uma religião una, universal, imutável, divina.
Sendo una, ela precisa de uma língua universal, não para pregar, mas para conservar a unidade perfeita em seus dogmas, cerimônias e comunicações. Sem uma língua única, seria impossível conservar a unidade, pois as palavras traduzidas de uma para outra língua podem facilmente adquirir novo sentido, ou, pelo menos, ficar ambíguas, de modo a estarem sujeitas a diversas interpretações. Sendo a língua una, no mundo inteiro, não pode haver alterações, nem nas expressões, nem no sentido. A Igreja sendo una, é, pois, uma necessidade que haja uma língua una.
De fato, a unidade deve existir e conservar-se na fé, no culto, no governo. Ora, para conservar a unidade nas verdades metafísicas, no mundo inteiro, torna-se imprescindível possuir termos fixos para exprimir tais verdades. Nas traduções sempre há equívocos, porque muitos termos de uma língua não encontram um equivalente perfeito em outra língua. É a razão por que nós adotamos em todos os países os termos de latitude, longitude, em vez de largura, lonjura, etc. porque tais termos não conservam no mundo inteiro a significação geográfica própria.
A mesma razão deflui da unidade de culto e de governo, À palavra pater, por exemplo, é conhecida no mundo inteiro para significar o ministro de Deus, como o substantivo Papa significa, para todos, o chefe supremo da Igreja católica.
Os protestantes andam numa mixórdia inextricável, por falta desta unidade, Para indicar os seus chefes, que não são sacerdotes, nem presbíteros, pois não recebem nenhuma investidura espiritual, recorrem aos termos de pastor: qualquer vaqueiro é pastor; ministro: qualquer leigo na investidura civil é ministro; pregador: qualquer analfabeto é pregador.
No mundo inteiro o sacerdote católico é pater; todos o sabem e todos compreendem o termo. Eis a vantagem da língua una, numa religião una. E assim por diante.
A Igreja católica é universal; como tal precisa de uma língua universal, que permita ao chefe supremo comunicar-se com todos os chefes subalternos: cardeais, patriarcas, bispos e padres, sejam eles chineses, árabes, russos, americanos ou africanos.
As seitas protestantes, sendo locais, sem união, sem ligação, sem unidade, podem usar cada uma a sua língua própria.
Quot capita, tot sensus, cada um deles fica repleto de sua própria opinião — predisse já o apóstolo (Rom 14,5). Daí as 888 seitas diferentes e antagônicas, todas com a bíblia debaixo do braço.
A Igreja católica é ainda imutável, e como tal ela precisa de uma língua imutável. Ora, entre as línguas, só as línguas mortas, não faladas oficialmente, são imutáveis.
Quanto às línguas vivas, dependem dos acadêmicos, dos filólogos, gramáticos, etc., que introduzem continuadamente novidades, mudanças, de modo que nelas nada pode haver de estável. Tudo o que vive muda e evolui.
Dentre as línguas mortas a Igreja católica adotou a mais antiga, a mais bela, a mais rica e a mais harmoniosa, que é o latim; uma das três, em que foi escrita a sentença de condenação do Salvador. E estava escrito em hebraico, em grego e em latim (Jo 19,20).
O hebraico e o grego são ainda falados; o primeiro pelos judeus; o segundo pelos gregos, o terceiro extinguiu-se, ficando apenas as suas numerosas ramificações, como o italiano, português, espanhol e francês. Tal língua estava, pois, natural e logicamente indicada para tornar-se a língua universal da Igreja católica, cujo centro ficou sendo a antiga Roma, centro da língua latina.
A Igreja é divina; como tal não pode depender de elementos puramente humanos. Adotando uma língua viva, depende dos homens, dos países, dos costumes e dos tempos, sem nunca ter uma base segura para exprimir com certeza a imutabilidade de seus dogmas e as verdades básicas de seu ensino.
Procurando na tradição dos antigos, nos primeiros padres e doutores da Igreja, o ensino doutrinal de qualquer ponto, necessário seria fazer um estudo linguístico para conhecer o valor dos termos nesse tempo, que talvez não possuem mais hoje.
É uma das bases da desunião protestante e prova de sua organização humana, enquanto a Igreja católica mostra a sua divindade pela imutabilidade de seu ensino, Os termos que nós empregamos hoje foram já usados nos primeiros séculos, pelos chefes da Igreja, no mesmo sentido e na mesma língua latina.
Agora uma distinção se impõe. A língua doutrinal, litúrgica e de governo da Igreja é o Latim; mas a sua língua precativa como explicativa é a vernácula de cada povo. O sacerdote recebe o seu ensino em latim, mas transmite a doutrina em língua popular, de modo que todos podem compreendê-lo. É ele, e só ele, que pode saber o latim, enquanto o povo conserva a sua língua popular.
E não há segredos nos ofícios litúrgicos; se as orações particulares, oficiais do padre, como a santa missa e o breviário, são em latim, os fiéis possuem as traduções em vernáculo, que podem compreender e seguir.
O latim, na Igreja, em vez de ser um empecilho, como julgam os protestantes, é uma prova de sua incomparável superioridade sobre todas as religiões diversas, pois só ela possui uma língua própria, universal e imutável.

VII. Invocação dos santos
A saraivada continua... mas desta vez são pedradas balofas de ignorante. Escutem bem o raciocínio do pobre rabiscador: “No evangelho de São Mateus, cap. 11,28, diz Jesus: “Vinde a mim, vós todos que andais tristes e sobrecarregados, e eu vos aliviarei”. “Todo aquele que invocar o nome do Senhor será salvo”. Estas palavras de jesus excluem a invocação dos santos. Se Cristo me alivia em minhas aflições, que necessidade tenho de ir contar minhas misérias a este ou àquele santo”?
Em resumo, o raciocínio é este: A bíblia não fala da invocação dos santos; logo, tal invocação não é necessária.
É mesmo de se bater palmas! Não figura na Bíblia que a gente deve usar sapatos, chapéu, camisa; logo, o nosso protestante deve andar de pé no chão, sem chapéu, sem camisa.
Não figura na Bíblia que a gente deve tomar café, almoçar e jantar; e o nosso protestante faz tudo isso.
Não está na Bíblia que devemos banhar o rosto, cortar o cabelo e as unhas, tomar banho, pentear o cabelo e fazer a barba... e eis o nosso protestante a fazer tudo isto.
E onde está, na Bíblia, que se devem fazer objeções contra a Igreja católica, atacar o papa, os padres, insultar a Virgem ssma., os sacramentos e tudo o que fazem os católicos; onde figura isto?... e, entretanto, esta é a vida dos protestantes fanáticos. Seria raciocínio de bobo, se não fosse de criança.
É inútil prolongar este assunto, porque já foi tratado em a “Luz nas Trevas”.

VII. O culto de Maria ssma.
O bom protestante não podia deixar de atacar o culto da Ssma. Virgem. Sem isso, o seu ataque seria incompleto; a trindade atacável e atacada, inseparável na glória, como o é nos ataques protestantes, é Maria Santíssima, o papa e o padre. Maria santíssima, porque é Mãe de Deus. O papa, porque é representante de Deus. O padre, porque é ministro de Deus. São três nomes intimamente ligados e que sempre recebem as homenagens dos católicos e o ódio dos protestantes.
De fato, são como as três bases da religião. Maria santíssima, como mãe, é associada à obra redentora; pelo seu livre consentimento à Encarnação, é a distribuidora das graças divinas. O papa, como sucessor de São Pedro, é o depositário da eterna verdade, é a coluna, o rochedo indestrutível, sobre o qual Cristo fundou a sua Igreja. O padre, pela recepção do sacramento da ordem, é o administrador, o instrumento das graças divinas.
Os protestantes, rejeitando o próprio Jesus Cristo, para só conservar a Bíblia, devem necessariamente rejeitar a Virgem Santíssima, que os católicos tanto amam e invocam com tanta confiança, como devem odiar o papa, que é o sustento da Igreja, preservando-a da desunião, da revolta que Lutero veio semear no mundo. Devem, igualmente, odiar o padre, porque é o grande propagandista da verdade, o semeador incansável das verdades evangélicas que o protestante renega e blasfema.
Tais ataques são, pois, uma necessidade para os pobres protestantes em revolta contra Deus e contra a Igreja.
Mas, diga-me, caro protestante, o amigo julga agradar a Jesus Cristo, insultando à sua Mãe santíssima? Curioso modo de querer granjear a amizade de um filho, insultando à sua mãe! Poderá Jesus Cristo ficar insensível a este ódio que os protestantes votam à sua Mãe?
Então terá ele outros sentimentos que nós?... Será ele pior Filho do qualquer um de nós?
Nós exigimos o respeito à nossa mãe, e Jesus Cristo terá prazer em ouvir insultar àquela que ele escolheu entre todas as mulheres, que encheu de graças, a quem obedecia durante a sua vida mortal, e a quem amava com toda a ternura que um filho tem necessariamente para uma boa mãe!
E vós, pobres protestantes, julgais honrar o filho tratando a sua mãe de mulher comum, até de mulher infiel, pois até aí chegam as vossas blasfêmias, dizendo que, além de Jesus, ela teve mais outros filhos.
O evangelho nos diz que ela não conheceu varão (Lc 1,34). É certo que Maria santíssima não teve filhos de São José... mas então de quem serão tais filhos? O evangelista São Marcos chama Jesus o Filho de Maria (Mc 6,3), e não um filho de Maria, o que denota claramente que ele é filho único da santíssima Virgem. Para quem sabe português, a tal expressão significa um filho único de viúva.
Os tais supostos irmãos de Jesus, que são seus primos, como se vê claramente no evangelho nunca foram chamados filhos de Maria. Veja-se Lc 6,15,16; Mt 27,56; Mc 6,3. Estas passagens resolvem toda a dúvida e mostram que tais irmãos são irmãos-primos.
Em tudo isso, caro protestante, sente-se o ódio...
Ora, o ódio nunca foi e nunca será virtude. É um vício obcecante que cega e faz cometer todos os crimes.
Este ódio à santíssima Virgem, ao papa e ao padre, é o bastante para provar que a vossa crença não é de Deus e não conduz a Deus.
O contra-senso de querer honrar a Jesus, e desprezar a sua Mãe, mostra a obcecação, a miséria de sua seita, que viola as próprias leis da natureza, para poder dizer o contrário do que diz a Igreja. Em vez de insultar, melhor seria e mais sensato pedir à Virgem Mãe de Jesus que ela vos abra os olhos, a inteligência e o coração, para compreenderdes melhor a palavra evangélica em vez de escutar as baixas objeções que vos incutem os vossos pastores!

IX. Conclusão
Seguem mais uma meia dúzia de asnices; mas não vale a pena refutá-las. Tenho já respondido a todas estas objeções nos diversos livros publicados.
Aquele que sinceramente procura a verdade e deseja lealmente abraçá-la, encontrará a resposta a todas as suas dúvidas na série de refutações já publicadas, e que podem ser encontradas em qualquer livraria.
São eles: Luz nas Trevas protestantes. — Resposta completa às grandes objeções protestantes e Ataques Protestantes às Verdades Católicas. Nestes livros encontram-se respostas claras e provadas a quase todos os erros protestantes.
Seria, pois, enfadonho repetir continuadamente as mesmas verdades. O articulista fala, por exemplo, sobre a salvação, purgatório, confissão, Igreja verdadeira, jejum, Virgem Maria, Eucaristia e mudança de religião; tantos pontos já longamente tratados no primeiro livro citado.
Pobre protestante, reflita um pouco. Escute mais a palavra de Deus, tal qual se encontra na Bíblia, em vez de escutar a sua cabeça, que nada tem de bíblico.
Peço ao bom Deus, Pai de misericórdia, que ilumine a sua inteligência para conhecer a verdade, e a sua vontade, para ter a força de praticá-la. Fazer objeções, insultar e lançar pedras, não é religião: — é covardia.
Se o amigo tem a convicção — mas não a tem — e pensa estar com a verdade, pratique então esta verdade, e deixe os outros em paz praticarem o que eles julgam ser verdade. Não quer o senhor escutar o sacerdote católico? Pois bem, escute o seu pastor... e deixe os outros em paz.
Os católicos possuem e leem a Bíblia; eles escutam a explicação da palavra de Deus que lhes é ministrada por padres, que durante longos anos estudam as ciências, a religião e a Bíblia, e cuja palavra bem vale, parece-me, a palavra de um pastor quase analfabeto, fanático, explorador.
Fazendo isso, seguireis o conselho do divino Mestre que disse: Aprendei de mim, que sou manso e humilde de coração (Mt 11,29), em vez de merecer a suprema maldição do Salvador contra aquele que escandalizou o próximo: “O que escandalizar um destes pequeninos, que creem em mim, melhor fora que se lhe pendurasse ao pescoço a mó que um asno faz girar, e que o lançassem no fundo do mar (Mt 18,6).
As suas objeções, mentiras, calúnias, blasfêmias e ódios, meu caro evangelista, escandalizam a todos aqueles que sinceramente acreditam em Jesus Cristo e procuram seguir a sua lei divina. Atenção, pois, à mó e ao fundo do mar. A ameaça é de Jesus Cristo... e se encontram na Bíblia.


SÉTIMO LAMPEJO
Conversões protestantes e bílis dos batistas


Os pastores protestantes possuem uma vesícula biliar de um tamanho formidável. Eu até agora ignorava que o protestantismo tivesse influência sobre o fígado.
Sabia que tinha, como especialidade, nutrir o ódio contra a Igreja romana, obcecar o espírito e fechar o coração com meia dúzia de objeções contra o papa, os sacramentos e o culto dos santos; mas ignorava que ele exercesse uma, influência preponderante sobre a vesícula, biliar.
E, entretanto, é um caso patológico. Seria bom que os médicos examinassem tal fato; pode até ser uma nova moléstia. Como diagnóstico, pode-se assinalar: a romofobia, ou ódio a Roma, Ora, as emoções violentas, o Ódio, os acessos de cólera, enfim, exercem uma verdadeira influência sobre o fígado, ao ponto que a medicina assina-la casos de morte instantânea pelas hemorragias, icterícias, derramamento de bílis, ocasionados por raiva e ódio.
Foi o que ocasionou uma notinha de “O Lutador”, como lemos no ilustre “Jornal Batista”. Neste jornal, os batistas derramam bílis em peso, e ódio ao romanismo, sem medida. É um jornal interessante mesmo, pelas mentiras que vai dizendo com sangue frio de jacaré.
Mente, calunia, a não poder mais; e depois, tão inocentemente como o gato que rouba um pedaço de carne, o rabiscador faz carinha de inocente, e... revolta-se, quando qualquer notícia o contraria.
Escutem o que ele escreve sem pestanejar: “O Lutador”, do Padre Júlio Maria, sob a epígrafe supra, publicou a seguinte nota: “Na segunda semana de Novembro, 50 ministros da igreja anglicana, em Londres, publicaram um manifesto em que se encontra a seguinte preciosa declaração: “O único meio que há, para sairmos do atual caos eclesiástico, é a união com a Santa Sé, em Roma”, A maior parte dos clérigos são pessoas que desde longos anos ocupam posições eminentes na igreja anglicana”.
Se a notícia é verídica, e não uma daquelas piedosas fraudes de que a facúndia romanista é tão fecunda, nós estamos de pleno acordo com os 50 judas da igreja anglicana, que ao mesmo tempo que vivem dela, cavam-lhe a ruína, fazendo no seu seio a propaganda papista. Se são papistas, passem-se logo com armas e bagagens para o papismo; ajoelhem-se reverentemente, extaticamente, perante “sua santidade”, beijem-lhe os seus santos pés, regalem-se com o seu santo chulé, obedeçam — perinde ac cadaver — às suas infalíveis ordens e decretos, mas não sejam hipócritas e traidores, no seio da corporação a que só estão ligados pelo interesse mercenário, e pelo interesse político da seita à qual de fato pertencem”.

I. Uma resposta
A notinha do “Jornal Batista” merece uma pequena resposta. Ei-la: Eu pergunto ao bom jornalista: — por que largar esta explosão de raiva contra os tais 50 pastores anglicanos, contra Roma e contra o papa?
O homem sensato reflete, pensa, compara e tira conclusões. O idiota deixa-se levar pela natureza, só enxerga a ideia própria, e condena todo o resto.
O fato autêntico, de 50 pastores anglicanos voltarem ao seio da Igreja católica, tem um valor probativo, e este valor aumenta consideravelmente, quando se ajunta que estes 50 pastores são todos doutores, professores de Universidades, homens de alta sociedade e de responsabilidades.
Um tal fato deve fazer refletir, por um instante, a todo protestante sério. Um protestante deve perguntar de si para si: A minha religião será mesmo a verdadeira?
A tal Igreja romana, tão atacada pelos protestantes, tão caluniada, será deveras o que os protestantes dizem que ela é?
Se a tal Igreja é tão perversa... se o papa é um monstro tão horrendo, como é que esta Igreja continua sempre e sempre a dominar o mundo? Como é que o tal papa é o vulto mais belo, mais sublime e mais aclamado que o mundo já conhece? Donde vem isto?
Vivemos num século de paixões e de lutas, de descrença e de perseguições, e, entretanto, este papa fica sempre o mesmo, imóvel em sua grandeza, sorridente no meio dos ódios, triunfante do mundo e do inferno. Como é isso? É isso natural ou divino?
Só pode ser divino! É esta verdade divina que é a realização das palavras de Jesus Cristo: Tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei a minha Igreja, e as portas do inferno não prevalecerão contra ela (Mt 16, 18).
Os 50 pastores ingleses, todos eles homens de cultura e de ciência, estudaram, e pelo estudo, auxiliados pela graça divina, compreenderam que não estavam mais ligados à Igreja verdadeira, e que, por conseguinte, se afastaram do rochedo de Pedro, fixando a sua casa de culto sobre Lutero e seus comparsas.
Homens de valor intelectual, e não baixos exploradores como são os pastores brasileiros — eles compreenderam que o evangelho, que professavam, não era mais o evangelho de Cristo, mas a interpretação de Lutero, e seguindo o conselho de São Paulo, preferiram escutar a voz de sua consciência em vez de seguir os interesses de sua bolsa.
Se alguém, ainda que fosse um anjo do céu, diz o Apóstolo, vos anunciar outro evangelho, que aquele que vos tenho anunciado, seja anátema (Gál 1,8).
Tiveram então coragem. O mundo os aplaude, enquanto o “Jornal Batista”, pelo contrário, sai com uma cesta de pedras, e lançando pedras e paus, grita: — "Judas... são Judas!... papistas... vão beijar os santos pés do papa... vão regalar-se com o seu santo chulé... sois hipócritas... traidores... mercenários!...”

II. Alto lá, seu pastor
Alto lá, meu caro pastor... vamos devagar, e deixemos os pulos para os cabritos irracionais. Diga-me uma coisa, uma só, permitindo-me tirar desta coisa as conclusões lógicas que dela defluem, Diga-me se é, ou não é permitido mudar de religião. Ou sim, ou não, sem recorrer aos mil e um sofismas que formam a base da ciência protestante.
Se não é permitido mudar de religião, o sr. é culpado... pois sendo um ex-católico, como aliás o são todos os protestantes, mudou de religião, contrariamente à sua própria proibição. E, neste caso, os judas, os traidores, os hipócritas, sois vós, meus caros pastores. Se é permitido mudar, não há, pois, razão de lançar tão altos gritos, pois estes homens usaram de um direito próprio.
Se não é permitido, como é que vós, batistas, vós brasileiros, filhos de católicos, renegastes a fé de vossos pais e avós? Como é que apostatastes da religião nacional do Brasil, para aderir a uma seita nascida da devassidão de Lutero e seus comparsas? O dilema é sem saída.
Se não é permitido, como é que vós, pastores mercenários, empregais todos os meios para fazer apostatar os católicos brasileiros?
Não estais vendo que fazeis uma obra que a vossa própria consciência e vossas próprias máximas reprovam e condenam?
Se não é permitido aos anglicanos voltarem à religião de seus pais, como é permitido aos católicos passarem para uma seita, como a batista, que nem é cristã?
Dizeis-vos discípulos de João Batista. Ora, São João Batista era católico, discípulo de Cristo. Ele nunca foi fundador de religião; foi apenas o precursor do Messias.

E sendo o precursor, a sua missão limita-se em preparar os caminhos do Messias, e não em fundar seitas religiosas!
Reflita sobre isso, meu caro batista. Não basta babar; isso não é argumento: é sujeira. Não basta acusar; acusação não é argumento, é uma denúncia. Não basta atacar; o ataque não é argumento, é uma destruição.
Antes de atacar a Igreja católica, é preciso provar a autenticidade da seita batista. E isso nunca o sr. fez, e nunca fará, porque tal prova é impossível, fora da mentira. E mentira não é prova; é baixeza!
Agora, outro absurdo, meu caro batista, que denota uma falta completa de lógica, ou então uma abundância transbordante de obcecação.
Diga-me, sinceramente: É, ou não é permitido voltar atrás, na escolha da religião que se professa? É ou não é? ... Responda.
Se disser que é, então o meu caro batista é um caluniador, pois insulta e calunia os 50 pastores anglicanos por terem abandonado o erro protestante, e terem voltado à religião primeira que é o catolicismo, pois antes de Henrique VIII — o assassino das esposas, — a Inglaterra era católica.
Se disser que não é permitido voltar atrás, então os belos epítetos tão generosamente aplicados aos neo-convertidos devem ser aplicados aos senhores porque voltaram atrás, e outrora católicos e filhos de católicos, tornaram-se discípulos do Batista, que é o precursor de Cristo, e não o próprio Cristo, como ele mesmo confessou.
Estais, pois, em revolta contra a religião de vossos pais e avoengos, renunciastes à religião de Cristo para voltardes ao batismo de penitência de São João Batista. É um novo dilema sem saída, onde o caluniador batista recebe a pedra que lançara sobre os outros.
Está vendo, caro amigo, que, antes de lançar pedras, é prudente examinar o próprio telhado, porque sendo ele de vidro, a volta das pedras pode ocasionar muita quebradeira.

III. A livre interpretação
Mas há coisa pior. Diga-me, caro batista, “não é um princípio de sua grande reforma que: 1º basta a Bíblia para conhecer a verdade; 2º cada um pode interpretar a Bíblia conforme a sua inspiração pessoal?”
Mas se assim é, por que o amigo batista não deixa os outros gozarem deste direito?
— Por que o senhor quer que os outros adotem a sua interpretação?
— Por que o Espírito Santo não inspiraria um romano, um anglicano e até um turco, como ele inspira um biblista de Lutero?
Então, não há liberdade, nem para Deus, nem para os homens? Como é isso, caro batista? Eu não compreendo... e só a sua inteligência formidável é capaz de decifrar tal enigma.
Se tais princípios fundamentais da reforma são gerais, deve conceder a cada um o direito de ler e interpretar a bíblia a seu talante.
Nós, romanos, lemos a passagem acima de São Mateus, e interpretamos que a única verdadeira Igreja é a fundada por Cristo sobre São Pedro, o primeiro chefe, o primeiro papa.
Vós, protestantes, pelo prazer da contradição, interpretais que São Pedro nada vale, que a Igreja católica nada tem com Pedro, mas, sim, com a fé de Pedro, o que não figura na Bíblia.
Por que a sua opinião ou interpretação tem mais valor que a nossa? Nossa interpretação é literal, ao pé da letra; a sua é puxada pelos cabelos, sem cabimento, por meio de intercalações... por que e em que a sua é superior á nossa?
E fosse ela superior, (o que em verdade não é), desde que exista a interpretação pessoal — por que a minha opinião pessoal será inferior à sua? Somos duas pessoas... por que e em que a minha pessoa seria inferior à sua?
Cada um — e isso é mui protestante — é livre de seguir a sua ideia. Eu sigo a minha... o amigo batista segue a sua... e os pastores anglicanos seguem a deles. E nada há a dizer a este respeito, conforme os princípios básicos de sua seita. É um novo dilema sem saída.

Não se trata, pois, nem de traidores, nem de hipócritas, nem de Judas; — trata-se de homens livres que estudam e seguem a voz de sua consciência. E isto é nobre... é sublime, enquanto as suas torturantes maldições não passam de um ralo chulé de pastor explorador... cansado pela caminhada explorativa dos níqueis.
O fato da conversão dos 50 pastores anglicanos não é uma piedosa fraude da facúndia romanista. A Igreja católica não precisa inventar histórias: os fatos são tão numerosos que não há artigos que cheguem para citá-los.
A Igreja católica não precisa de recorrer ao chulé protestante; basta-lhe a verdade e o triunfo constante de sua fé no mundo.
Citemos aqui uns pedacinhos não menos significativos.

IV. Testemunhas protestantes
“O conhecido jornal católico “The Universe”, de Londres, em data de 10 de Julho, publicava o testemunho sincero de um ministro protestante da seita presbiteriana inglesa, que merece ser conhecido.
Um recente discurso do professor Curtis, pastor presbiteriano, na assembleia da seita em Edimburgo, (refere o jornal), é deplorado por uma carta enviada ao “Glasgow Herald”, firmada por um “membro da igreja” (presbiteriana), na qual se diz que esse discurso é próprio para provocar muito aquele acerbo sectarismo que, por felicidade, se julgava extinto.
A mencionada carta prossegue: “Há uns quarenta anos sou membro da Igreja da Escócia, e nos meus trabalhos diários me encontro no meio de pessoas de todas as classes e de todos credos. Não verifiquei nunca qualquer propaganda dolosa da parte dos muitos meus amigos católicos. Pelo contrário, tenho devido admirar a tolerância de que eles sabiam usar, quando, protestantes irrefletidos, falavam do papado e dos papistas, e das imaginárias maquinações de Roma. Meneavam a cabeça, deixando a cada qual dizer os seus disparates. E isto, certamente, o tem podido verificar qualquer homem de bom senso,
“É um fato de que a Igreja romana desenvolve a sua obra e a promove bem, com tranquilidade e seriedade, e os frutos de tal trabalho estão visíveis no desenvolvimento dessa Igreja e na devoção dos seus membros. Nossa igreja faria bem em imitar alguns dos seus métodos, por exemplo, nos cuidados dispensados aos pobres nos bairros mais pobres da nossa cidade; no interesse da Igreja católica pela juventude; na dedicação dos seus sacerdotes aos deveres, e, em poucas palavras, em fazer seriamente o que faz”.
Esta declaração, diz o “The Universe”, parece uma prova de que nem todos os nossos irmãos dissidentes estão tomados daquela intolerância, que tão amiúde se manifesta nas assembleias gerais dos seus oradores.
A citada carta remata com este proveitoso conselho: “A igreja unida (presbiteriana) faria muito melhor se dedicasse as suas energias e as sobras da sua potencialidade humana a uma obra social, entre os pobres tão desprezados, e deixasse os outros perseverarem no seu modo e nos seus esforços.”

V. Glórias do protestantismo
Um jornal alemão, protestante, escreve sobre as conversões: “Somos obrigados a confessar o fato de que quase em todos os casos, em que protestantes se tornam católicos, estas conversões são um lucro positivo para a Igreja católica. Não se pode duvidar que a passagem para a Igreja católica, quase sem exceção alguma, é fundada em motivos religiosos. Isto, porém, não se dá quando um católico se torna protestante; as mais das vezes tal passagem se dá por outros motivos que não têm nada com religião. Tais conversões não lucram para o protestantismo; pode ser um lucro de número, mas não de valor”.
De fato, é certo que os que são hoje uma glória do protestantismo eram ontem uma vergonha da Igreja católica.
Uma vez, um dos próceres do protestantismo se queixou sinceramente de que, quando o papa varre a Igreja, lança o lixo no protestantismo.
É verdade. O protestantismo, com exceção de um pequeno número que sorveu a heresia maternal, é, quase todo, no Brasil, de apóstatas. Foram católicos, maus católicos, ignorantes, e passaram facilmente para a heresia, que os dispensava de uma porção de coisas incômodas.
E entre esses infelizes estão alguns padres. Não eram eles, certamente, dos melhores. Os vasos de honra e de eleição não são jogados fora com a vassoura. Guiados por vergonhosas paixões a que não quiseram nem souberam resistir, saíram da Igreja. A Igreja não lhes permitia viver segundo as paixões. A Igreja tinha exigências de virtudes a que eles não se queriam submeter.
Era preciso passar-se a uma religião folgada, fácil, camarada. A uma religião em que a virtude fosse barata, sem exigências incompatíveis com as solicitações da carne. E passaram para o protestantismo!
E o protestantismo os recebeu de braços abertos, e fez deles heróis. E eles passaram repentinamente, de ignorantes (como são todos os ex-padres) a sábios, de imorais a virtuosos, de exploradores a homens dignos.
Por quê? Porque se casaram no civil e fazem conferências contra a Igreja.
Foram ao protestantismo em busca de perfeição?
Não. Foram levados pela impureza.
Eram homens virtuosos, mortificados, cumpridores de seus deveres? Não. Eram um espinho no coração da Igreja.
Quem eram esses padres? É um desses infelizes que no-lo vai dizer, numa confissão espontânea. Rafael Gioia Martins, padre, hoje pastor amasiado e bem pago, escrevendo a respeito de outro infeliz de igual jaez, disse n“O Evangelista”: “Tratava-se do padre Francisco Benjamim Melito, meu velho amigo, companheiro de bons vinhos e saborosas macarronadas”. Não é de admirar que quem vive para o copo e para o garfo, ache pesadas as leis da virtude, e vá desafogar as paixões longe da Igreja. São esses os ex-padres de que tanto se honra a imprensa protestante!

VI. Conversão de um pastor metodista
Citemos ainda umas linhas do pastor Stanton convertido ao catolicismo, pela sua visita ao santo Padre Bento XV, em 1920, e hoje padre católico fervoroso.
Apenas Stanton tinha entrado no seminário protestante, começou a ler um resumo das obras de Lutero e a apologia católica de Newman; este último livro fez sobre o jovem uma impressão profunda. Escreve: “Estava certo de que não podia tornar-me católico, mas no meio da confusão do protestantismo me convenci de que a Igreja católica sempre estava de pé. Tirai a Igreja católica, e todas as seitas protestantes podem preparar-se para ir embora”.
Entretanto, Stanton se tornara ministro metodista; todos os domingos celebrava um ou dois cultos: uma oração, um cântico, uma leitura da Bíblia, mais alguns cânticos, e por fim uma coleta de bênção. No fim do culto devia dar a mão a centenas de homens e mulheres que voltavam a casa.
Certo dia, assistiu à missa católica na noite de Natal, o que sobre sua alma fez uma profunda impressão.
Durante as férias que seguiram, passou alguns dias em um convento de cartuxos, e a vida religiosa parecia-lhe a forma mais nobre do cristianismo. Escreve: “Esses homens viviam para Deus com o fim de unir-se cada vez mais a Deus, de salvar sua própria alma e de fazer bem ao mundo”, Deste modo se preparava para abraçar afinal o catolicismo.
Seus amigos já sabiam que ele se inclinava pouco a pouco a seguir a doutrina católica, e por isso procuravam dissuadi-lo deste passo. Um deles lhe escreveu: “Se um dia conheceres o Catolicismo em sua realidade, o detestarás para sempre”.
Contavam-lhe que em Roma havia muitos sacerdotes ignorantes e de vida irreligiosa, recrutados das mais baixas classes da sociedade italiana, e que a superstição do povo, seduzido pelo clero, era incrível.
Sabia Stanton que estas informações eram falsas, mas resolveu ir a Roma, a capital do cristianismo. Ajoelhado na basílica de São Pedro, começou a ver a verdade do catolicismo, e por fim teve uma audiência no palácio do papa.
Admitido à presença de Bento XV, sentiu-se profundamente comovido. Escreve: “Quando peguei na mão do papa e beijei seu anel, compreendi que este episódio era o auge de minha visita a Roma e talvez de toda a minha vida. Representante ou não de Deus, em todo caso lá estava diante de mim o homem de maior influência do mundo”.
Voltando a casa, ocupava-se continuamente com a grande questão: onde achar o verdadeiro cristianismo.
Mas todos os seus estudos não podiam conduzir à verdadeira fé; faltava-lhe ainda a graça, e fé é o dom de de Deus. Esta graça afinal recebeu-a o ministro metodista, pelo que se apressou a dar sua demissão de pastor.
Instruído por um padre jesuíta, em Junho de 1921, confessou-se e recebeu a primeira comunhão.
Escreve ainda: “Quanto a meu futuro e meio de subsistência, disto não me lembrava; mas sacrifiquei tudo para possuir a verdade; devia obedecer a Deus.
Agora não posso fazer mais nada do que pedir a graça de ficar fiel à fé católica no meio das maiores dificuldades que talvez me esperam”.

VII. O exemplo do pastor Campos
Não devo deixar de relembrar aos amigos batistas a abjuração de um de seus pastores mais inteligentes, mais zelosos e de uma vida exemplar, o pastor Campos.
O senhor Campos era um homem sincero, pastor por convicção e espírito religioso, procurando lealmente a verdade, e encontrando esta verdade na Igreja católica, que ele adotou, e na qual persevera, há já uns 25 anos, sendo hoje um ardoroso propagandista da boa imprensa e um católico fervoroso.
Recolhemos apenas uns trechos de uma brochura que ele publicou depois de sua abjuração; há nesta brochura passagens que mostram a bela alma do senhor Campos, e ao mesmo tempo o erro e o ódio protestante.
“O dia mais feliz da minha vida é, inquestionavelmente, o da abjuração que fiz dos erros do protestantismo. Nenhum dos atos importantes de minha existência foi realizado com mais ponderação, convicção e tranquilidade. Mesmo, calculando toda a guerra que ia sofrer, a luta porfiada que esta resolução ia causar, a perda de amigos de muitos anos e de interesses encadeados, e até, como aconteceu, ódio da família e a separação da esposa fiel e estimada, só porque eram luteranos, não diminuiu a alegria, o gozo, a felicidade íntima, que usufruí em tão soleníssimo momento.
“Sabem todos que me conhecem que uma série de acontecimentos providenciais me predispôs ao abandono do protestantismo, após alguns lustros de militança nele. Era de esperar que eu (como a quase totalidade dos protestantes desiludidos), caísse no desespero da incredulidade, perdida a confiança nos homens e nas doutrinas versáteis; mas, não!
“A Providência guiou meus passos. Aconselhou-me a deixar o meu rebanho batista da cidade de Campos, e a vir a São Paulo, em propaganda do meu Diário Evangélico, então nascente. Foi isto em Setembro de 1903. Chegado ao esta cidade, soube que um sacerdote combatia os erros do protestantismo em fulminantes conferências feitas na matriz de Santa Cecília.
“Fui lá, ouvi-o e fiquei fulminado. Vim a São Paulo procurar elementos para minha campanha tenaz contra a Igreja de Deus, e caí, assombrado, neste verdadeiro caminho de Damasco. A palavra eloquente, convincente, irrespondível do notável tribuno, Dr. João Gualberto do Amaral, foi o clarão fulminante que me atirou por “terra.
“— Que devo fazer? — perguntava a mim mesmo, na escadaria do majestoso templo e a ouvir os comentários da multidão.
É certo que os chefes protestantes, por flagrante insinceridade, já haviam desde anos causado profundos golpes de dúvida em meu espírito. Mas o protestantismo me sorria ainda como sistema aceitável...
“Era em Novembro. Mal cheguei, oficiei à congregação de que era pastor, declinando o cargo e declarando que não era mais protestante, ofício também comunicado aos diários de Campos, que deles se ocuparam como de um fato notável.
“Um mês depois, a 14 de Dezembro, após um retiro espiritual, depositava aos pés do altar da Imaculada, na capela da Congregação Mariana, a minha resolvida abjuração”.

VIII. William Orchard
Quem é ele? É um dos mais considerados catedráticos da célebre universidade de Oxford, talvez a figura de mais alto relevo da “alta igreja” anglicana.
O que lhe aconteceu? — Ele no-lo vai dizer; escutemo-lo, que vale bem a pena, “Eu sentia, diz o eminente professor, que a minha teoria espiritual nem me dava satisfação à razão, nem era fundamento para as esperanças da redenção social que eu ambicionava. Insensivelmente a Igreja romana revelou-se-me, pela sua história e constituição, como a única garantia séria da doutrina autêntica a respeito da doutrina de Cristo. É só a Igreja romana que continua sem cessar a desenvolver com lógica essa doutrina, a exprimir os seus corolários que salvaguardam a fé e a conciliam com o progresso das exigências humanas.
“Só a Igreja romana possui um programa definido e dispõe de uma organização central em ordem e um apostolado mundial, capaz de apresentar à humanidade a fé como uma revelação — a humanidade hoje cruelmente dividida por tantas lutas sociais e políticas. De há muito eu me convencera de que o pontificado não só constituía a única realização da promessa de Cristo, de construir a sua Igreja sobre uma pedra, mas que essa própria pedra é o rochedo inabalável ao qual tem de se apegar toda a esperança humana de paz entre as nações, e de política social, se ela não quer se afogar no naufrágio sob as violentas tempestades que assolam o mundo moderno. A Igreja verdadeira tinha de ser a que mantinha a unidade da doutrina de Cristo; mas a mantinha visivelmente.
“Esta Igreja, de unidade universal e visível, concluí, deve ser aquela que se possa identificar, sem sombra de dúvida, com o ministério dos apóstolos. Só o era a católica, apostólica, romana. Os meus últimos passos dei-os, pois, menos por sentimento do que pela necessidade de cumprir um dever de inteligência. Não apenas para encontrar o que correspondia exteriormente ao meu desejo de amar a Cristo, mas para me unir á Igreja visível como quem executa um dever perante os seus semelhantes, sobretudo perante aqueles que ainda permanecem afastados dela. Não era efetivamente o que eu tinha de melhor a fazer, como contribuição para trazer para o grêmio da Igreja as ovelhas que andam transviadas?
“Hoje penso que pratiquei um ato de amor para com a humanidade, mostrando-lhe, com o meu passo, que só na Igreja de Roma ela pode encontrar a realização dos grandes sonhos que atormentam o coração do homem.
“Estes sonhos não foram nunca tão fervorosos como na nossa época. Mas também nunca foram mais próprios para enganar, para desorientar e desesperar, se “não têm por base a fé divinamente revelada e não procuram o centro na pedra da Igreja visível de Cristo”.

IX. Confissão de Lutero
Rematemos estas confissões dos convertidos pela confissão do próprio Lutero. Escreve Lutero sobre as consequências de suas pregação, com a qual pretendia reformar o mundo cristão: “Os povos espantam-se quando veem que tudo outrora era calmo e tranquilo; a paz reinava por toda parte, ao passo que hoje está tudo cheio de seitas e facções, que faz dó... Devo confessar que a minha doutrina produziu muitos escândalos; sim, não posso negá-lo: estas coisas muitas vezes me causam terror, principalmente quando me diz a consciência que despedacei o passado da Igreja, tranquila e pacífica sob o papado.
“Os homens são hoje mais vingativos, mais avaros e sem misericórdia, menos modestos e mais incorrigíveis, piores, enfim, do que no tempo do papado.
“Coisa escandalosa! Desde que a pura doutrina do evangelho foi posta em luz, o mundo vai diariamente de mal a pior. Nós pretendemos mostrar que somos evangélicos, celebrando a comunhão debaixo das duas espécies, quebrando as imagens, saturando-nos de carne, abstendo-nos de jejuar, de orar, etc.; quanto à fé e à caridade, pouco nos importa. A malícia dos homens em pouco tempo tem chegado entre nós a um tal ponto, que não possa ainda o mundo durar cinco ou seis anos... É uma experiência incontestável: nós outros, pregadores, somos agora mais preguiçosos, mais descuidados do que outrora nas trevas da ignorância papista.
“Quanto mais estamos seguros da liberdade adquirida por Cristo, mais somos tíbios e indolentes em observar o ensino e a oração, em praticar o bem e suportar as injúrias.
“Ai! acreditei em tudo o que diziam o papa e os monges: presentemente não posso mais crer o que disse Jesus Cristo, que, entretanto, não mente”.
Foi persuasão geral dos povos que as religiões são mais puras e limpas quando mais próximas à suas nascentes. Se julgarmos o protestantismo por este critério, não pode merecer conceito favorável uma religião, que, ainda fresca do sopro da revolução, que lhe insuflou a vida, fez a sua entrada no mundo já impura e corrupta, como as paixões ignóbeis que lhe serviam de berço. Esta corrupção assombrosa, que mancha de lodo e sangue o alvorecer do protestantismo, evidencia deste modo sua descendência terrena e vil e, portanto, sua falsidade.

X. Mais conversões
Conversões na Inglaterra em 1983. — O “Official Catholic Directory” da Inglaterra para 1934 conta que o número dos convertidos recebidos na Igreja em 1933 era de 12.288, i. é, 126 mais do que no ano precedente; entre eles muitos de destaque, ministros de diferentes seitas portestantes, como o rev. Thomas Whitton, ministro anglicano por 31 anos; rev. Harold Cheesman, ex-vigário anglicano de Collaton, Paington; rev. William Forre Stead, capelão do Worcester College, em Oxford; rev. W. V. Thomas, ex-vigário anglicano de Santa Agnes, Cardiff; Miss Bidwell, filha do bispo anglicano Bidwell, em Kent; e sra. Catarina Beryl Gallagher, irmã do Lord Inchiquin; o vice-almirante Robert Hornell e muitos outros.
Contam-se por milhares as pessoas que todos os anos se convertem para a Igreja católica. Em Junho do ano passado converteu-se o pastor protestante Dr. Orchard com outros 18 colegas.
Nos Estados Unidos, converteu-se o pastor episcopal Dr. Booyar Campbell, que se enojou das resoluções duma conferência de sábios (?) que falavam em favor da restrição da natalidade.
O capelão militar anglicano de Oxford, que durante a guerra acompanhou o exército americano, e conhecido escritor, passou para a Igreja católica.
Igualmente o missionário anglicano, em Bombay, na Índia inglesa.
Numa aldeia da Nigéria Ocidental, não menos de 190 negros protestantes foram recebidos no seio da Igreja católica.
Cinquenta ministros anglicanos publicaram uma declaração, dizendo que o único meio para os protestantes saírem do atual caos eclesiástico é a união com a Santa, Sé, em Roma. Um jornal batista, referindo-se a esta declaração, trata esses ministros de “judas” da igreja anglicana, como se fosse uma traição reconhecer a verdade. Este mesmo jornal afirma que estas conversões se fazem por interesse mercenário; ao qual responde um jornal alemão protestante: “Não se pode duvidar que a passagem para a Igreja católica, quase sem exceção alguma, é fundada em motivos religiosos. Isto, porém, não se dá quando um católico se torna protestante, e tais conversões não lucram para o protestantismo; pode ser um lucro de número, mas não de valor”.
600 pastores evangélico alemães pediram admissão no clero católico. — Berlim. Soube-se, de fontes habitualmente bem informadas, que 600 pastores evangélicos dirigiram uma petição à Santa Sé, solicitando admissão no clero católico romano, expondo pormenorizadamente os motivos que os levam a proceder dessa forma.
Pertencem todos à ala da oposição da igreja evangélica, hoje organizada em todo o país.
No dia 2 de Março converteu-se e foi batizado na capela dos salesianos, em Nápoles, o capitão Etton Home, da esquadra inglesa das Índias.
Falando sobre o processo de sua conversão, disse que o protestantismo leva fatalmente primeiro à indiferença e depois ao ateísmo e que ele durante trinta anos fora quase ateu, conseguindo, só após muitas lutas e ajudado pelos exemplos e conselhos de bons católicos, sair destes estado de alma e achar a verdade na Igreja católica. — Sempre a mesma experiência! o protestantismo, religião falsa, não pode tornar o homem melhor, antes torna-o indiferente e descrente, pelo que, os protestantes sinceros e de boa vontade sempre se sentem mal, até encontrarem a verdade na Igreja católica.

XI. Conclusão
Terminemos com esta conclusão tão simples quão lógica, certa e prática. Jesus Cristo fundou e instituiu uma só religião. Isto é um fato histórico admitido por todos, católicos e protestantes.
Todos admitem também que Jesus Cristo estabeleceu uma só Igreja, pois todas as vezes que a ela se refere, fala no singular. Ele diz: “Ouvi a Igreja”, e não as igrejas; “sobre esta pedra edificarei minha Igreja”, e não minhas igrejas. Compara sua Igreja a um rebanho com um pastor; a um reino com um monarca, e uma forma de governo, a um código de leis. Esta Igreja de Cristo é a congregação de todos os fiéis que, sendo batizados, creem e professam a mesma fé, recebem os mesmos sacramentos, adoram a Deus com o mesmo sacrifício e são governados por seus legítimos pastores sob um chefe visível — o papa.
Ora, há várias denominações sectárias pretendendo ser a verdadeira Igreja de Jesus Cristo. Verdade que só uma o pode ser, e é a que ele mesmo estabeleceu no ano 33. Qualquer outra igreja, que não tenha existido 1933 anos, não é a Igreja que Cristo, o Filho de Deus, fundou antes de deixar o mundo para ir para seu Pai.
Há uma Igreja (prova-o a história) que existiu durante este tempo. Só a Igreja católica existiu 1936 anos.
Só ela é a obra de Deus; todas as outras igrejas são de data recente, e são moralmente invenções humanas.
Nunca houve uma igreja protestante ou luterana antes de Martinho Lutero, no século XVI. Nunca houve uma igreja episcopal ou anglicana antes de Henrique VIII. Nunca houve uma igreja presbiteriana antes de João Knox. Nunca houve uma igreja metodista antes de João Wesley. Nunca houve quáqueres antes de Jorge Fox. Não houve também uma igreja anabatista ou batista antes de Nicolau Stork.
Estes homens não tinham mais direito de fundar uma igreja do que os nossos caros leitores ou qualquer outra pessoa.
A religião deve vir de Deus. Somente a Igreja católica tem um fundador divino.
Cristo prometeu, com juramento solene, que sua Igreja permaneceria e permanecerá até à consumaçon dos séculos. E a Igreja católica tem permanecido firme, apesar de todas as perseguições e oposições.
Os falsos profetas com suas igrejas vieram e desapareceram, porque tudo o que é humano é condenado a se acabar.
A verdade é esta, caro batista. O senhor nem acredita em suas próprias fanfarronadas; é protestante como meio de vida, como outro é mecânico, marceneiro ou ferreiro. É um ganha-pão.
A estas fanfarronadas, talvez que a melhor resposta seria aquela que o cardeal Newman, convertido do protestantismo, deu a um de seus amigos ainda protestante.
Este lhe disse: “Estou convencido da divindade da Igreja católica; mas não me posso resolver a tornar-me católico”. Newman sabia de tudo, e tomando um papel, escreve a palavra “Deus”. E mostrando-o a seu amigo, lhe perguntou: “Que lês tu?” Respondeu o outro: “Deus”.
Newman tomou então uma moeda de ouro, e a colocou sobre a palavra escrita. “Que lês agora?” perguntou-lhe.
O homem ficou envergonhado, pois que compreendeu por que lhe faltava a coragem de converter-se para o catolicismo. Quantos há que têm medo de perder alguma vantagem terrestre e por isso deixam de servir a Deus!

 

Terceiro anjo das trevas:

A MAÇONARIA

1) A maçonaria moderna.
2) A palhaçada maçônica.
3) Maçonaria e Rotarismo,


OITAVO LAMPEJO A maçonaria moderna
Pode um católico ser maçon?


Mais uma consulta, e uma consulta cuja solução é capaz de sacudir os chifres de Satanás e de sua coorte, Pouco importa: a verdade está acima de tudo, e não teme nem os satanases do outro nem deste mundo, porque a verdade é de Deus, é o próprio Deus: Ego sum veritas (Jo 14,6).

I. Consulta e resposta
Um católico escreve: Sr. Padre Júlio Maria. Sou católico, apostólico, romano; como tal entrei neste mundo, como tal pretendo dele sair; porém acontece que um amigo me convida, há um ano já, para eu entrar na maçonaria, aduzindo que é uma sociedade de beneficência, e que posso ser perfeitamente bom católico e maçon.
Peço ao senhor indicar-me o que há nisso de verdade.
Antes de tudo, sou católico; podendo aliar os meus deveres de católico aos compromissos da maçonaria, aceitarei o convite; não o podendo, rejeitá-lo-ei, sem hesitação.
Queira elucidar esta questão, e dizer-me com a sua conhecida competência e clareza o que há a este respeito, e qual é a doutrina da Igreja. Agradecendo a resposta, peço a V. Revma. aceitar os meus respeitosos sentimentos. - P. N.

Eis o que é falado para ser compreendido. A franqueza, à lealdade, a sinceridade e a docilidade do meu digno consulente elevam-no bem alto, no conceito do leitor; tanta grandeza d'alma merece uma resposta clara e positiva. Quero dá-la. A questão é de uma atualidade palpitante, sendo, além disso, de uma necessidade absoluta, no caos de calúnias e mentiras que os inimigos da religião espalham em toda parte.
Procurarei satisfazer plenamente o amigo, mostrando-lhe claramente o que é a maçonaria, donde ela vem, o que ela pretende, e quais os meios que ela emprega para conseguir o seu fim.
Depois destas considerações rigorosamente certas, o amigo tirará, ele mesmo, a conclusão, conforme os ditames de uma consciência reta e esclarecida.


II. O que é a maçonaria
A melhor definição é a de nosso Senhor: Falsos profetas, que vêm a vós, com vestidos de ovelhas e por dentro são lobos rapaces. — Pelos seus frutos os conhecereis: porventura colhem-se uvas dos espinhos? (Mt 7,15).
É a melhor definição. Mas não basta definir. Procuremos conhecer-lhes a história misteriosa.
Donde vem a tal maçonaria? maçon, franco-maçon, pedreiro livre, como o seu nome indica, era no princípio uma vulgar associação de pedreiros (maçons, em francês). Tal associação foi fundada na idade média entre pedreiros, ocupados nas grandes obras arquitetônicas daqueles tempos.
Havia aprendizes, oficiais, mestres. Mais tarde, com a sucessiva decadência da arquitetura, tornaram-se essas associações mais ou menos supérfluas. Por isso os pedreiros-livres abandonaram o seu fim primitivo, pondo a mira em objetivos diversos. A princípio, os mações nada tinham de hostil ao cristianismo, nem à Igreja católica.
No ano de 1717 operou-se, porém, uma mudança radical no seio da antiga maçonaria: quatro lojas se fundiram numa só, elaborando estatutos novos e adotando ritos especiais. Os ministros protestantes Teófilo Desagulier e James Anderson, mais o arqueólogo George Taine, escolheram para o cargo de grão-mestre um tal sr. Antônio Sayer; deu-se isto em Londres, aos 24 de Junho do referido ano, razão por que este dia (festa de São João Batista) é geralmente considerado como data de fundação da maçonaria moderna.

III. Sua base religiosa
A base filosófico-religiosa desta loja era o deísmo, sistema que reconhece e cultua um supremo Arquiteto do universo. Nega, porém, qualquer intervenção divina no governo do mundo, e rejeita os dogmas revelados. Nos seus primórdios, portanto, a atual maçonaria não se declarou ateia, mas, sim, anticristã.
Convém não esquecer que a evolução filosófico-religiosa da maçonaria não é a mesma, em todos os países; cada nação imprimiu às suas lojas um cunho característico mais ou menos diverso do das outras semelhantes. Assim tem havido e há lojas que exigem dos seus candidatos, como condição de admissão, profissão do cristianismo, como acontecia, por exemplo, na Suécia.
O artigo 1º da constituição da maçonaria francesa, ainda em 1877, rezava assim: “A maçonaria tem por base a existência de Deus e a imortalidade da alma”. Mais tarde, porém, o Grande Oriente mandou eliminar tudo o que se referisse a Deus.
A Itália foi-lhe nas águas, ateizando também as suas lojas e declarando alto e bom som que daí por diante Deus deixava de governar o universo.
A revista maçônica berlinense “Herold”, declara sem rebuços: “O nosso inimigo é o ultramontanismo (a Igreja católica); quebrar o seu poder é o nosso fim” (5 de Dezembro de 1909, nº 45). O grão-mestre Cocg, da maçonaria belga, fez, no congresso maçônico de 1900, esta declaração: “O que é necessário é acabar com a religião, porque dela se aproveita o clero para enganar as massas populares. A guerra entre a maçonaria e a Igreja é de vida e de morte — guerra sem tréguas e sem perdas”. (Bulletin des Travaux du Suprême Conseil de Belgique, nº 51, pg. 59).

IV. Espírito anticristão
Em 1877 a maçonaria inglesa, e mais tarde a loja alpina da Suíça, como também a dos “Três Globos”, de Berlim, romperam as relações com a maçonaria francesa, pelo fato de haver esta suprimido a fórmula tradicional: “Pela glória do grande Arquiteto do universo”.
À frente do Grande Oriente Francês se acha o conselho da Ordem, composto de 33 membros, que se obrigam a não pertencer a religião alguma nem eles nem suas famílias (Gr. Oriente, 1893).
Ainda mais claramente se manifesta este espírito anticristão e anticatólico, na maçonaria italiana. Quando o ministro Deprete, grau 33, procurava resolver pacificamente a “questão romana”, entre o Vaticano e o Quirinal, a loja enviou-lhe uma nota enérgica, lembrando o juramento de obediência prestado à maçonaria, e intimando-o com o artigo 23 das leis universais das sociedades secretas, artigo que diz assim: “O maçon, investido de cargos públicos, tem a obrigação de respeitar o programa da maçonaria; e não o fazendo, comete crime de rebelião contra as ordens e decretos do Grande Oriente”.
No decorrer dos tempos, estas lutas de hostilidade à religião não têm mudado senão para pior, e esta mudança consiste em esconder melhor as tramas e planos de luta.
A maçonaria age às escondidas. Ela é fraca, no fundo, mas para dar-se ares de poder, ela recruta em todas as camadas da sociedade sócios ignorantes, unicamente para fazer número. Depois prevalece-se deste número, não querendo saber se tais sócios são ou não são maçons militantes.
É o que explica como entre nós, no Brasil católico, há maçons que, com a maior boa fé e simplicidade mais ingênua, ficam admirados quando se lhes diz que a maçonaria é uma seita perversa.
Não querem acreditá-lo, porque — dizem eles — nunca ouviram, nem viram nada, na maçonaria, que a religião condenasse.
Pode ser, porque fazem apenas número, ignorando tudo, e servindo apenas à maçonaria pela mensalidade que pagam, pela sua influência moral e o número de sua pessoa. Já é bastante: contribuem indiretamente para o mal que a maçonaria vai fazendo.

V. Espírito diabólico
A maçonaria, na Itália, atingiu o auge do ódio ao cristianismo, glorificando a Satanás como símbolo da razão e da rebelião contra Deus. A “Rivista della Massoneria Italiana” (1906, pg. 157), conferiu a Satanás o título honorífico de “o grande”, Em ocasiões solenes é cantado publicamente o hino a Satanás, composto pelo maçon Josué Carducci no qual ocorre esta estrofe:
Salute, Satana! O Ribellione!
O forza vindice della Ragione!
Isto é: Salve, Satanás, ó gênio da rebelião, ó força vingadora da razão!
Este hino diabólico foi cantado em Roma a 27 de Agosto de 1893, no “Teatro Umberto”, como também em 1893, por ocasião da inauguração do monumento ao famigerado maçon Garibaldi.
Não foi tudo: Na inauguração do monumento em honra do célebre Mazzini (22 de Junho de 1882), e na grande manifestação de Gênova (20 de Dezembro de 1883), as lojas mandaram levar pelas ruas da cidade um estandarte preto, com a figura de Satanás, cor de fogo; e os oradores afirmaram em público e raso que era intuito da sociedade plantar o pavilhão de sua majestade satânica no topo do Vaticano e em todas as igrejas da Itália. Verdade é que a maçonaria inglesa e a americana não chegaram ainda a estes excessos; e houve tempo em que as lojas sul-americanas se mostraram até certo ponto tolerantes, não faltando mesmo “irmãos” que julgavam poder congraçar o programa maçônico com o da Igreja católica.
Compreende-se essa singular tendência sincretista, quando se considera que a maçonaria é uma sociedade secreta, que não revela os segredos mais íntimos a qualquer dos seus membros. Não são poucos entre nós os maçons que se dizem cristãos e até católicos, devido à circunstância de não terem conhecimento exato de uma “última palavra” da seita. O maçon de verdade, inteirado dos fins característicos da sociedade, considera a ideia de “maçon-católico” tão absurda e impossível como o conceito de um “círculo quadrado”. Um conceito exclui o outro.
Desde os fins do século passado, a maçonaria sul-americana estreitou relações mais íntimas com as lojas da Europa; atualmente todas as lojas daqui se acham aliadas ao Grande Oriente de Paris, que as mantém em dia com o movimento e as aspirações da seita, por meio do “Bureau da maçonaria internacional”, cujo objetivo é a república mundial ateia (Congresso, 1900, 31 de Agosto até 2 de Setembro).
Em 1905, interrogado sobre as relações da maçonaria com o catolicismo, o Grande Oriente deu a seguinte resposta, que trasladamos em tradução textual: “O maçon não pode ser católico, nem o católico pode ser maçon: a incompatibilidade é radical”.
“O maçon tem até a imperiosa necessidade de combater a Igreja católica, o maior óbice aos fins da maçonaria”, (1995, Março, ano 40, nº 3, pág. 172).

VI. Os segredos maçônicos
A maçonaria é uma sociedade secreta. Disso fazem fé o seu ritual, o aprendiz maçon e outros livros adotados. E qual é este segredo? O segredo é de ser o maçon um instrumento entre as mãos de seus chefes, para fazer o que eles mandem fazer, sem revoltar-se, sem reagir, sem falar, sob ameaça da pena de morte.
A maçonaria é uma associação, cujo fim é fazer o mal, e proteger os malfeitores. O que é bom não teme a luz do dia; o que é ruim e perverso esconde-se o mais possível. A maçonaria esconde-se porque é perversa; ela exige o sigilo mais rigoroso sobre todos os seus manejos, para poder fazer o mal e não ser descoberta.
Tudo isso é absolutamente certo. Por que estes juramentos horríveis, que arrepiam, pronunciados por seus adeptos? Para assegurar-lhe a impunidade. Não será sem interesse este juramento diabólico que é exigido dos sócios. Leiam bem esta solene e diabólica obrigação, que é extraída textualmente do ritual, oficialmente adotado pelo Grão Oriente do Brasil:
Juramento: Eu F... juro e prometo, de minha livre vontade, pela minha e honra e pela minha fé, em presença do supremo Arquiteto do universo, que é Deus, e perante esta assembleia de maçons, solene e sinceramente, nunca revelar qualquer dos mistérios da maçonaria, que me vão ser confiados, senão a um bom e legítimo irmão, ou em loja regularmente constituída; nunca os escrever, gravar, traçar, imprimir ou empregar outros meios pelos quais possa divulgá-los. Juro mais ajudar e defender os meus irmãos em tudo que puder e for necessário, e reconhecer como única potência legal e legítima no Brasil o Grão Oriente e Supremo Conselho do Brasil, ao qual prestarei inteira obediência. Se violar este juramento, seja-me arrancada a língua, o pescoço cortado e meu corpo enterrado nas areias do mar, onde o fluxo e o refluxo me mergulhem em perpétuo esquecimento, sendo declarado sacrílego para com Deus e desonrado para com os homens. Amém.
Eis uma fórmula de juramento diabólico, que só pode exprimir e esconder coisas diabólicas. Um tal juramento é sem valor perante a consciência, porque é contra a natureza, a dignidade, a fé e o bom senso.
E por que tantas blasfêmias? Será para fazer o bem?
Nunca!... Podemos esconder o bem que fazemos, mas sem juramentos e blasfêmias. Só pode ser para fazer o mal.
O maçon deve esconder aos seus pais, à sua esposa, aos seus filhos, aos seus amigos, o que perpetra nestes antros tenebrosos, onde se combinam o assassínio, o envenenamento, o roubo, a desonra, a desgraça, a perda dos lares e das nações. Tudo isto deve ficar secreto, por que é horrível, é abjeto.
De tal juramento pode-se concluir, sem maior exame, que a maçonaria é uma sociedade abjeta, imunda, nojenta, para qualquer pessoa de brio e de dignidade.
Pode haver maçons ignorantes e tolos, porém pertencem a uma associação nefanda, abjeta, que só merece a repulsa.
Meditem sobre este juramento as pessoas sensatas e digam-me se é digno de um homem entregar-se, de mãos, pés e língua ligados, a chefes que nem conhece, a segredos que ignora, a tomar compromissos que a consciência e a honra repelem?
Hão de obedecer, custe o que custar. A maçonaria pode dar-lhes a ordem de assassinar a própria esposa, de apunhalar os próprios filhos, e o maçon, feito um miserável escravo, é obrigado a obedecer. É a escravidão... é a abjeção, é a degradação da raça humana.
Pobres maçons, abri os olhos!... E vós, homens livres, quebrai as algemas infames com que vos querem acorrentar!


VII. A maçonaria brasileira
Há quem diga que a maçonaria brasileira não é hostil ao cristianismo e à Igreja católica. Vejamos o que dizem os documentos oficiais: O congresso maçônico rio-grandense de 22 até 26 de Junho de 1902 diz, entre outras coisas: “A maçonaria tratará de combater o clericalismo no Estado, negando aos padres recursos de qualquer natureza. — A maçonaria tratará de demonstrar que a Igreja católica, apostólica, romana, não é a executora dos princípios do cristianismo”. Que tal?
Entre as teses votadas pelo congresso maçônico brasileiro do Lavradio em 1909, encontram-se os seguintes dispositivos: “A maçonaria se empenhará para que seja supressa a legação junto à Santa Sé; que se torne obrigatória a precedência do casamento civil; que se decrete o divórcio a vínculo; que se negue a competência especial aos representantes das religiões para a catequese e civilização dos selvagens; que seja condenada como contrária à moral, retrógrada e anti-social, a existência de corporações religiosas que segregam seres humanos da sociedade e da família”.
São essas as piedosas aspirações da cristianíssima maçonaria brasileira. Quem quiser crer, consulte os arquivos do referido congresso, ou outros semelhantes.
Pergunto se pode dizer-se cristão ou até católico o homem que nega a eficácia do batismo; que advoga a calamidade moral e social do divórcio; que não conhece a Igreja católica fundada por nosso Senhor; que invectiva contra o papa; que diz mal das Ordens e Congregações Religiosas, que constituem a fina flor da perfeição evangélica?...
Pergunto se é cristão o maçon que recusa o batismo? se pode chamar-se católico quem não reconhece a Igreja católica, como fundada por nosso Senhor Jesus Cristo?

VIII. A Igreja e a maçonaria
Tudo o que acabamos de dizer são argumentos humanos, capazes de esclarecer um homem de boa vontade; mas temos mais que isso: temos um argumento divino.
Este argumento é a decisão da autoridade suprema da Igreja. Roma locuta est, quaestio finita est, dizia Santo Ambrósio: Roma falou, a questão está resolvida. A maçonaria é uma sociedade condenada e até excomungada pela Igreja. Não é de hoje que a Igreja católica é contrária à maçonaria. Condenaram-na os seguintes papas:
Clemente XII, na constituição “In eminenti”, de 28 de Abril de 1758.
Bento XIV, na constituição “Providas”, de 18 de Maio de 1751.
Leão XII, na constituição “Quo graviora”, de 13 de Março de 1825.
Pio VIII, na encíclica “Tradit”, de 24 de Maio de 1829,
Pio IX, na constituição “Apostolicae Sedis”, de 12 de Outubro de 1869.
Leão XIII, na constituição “Humanum genus”, de 20 de Abril de 1884.
Finalmente, Bento XV, no Código do Direito Canônico. Pelas disposições do código, cânon 2.335, todos aqueles que se inscreverem na maçonaria incorrem na pena de excomunhão, reservada à Santa Sé.
Os vigários não podem fazer encomendação e ofícios fúnebres em favor dos maçons notórios, a não ser que tenham dado sinais de arrependimento antes da morte (cânon 1.240, 8 1 1º).
Os clérigos são proibidos de fazer a encomendação religiosa de cadáveres que são conduzidos com emblemas maçônicos (S. Penitenciaria, 20 de Março de 1885).
Não se pode permitir o comparecimento oficial de maçons a qualquer ato religioso, nem pode o clero celebrar missas ou ofícios religiosos a convite da maçonaria (S. C. S. Officii “ad Ordinarios Brasiliae”, 5 de Julho de 1875).
Não se pode admitir maçons notórios para padrinhos de batismo ou de crisma (S. C. S. O. 5 de Julho de 1878; Código, cânon 766, 2º e 769).
Não se pode admitir maçons ao sacramento do matrimônio com as solenidades católicas (S. C. do S. O,, já. citada, e Cons. Plen, A. Lat. n. 175).
Não se pode receber validamente em associações católicas pessoas filiadas à maçonaria (Código, cânon 693).
Pecam gravemente as pessoas que tomam parte em festas e bailes maçônicos ou promovidos pela maçonaria (S. C. de Prop. Fide, de 15 de Julho de 1876).
Alerta, pois, católicos! Zelemos pela nossa crença, fazendo a contrapropaganda maçônica. Sejamos católicos até à morte. Detestemos a maçonaria, que pretende colocar o seu domínio acima do próprio Deus e da sua santa Igreja.

IX. A consciência e a maçonaria
Depois destes pontos elucidativos, perguntemo-nos, com sinceridade, se um católico pode ser maçon, e se um maçon pode ser católico. As respostas já estão dadas; resumamo-las para melhor gravá-la na mente.
Há alguns anos que monsenhor Ketteler, bispo de Mogunça, um dos mais sábios prelados da Alemanha, espírito vasto, foi levado a esta questão sobre que publicou um trabalho seu, com o título: Pode um católico ser franco-maçon? A sua resposta fá-la-ei minha, e após o breve estudo que precede, respondo: não, não, um católico não pode ser maçon!
E por quê? Porque a maçonaria é inimiga irreconciliável do catolicismo.
Vamos adiante, e pergunto: Pode um homem sério ser maçon? Não, é impossível, porque a maçonaria é perversa em seu fim e em seus meios. A incompatibilidade é tão radical e tão flagrante que a própria maçonaria confessa o antagonismo.
Eis o que diz o boletim do Grande Oriente do Brasil, de Março de 1915, pág. 172: “O maçon pode ser católico romano? O católico romano pode ser maçon?” — Não pode: a incompatibilidade é radical. Não; o maçon não pode ser católico, nem o católico pode ser maçon. Este tem até imperiosa necessidade de combater a Igreja católica, o maior óbice aos fins da maçonaria. Não; o católico romano não pode ser maçon, nem o maçon pode ser católico... Admitir o contrário seria glorificar Jânus, o deus que era bifronte, mas que, apesar disso, não tinha dois corações para vibração acorde de sentimentos opostos. Por nós ou contra nós. Ou católico ou maçon”. Eis o que é claro e dispensa comentários. Ou Deus ou o demo. Ou a Igreja ou a loja. Ou o Cristo ou o bode preto. Ou o céu ou o inferno.
Não podeis servir a dois senhores, disse o divino Mestre. Aqui, no caso, estes dois senhores excluem-se completamente, e não podem ter o mínimo contacto. O católico deve ser o amigo de Deus. O maçon é inimigo de Deus.
A sociedade rejeita a maldita seita da maçonaria, a Igreja a excomunga; a nossa consciência deve, pois, desprezá-la, fugir dela e combatê-la.

X. A maçonaria e o clero
Até há pouco tempo, esforçava-se a maçonaria no Brasil por se mostrar uma instituição de todo desinteressada pelo problema religioso. Acolhia no grêmio secreto adeptos de todos os lados. A sua propaganda junto aos elementos católicos era feita, sorrateiramente, sob o disfarce de que, lá nas alfurjas, não se cogitava de perseguir o ideal sagrado de nossa fé. Quando a voz infalível da Igreja proclamava que a maçonaria é inimiga de Deus e da religião, surgiam protestos das “lojas”, classificando de intolerante a atitude das autoridades eclesiásticas.
Chegamos, felizmente, a um tempo, em que a maçonaria já não pode ocultar o seu segredo e vem a público, por meio da imprensa a seu serviço, revelar-se tal qual é, como a Igreja sempre a considerou, a organização de todas as forças do mal para combater a doutrina de nosso Senhor Jesus Cristo. Os católicos, ainda os mais ingênuos, já não podem iludir-se acerca dos seus desígnios tenebrosos.
Também em nossa terra, o grão-mestrado obedece à palavra de ordem do congresso internacional de Paris, que determina: “Não basta combater a influência do clero; o que deve ser destruído é antes o instrumento de que o clero se serve para subjugar as massas, — é a própria religião”.
Por que a maçonaria, nesta terra de crentes, cujas tradições são as mais vivas e arraigadas, desmascara-se e vem, pelos seus órgãos de publicidade, ameaçar os católicos de uma campanha de insultos contra os guardas do patrimônio da fé? É que a maçonaria, tomada de intensa irritação contra o governo, que promulgou o decreto de 30 de Abril de 1931, instituindo o ensino religioso facultativo nas escolas do país, não consegue dominar o seu despeito, traindo, assim, o seu ódio à fé professada desde o berço pelo povo brasileiro.
Profetiza, então, que a religião vai morrer e já agoniza... Não morreu na Rússia, onde tem sido perseguida a ferro e fogo. Ainda agora, por ocasião do Natal, foi oficialmente lamentado pelo governo de Moscou que ainda continuassem abertas inúmeras igrejas, apesar dos ingentes esforços para se estabelecer o ateísmo em toda as classes.
Uma legislação de guerra encarniçada à espiritualidade do indivíduo e da família tem conseguido afundar, na miséria moral mais nefanda, gerações inteiras de “sem-Deus”. Mesmo assim, não se pôde ainda, na república dos sovietes, extirpar o amor a Cristo nas almas que se não deixaram enlamear pela corrupção generalizada. Muitas igrejas ainda são frequentadas na pátria do bolchevismo.
No México, enquanto Calles passou para o rol dos monstros, a figurar ao lado de Nero e Diocleciano, a Igreja, que ele tentou aniquilar com martírios, apresenta a mesma pujança dos outros tempos.
As leis maçônicas de Portugal e da França, opressoras do pensamento do povo, jazem hoje no número das coisas retrógradas e arcaicas... Em Paris e em Lisboa, há as mais belas e comovedoras manifestações, por parte da juventude dos nossos dias, em favor da religião, cuja morte os pobres maçons andam a proclamar para breve...
Ainda recentemente, a ditadura do general Carmona fechava um reduto maçônico, de onde partira a inspiração de um movimento sedicioso contra as autoridades. Os chefes mais graduados da maçonaria portuguesa foram postos na fronteira, como incompatíveis com o regime da ordem no país.
Na França, o infeliz finado presidente da república, sr. Doumer, abandona as lojas, batendo o pó das sandálias, com essas verdades descoroçoantes, ditas bem alto para que todos o ouçam: “Rompi com a maçonaria, a fim de me desembaraçar de uma clientela que me desonra”. E acrescenta: “A maçonaria passou a ser, e é, um corrilho, uma casta, de onde parte a delação, o baixo regime da espionagem, do favoritismo, do internacionalismo”. É preciso notar que este presidente da república da França não era sequer católico... já se vê que têm razão os nossos pontífices da Igreja em condenar a maçonaria, como inimiga irreconciliável da religião. É forte a animosidade da seita negra contra o clero.

XI. Conclusão
Em resposta ao meu digno consulente, tenho apenas a dizer que não pode, de nenhum modo e por motivo nenhum, entrar na horrenda, maldita e criminosa seita que é a maçonaria.
E não somente não se pode entrar em suas fileiras, mas não se pode, de nenhum modo, assistir às suas reuniões, nem mesmo por mera curiosidade, nem mesmo às suas festas; não podem concorrer com dinheiro para os seus estabelecimentos de fingida caridade; não podem lecionar, muito menos pôr seus filhos em seus colégios ou escolas; não podem prestar seus serviços à seita ou às suas reuniões, como artistas ou mesmo como simples operários.
Perguntar se a Igreja tem o direito de proibir a maçonaria aos católicos, vale o mesmo que perguntar se um pai tem o direito de proibir a seu filho de entrar numa determinada casa, ou tomar parte numa certa sociedade ou reunião. Assim, a maçonaria sendo, como de fato é, condenada pela Igreja, o católico com ela não pode ter relação alguma de convivência. Querer ser, ao mesmo tempo, maçon e católico, além de não ser permitido, não é sério, não é decoroso — é absurdo.
O maçon está completamente separado da Igreja, ainda que, por sua ignorância, julgue que pode ser católico e maçon, ao mesmo tempo. Não o pode de nenhum modo; e tais católicos vivem completamente iludidos. O catolicismo é um só, e o protestantismo, espiritismo, bolchevismo, maçonismo, são seitas condenadas, perversas, em luta contra esta mesma Igreja.
Como, pois, um católico poderia ser, ao mesmo tempo, filho, inimigo e perseguidor da mesma religião? Aos adeptos da maçonaria, os católicos não devem, em hipótese alguma, dar seus filhos para afilhados. O maçon está completamente separado da Igreja, ainda que por sua ignorância julgue que pode ser católico e maçon ao mesmo tempo. Os católicos estejam, pois, alerta e não se deixem seduzir pelas insinuações dos filhos da viúva alegre.
Vamos, católicos, sejamos de Deus... longe de nós o demônio e seus sequazes!

 

NONO LAMPEJO
A palhaçada maçônica

Pode um homem sério ser maçon?
Recebi mais uma consulta, que me dá ensejo de completar a exposição feita dos fins da maçonaria, pela exposição de suas iniciações, que constituem o lado pueril, senil, ou melhor, palhaço de seus segredos.

I. A consulta
Sr. Padre Júlio Maria. Li com interesse a sua exposição doutrinal sobre a maçonaria, e, francamente, gostei muito. Há uns anos que eu tive a desgraça de entrar nesta seita; afastei-me dela, a pedido de minha virtuosa esposa, que sempre repetia que a maçonaria é uma sociedade perversa. Foi o seu pedido que me decidiu a romper completamente com esta imundície; entretanto, a minha consciência de católico estava revoltada e enojada pelas poucas reuniões a que assisti. A maçonaria, praticamente considerada, é um antro infame, onde só permanecem aqueles que precisam de proteção contra a justiça humana.
Só os criminosos de vida de negócios, exploradores sem consciência, e vendendo a honra de suas famílias e de seus filhos, podem permanecer maçons. Infelizmente, como V. Revma. disse, depois de entrarem e ficarem ligados pelos juramentos abomináveis que fazem, têm medo de recuar... e assim ficam, contra a sua convicção e consciência, por covardia e respeito humano. Mas há um lado que V, Revma. devia revelar também: o lado ritual, que é coisa mais extravagante que se possa imaginar. Uma exposição deste rito mostrará a puerilidade da seita, ou, se quiserem, a sua baixeza. Grato, pelo novo serviço que V. Revma. prestará à sociedade católica, subscrevo-me de V. Revma. R. V.
Meu digno consulente tem razão, e com satisfação correspondo ao seu desejo.
O lado doutrinal é mais para as pessoas de certa cultura intelectual, enquanto o lado ritual está ao alcance de todos, e revela admiravelmente a baixeza da seita maçônica.
Provei que um católico não pode ser maçon; quero provar agora que um homem sério, seja ele indiferente, protestante, espírita, ou ateu, não pode ser macão, porque tal seita, se é perversa em seus fins, é sumamente degradante e ridícula em suas iniciações. Nada inventarei; vou reproduzir exatamente os manuais e rituais em uso na maçonaria.
Umas breves informações são necessárias para fazer compreender os mistérios do triângulo de Hiram.

II. Dignidades ou graus maçônicos
É do domínio público que há muitos ritos macônicos: o egípcio, o escocês, o francês, o de York e os ritos azuis. Cada um destes tem três graus fundamentais: aprendizes, companheiros e mestres. Quem não é maçon denomina-se profano. Demais, cada rito tem seus altos graus e mistérios. O Grão Oriente do Brasil segue o rito escocês, que chamam de antigo e aceito, em linguagem maçônica: Rit.'. Esc.'. Ant.'. e Ac.'. Este rito é composto de 33 graus que são (Risum teneatis):
1) Aprendiz.
2) Companheiro.
3) Mestre.    
4) Mestre secreto.
5) Mestre perfeito.
6) Secretário íntimo.
7) Preboste.
8) Intendente.
9) Mestre dos nove.
10) Eleito dos quinze.
11) Cavaleiro eleito.
12) Gão mestre.
13) Real arco.
14) Grande eleito.
15) Cavaleiro do oriente.
16) Príncipe de Jerusalém.
17) Cavaleiro do ocidente.
18) Cavaleiro Rosa-Cruz.
19) Grande pontífice.
20) Mestre ad vitam.
21) Cavaleiro prussiano.
22) Príncipe do Líbano.
23) Chefe do tabernáculo.
24) Príncipe do tabernáculo.
25) Cavaleiro da serpente.
26) Príncipe de mercê.
27) Soberano comendador.
28) Cavaleiro do sol.
29) Grande escocês.
30) Cavaleiro Kadosch.
31) Grande inquisidor.
32) Soberano príncipe do segredo.
33) Soberano grande inspetor.
Lendo tais nomes estrambóticos, ridículos, sente-se logo a puerilidade ou, melhor, a senilidade da seita maçônica... Tudo isso não passa de uma peça de teatro, onde certa gente pretende representar uma peça cômica, numa cena de palhaçada.

II. Linguagem maçônica
Cada grau tem enigmas e distintivos. Tem o avental, a trolha, o malhete, o compasso, o esquadro, os cordões em arpa, com sol de ouro, e outros emblemas ridículos. Para homens que pretendem professar as teorias de igualdade, toda essa hierarquia de ninharias, de vaidades mesquinhas, são uma contradição ridícula.
Os próprios maçons, um pouco sérios, reconhecem-na, mas não deixam de respeitá-la.
Mas, vamos adiante; convém conhecer o vocabulário grotesco da seita.
Chamam-se oficinas as diferentes agremiações maçônicas: Loja é a oficina que confere os três primeiros graus. Capítulo é a oficina que confere do grau quatro até dezoito. Conselho é a oficina que confere os graus dezenove a trinta. Supremo conselho é a oficina que confere os graus trinta e um a trinta e três.
Só estas últimas, chamadas grandes oficinas, estão a par dos segredos íntimos da maçonaria.
Os dignitários das lojas são mais ou menos numerosos: O venerável; o respeitabilíssimo; o irmão sacrificador; o irmão terrível; os vigilantes; o grande esperto; o grande orador; o cobridor; o mestre de cerimônias, etc.
São estes os nomes pomposos e grotescos, que diariamente se encontram nos jornais maçônicos e narrações das sessões das lojas. Haverá mesmo gente que tome isso a sério? É uma palhaçada!
Mas a peça de teatro continua. Os maçons têm uma língua peculiar, para exprimir as coisas por modo diferente dos profanos.
Por exemplo: O orador maçon, na loja, não pronuncia um discurso: isso é comum demais; — ele compõe uma peça de arquitetura. Num banquete, o maçon não come, mastiga. O copo do maçon chama-se canhão.
O prato chama-se telha. A faca vira uma espada. Encher os copos é carregar o canhão. Interromper a sessão é dormitar. Uma circular maçônica é uma prancha.
Um relatório é um traçado. Os aplausos são baterias.
Os banquetes são os trabalhos de mesa.
E a gente séria deve necessariamente completar este vocabulário, dizendo que um maçon é um palhaço ou então um desequilibrado, ao nível dos vulgares cangerês, pagés, histéricos ou loucos do espiritismo.

IV. Será sério tudo isso?
É sério tudo isso?... e pode um homem sério e sensato sujeitar-se a tal acrobacia senil, pueril e ridícula? É possível que homens sérios, pais de família, negociantes honrados, advogados, magistrados, médicos, homens de letras, de ciência e de responsabilidade, se sujeitem, sem pestanejar, a empregar tais termos, que só podem convir a brincadeiras de crianças, ou a jogos de molequinhos?
As cerimônias, sinais, marchas, contramarchas, honras fúnebres, trabalhos de mesa, baterias, tudo se acha regulado pelos rituais maçônicos, com minuciosidade, e exige um verdadeiro estudo por parte dos iniciados.
E se fosse ainda um estudo científico, mas é um estudo para perder a gravidade e o sério de um homem educado, para tornar-se um verdadeiro palhaço de circo, que procura termos e expressões para não chamar os objetos e as coisas pelos nomes que lhes são próprios... Não é isso uma palhaçada?
Homens de sociedade e de responsabilidade que se ufanam, talvez, de não acreditarem, nem na religião, nem na moral, nem na vida futura, nem nos sacramentos ou cerimônias da Igreja católica, são obrigados a passar horas estudando os cadernos de seus graus, as prescrições de seus rituais, o falso misticismo dos seus emblemas, e tudo quanto compõe a futilidade ridícula das sessões maçônicas.
É sério isso?... ou é peça de teatro, para se divertirem uns aos outros?
Estes homens, que querem esclarecer o gênero humano, libertá-lo do que chamam superstições, têm pelo seu lado templos, altares, sacrificadores, batismo, sacramentos e mistérios, mil vezes mais complicados que os que rejeitam e reprovam. Esses homens, que não querem a voz de 20 séculos de cristianismo e de civilização... que não acreditam nem no Evangelho, nem nos sábios católicos, nem na autoridade da Igreja fundada por Jesus Cristo; estes homens escutam os ditames de homens ímpios, devassos, bolchevistas, assassinos e outros que presidem e governam a seita maçônica!...
Aceitam os seus rituais ridículos: como voz do céu, e alistam-se no seu registo criminoso, como se fosse uma honra pertencer a uma associação execrada pela voz do povo e pela voz de Deus.
Não, tudo isso não é sério! É puerilidade, é senilidade, ou é palhaçada. Prefiro adotar o último termo... e creio que ele exprime melhor a disposição da maçonaria, como instituição.
O homem sério tem as suas fraquezas, mas não deve ter baixezas. O homem sério pode esquecer-se de sua dignidade, mas nunca deve abdicá-la. O homem sério pode, às vezes, perder um instante a sua cultura social, mas nunca deve fazer desta decadência uma regra de vida e de compostura.
Isso é indigno de um homem sério. E se o maçon refletir, deve compreender que faz tudo isso: cai na baixeza, abdica a sua dignidade, e faz da descompostura social uma regra de vida. Tudo isso não passa de palhaçada, de falta de educação, ou então de compreensão!
Tudo seria sumamente triste, se não fosse sumamente ridículo.

V. Os trabalhos da mesa
O trabalho da mesa é o banquete. Conforme o vocabulário já exposto, o leitor pode fazer uma ideia do que deve ser tal banquete maçônico. É impagável de grotesco e ridículo, e merece conhecido. Tudo aí obedece ao ritual, e é por isso que nas pequenas lojas do interior tais banquetes não são oferecidos aos veneráveis maçons; contentam-se em fazer os trabalhos de mesa, em casa ou na intimidade, onde podem comer à vontade, enquanto, no banquete maçônico, a gente só pode mastigar.
Nada quero dizer por mim mesmo; contento-me em copiar do ritual. Eis como descrevem os tais trabalhos da mesa os tripingados Ragon.'. e Clavel."., grandes luzeiros da seita. Escutem bem. São eles que vão falar:
“A sala onde se faz a mastigação deve, como a loja, estar coberta das vistas profanas.
O venerável diz: Irmão Vig.:. preveni os II.'.
que suspendam os trabalhos e vamos nos ocupar na mastigação.
I.:. 1º e 2º Vig.:. convidai os II.'. sob o vosso comando, que se preparem para carregar e a entrar em linha para o primeiro brinde de obrigação.
Durante o banquete, há sete brindes obrigatórios.
Quando se fazem, cessa a mastigação, os irmãos... levantam-se, põem-se em ordem, e lançam seu estandarte (guardanapo) sobre o ombro esquerdo.
Ao convite do Ven.*. os IT.'. (leiam: Venerável tripingado, os irmãos tripingados) carregam os canhões (os copos) e quando tudo está pronto, diz-lhes aquele:
— Meus irmãos, vamos fazer uma saúde...
Faremos fogo, bom fogo, o mais vivo e cintilante de todos os fogos.
— Meus irmãos! Mão direita à espada! (é a faca).
— Espada acima!
Continência de espada!
— Espada na mão esquerda!
Todas as facas se levantam e saúdam-se.
Depois deste movimento brilhante, levam a mão às armas (são os copos).
— Armas acima!
— À cara!
Os irmãos.'. chegam o copo à boca.
— Fogo!
Bebe-se parte do conteúdo.
— Bom fogo!
Bebe-se o resto.
— O mais vivo e cintilante dos fogos!
Despeja-se o copo.

VI. Os brindes maçônicos
Avante a música!. estamos em pleno teatro...
cômico... e cada maçon, de gravata e sapato de verniz, é um ator de peça teatral cômica... falta-lhe apenas a vestimenta própria dos palhaços de circo. Lembro mais uma vez que não estou inventando nada; reproduzo textualmente o ritual maçônico e as interpretações do ritual feito pelos chefes da seita. Assistamos agora à cerimônia dos brindes maçônicos. E nova palhaçada!
Para, anunciar a primeira saúde, o Ven.'. comanda assim o exército: :
— Atenção, meus II.-. mão direita às armas!
— Armas acima! À cara!
— Primeiro fogo: A saúde de...
— Segundo fogo: A saúde de ...
— Terceiro fogo: À saúde de...
Esvaziam o copo. O exercício continua:
— Irmãos.*. descansar armas!
Levam os copos ao ombro direito.
— Armas à frente! Assinalemos nossas armas!
— Um!
Levam os copos ao ombro esquerdo.
— Dois!
Levam-nos ao direito.
— Três!
Levam-nos à frente.
— Um! dois! três!
A cada um destes tempos, os maçons descem gradualmente o canhão (copo), para a mesa. Ao terceiro deixam cair o copo com bulha e simultaneamente, de modo que se ouça uma só pancada. Faz-se a mesma coisa com a espada (faca).
Eis uns textos copiados textualmente do manual do aprendiz. Tal citação não dispensa um breve comentário. Por maior seriedade que se deseje manter neste estudo, é difícil deixar de dar uma risada. E quando nos lembramos de certos maçons conhecidos, que parecem homens sérios, honestos, instruídos, colocando-os nas cenas descritas, entregando-se a verdadeiras farsas, pantomimas, não se pode deixar de experimentar um sentimento de compaixão. Que um palhaço de circo faça pantomimas, caretas e acrobacias, ninguém estranha o fato, é ofício dele. Que a mocidade, em seus prazeres e pagodeiras, faça rir pelas farsas que inventa, ninguém se escandaliza, pois a mocidade, dominada pelo ardor da vida, quer brincar e rir.
Que nos manicômios haja loucos, que se imaginam ser imperador, rei, general, ninguém fica admirado: pois é um desequilibrado. Mas que um homem sério, um homem de sociedade, de instrução, de responsabilidade, entre num destes antros maçônicos, e represente aí o papel que lhe impõe o ritual, é o cúmulo da degradação.
Um homem de pergaminho, um negociante de fortuna, um pai de família, que em público fica sério, grave, majestoso, e, na loja, representa o papel de bobo, de palhaço, de pagodeiro, de louco: é o cúmulo da baixeza.
As crianças têm as suas brincadeiras, são puerices. A velhice tem as suas manias, são senilidades. Tudo isso não lhes pode ser imputado a mal; mas um prefeito de município, um médico, um advogado, um homem de posição, que perde o equilíbrio, ao ponto de meter-se em criancices, em senilidades, ao ponto de fingir guerra na mesa, de apresentar armas com um garfo; de tirar a faca, como espada; de preparar fogo de canhão com um copo de cerveja; de apresentar o guardanapo, como bandeira, de fazer fogo, esvaziando um copo... é demais: não é simplesmente puerilidade, senilidade, é idiotismo.
E estes homens podem olhar uns para os outros, sem espoucar em gargalhadas, sem sentir o desprezo, a baixeza de tal pagodeira.
Que castigo divino! Não se sujeitam à doutrina da Igreja católica; não querem obedecer aos ministros de Deus, e obedecem, como crianças, a um palhaço que lhes impõe as cerimônias mais grotescas que a loucura pode inventar. Penso que nos manicômios a loucura dos desequilibrados não chegou ainda à degradação de tais equilibrados.
Só sendo um castigo de Deus. Pobres maçons... sois condenados a servir de palhaços, para fazer uma pagodeira, que vos rebaixa e avilta, abaixo das criaturas mais grotescas.
O palhaço ganha a vida com as suas mímicas, e vós perdeis a vossa dignidade e a vossa fé. Pobres macãos, sois dignos de lástima, mais do que de desprezo.

VII. O juramento do aprendiz
Para ser maçon, é preciso ser um idiota, um bobo ou então um louco. Um idiota, porque entra numa associação que não conhece, e jura guardar segredos que ignora ainda. Um bobo, porque executa seriamente truanices e esgares que só podem ser feitos por qualquer bufão. Um louco, porque julga ser o que não é, dá-se importância que não tem, faz cerimônias que são baixezas, e julga elevadas ações que são ridículas.
O que tenho exposto dos banquetes prova já plenamente estes títulos, dados aos maçons.
Mas vamos adiante... tudo é ridículo e deprimente nas cerimônias da seita. Parece que foram feitas para aviltar o mais possível o idiota, o bobo ou o louco que aí ingressa.
Para ser maçon, e receber a luz maçônica, é preciso uma iniciação. Como se faz a tal iniciação? Consultemos o ritual do aprendiz. Será mais um ato da comédia de teatro. Eis o que o companheiro postulante deve jurar: Juro não revelar os segredos, sinais, toques, palavras, doutrinas ou usos maçons... quando eu faltar à minha palavra, queimem-me os lábios com ferros em brasa, cortem-me a mão, arranquem-me a língua, degolem-me, e meu cadáver seja dependurado na loja durante a admissão de algum novo irmão, para que assim se imprima o ferrete de minha infidelidade e o terror dos outros; queimem depois meu cadáver, e lancem minhas cinzas ao vento.
Tal juramento é feito por alguém que de nada sabe e ignora o que lhe vai ser revelado.
Se depois o venerável tripignado der ordem ao maçon de matar os próprios pais, de assassinar a esposa, de enforcar os filhinhos, ele tem que obedecer... ou julga ser obrigado por um juramento macabro, ridículo, que só o demônio pode inventar. Tal juramento a nada obriga perante Deus e perante a consciência é certo, pois é uma horrenda blasfêmia, é um juramento canibalesco, de doido, mas o postulante, amedrontado pelas promessas feitas e pelas consequências acarretadas, não tem a coragem de quebrar as algemas em que ele mesmo meteu os punhos, e ei-lo feito criminoso, assassino, ladrão e até parricida sem o querer... pelas ordens da loja maçônica. Seria sumamente grotesco se não fosse horrivelmente macabro. E quem pronuncia tais juramentos, quem assume tais responsabilidades desconhecidas, quem se amarra deste modo as mãos, os pés, a consciência, a língua e a vida... deixa de ser homem livre... é um escravo, um vil escravo, a não ser, como já disse: que seja um idiota, um bobo ou um louco.

VII. A iniciação do aprendiz
O aprendiz está no limiar da maçonaria. Exige-se-lhe pouco, apenas que lhe cortem o pescoço, antes que revelar os segredos. O pescoço cortado: já é alguma coisa! E agora o desgraçado aprendiz passa pelas provas dos quatro elementos: a terra, o ar, a água e o fogo. É nova palhaçada grotesca e ao mesmo tempo fúnebre.
Primeiro o aprendiz entra no quarto de reflexões, lugar obscuro, alumiado por uma lâmpada sepulcral, os muros forrados de preto, e cheios de emblemas fúnebres.
É o primeiro ato da palhaçada. Já faz arrepiar os cabelos do bobo, Mas avante; é apenas o primeiro passo. Deve passar depois pelos quatro elementos.
Deve passar pela terra, em cujo seio supõe encontrar-se... Um esqueleto jaz a seu lado em um caixão aberto. Não havendo esqueleto, deverá colocar sobre a mesa uma caveira (Ritual Ragon). É-lhes fácil ter qualquer caveira das vítimas que mandaram assassinar. O aprendiz permanece aí algum tempo. Deve responder por escrito a três questões, fazendo depois o seu testamento. Vendam-lhe os olhos, e assim deve apresentar-se na loja, da cinta para cima em camisa, o braco e lado esquerdo descobertos, o joelho nu, o sapato esquerdo acalcanhado (lan. do Aprendiz).
É o segundo ato da palhaçada; a viagem pela terra.
O aprendiz deve fazer depois outras viagens simuladas pelo ar, pela água e pelo fogo. Tais viagens não passam de grotescas imaginações, com o fim de aterrorizar o aprendiz e de fechar-lhe a boca, para não revelar os crimes e baixezas que poderia presenciar.
Para a primeira viagem simulam dificuldades e obstáculos, (que não existem). O venerável grita: Salte, para atravessar um fosso que só existe na sua mioleira.
— Levante o pé direito para subir um alto. — Abaixe-se outra vez. — Suba a escada. — Passe sobre a redouca. E durante este tempo os maçons assistentes devem produzir o rumor de numerosos assistentes (que não estão) e imitar o ruído de saraiva e o trovão, exatamente como uma garrafa de Leide. (Mand. do apr. Ragon.:.).
Aqui está a purificação pelo ar. É o terceiro ato da palhaçada!
Na segunda viagem faz-se a purificação pela água; durante esta viagem o candidato só ouve um rumor surdo, e o estrépito de espadas (facas).

O esperto. :. mergulha três vezes o punho esquerdo do candidato em um vaso com água.
A terceira viagem é a prova pelo fogo e faz-se rapidamente e e em silêncio. O candidato é seguido, envolvendo-o por três vezes e com cautela, nas chamas até que chega ao seu lugar.
Apresentam então a bebida amarga e o ven.*. lhe diz com gravidade: “O profano que é recebido maçon, deixa de dispor de si; não pertence mais a si próprio.”
É o quarto ato da palhaçada.

IX. A admissão na maçonaria
É a nova palhaçada. O candidato deve prestar juramento. Até agora o candidato tinha os olhos vendados ; tiram-lhe a venda. É conduzido ao altar; colocam-lhe na mão esquerda um compasso aberto, mete a mão direita sobre a espada (faca), a perna esquerda em esquadria, e assim presta o juramento já citado.
O venerável dá-lhe o avental de pele de bode e ensina-lhe as palavras, sinais e toques.
A palavra posse é T... filho de Lamé.
A palavra ordem é: faremos tudo em esquadria. A ordem consiste em ficar em pé, a mão direita estendida debaixo da garganta, os quatro dedos unidos e o polegar desviado em ângulo reto com os outros.
O sinal gutural é retirar a mão horizontalmente e deixá-la cair perpendicularmente.
O toque faz-se, tomando simultâneamente os quatro dedos da mão direita; assentando o dedo polegar sobre a falange do índice, e por um movimento invisível, bater três pancadas no aprendiz.
Eis como os maçons recebem a luz, É o quinto ato da palhaçada.
O profano torna-se iniciado; o candidato é maçon, livre pedreiro, ou pedreiro-livre, pouco importa. É um outro homem... o homem de luz... mas da luz infernal!...

X. Conclusão
É tempo de concluir... Rir demais dá dor nas bochechas... e aqui tudo é para rir. Terminemos repetindo apenas a pergunta: Pode um homem sério entrar na maçonaria???
O leitor dará a resposta. Parece-me impossível. Submeter-se a cenas tão burlescas, tão grotescas, senis ou pueris... Consentir em tantas mímicas e caretas charlatanescas, não é de homem sério. Então homens sérios, de valor, de posição, de responsabilidades, que se ufanam de honra, de dignidade e de brio, vão prestar-se a uma comédia idiota, a gestos, palavras e passes de uma senilidade de loucos... estes homens, que se dizem condutores de homens, vão sujeitar-se a atos de comediantes, de saltimbancos, de pândegos, de boêmios, de pagodeiros que fazem rir e chorar de compaixão e de vergonha?!
Oh! é demais! Não há pessoa de bom senso que o possa admitir, nem acreditar.
Há teatros cômicos... há circos de palhaços... para divertir-se... vão assistir a estes atos... mas que homens de sociedade, homens sérios, desçam do trono de sua educação para rebaixar-se e fazer-se palhaços...
a pronunciar juramentos para perder a sua dignidade de homens livres, para tornar-se miseráveis escravos de desconhecidos, isso ultrapassa o bom senso...
É demais: Não, não, nunca, nunca! Um maçon é necessariamente um idiota, um bobo ou um louco. Pobres maçons, iludidos, levantai-vos e sacudi as algemas da escravidão, para readquirirdes a dignidade e a liberdade!
E vós, homens de bom-senso, fugi da seita vergonhosa e degradante que é a maçonaria. É uma palhaçada degradante. É uma palhaçada de demônio. É uma palhaçada perigosa.

 

DÉCIMO LAMPEJO
Maçonaria e Rotarismo

As informações sobre a maçonaria seriam incompletas se não se mencionasse uma organização que, exteriormente, se apresenta com ares e gestos amigos, para melhor ganhar a confiança, mas que interiormente é um inimigo escondido da Igreja, inimigo tanto mais perigoso, quanto mais cuidadosamente se esconde. É o Rotary-club ou rotarismo.
A mocidade de hoje vê no Rotary apenas uma sociedade recreativo, inócua, que nada tem com a religião, e até se mostra amigo da religião.
Cuidado com os lobos em pele de ovelhas! O Rotary, ainda mal conhecido, é inócuo, como o era a maçonaria, antes de tirar a máscara que encobria os seus planos.
No Brasil, o Rotary é inofensivo, por ora, porque, estando num país católico, seria o cúmulo da imprudência revelar logo o seu plano e as suas ligações.
O Rotary é mais fino; alicia, primeiro, a mocidade de todos os credos, e depois, na hora precisa, mostrará o que é, o que pretende, tal qual a maçonaria dos primeiros tempos.
Nada de ilusão! Leiam bem o que se segue aqui a respeito.

I. O que é rotarismo
O rotarismo deve ser julgado pelo fim que se propõe e pelos meios que emprega para alcançar este fim.
Ora, a sua divisa é “fazer homens bons numa sociedade boa”.
Tal divisa, à primeira vista, parece excelente; mas, examinando-a de perto, nota-se. um erro fundamental: — “Fazer homens bons é um fim ótimo; fazendo homens bons, constituiremos uma sociedade boa, sendo o primeiro a causa do segundo. Não pode haver sociedade boa, sem homens bons, pois o conjunto dos homens, que forma a sociedade, será necessariamente o que são seus componentes, os homens”.
E quais são os meios que o rotarismo emprega para alcançar este fim? Para isso, ele propõe uma moral natural, que, no melhor dos casos, não será outra coisa que o cumprimento das leis naturais, insculpidas na consciência, pela natureza. Eis o que já é uma aberração!
Mas há mais do que isso. O rotarismo declara que não se intromete no santuário da consciência, de modo que no cumprimento das leis naturais limitam-se para ele as relações sociais. Eis o que é mais grave.
O homem é um composto de um corpo e de uma alma imortal, e como tal tem deveres para com Deus, para com o próximo e para consigo.
Querer rejeitar os seus deveres para com Deus, para unicamente conservar os deveres para com a sociedade, é rejeitar a lei divina e querer estabelecer uma civilização puramente pagã. Os pagãos adotaram a mesma regra de vida: ser bom um para com o outro.
Neste caso os rotarianos rejeitam Deus e qualquer religião, de modo que não passam de ateus; substituindo Deus pela sociedade, caem no miserável panteísmo.
Fazer homens bons, sem religião, é uma utopia, é um erro fundamental. Depois do pecado original, o homem está inclinado ao mal, e não pode resistir a este mal, sem a graça divina. O querer fazê-lo bom, sem religião, não passa de uma grosseira ilusão, já desmentida pelos 19 séculos de civilização cristã, e (ainda) desmoronada pelas experiências diárias das nações e dos indivíduos.
O rotarismo peca pois pela base. O seu ideal é uma utopia. Os seus meios de realizar este ideal são outra utopia. O tal lema “Fazer homens bons numa sociedade boa”, não passa de capa ilusionista, para esconder fins grosseiros e alimentar o grande cancro da sociedade atual: o indiferentismo.
O rotarismo é pois condenável em seus meios, como é condenável no fim que pretende alcançar.

II. Origem do Rotary
O primeiro clube rotariano foi fundado a 23 de Fevereiro de 1905, em Chicago, por Paulo P. Harris, advogado naquela cidade. O segundo foi estabelecido pelo mesmo Harris, em São Francisco, em 1908. Rapidamente muitos outros clubes surgiram em diversas cidades dos Estados Unidos e do estrangeiro. Em 1910, o Rotary se constituía associação internacional, com capital de fundos limitados e de acordo com as leis do Estado de Illinois. Chesly Perry sucedeu a Harris, sendo por sua vez substituído por Artur Sapp. E depois deste, outros chefes vieram.
O emblema do Rotary, donde aliás lhe vem o nome, é uma roda dentada, de cinco raios, com as palavras: Rotary Internacional. As explicações desse emblema são várias.
Os diversos agrupamentos rotarianos têm organização autônoma, sob a chefia de um comitê diretivo inter- provincial, sendo a direção internacional em Chicago, de onde, secretamente, emanam as diretrizes gerais.
Toda ingerência política é excluída. O Rotary pretende ter missão moral e social, consistindo principalmente em “servir” a sociedade. De todos os campos da atividade humana — industrial, comercial, agrícola, intelectual, técnica, profissional — o Rotary recruta uma aristocracia, fruto da severa disciplina que preside à admissão dos membros.
O espírito dessa associação não é, de fato, senão uma dissimulação hábil do laicismo maçônico.
A pretexto de tolerância, de largueza de ideias, a filosofia rotariana põe todas as religiões em pé de igualdade. O rotariano, como tal, qualquer que seja a sua religião, deve adotar um código moral especial (Rotary Code of Ethic), que faz abstração de todas as religiões positivas e se coloca acima de todas elas. O princípio fundamental — quem serve melhor aproveita mais — é tomado do Código Maçônico: “Trabalhas por ti próprio, quando preferes tudo à utilidade do teu irmão”.
O Rotary traz do berço um vício original: fundado por um maçon, seus primeiros membros eram maçons, vários dos seus diretores são maçons. Tem, além disto, pontos de afinidade com outras instituições análogas, nascidas, neste últimos anos, da maçonaria americana, que nele vê conjunto de empresas criadas a fim de propagar, com eficácia, sob a sua inspiração, o seu ideal e os seus interesses no mundo inteiro. A Wiener Freimaurer Zeitung fornece a respeito interessantes esclarecimentos. Esta revista define tais organizações como “rebentos da maçonaria americana”, cujo fim é colocar, direta ou indiretamente, os diversos estados e classes da sociedade — jovens de ambos os sexos, homens e mulheres de todas as condições — sob a influência da maçonaria. :

III. Maçonaria e rotarismo
Esse vício de origem do Rotary se revela amplamente nas manifestações da sociedade e nas suas relações com a maçonaria. No México, o Rotary empenhou-se em ajudar, quando pôde, a obra de sectarismo e perseguição do governo de Calles, ligando-se estreitamente à “Y.M.C.A”, que, nessa infeliz nação, faz uma ativa propaganda protestante.
O irmão Robert A. Greenfield, em memória publicada sobre A Questão Religiosa no México, afirma explicitamente que a maçonaria se serve da “Y.M.C.A”, e do Rotary para combater o catolicismo, destruir todo sentimento religioso e firmar a influência pan-americana.
A revista maçônica “Alpina”, órgão da Grande Loja Suíça, anunciando uma conferência feita numa loja sobre o Rotary, confessa, com satisfação, que os clubes rotarianos contam inúmeros maçons e acrescenta: “O que, aliás, considerando-se os princípios gerais, é fácil de se compreender”.
O Boletim Oficial do Grande Oriente Espanhol dá preciosas informações sobre as cordialíssimas relações reinantes entre o Rotary e a maçonaria, na Venezuela.
A Wiener Freimaurer Zeitung, órgão da Grande Loja de Viena, diz que, em Londres, existe uma loja especial, muito florescente, reservada aos membros do Rotary (Maio 1928, pág. 20).
Em outros lugares, onde certas aproximações causariam má impressão, o Rotary é mais reservado; procura mesmo atrair ao seu seio os bons católicos, salientando, pela imprensa, atos e maneiras de deferência para com a religião. É o que se observa, principalmente, na Espanha.
Diante das graves suspeitas que, do ponto de vista católico, pesam sobre o Rotary, declarou ele, já, mais de uma vez, pela boca dos seus chefes, que é isento de ingerências maçônicas, sem lograr, entretanto, prová-lo claramente.
Juntemos a isso o que acima dissemos, isto é, que o Rotary, em conjunto, é de inspiração maçônica, Basta ler o código moral rotariano supracitado para ver como a sua concepção da vida moral está muito longe da concepção espiritualista e cristã. Tudo, nele, se reduz, pura e simplesmente, a um utilitarismo individual, mascarado por um vago ideal de humanidade. Certas máximas contidas no código rotariano são, mesmo, absolutamente falsas. A maçonaria não cessa de apregoar que é necessário substituir todas as religiões positivas pela religião da humanidade, e a moral fundada sobre a religião pela moral leiga da igualdade e da fraternidade maçônicas. Deste ponto de vista, o código rotariano tem o parentesco mais estreito com o código maçônico e com as “Declarações de Princípio” deliberadas no Congresso da Associação Maçônica Internacional em 1921.
Os fundamentos comuns não são outros senão os erros clássicos do naturalismo condenados por Leão XIII na encíclica Humanum Genus, vindo em primeiro lugar o indiferentismo religioso.
Parece, por outro lado, que o Rotary se quer aproveitar da depressão em que se encontra atualmente a maçonaria, na maior parte do continente europeu, para colocar a maçonaria anglo-saxônica nas posições perdidas pela maçonaria latina.
Conclusões:
1. O Rotary tem origens maçônicas.
2. Em muitos países marcha de braço dado com a maçonaria.
3. Em certos lugares assumiu atitudes abertamente anticatólicas.
4. A moral rotariana não é senão um disfarce da moral leiga maçônica.

IV. A moral rotariana
A moral rotariana é uma moral toda natural; em outros termos: não passa de uma moral animal. As virtudes são necessariamente o desabrochamento da moral, de modo que sobre uma moral sobrenatural desabrocham virtudes sobrenaturais, e sobre a moral natural só podem desabrochar virtudes naturais.
Eis por que, mostrando-se lógico consigo mesmo, o rotarismo só preconiza o respeito mútuo, a filantropia, a beneficência, a alfabetização, os esportes, os divertimentos, etc.
Ora, tais virtudes nada têm de virtude; são apenas costumes de respeito mútuo, ou sociabilidade; filantropia ou ações externas, que excitam a aprovação dos homens; esportes, ou distrações higiênicas, atléticas, ou sociais.
Em tudo isso não há sombra de virtude, de modo que a moral rotariana não consiste em fazer os homens intrinsecamente bons, mas apenas socialmente bons.
É um verniz que pretendem passar sobre as paredes enegrecidas do vício, da leviandade, da futilidade, para que o que a religião desaprova como indiferença, a sociedade o aprove como virtude social. É um erro, e um erro fundamental.
A moral é o fruto do dogma. Pelo dogma acreditamos o que Deus nos ensina. Pela moral fazemos o que Ele nos manda.
O rotarismo procede às avessas. Pretende formar homens felizes, libertando-os de toda crença e de toda moral, Considera a honestidade pública como o grande, o único dogma e a única moral. Ora, a honestidade pública, embora necessária, é entretanto a mínima expressão de nossos deveres. O homem não tem simplesmente deveres para com a sociedade; têm-nos sobretudo, é em primeiro lugar, para com Deus. O rotarismo não admite religião nenhuma, porque quer poder admitir em seu seio todos os homens, qualquer que seja a religião que estes professem. E para poder admiti-los, sem que haja choque de ideias, lutas internas, é preciso suprimir os embaraços. Ora, o primeiro embaraço é necessariamente aquele que provém das ideias, e entre as ideias, a mais intolerante, que se apresenta como a mais propícia a dissensões e conflitos, é a ideia religiosa.
Pretendem pois rejeitar tal ideia... O rotarismo declara-se neutro, sem religião nenhuma. Os seus membros, como rotários, são simplesmente homens, mas homens da natureza, que só têm um fim: serem bons para com a sociedade. O católico pode ser católico em sua igreja. O protestante será protestante em sua casa de oração, O espírita será espírita em sua macumba. O maçon será maçon em sua loja do triângulo. O budista será adorador de Buda em seus pagodes. Mas cada um deles, que passa a soleira do Rotary Clube, é simplesmente um homem sem ideia própria, é um rotário, um amigo da sociedade... nada mais.
No clube não há nem Cristo, nem Lutero, nem Alan Kardec, nem Hiram, nem Buda; há exclusivamente o rotário, o homem sem ideias. Ora, um homem sem ideias é um idiota. Se o rotariano realizasse o ideal de seu clube, não passaria de um idiota. Felizmente, para. ele, tal realização é impossível.
O homem conserva necessariamente as suas ideias adquiridas, de modo que se pode aplicar ao rotarismo o que um dos senadores romanos respondeu à proposta de outro senador, que propunha colocar no meio dos deuses de seu Panteão uma estátua de Jesus Cristo: Cristo não partilha o seu reino com ninguém; ele quer tudo, ou não aceita nada. Elevando-lhe uma estátua, é necessário retirar as estátuas dos outros deuses.
O rotarismo pretende excluir tudo. É impossível!
Nenhum destes homens que ali penetrarem renunciará à sua ideia religiosa. O católico, sendo sem convicção, poderá virar protestante, espírita, budista, isto sim: não renunciará, mas mudará a sua ideia religiosa, ao passo que o protestante, o espírita, o maçon far-se-ão ardorosos propagandistas de suas seitas condenadas, procurando impor as suas ideias.
Qualquer deus humano poderá reinar no rotarismo, seja até Judas, Barrabás, Caifás, Lenine, Trotsky ou outro quaiquer, mas ali não reinará o Deus divino, que é Jesus Cristo.


V. A neutralidade rotarista
O rotarismo pretende, pois, estabelecer como base de sua associação a neutralidade religiosa. Ora, tal neutralidade é absolutamente impossível. A ideia religiosa é inata no homem. Homo naturaliter christianus, dizia Tertuliano.
Alguém pode deixar de pertencer a tal ou tal religião determinada, pode adotar o erro e até o absurdo, mas tem de se inclinar para qualquer ideia religiosa.
Não sendo católico, será protestante, espírita, fetichista, se quiser; e não professando nenhuma religião, ele professará a religião da superstição. A superstição é como a religião daqueles que pretendem não ter religião.
Esses fanfarrões que se ufanam, de boca, de não acreditar, nem em Deus, nem em demônio, nunca aceitarão sentarem-se 13 a uma mesa, inciarem uma viagem no dia 13 do mês; não acreditam em Deus, dizem eles, mas acreditam numa aranha, numa coruja, numa borboleta negra, em fantasmas, em visagens, e até na palavra de qualquer feiticeiro, pagé ou curandeiro da roça.
Não! não! amigos rotarianos, a vossa pretensa neutralidade é impossível, e eis por que entre vós domina como dogma a ideia maçônica, a ideia protestante, e, como moral, a libertinagem sem freio, envolta em fórmulas atraentes de filantropia, de esportes, de diversões.
Eis o que explica como há no Rotary Clube três categorias de sócios:
1. Os católicos tolos.
2. Os gozadores da vida.
3. Os inimigos da religião católica.
Os católicos tolos se deixaram iludir por belas palavras, promessas, aparências, lá estão eles arrastados para o abismo, sem terem a coragem de reagir ou de quebrar as algemas de sua involuntária escravidão.
Os gozadores da vida encontram no Rotary um campo aberto para as suas inclinações. Ali não há religião, não há moral... logo, avante, gozemos, dizem eles, enquanto temos tempo.
Os inimigos da religião encontram no Rotary um apoio para os seus planos de luta contra a Igreja, pois num meio sem religião, ser-lhes-á fácil recrutar companheiros, a quem poderão transmitir o seu ódio, os seus desejos de vingança e de perseguição. Muitos sócios do Rotary são maçons conhecidos, enquanto outros são protestantes fanáticos.
A imprensa cita, a cada instante, gestos, palavras e escritos comprometedores da mentalidade rotária, e prova que os seus favores são sempre para os macãos ou os protestantes, e nunca para a Igreja ou as instituições católicas.

VI. A exigência católica
A neutralidade em religião é impossível, como é impossível a neutralidade de um filho a respeito de seu pai. Um filho deve a seu pai respeito e obediência e não podendo, mesmo que o queira, deixar de ser filho de seu pai, não pode deixar de tributar-lhe o respeito que lhe deve.
O católico é filho de Deus, pelo batismo, e queira ou não queira, filho ficará, na vida, na morte, e até no fundo do inferno, se perder a sua alma. É um caráter inapagável que o batismo imprime na alma do cristão.
Pelo batismo o cristão sai da ordem natural e se eleva até à ordem sobrenatural.
E uma vez constituído nesta ordem, ele não pode mais recuar. É cristão, e sê-lo-á durante toda a eternidade. O vício, a lama, a podridão podem encobrir o seu título, como o lodo pode encobrir um diamante caído no chão, mas na lama como ao ar livre o diamante existe, e brilha, embora na lama o seu brilho seja invisível ao nosso olhar.
A elevação do cristão é um dogma, e não simplesmente um fato. O cristianismo exige pois que o homem não seja simplesmente bom. Ser bom é uma necessidade de todo homem; ser bom cristão é uma necessidade para todo cristão. Ora, para ser bom cristão, deve sê-lo, não simplesmente em sua vida particular, íntima, mas em toda parte, acomodando a sua vida social como a sua vida íntima às normas da Igreja católica.
O cristão nunca pode prescindir de seu caráter de cristão, Não existe para o cristão uma bondade puramente natural, como a que pretende fazer praticar o Rotary; só existe a bondade cristã; só esta tem mérito em vida e recompensa no céu.
Toda associação que se afasta do dogma e da moral cristã, para adotar outro dogma e outra lei moral, é ilícita para o cristão e constitui um perigo para a sua fé, e uma renegação de sua crença.
As associações têm necessariamente que adotar uma das três posições a respeito da religião: 1) Positivamente em oposição a ela; 2) Declarando-se neutra; 3) Declarando-se favorável.
Na primeira posição, francamente hostis à religião, estão a maçonaria, o protestantismo, o espiritismo e o comunismo, para não falar dos outros ismos. Estas associações, formalmente condenadas pela Igreja, inspiram hoje repulsa da parte de todos os católicos de brio e de dignidade.
Na segunda posição pretende colocar-se o Rotary.
Tal é a sua intenção pública. Tal não é, entretanto, a sua intenção particular, como o demonstram centenas de fatos assinalados pelos jornais católicos.
O Rotary, mesmo admitindo que tenha uma intenção leal de perfeita neutralidade, não pode sustentá-la, e a associação tem que inclinar-se, com preferências, para uma ou outra seita condenada.
Foi deste modo que começou a maçonaria. No princípio ela era uma simples associação de pedreiros, tendo por fim sustentar uns aos outros, na execução das obras de construção. A maçonaria pretendia ficar neutra, fora de toda questão religiosa, para poder aceitar em seu grêmio pessoas de todos os cultos e credos; ora, sabemos como em breve ela descambou para o protestantismo e, logo em seguida, adotando o fanatismo protestante, tornou-se a grande inimiga da Igreja católica.
A mesma sorte está reservada ao rotarismo, cedo ou tarde, e é questão de poucos anos, o Rotary será um ramo da maçonaria, e tornar-se-á completamente hostil ao ensino católico.
A terceira posição é a dos que se declaram abertamente favoráveis à religião católica. Tais associações, felizmente, são em grande número, são a quase totalidade.
Os católicos, para obedecerem à lei da Igreja, como às leis de sua consciência, não podem de nenhum modo aderir às duas primeiras associações.
A primeira é condenada pela Igreja. A segunda não o é ainda, mas continuando a trilhar o caminho encetado, sê-lo-á um dia... e mesmo que não o fosse publicamente, ela constitui sempre um perigo sério para a fé dos católicos, e como tal deve ser afastada rigorosamente.
Um católico não pode ser rotariano!

VII. Outro argumento
Encontramos contra o Rotary Clube um argumento decisivo em sua origem. É antes de tudo uma instituição norte-americana, protestante-maçônica.
Ora, é difícil, senão impossível, acreditar que os protestantes venham fazer instituições sociais, no Brasil, que não tenham qualquer fim protestante.
Fundam eles colégios e ginásios no Brasil, gritando e escrevendo em todos os jornais do país, que ali serão respeitadas as opiniões religiosas, e que cada um terá liberdade de praticar a sua própria religião. No começo, não faltavam pais tolos que acreditavam em tais promessas; hoje é do domínio público que tal liberdade não existe. Não é por amor ao Brasil que os americanos fundam colégios no Brasil. Além do lucro financeiro, pois a crise aperta atualmente as finanças americanas como as dos outros países, há a propaganda protestante, que tem por fim semear entre os brasileiros, unidos pela mesma fé, a dúvida e a discórdia, pela livre interpretação da Bíblia e pelas calúnias contra a Igreja, o Papa e os Padres.
Não há um único colégio protestante que faça exceção a esta orientação proselítica, desde o Grambery, de Juiz de Fora, até ao simulacro de ginásio, de Jequi- tibá.
O que querem estes pastores é espalhar as suas ideias... é afastar os filhos dos católicos da crença de seus pais... é infiltrar na inteligência da mocidade o veneno de seus erros e de seus ódios, obrigando os alunos à assistência de seus cultos.
Este fanatismo proselítico é hoje por todos conhecido, e eis por que, nos lugares ainda sinceramente católicos, os colégios protestantes estão desertos e desprezados.
O Rotary mudou de capa, mas sob a capa nova está escondido o mesmo inimigo. É uma árvore norte-americana e protestante. E esta árvore quer ser plantada no mesmo terreno, para produzir o mesmo fruto, sob um nome diferente.
Outrora era o amor à civilização, ao ensino que pregavam tais protestantes. Hoje é a educação social, os esportes, os divertimentos, o atletismo etc. que eles anunciam.
Viraram apenas o rótulo... por detrás é sempre a propaganda protestante.
Outrora os pastores vinham para o Brasil, como civilizadores no meio de um país de selvagens; como médicos no meio de um imenso hospital, para trazer aos brasileiros a luz, a saúde e o progresso. Não exagero nada, pois são as próprias palavras de diversos emissários protestantes.
O Rotary, vendo frustrados os esforços de tais pretensos evangelizadores, tomou outro nome e outro rumo.
Vendo que o Brasil nada tem que invejar aos protestantes americanos, em questão de civilização e de instrução, resolveram vir divertir-nos, alegrar-nos, organizando clubes americanos, esportes americanos, jogos americanos; mas tudo isso com ideias, orientação e fim protestantes- maçônicos.
A mocidade brasileira, que não se deixou cativar pela ciência protestante, talvez se deixe prender pelos divertimentos protestantes...
Pouco importa o meio; o que é essencial é ganhar a confiança da mocidade brasileira e incutir-lhe a indiferença religiosa,
Uma vez indiferente, tal mocidade há de afastar-se naturalmente da religião de seus pais... e uma vez desamparada, não será difícil incutir-lhe, com a admiração do americanismo, o amor ao protestantismo.
Mocidade brasileira... abri os olhos... os dois...
pois o pior inimigo é aquele que se esconde!

VIII. Conclusão
Tiremos a conclusão dos princípios acima expostos.
Que se deve pensar do rotarismo? Que é uma associação perigosíssima; e tanto mais perigosa, quanto melhor se esconde.
Tal associação, pela divisa ou brasão que a orienta: Fazer homens bons numa sociedade boa, é deficiente, pois limita-se a uma formaçon social, excluindo a formaçon religiosa, que é e será sempre o elemento preponderante em toda formaçon.
O Rotary pretende formar indiferentes. Ora, o indiferentismo é a chaga de nossa época... é o mal crônico de nossa sociedade moderna. O homem não pode ser indiferente para com Deus, como não o pode ser para com a sua pátria e para com a sua família. O Rotary peca, pois, pela base, em sua organização educativa.
Além disso, o Rotary, embora se esconda e se apresente com fins filantrópicos, tem um pecado de origem, que só o batismo cristão poderia apagar: “É uma sociedade norte-americana-protestante”. Ser norte-americano não é um mal; mas o que é um mal é ser de origem protestante; e a experiência nos demonstra diariamente que toda associação protestante tem por fim fazer proselitismo, propaganda contra a Igreja católica.
Se o rotarismo tivesse apenas fins altruísticos, ele “podia ser protestante, em terras protestantes; mas devia ser católico em terras católicas. Neste caso, sim; mostraria que a sua neutralidade é uma realidade, e que tal neutralidade tem por fim adaptar-se ao meio onde penetra e pretende fixar residência.
Mas tal não acontece! O rotarismo é, fica e quer ficar neutro exteriormente em toda parte, mas permanece, interiormente, protestante em toda parte. É o bastante para mostrar o que ele é e o que ele quer!
Pode, pois, um moço católico ser membro do Rotary? Não, não, não! três vezes não! porque o rotarismo é falho em seu fim, é falso em seu ideal apregoado, é perverso em seus resultados.
Dirão talvez que a Igreja é intransigente! Não o é!... É a verdade que o é, e deve sê-lo! A verdade é o que acabo de expor... A mentira é o que o Rotary nos apresenta... Pode a mentira ser verdade?... ou a verdade ser mentira?... Não! É impossível.
Brasileiros, somos um povo católico. Temos um fim, um ideal, uma fé, uma doutrina, uma moral e meios escolhidos pelo próprio Deus, para conseguirmos este fim e realizarmos este ideal, tanto como cristãos, quanto como membros da sociedade em que vivemos. Estes meios não são meros conselhos, são deveres imprescindíveis! A vida do cristão não pode ser parcial, eclética; deve ser integral, completa. Jesus Cristo já o disse: Não se pode servir a dois senhores (Mt 6, 24). Ele disse também: Quem não é por mim é contra mim. — Qui non est mecum, contra me est (Mt 12, 30).
Moços católicos, organizai associações católicas, e não vos alisteis em associações estrangeiras, perigosas e perversas. Não vos deixeis iludir nem pelas aparências, nem pelas promessas, mas colocai acima de tudo a vossa fé e o vosso brio religioso. Fugi do Rotary, porque ele é contrário a esta fé e a este brio. Pode servir para os protestantes; não serve para os católicos!
O episcopado espanhol publicou, ultimamente, uma circular, declarando ilícito aos católicos filiarem-se ao ao rotarismo. Esta condenação implícita, feita pelo episcopado de diversos países, tem sua razão fundada...
e só a ignorância religiosa pode desculpar o fim e os meios desta associação.
O Rotary não passa de uma instituição protestante-maçônica, tendo o mesmo fim que estas duas organizações, tomando apenas outra aparência! Não nos deixemos iludir por ela. O Rotary-Clube é um inimigo da religião de Jesus Cristo. Tratemo-lo, pois, como tal!

 

Quarto anjo das trevas

O DIVORCISMO


1) Divorcismo e moléstia.
2) Matrimônio e divórcio perante a razão, a sociedade e a religião.


DÉCIMO PRIMEIRO LAMPEJO
Divorcismo e moléstia do sr. Heitor Lima


Diversos católicos mandaram-me uma série de artigos do hoje tristemente célebre Heitor Lima, sobre o divórcio, pedindo que lhe desse uma resposta. Percorri uns dois destes artigos, e fiquei hesitante. Tal acervo de tolices não merece resposta. O que lhes convém é água, creolina e vassoura. Baba, asnices, lama, não se refutam; varrem-se.
Não conheço o tal Heitor Lima; creio conhecê-lo melhor do que transparece em seus artigos; porém, se é verdade que o homem é o que são suas ideias, o senhor Heitor Lima é um doente, e é, sobretudo, um ignorante: — ignorante de psicologia, de religião e de história.
Faz até a impressão de um colegial, que por saber um pouco de álgebra, geometria e de história, julga ser o sabe-tudo deste mundo, capaz de dogmatizar, e dirigir o mundo, a lua e as estrelas... e não sabe ainda dirigir a própria vida.
Não pretendo refutar todos os artigos de sr. Heitor Lima. Tais artigos refutam-se pelo bom-senso do leitor, que nota logo o ateísmo, a falta de noção da moral, do patriotismo e da história, para querer — pelo menos é o que parece — agradar a umas senhoritas aduladoras, de ideias bolchevistas e de amor livre...
É só isso que se apresenta a um leitor de ideias claras, e não preconcebidas, desejoso da verdade e do bem.

I. A moléstia divorcista
O divorcismo é uma moléstia: — moléstia da inteligência, moléstia da vontade e moléstia do coração.
No primeiro caso é o que a medicina chama monomania, a idéia fixa sobre um ponto, que só enxerga este ponto, e torna-se incapaz de raciocinar sobre tudo o que vai de encontro a este ponto. Parece-me ser o estado de espírito do sr. Heitor Lima. — É um monomaníaco.
Tal moléstia do espírito, desenvolvendo-se, torna-se mania, o que já é uma loucura parcial... e termina, muitas vezes, na demência. É a grande moléstia moderna. O espiritismo é o desenvolvimento gradual desta moléstia.
O espiritismo como doutrina, ou como ciência, não existe, como propriamente não existe o divorcismo; o que existe é a moléstia, sendo o divorcismo uma consequência desta moléstia. É a monomania, no princípio; é a mania depois, ou espiritismo, que termina no manicômio, pela demência. Pobre Heitor Lima, está num caminho perigoso, escorregadiço.
Mas não há só a moléstia de inteligência; as outras da vontade e do coração não são menos perigosas no caso. A verdade tem os seus extremos: é o otimismo exagerado, ou o pessimismo desastrado. O divorcista ou pessimista vê tudo através do prisma negro de suas tendências mórbidas.
Para ele, o casamento não é um ato sagrado, em busca de uma felicidade alegre; é o prazer do animal, a nevrose sensual, é podridão da lama.
E o coração? Pobre coração! Ele tem inúmeras moléstias, tem, sobretudo, a volúpia, o delírio da paixão...
Não é o amor, pois o amor é nobre e a paixão é aviltante... A paixão é uma moléstia. O divorcista sofre desta moléstia; é um tríplice doente... tudo está enfermo nele.
Os escritores católicos não se lembram bastante disto; refutam esta gente, acumulam argumentos, elevam a vontade, excitam o amor à pureza do casamento, mas não se lembram que o divorcista é incapaz de compreender um destes argumentos, porque é um doente. É um monomaníaco, é um pessimista, é um viciado.
Não tenho a coragem de aplicar tudo isso ao sr. Heitor Lima; não lhe pode ser aplicável; entretanto, um pouco de lógica, um pouco de psicologia e um pouco de experiência da vida, obrigam a atribuir tudo isso aos divorcistas.
Estamos diante de um caso patológico ou psíquico, ou então de maldade. O sr. Heitor Lima deve ser um rapazote, a julgá-lo pelos seus artigos, o qual não teve tempo ainda de criar pelos no queixal, nem juízo no cérebro. Deixemo-lo chegar aonde já chegou a barba branca de “O Lutador” e ele mudará de opiniões e de ideias, porque compreenderá melhor a realidade da vida. E se não mudar, então, é porque a moléstia era mesmo incurável.
Mas vamos ao artigo do divorcista.

II. Ponderações sem peso
O primeiro dos artigos do sr. Heitor Lima, que me vem às mãos, é o das “ponderações”. Examinemos tais ponderações, que parecem constituir o exército de batalha do ilustre, mas enfermo divorcista, enquanto os outros artigos parecem ser a reserva.
A primeira impressão, que deixa na mente do leitor, como aliás todos os artigos do mesmo autor, é a realização da palavra de Voltaire:
Um déluge de mots, sur um désert d' idées.
“Um dilúvio de palavras, sobre um deserto de ideias”.
O homem fala, fala sempre, não pára, afirma, nega, mas não prova nada de tudo o que diz. Nenhuma prova, nenhum argumento sério e sólido que suporte uma pequena análise de bom-senso, de história, ou de ciência positiva.
O homem pretende discutir, refutar e atacar os ilustres doutores Clóvis Bevilaqua, Miguel Couto e outros; grita que eles estão errados, mas não cita nenhuma prova do erro, nenhum argumento que destrua os argumentos daquelas sumidades.
O homem começa num tom dogmático, supondo já estar provado o que assevera: Não será possível uma renovação social do Brasil, sem a adoção do divórcio vincular.
Um criançola pode escrever uma tal asserção; um homem de pensamento e de juízo não desarticularia um tal sofisma, a não ser se estivesse doente das três faculdades acima indicadas.
Todos compreendem que uma renovação é uma coisa positiva, uma afirmaçon. Mas uma afirmaçon não se faz pela negação, como um efeito positivo não pode ser produzido por uma causa negativa. Ora, o divórcio é uma negação, é um defeito. É a negação do casamento contratado, é um defeito oriundo de um casamento mal sucedido. Como agora tal efeito negativo pode ser um instrumento positivo de renovação social? Como é que se pode renovar a sociedade, introduzindo nela um corte, uma facada? Que relação pode haver entre a renovação social e o divórcio? É mais que um mistério, é um absurdo.
A renovação de um país depende do esforço combinado e ordenado de todos os seus membros: — da parte dirigente, pela clarividência, pela justiça e pela oportunidade das leis que fabrica; da parte dirigida, pela cooperação e pela, docilidade a estas leis.
Ora, o divórcio só pode atingir a ínfima minoria, e a minoria sem juízo, porque, enfim, é preciso excluir todos os solteiros, viúvos e os bem casados, ficando apenas uma dúzia de boêmios, outra dúzia de viciados, e meia dúzia de desmiolados, que casaram sem saber por que e com quem. E são estas duas dúzias e meia sem qualidade que vão renovar a sociedade brasileira?...
Então os homens pensadores, ajuizados e prudentes serão os reformados, enquanto os boêmios e gozadores da vida serão os reformadores... :
O tempora, o mores... usquedum, exclamaria o velho Cícero. Creio no ateísmo do sr. Heitor Lima, em sua monomania, mas não posso crer em seus talentos de renovador social. Isto é impossível!

III. O paraíso terrenal
O Brasil, assim reformado pelo método do sr. Heitor Lima, seria o paraíso terrenal dos divorciados, a Jerusalém beatífica dos mercantes de mulheres. Senhores!
tirai o chapéu! E vós, senhoritas, lançai flores sobre o crânio desnudado e a mioleira oca do divorcista Heitor Lima e... avante a música!...
“Allons, entants de la patrie, Le jour de gloire est arrivé”.
O Brasil de hoje e de ontem, da República e do Império, está nas trevas e no idiotismo, porque faltava o luzeiro ou o lampião, que é Heitor Lima, Tal o colosso de Rodes, tendo um farol em uma das mãos e lançando lodo com a outra, ele teria feito do Brasil o que o gênio brasileiro ainda não soube fazer: “uma tribo de índios ou de africanos”, pois entre estes o divórcio é aceito e largamente praticado.
Por que o sr. Heitor Lima não fixou residência entre os índios e africanos? As suas teorias, entre eles, seriam coroadas de pleno êxito.
A sociedade brasileira periclita, se dissolve, morre, porque a união entre os esposos é coisa sagrada, indissolúvel, amando-se nas agruras e nas felicidades, e separando-se apenas à beira do túmulo.
“E isto é de zulus”, brada o novo reformador. o homem não deve ligar-se à mulher, nem a mulher ao homem. Isto é de selvagens... O homem deve amar hoje, odiar amanhã e depois separar-se, ou meter uma bala na cabeça da consorte. Isto, sim, rompe a monotonia da vida, dá satisfação, prosperidade e felicidade; isto é o paraíso terrenal!... Ó vós todos que sofreis, diz melifluamente o mestre divorcista, vinde a mim, e eu vos darei, em vez das pílulas rejuvenescentes de Voronoff, as cápsulas laxativas do divórcio.
Falta apenas isso para introduzir a felicidade em todos os lares e em todas as cabeças ocas. Com este regime, o marido amará a sua mulher com um amor apaixonado... e passada a lua de mel, metê-la-á na rua, na prostituição, pelo áureo divórcio.
A esposa, por sua vez, sabendo que tem poucos dias a passar na nova casa, será de uma meiguice, de um desvelo, de um carinho sem igual, vivendo aos abraços e beijos, até que um belo dia o maridinho divorcista, por ter dormido mal, fica lunático, nervoso, e manda a cara metade para a rua, a plantar favas, pelo áureo divórcio!
E os filhos... estes receberão em troca tanto amor de um lado, e tanta indiferença de outro que, entre lágrimas e sorrisos, hoje tendo pai e amanhã perdendo a mãe, serão educados como cidadãos de uma nova vida, mais ou menos como no paraíso soviético dos russos.
E tudo isso se fará tão naturalmente, que nem perturbará a paz seráfica dos casados, nem o sono angelical das crianças; tudo isso se fará com um sorriso de serafim, como um beijo de querubim, e uma bala de russo, sob o pontificado supremo do pontífice da reforma — o Heitor Lima.
Parabéns, patrício, pelas ponderações. O porvir comovido e grato levantar-te-á estátua simbólica: um homem tendo debaixo dos pés uma mulher; em uma das mãos segura um coração flamejante, e na outra, um revólver fumegante, tendo a estátua por inscrição em baixo: “Paraíso terrenal de Heitor Lima!”

IV. O conceito romano
O sr. Heitor Lima professa, talvez, a religião de Epicuro, ou de Maomé. Não se sabe: o certo é que tem raiva de Roma. Será da Roma dos césares, ou da Roma dos papas? Não o sei; mas suponho ser da segunda, pois a primeira era divorcista, e Heitor Lima se faz o copista da moralidade da Roma decaída no tempo dos imperadores pagãos.
Escutem a palavra ciceroniana do pobre homem: O conceito romano de que a estrutura íntima do Estado depende do modo por que se constitui a família, continua em pé. Estado feliz pressupõe indivíduos felizes. O Estado é uma abstração e outro fim não visa senão a felicidade dos indivíduos.
Tudo isso é verdade, e ao mesmo tempo a condenação formal dos erros, tristemente grotescos, do sr. Heitor Lima.
A Igreja católica, seguindo a lei natural, social e divina, que deve servir de base a toda instituição que pretende o aperfeiçoamento da sociedade, declara que o casamento não é um simples contrato de compra e venda de carne humana, como praticamente ensinam os divorcistas, mas, sim, uma lei da natureza, uma lei social e uma lei divina.
Se fosse apenas uma lei social, os governos poderiam votar o divórcio, pois, sendo apenas, neste caso, um simples contrato bilateral, nascido do consentimento das partes, este contrato podia findar pelas causas que lhe deram a existência.
Mas o matrimônio não é um contrato como os outros: Seu fim é determinado pela natureza, assim como o regime necessário para alcançar este fim. Breve estudaremos este regime, assim como a lei divina que o rege.
Desde já podemos dizer que o matrimônio, como o ensina a Igreja, ou conforme o conceito romano, como diz Heitor Lima, embora não se trate de conceito, mas de lei fundamental, o matrimônio, digo, é indissolúvel, pela lei da natureza, a lei social e a lei divina, de modo que o divórcio é uma aberração, uma violência contra estas três leis, e como tal é uma aberração contra o bom-senso, a moral, o progresso e a felicidade. É um crime de lesa-humanidade, de lesa-sociedade e de lesa- divindade.
Heitor Lima não deve ser tão tolo que não compreenda isto; porém não há pior tolo do que aquele que o é por maldade, como não há pior louco que aquele que não o é, mas se faz de louco, por vício ou por interesse.
Sigamos um instante o raciocínio do sr. Heitor Lima, destruindo os seus próprios argumentos. O conceito romano, ou a religião de Jesus Cristo ensina que o estado deve ser como o prolongamento da família. Boas famílias formam bons estados. Famílias indissolúveis, formam estados indissolúveis, como famílias nômades, vacilantes, versáteis, formam estados vacilantes, sem firmeza e sem duração. Isto é princípio de simples sociologia. E Heitor Lima deve conceder este princípio.
Estado feliz pressupõe indivíduos felizes, diz ele.
E ajunta que o Estado é uma abstração.
Ora, uma abstração não pode ter felicidade. O Estado, como tal, precisa de firmeza, de justiça, e esta firmeza e justiça devem ser a garantia, a protetora da felicidade individual de seus componentes.

V. A felicidade do povo
Um Estado feliz é aquele cujo povo é feliz. E em que consiste a felicidade do povo, dos indivíduos? Para o homem sadio é a satisfação estável de suas faculdades e tendências racionais. Para o desequilibrado é o prazer, que é sempre mais ou menos fugidio e superficial.
A felicidade é, pois, muito distinta do prazer. Até o animal sente o prazer; só o homem é capaz de felicidade,
Aqui, mais uma vez, o sr. Heitor Lima revela-se de uma ignorância incrível, em noções de psicologia e sociologia. A felicidade do indivíduo não depende do prazer que experimenta, mas da satisfação duradoura e permanente de suas faculdades. E, mais elevadas são estas faculdades, maior é a felicidade que o seu exercício lhe dispensa.
Há no homem uma felicidade do espírito: é a do sábio. Há nele uma felicidade da vontade: é o homem virtuoso, o santo. Há nele uma felicidade do coração: é o amor racional, puro e honesto. No homem há também o prazer: o prazer lícito e o prazer infame; o primeiro é oriundo do espírito, da vontade e do coração; o segundo é oriundo do vício lamacento.
Que é que o homem procura no casamento? Será só o prazer dos sentidos? Neste caso, não passa de um animal.
Será a felicidade? Neste caso, é um homem racional.
Mas a felicidade exige, essencialmente, que o estado em que procura esta felicidade seja estável, permanente, indissolúvel, enquanto viver. Ora, o divórcio é a separação, a desunião, a cessação, ou prevista, ou imprevista, ou realizada, deste estado. É pois, essencialmente oposto à felicidade do homem.
Não falo agora das coisas que podem influir em sua execução; veremos isto mais tarde, Aliás, tais coisas são acidentais, particulares, limitadas, e uma causa acidental não pode mudar a essência dos fatos; como a exceção de uma lei não prejudica esta lei; ao contrário, confirma a lei.
Felicidade e divórcio são dois elementos opostos e isso essencialmente. O divórcio, por motivos quase sempre fictícios, rompendo o vínculo da união, rompe o vínculo da felicidade, porque não há felicidade numa união precária, passageira; pode apenas haver prazer.
O sr. Heitor Lima, inconsciente, formou o silogismo, mas, ignorante como é em noções lógicas, não soube tirar das premissas a conclusão nelas contida.
Desculpe-me o mestre dar-lhe esta pequena lição.
Faço-o para o seu bem, pois é uma obra de misericórdia espiritual o ensinar os ignorantes, sejam eles ignorantes inconscientes ou voluntários.
Os indivíduos felizes, e não os gozadores, formam uma família feliz. As famílias felizes formam um estado justiceiro, firme, progressista, que mantém e assegura a felicidade de seus componentes.
Eis como o sr. Heitor Lima condena os seus próprios princípios e teorias, e pretende com as suas contradições renovar a sociedade brasileira! O pobre homem não entende a si mesmo; como e em que pode ser entendido pelos outros? Ele semeia balbúrdia; só pode colher a desunião. Quer semear ventos, e ventos só produzem tempestades, e nunca bonança.
Ignorância, fanatismo ou moléstia? Demos tempo ao tempo, para ele resolver o problema.

VI. A cultura moral e o divórcio
Escutemos mais uns trechos do incomparável Heitor Lima: “Há quem diga, diz ele, (é tão fácil disparatar!), há quem diga que a sociedade brasileira ainda não tem a cultura moral necessária para compreender e usar com critério a lei do divórcio. A frase quase não tem sentido.
Admito que seja necessária a cultura moral para casar; para descasar, não. No Brasil, só vinte por cento dos casais são casados”.
Há quem diga!... É o sr. Heitor Lima quem o diz.
A frase quase não tem sentido!... Tem o sentido de moléstia ou de perversidade. O mestre divorcista admite a cultura moral para casar; para descasar, não!
Um pouco além, ele continua: “Que se pretende com ela (tal frase)? Que a cultura moral limita o divórcio?
É exatamente o contrário o que se verifica”.
Comentemos um instante estas expressões. O sr. Heitor Lima põe como princípio que a cultura moral favorece o divórcio. Mas, homem de Deus, queira dizer-nos o que é cultura moral? O sr. fala sem compreender o sentido das palavras. Basta de tantos sofismas, de paradoxos e de trocadilhos. Que é cultura? Que é moral?
Para nós, a cultura é o desenvolvimento das faculdades da alma. Os sábios cultivam a inteligência. Os homens de caráter cultivam a vontade. Os homens honestos cultivam o coração. Esta tríplice cultura constitui a cultura completa. Quando aos boêmios, estes nada cultivam; somente destroem, pervertem.
A monomania é destruidora da inteligência. A hiprocrisia é destruidora da vontade. A libertinagem é destruidora do amor. E como é que o sr. pretende construir com elementos destruidores? Isso é fenomenal! Isso é apenas a explicação da sua sofística cultura.
E a moral?... o senso moral, o que é? Para nós, é a noção que temos do bem e do mal. Para o sr. como mostrarei, é o contrário: é a luta do mal contra o bem.
A moral refere-se às faculdades da alma, e como tal abrange a inteligência, a vontade e o coração.
Existe moralidade e imoralidade para o espírito, a vontade e o coração, isto é, em pensamentos, desejos e ações. Os pensamentos dos divorcistas, pelas teorias materialistas que professam, são imorais. Os seus desejos, pela propaganda da praga divorcista, são imorais. Os seus amores ilícitos, que procuram erigir em princípio e regra, são imoralíssimos. É o reino da imoralidade, quanto o casamento indissolúvel é o reino da moralidade.
Eis o que é cultura e o que é moral.

VII. Casamento e divórcio
Aproximemos agora estes dois termos da palavra — divórcio — e veremos o antagonismo, a oposição radical na ideia e na expressão. Estes termos são tão opostos um ao outro, como são opostas as palavras: branco e preto, construir e destruir, unir e separar.
O casamento é a união do homem e da mulher, para, no regime do lar, atingir a finalidade deste ato que é o amor mútuo e a procriação.
O divórcio é a separação do homem e da mulher, para lançar o primeiro no crime e a segunda na prostituição: sem amor e sem procriação.
E o sr. Heitor Lima chama isso cultura moral. Não, senhor: é destruição imoral. A cultura é um desenvolvimento; o divórcio é uma diminuição. A cultura provém da união; o divórcio é a desunião. A moral é um ato que aproxima o homem de seu fim; O divórcio afasta-o deste fim. A moral é um ato que eleva o homem; o divórcio o rebaixa ao nível dos animais.

Conclusão: O casamento é um ato livre, porém, uma vez aceito, deve ser indissolúvel tanto em virtude da lei natural, como da lei social e da lei divina; enquanto o divórcio, destruindo o vínculo desta indissolubilidade, ofende a lei da natureza, a lei social e a lei divina: é, pois, um ato imoral.
A cultura moral ou virtude, limita, pois, o divórcio e pugna em favor do casamento indissolúvel. A cultura moral é um progresso: o divórcio é um regresso aos costumes pagãos e selvagens.
Como pode, pois, o sr. Heitor Lima ligar estas duas asserções completamente contraditórias: “É preciso cultura moral para casar, e não para descasar”? E esta outra: “A cultura moral estende o divórcio”?
É impossível! A aproximaçon formaria argumento de aluno do curso primário, que enxerga apenas palavras, sem lhes compreender o sentido.
Sim, é preciso cultura moral para casar: a prova está na história, que nos mostra os povos incultos, selvagens e apodrecidos evitarem o casamento, para lançarem-se no amor livre.
É a falta desta cultura que faz descasar, como nos mostra a vida e as aberrações dos boêmios de todos os tempos. Tal é o sentido dos princípios do sr. Heitor Lima.
Mas, como é que o sr. afirma depois o contrário: “a cultura moral estende o divórcio"? E” o contrário...
o sr. acaba de dizê-lo. A cultura moral faz o homem casar e a falta desta cultura o faz divorciar. O sr. não entende ou não se lembra do que disse ou está dizendo.
Tão verdade é que o homem não pode mentir nem se contrafazer sempre: a verdade escapa, às vezes, maugrado seu.
O sr. Lima prega o divórcio, mas confessa que tal divórcio é uma falta de cultura moral. É uma decadência moral, é um ato imoral, Isto é certo: Habemus reum contitentem. E assim por diante.
O sr. Lima escreve artigos quilométricos, afirmando no começo e negando no fim; pondo princípios afirmativos e tirando conclusões negativas. É, segundo a palavra de Jesus Cristo, o reino de Satanás dividido contra si mesmo, não pode subsistir. É por isso que o divórcio não subsiste...
É apenas um sinal de decadência; é a negação da lei natural, social e divina; mas tal negação denota a existência da lei, como a ignorância, que é a negação da ciência, denota a existência desta última. Decadência pelo divórcio... restauração pelo matrimônio indissolúvel.

VIII. Benefícios do divórcio
Para fazer aceitar uma inovação, é preciso mostrar os seus benefícios. O sr. Heitor Lima vai procurar — mas em vão — apresentar-nos os benefícios do divórcio. Infelizmente tais benefícios não passam de promessas quiméricas, contradizendo abertamente o bom senso e a experiência da vida.
Escutem o mestre divorcista: “Em primeiro lugar, e esta é a vantagem psicológica do divórcio, tornaria mais apertado o laço nupcial, por paradoxal que pareça a afirmaçon. A coação predispõe mal, porque predispõe à reação. O caráter indissolúvel do vínculo conjugal, o pensamento de que a liberdade foi alienada para sempre, atuam como elementos de irritação. Só há moralidade verdadeira nas ligações espontâneas. Coabitar por amor é moral; por obrigação é imoral, constitui mesmo a maior das imoralidades”.
Quantos paradoxos, sofismas e falsidades desta primeira vantagem quixotesca.
Vejamos de perto, pois as palavras do sr. Heitor Lima formam uma torrente, para esconder, pela abundância de palavras, o vácuo das ideias. Ao ouvir o barulho, julga-se ser o trovão, quando é apenas a tosse de um tuberculoso. Não se espantem, pois não haverá tempestades.
O primeiro benefício, diz o sr. Heitor, é apertar o laço nupcial. O bravo homem viu esta vantagem tão grotesca em sua teoria, que ele mesmo avisa logo que parece paradoxal. E não só o parece, mas o é completamente. O matrimônio faz a união — a indissolubilidade aperta esta união, fazendo-a obrigatória para a vida.
O divórcio faz a separação — a ideia do divórcio predispõe e prepara a separação, e pela ideia obcecante da possibilidade desta separação, irrita na menor contrariedade, exaspera e enfim corta o laço, ou pelo abandono ou pela bala.
O sr. Heitor pretende apertar os laços de amor, prometendo-lhe a separação; promete aos casados o amor, mostrando-lhes o ódio; apresenta-lhes a felicidade, fazendo-lhes o quadro da desgraça. É o cúmulo! É prometer beijos e dar pontapés. Só mesmo a lógica do sr. Heitor Lima!

IX. Casamento ou amor livre
E como é que o sr. mestre vai provar uma tal asserção paradoxal? Para ele é muito simples; como tudo é simples para quem não raciocina. É só dizer, e pronto: está feito.
A prova, diz o divorcista, é que: “a coação predispõe à reação”. O casamento para ele é uma coação.
Para quem casa obrigado pela polícia, é mesmo uma coação. Mas então o sr. Heitor Lima julga que a maioria dos brasileiros se casem forçados pela polícia? E ele escreve isso no Rio de Janeiro!...
Como já disse, o matrimônio não é um simples contrato bilateral, é uma lei natural, social e divina. Mas o nosso Heitor Lima parece ser budista: para ele não há lei, porque toda lei é coativa, e como tal, é irritante. Para ele só deve haver uma lei: a lei do divórcio.
Então, ó homem, se o casamento não é lei, por que o deve ser o divórcio? Lei contra lei, sim, mas lei contra livre contrato, isso é ridículo. O sr. está aqui num dilema.
Ou o matrimônio é lei, e como tal, perpétua, indissolúvel, ou então se há de admitir.o amor livre, destruindo a instituição do matrimônio.
O divorcista tem de aderir à indissolubilidade, ou tem de ir até ao fim e abolir o matrimônio, permitindo que cada qual ande com a companheira que lhe aprouver, quando e como lhe aprouver. :
Se não há lei que ordene, não pode haver lei que proíba. Se não há lei que una, não pode haver lei que separe. Se o sr. não admite a lei do casamento, como, pois, quer a lei do divórcio? Se é apenas um contrato bilateral, neste caso, o casamento deve seguir a legislação de tais contratos, e extinguir-se pela livre vontade de ambos os contratantes.
A sua teoria, caro Heitor, peca pela base, é um paradoxo grotesco. Por que demolir o que não existe? Se o sr. quer o amor livre, corra, pois, através do Brasil, alugando um séquito de mulheres perdidas. O sr. é livre; porém os bons, os honestos, os homens sérios são livres também de fundar o seu lar como santuário, onde reine o amor, a fidelidade e a virtude até à morte.
Só o divorcista pensa assim; o bom senso, a religião e o senso comum pensam de modo diferente. E a verdade está com eles.

X. Coação e reação
“A coação predispõe à reação”, dogmatiza o sr. Heitor Lima, Será por causa da rima que o homem aproveitou os dois termos? O sr. foi pouco feliz na escolha, olhou demais para a rima, e não para a significação.
Em filosofia, (é verdade que o sr. Heitor Lima não estudou este guia das ciências), em filosofia diz-se que toda ação produz uma reação; isto, sim; mas a coação produz apenas uma tristeza, um mal-estar.
Além de péssimo pensador, péssimo moralista, péssimo sociólogo, o sr. é ainda um péssimo filologista.
Isto recomenda muito mal as burlescas teorias do divorcismo.
Conforme a interpretação do divorcismo, o homem é continuamente levado à reação no sentido da revolta, pois a vida é uma coação contínua, perpétua e ininterrupta.
O sr. Heitor Lima escreve asnices sobre o divórcio; está sujeito à coação e tem de aguentar as lambadas um tanto pesadas do intransigente “O Lutador”.
O sr. Heitor pretendia ser eleito para a constituinte pelo elemento divorcista; caiu miseravelmente no fundo da cesta, e com ele as sua teorias bolchevistas; está sujeito à coação, tendo que aguentar os risos e as gargalhadas dos adversários.
O sr. Heitor Lima julgava reformar o Brasil, ser o pai da novidade, o autor da época áurea da libertinagem e da devassidão que o divórcio suscitaria; está sujeito à coação como um homem desmoralizado, que o Brasil, em massa, despreza.
Tanta coação devia produzir no sr. não a reação, mas a vergonha, a tristeza de ter sido tolo, pretensioso, extravagante e imoral em suas ideias.
Tal reação seria lógica... e seria digna, merecendo-lhe, além do perdão das faltas, a estima da nação, que veria um homem sincero, arrependido, que se retrata e toma outro rumo.
Tal efeito se produziria num homem sensato, de brio e de sinceridade; só não produzirá num pobre doente, atacado de monomania; este, (coitado), sentirá a re- volta, o ódio, e responderá aos seus antagonistas com pedras e grosserias, que farão as vezes de argumentos.
Se assim não fosse, a vida do homem, que é uma contínua coação, seria uma vida de revolta e de ódio. Felizmente, as teorias do sr. Heitor Lima não hão de vingar em nosso querido Brasil, que está fadado a um futuro mais risonho e mais nobre, que o de atirar-se no fedorento lamaçal do divórcio ou do amor livre.

XI. Obrigação é imoralidade
Perdoemos ao pobre sr. Heitor Lima a heresia de bom-senso; é um doente, e não se deve imputar a um “doente as asnices que lhe escapam. Aliás, já estamos acostumados ao paradoxismo do divorcista.
Aqui vai mais outra do mestre: “Coabitar, por amor, é moral; por obrigação, é imoral, imoralíssimo”.
Que frase para embasbacar os tolos e fazer sacudir a cabeça aos homens de bom-senso.
Estudemos bem este grande principio do divorcismo, formulado pelo seu grão-mestre.
Pobre Heitor Lima! A gente tem até compaixão de tanta verbiagem e tão, pouco compreensão! O sr. faria bem tomar uma consulta com algum ilustre clínico, sobre o seu estado patológico; uma outra com o dr. Clóvis Bevilacqua, sobre o seu estado social; e uma terceira com o padre Gastão da Veiga, sobre o estado de sua alma; estes seus amigos, embora combatam suas ideias mórbidas, poderiam ajudar-lhe a alcançar a sua cura.
Eu também, caro Heitor, poderia lhe ser útil, pois, em minha vida já longa, fui capelão de um asilo de loucos; adquiri uma certa experiência de moléstias nervosas e encefálicas. Estou às ordens!
Mas, vamos à análise da frase lapidar divorcista: Coabitar por amor é moral, por obrigação é imoralíssimo.
O meu Heitor não sabe ainda distinguir entre o instinto do bruto, e o amor racional do homem.
O sr. não sabe o que é o amor? Há no homem um tríplice amor: o amor natural, — como entre pais e filhos; o amor sobrenatural, pela graça divina — como entre os homens e Deus; o amor bestial — como entre os animais: é o instinto brutal.
Para casar é preciso, pelo menos, o amor natural; para o católico, é exigido o amor sobrenatural da graça, para receber o sacramento do matrimônio. Os boêmios e divorcistas conhecem apenas o amor bestial, o instinto da natureza decaída.
Para eles, amar é gozar... é o amor de lama. Para nós, amar é dar, é querer bem à pessoa amada mais do que a si. Por que é que a gente casa? Por causa do amor mútuo.
Por que querem coabitar? Para amarem-se mais e darem provas deste amor. Ora, amar é dar, e até sofrendo, se preciso for.
Ubi amatur non laboratur, diz muito bem S. Agostinho; quando duas pessoas se amam, nada lhes custa, porque o amor suaviza tudo.
Toda coabitação voluntária supõe o amor, é natural; por obrigação, não é imoral, mas pode ser a consequência da imoralidade, como, exemplo, o libertino que foi casado na polícia. Tal coabitação é obrigada, sem ser de amor. É a exceção.
Mas qual é a lógica que toma por regra a exceção da regra? Só a lógica divorcista.
O amor é a condição necessária para um bom casamento; e o amor tem dois componentes essenciais: deve ser recíproco e deve ser permanente. Sem isso, só pode haver paródia do amor.
Reciprocidade e permanência do amor constituem a indissolubilidade. O matrimônio, pelas leis da natureza, deve ser indissolúvel, como é indissolúvel o amor entre os pais e os filhos.
A indissolubilidade obriga a amar por obrigação, de modo que coabitar por obrigação, longe de ser imoral, é a consequência necessária do amor. Se assim não fosse, podia-se dizer, seguindo o mesmo princípio, que toda obrigação é imoral. Comer, beber, dormir, digerir, falar, ouvir, andar, tudo isto, então, seria imoral, pois tudo isto se faz por obrigação. O menino, que estuda, seria imoral.
E o próprio Heitor Lima, que passeia, que diz asnices, seria imoralíssimo. Ele, de fato, já o é bastante pelas suas ideias e sua ignorância; não vale a pena carregar-lhe mais do que está.

XII. Desquite e divórcio
Apreciemos mais um pedacinho do corifeu do divorcio, que se torna o inimigo do desquite: Outra enorme vantagem do divórcio: facultar a regularização dela resconstituídos à margem da lei, constituídos por desquitados, aos quais não é lícito convolar em novas núpcias; a legitimaçon de filhos que o infame desquite estigmatiza com o ferrete de adulterinos é ainda uma altíssima vantagem do divórcio. Assim, o divórcio influiria beneficamente nos costumes, pois elevaria o nível da moralidade, tão rebaixado entre nós pelo desquite”.
Novos princípios, novos sofismas do sr. Heitor Lima!
O desquite ou separação legal dos esposos, em caso de impossibilidade de se suportarem, é um meio legal de evitar desastres, ódios, entre aqueles que não souberam compreender e exercer o amor conjugal.
É um meio honesto, e até, às vezes, honrado. Seja qual for a razão da falta de combinação, ou da amargura que envenena a coabitação, ambos separam-se, continuando fiéis à palavra dada, à fidelidade jurada.
É um meio honesto... e em caso de infidelidade de uma das partes, pode ser um meio honrado de resolver problemas complicados, conservando para os filhos o amor e dando-lhes a educação que lhes é devida. A lei da natureza, a lei social e a lei divina são respeitadas.
Mas os divorcistas não querem saber de desquite; querem a liberdade completa, querem o amor livre e a separação livre; querem o amor de hoje, a infidelidade de amanhã, a separação no terceiro dia e a libertinagem do quarto: e tudo isto legalizado. Em duas palavras, os divorcistas querem a libertinagem, a devassidão, a imoralidade sancionadas pela lei.
Neste caso, os ladrões, os bêbados e os assassinos podiam procurar sancionar os seu crimes pela lei. Uns valem bem os outros! Não vejo em que o libertino seja superior ao bêbado, ao ladrão ou ao assassino. Ele é um bêbado do prazer bestial. Ele é um ladrão da honra alheia. Ele é um assassino do pudor da mulher.
Um divorcista é tudo isso, e mais qualquer coisa, pois, além de perverso, destrói não só o bem, a honra ou a vida do próximo, mas a família e a pátria inteira.
O sr. Heitor Lima, em sua doutrina bolchevista, acha que o desquite é infame e o divórcio, honrado. É o contrário: o desquite é honrado, quando justificado; o divórcio é infame e infamante.
A razão desta aberração é de que o desquite obriga os casados a ficarem fiéis à palavra de fidelidade, enquanto o divórcio, destruindo tudo, isto é, a palavra, o juramento, a honra mútua e a honra dos filhos, permite entregarem-se à completa libertinagem, sob a sombra protetora das leis.
O divorcista não se importa de virar um suíno, mas quer ser suíno legal.

XII. Remédio e amputação
O sr. Heitor Lima pensa que o divórcio é o grande remédio contra o infame desquite, porque o divorciado pode convolar em novas núpcias. É sempre a sensualidade que domina; nunca o bem ou o amor. Então o divórcio é o meio de evitar a moléstia. O desquite era um remédio; o divórcio é a amputação. Isto é certo mesmo, mas é substituir um remédio, que é suficiente e eficaz, pela amputação do membro.
É absolutamente como se alguém dissesse: Vamos acabar com as farmácias e os farmacêuticos, deixando apenas os médicos-operadores. Não se tratará mais uma moléstia; corta-se logo o membro, pois é mais radical.
Neste Brasil afora há tanta gente sofrendo de feridas nos pés, nas pernas; nada mais de remédios; faca nos pés e nas pernas doentes.
Muita gente anda se queixando de moléstia dos “rins, do fígado, do estômago; nada de remédios; arranquem os rins, cortem o fígado, raspem o estômago, e pronto: estarão curadas e para sempre as icterícias, hepatites, nefrites e diabetes.
Outros sofrem dos olhos e dos ouvidos; o remédio de Heitor Lima está pronto: cortem a cabeça, “furem os olhos, arranquem as orelhas. Já passou o tempo do princípio dos alopatas; “contrária contrariis curantur”. Hoje o princípio é: Omnia mala cultello curantur: os males curam-se pela faca.
E aqueles que sofrem da cabeça? O mestre divorcista tem a resposta pronta: “Cortem a cabeça: o remédio é radical”. Experimente, ó mestre!
E tudo isso chama-se argumento decisivo. Não é exato: é um argumento cortante.
Eis o que vem ensinar-nos o divorcismo. Há casamentos ruins, mal assortidos, sem união, sem amor.
É certo... Mas de quem é a culpa? Dos que se casam sem pensar, sem indagar, sem examinar o gênio e as inclinações da noiva.
Em caso de necessidade há um remédio: é o desquite. — É um remédio, e como todo o remédio, ele é amargo.
O divorcismo quer a faca, quer cortar tudo, destruir, aniquilar, desmoralizar mulher e filhos, para satisfazer a libertinagem do homem, que quer uma segunda mulher, à qual será infiel como à primeira, e depois uma terceira, uma quarta...
“Morra a mulher, morram os filhos!... brada o divorcista, isso não importa; o que me importa é que eu seja livre de qualquer compromisso”.
Admirável moral bolchevista!

XIV. O nível da moralidade
Os leitores já compreendem até onde vai a moralidade divorcista... Não há mais moral, está fora de toda moral... é o puro instinto.
Isto não impede ao mestre divorcista de exclamar, como conclusão das vantagens que tenho reproduzido e comentado: E assim, exclama ele, enfaticamente, o divórcio influirá beneficamente nos costumes, pois elevará o nível da moralidade (sic!).
Bela moralidade construída sobre a imoralidade!
Admirável saúde adquirida, cortando o membro doente, em vez de curá-lo.
Estupendo progresso, que faz, de um povo civilizado e culto, uma tribo de índios, de africanos, de chineses, pois todos estes praticam o divórcio e o amor livre.
Inebriante felicidade, onde o coração fica excluído, para ceder lugar às paixões mais abjetas e vergonhosas.
Vida celestial, em que um homem e uma mulher se unem para se separarem brevemente; em que geram filhos para lançá-los na rua, como expostos ou órfãos; em que os amantes se beijam com os lábios, tendo nas mãos o revólver do divórcio; em que se amam hoje para se odiarem amanhã; em que se juram fidelidade para no dia seguinte jurar a vingança.
Tudo isto é o nível da nova moral divorcista! É horrível! E entretanto é certo. E dizer que há gente que aplaude tais perspectivas! É, pois, claro, que o divórcio propaga de um modo pavoroso a imoralidade.
O temor do divórcio e de seus efeitos, ou a paixão que tem ocasião de se satisfazer, buscará mil meios e pretextos para romper o matrimônio e, ao mesmo tempo, não ficar em situação prejudicial quando se romper.
Não se pode negar que o divórcio foi inventado em favor daqueles que se querem entregar desenfreadamente à imoralidade.
Isso, aliás, é provado pelos dados estatísticos dos tribunais. Onde cresce o divórcio, cresce também o suicídio, cresce a divisão da família, cresce a infidelidade dos cônjuges, cresce o número dos ilegítimos, cresce o número das crianças expostas, crescem os infanticídios, e diminui o número de casamentos.
Eis o nível da moral que os divorcistas pretendem alcançar — nível abaixo de todo nível humano — o nível do lodo e da lama.

XV. Os exemplos dos outros
Para ser completo na enumeração das vantagens imorais do divórcio, o sr. Heitor Lima não podia deixar de citar o exemplo de outros países; mas convém notar que ele cita apenas o bem existente nestes países, sem citar os efeitos desastrados do divórcio.
Ele faz, como fez um certo prefeito municipal do norte, mostrando o adiantamento e progresso da cidade, após uma péssima administração que obrigou o governo a mandar examinar os fatos. O prefeito mostrou tudo: havia duas escolas, quinze casas de comércio, um jardim Público, dois clubes de futebol, três carroças municipais para o serviço do lixo e trinta contos em caixa.
O enviado do governo achou isto esplêndido, e numa reunião popular manifestou o seu contentamento sobre a administração, dizendo não compreender as razões das queixas. Um coronel da roça, com uma franqueza de cearense, respondeu simplesmente: “Sim, sr., tudo isso existe, mas o sr. prefeito não mostrou o que não existe mais, mas apenas o que existe hoje. Há três anos havia 6 escolas, 40 casas de comércio, 5 jardins públicos, 5 clubes de jogos, 12 carroças municipais, uma grande fazenda, 10.000 pés de seringueira e 200 contos em caixa”.
É o caso do sr. Heitor Lima. Quer mostrar-nos o bem que ainda existe em outros países, apesar do divórcio, mas não indica o bem que ali existiu antes do divórcio.
Diz ainda que muitos outros países o adotaram; pode ser, mas por desgraça deles.
Tomemos, por exemplo, a França, o país das novidades e progressos. No tempo da Revolução, o divórcio foi ali introduzido pela lei de 1792. Ora, três anos depois, o governo viu-se obrigado a restringir a facilidade de divorciar, o que aconteceu de 1797 a 1798.
Em seu Étude démographique du divorce, Jacques Bertillon diz: “Em 24 meses depois da promulgação da lei do divórcio de 1792, os tribunais de Paris pronunciaram 5.994 divórcios, num crescente até que o número dos divórcios excedeu ao número dos casamentos”
Em 1795, Malche, um dos promotores da lei, exclamou: “Não podeis cedo demais fazer parar a corrente de imoralidades que carregam estas leis desastrosas.
A lei do divórcio é antes uma tarifa de especulação usurária, que uma lei”.
Regnault de "Orne designava no divórcio um prêmio à leviandade e à inconstância dos esposos, transformando a santidade do matrimônio num concubinato vergonhoso e repugnante.
Glasson, no começo favorável ao divórcio, mais tarde exclamou: “O casamento civil, descendo à ordem dum contrato temporário, revogável à vontade, tende a deixar de existir, entrando na categoria do que, hoje, se chama união livre” (Phil. du droit civil, p.69).
Delleville, por sua vez, pergunta: “Até quando se verá triunfar este infame mercado de carne humana?...”
A imoralidade penetrou em todas as classes sociais dum modo tão assustador, que a abolição do divórcio absoluto se tornou uma necessidade, tendo sido decretada, por quase unanimidade, pela câmara dos deputados, confirmada pela dos pares e sancionada a 8 de Maio de 1816, apoiando-se sobre a legislação natural, sobre a natureza e as coisas, sobre as considerações tiradas da essência do vínculo conjugal.
Supresso em 1816, o divórcio foi restabelecido em 1884. E quais foram os resultados? Em 1885, o número de divórcios foi de 1.640. Em 1901 foi de 10.539.
Em 1908 aumentou de 577 sobre o ano precedente.
Em 1909 aumentou de 1.539 sobre o ano de 1908; ou seja 12.874 divórcios.
Em Paris, a quarta câmara civil pronunciou uma vez 159 julgamentos de divórcios, num dia; uma outra vez, num só dia, chegou a 249 casos; uma terceira vez chegou ao número quase incrível de 294, Pensem bem nisso: 294 julgamentos de divórcios num dia, em 15 de Dezembro de 1908.
Tais algarismos são formidáveis, tomados em si mesmos; mas parecem aumentar o horror que inspiram, ao lembrar-se que o divórcio existiu apenas há 28 anos, e que tinha encontrado imensas dificuldades, devidas à educação religiosa, à moralidade pública e cristã durante mais de 15 séculos, lembrando-se ainda que só houve divórcio onde tinha havido verdadeiro casamento e que o número de uniões livres, aumentando dia a dia, tira a necessidade do divórcio.
Onde existe o divórcio, sem encontrar os costumes cristãos, como na França, o progresso divorcista ou imoral é mais espantoso ainda. Podíamos fazer uma estatística que pareceria estupenda, mas não vale a pena. O Padre Leonel Franca publicou-as em seu livro sobre o divórcio.
Eis o que o sr. Heitor Lima chama o exemplo das outras nações. Belo exemplo... não de progresso, mas de regresso para a barbaria.

XVI. O divórcio na história
Citemos mais um trecho das deseguilibrações imorais do sr. Heitor Lima. O homem é de uma facúndia tão extensa como oca. Bem pobre é aquele que não sabe prometer, diz o adágio; enquanto o sr. Heitor Lima exclama: bem idiota é aquele que não sabe mentir!
Saboreiem mais o seguinte pedacinho; se não é linguiça, é, pelo menos, tripa, como dizem os alemães: “O divórcio contribui para o aperfeiçoamento moral dos povos como nenhuma outra lei. Os países mais adiantados e mais civilizados do mundo são divorcistas, e vá aí alguém sugerir a supressão do instituto do divórcio”.
É admirável, mas é tripa! E para mostrar que tal tripa é capaz de fazer enforcar muita gente, basta citar o exemplo antigo, mas sempre instrutivo, do grande povo romano: “Que espetáculo apresenta o povo romano, onde reinavam o divórcio e o repúdio? Aí se vê o divórcio reconhecido e justificado pelos pretextos os mais fúteis, praticados pelos homens os mais célebres e degenerados por uma corrupção fatal até ao amor livre, que é a negação do matrimônio e de sua dignidade.
Paulo Emílio expulsa de sua casa a sua mulher, por considerá-la um traste já gasto. Sulpício Galo, porque ela saiu com a cabeça descoberta. Antístius Veter, porque a viu entretida em conversa com uma liberta. P. Semphronius, porque ela fora assistir aos jogos, sem sua licença. Cícero repudia Terência, depois de trinta anos de casados, porque tinha ele necessidade dum novo dote para pagar suas dívidas. Públius despediu sua mulher porque se alegrou da morte de Tulíola. Terência casou-se sucessivamente com quatro maridos. Tulíola, com três, e o último, Dolabelo, a repudiou próxima a dar à luz. Bruto deixou Cláudia para unir-se a Pórcia.
Tintínius, de Minturnos, casou-se com a impudica Fãnia, tendo a intenção de expulsá-la, pela má conduta, para ficar com o seu dote, exploração esta muito comum na antiga Roma. Era frequente a separação com acordo ou sem acordo, por qualquer motivo, para contrair novas uniões. César teve três mulheres; Augusto, quatro; outros membros da família, cinco ou seis. Certas mulheres contavam os anos pelos seus maridos e não pelos cônsules. Suetônio, Tácito, Juvenal e outros escritores notáveis do Império Romano narram a que grau de abjeção caiu o povo, assinalando a decadência romana, o seu aviltamento moral nos últimos dias de sua história, tendo como causa preponderante o criminoso desprezo da unidade e indissolubilidade do vinculo conjugal. O povo romano soube manter as suas grandezas, quando respeitou a elevada concepção do casamento, constante do direito romano, que assim o definiu: É o dom recíproco de sua vida total, consortium omnis vitae; é um dom mútuo de tudo o que há de humano e de divino, juris humani et divini communicatio.
Os imperadores, senadores, cavaleiros e plebeus, ricos e pobres, dominados pelas paixões insaciáveis, as mais vergonhosas, se entregaram à prática do divórcio absoluto, do repúdio fácil e cruel, de tal modo que perderam todo o valor patriótico, todo o devotamento à grandeza nacional, estrebuchando na mais terrível degradação moral e social. E o Império Romano, caindo aos pedaços pela depravação de seus costumes, foi esmagado pelas hordas dos bárbaros”.

XVII. A reabilitação da mulher
Chegamos enfim, à conclusão do artigo do Sr. Heitor Lima. É tempo de concluir; de fato, a imaginação mentirosa do homem deve estar esgotada de tanto correr e voar atrás de provas, que não pode descobrir.
Escutem agora a conclusão digna das premissas: “O divórcio reabilita a mulher, diz ele, liberta-a de uma porção de preconceitos cruéis, dá-lhe mais garantias e torna-a mais feliz. E tanto mais perfeito moralmente é um povo quanto melhor tratamento a sua legislação dispensa à mulher”.
Chapéu abaixo... e avante a música! O sr. Heitor Lima terminou as suas ponderações. Umas reflexões de comentário sobre as palavras do mestre são necessárias.

PRIMEIRA ASNICE: O divórcio reabilita a mulher, diz ele. E como é isso? Reabilitar alguém quer dizer: restituir-lhe direitos, créditos ou estima perdidos. Que é que a mulher perdeu? A mulher honesta e digna é honrada, estimada, seja como moça, como esposa, como mãe ou como dona de casa. Neste Brasil afora ninguém pensou nem pensa em deprimir a mulher; ela é rainha em seu papel próprio, ela segura o cetro de sua fidelidade e cinge a coroa de seu amor. Quanto à mulher caída, perdida, não falemos dela; esta, sim, precisaria de reabilitação.
Mas não é o divórcio que o pode fazer, é só a religião, pela regeneração. A mulher brasileira está ainda em cima de seu trono, ó Heitor, e não precisa da sua reabilitação; ela está habilitada para tudo quanto é grande, nobre e virtuoso.

SEGUNDA ASNICE: “O divórcio liberta a mulher de uma porção de preconceitos cruéis”! E quais são estes preconceitos? A fidelidade a seu marido, o carinho do amor, o desvelo de seus filhos. São belos, são santos, estes preconceitos, e não cruéis. Heitor Lima quer fazer da esposa terna, da mãe carinhosa, uma mulher sem dignidade, sem coração, que passa pelo lodo da queda, oferecendo os seus lábios aos imundos profanadores e o seu corpo aos infames divorcistas. 0h horror!...
Cinzas de nossos avoengos, animai-vos para cuspir sobre o traidor de vosso brio, de vossa glória e de vossas tradições.

TERCEIRA ASNICE: “O divórcio dá mais garantias à mulher e torna-a mais feliz”. E como é isso, ó mestre divorcista? A mulher tem a garantia de seu amor, de seu lar, de seu marido, de seus filhos e do governo.
Ela não precisa da garantia da infâmia, e da perdição que vem lhe trazer o divórcio. Ela será mais feliz. E por que?
A esposa encontra a felicidade perto de seu marido, e não perto dos famigerados boêmios.
A mãe encontra a felicidade perto de seus filhinhos, e não nos bailes e nos prazeres que lhe oferecem os mercadores de seu amor.
A dona de casa encontra a felicidade na vida de família, no seu lar honrado, e não nas praças públicas, ao lado de homens sem fé e sem consciência.
A cristã encontra felicidade na prática da sua religião e não na impiedade e na libertinagem que lhe apresentam os corifeus do divórcio.
A legislação brasileira honra, protege e defende a mulher, porque esta legislação foi feita por homens que conservaram o brio de sua raça e a dignidade de sua pátria, enquanto os modernos divorcistas não passam de traidores de sua raça e de sua terra, querendo deter o seu progresso para lançá-la na barbaria dos africanos ou dos índios.
Leve a sua reabilitação para as mulheres chinesas, para as africanas, as muçulmanas, as índias, sr. Heitor Lima, e não insulte a mulher brasileira, fazendo crer que ele seja uma decaída, que precisa de reabilitação.
Mulheres brasileiras! mostrai o punho ao vosso insultador! Que de vosso seio de esposa e de mãe se levante o brado de indignação contra os miseráveis traficantes de carne humana que pretendem escravizar-vos, vender-vos e lançar-vos no lodo. É o único gesto que eles merecem. Deus tenha compaixão de suas misérias! “Perdoai-lhes, Senhor, porque não sabem o que fazem!”

XVII. Conclusão
É tempo de terminar esta polêmica. O assunto foi-se estendendo à medida das refutações. Ao iniciá- lo, eu disse, por não conhecer o sr. Heitor Lima, que, a julgá-lo pelos seus artigos, devia ser um rapazote que ainda não teve tempo de criar barba e juízo; ou então que era um doente, um monomaníaco.
A primeira parte da asserção cai, fica apenas a segunda, conforme uma notícia da “União” que acaba de me chegar às mãos.
O sr. Heitor Lima não é um rapazote, é um velho doente, senão já caducando; mas é um doente... muito doente... além de ser um pobre infeliz, tanto por ser um homem sem fé, como pelas asnices de sua vida. Sofre do despeito... é um vencido... e não há pior moléstia que o despeito.
Parece que é um desquitado; não soube viver em paz com sua mulher... ou casou sem saber com quem... efeito da leviandade. E estando louco para casar outra vez, faz-se arauto do divorcio. É lógico! Não tendo fé, não tem consciência; sem consciência não há moral; sem moral não há felicidade. Começo a compreender a coisa, ou, melhor, a mola de tanto fanatismo e cegueira.
Em vez de pensar em casar outra vez, meu velhinho, seria melhor preparar-se para morrer... e acabar, pelo menos, por uma boa morte, uma vida tão miserável como a sua, e merecer a misericórdia divina.
E a esta primeira desgraça vem juntar-se o despeito, conforme o artigo da “União”, da qual reproduzo apenas o seguinte trecho, bem significativo: “O sr. Heitor Lima sofre da moléstia do despeito. Não venceu nas eleições de 3 de Maio como “tal” representante das classes intelectuais, e por isso ataca agora o prof. Miguel Couto, que vai entrar no “Tiradentes”, queira o sr. Heitor Lima ou não queira. Quais são as credenciais de ilustração do sr. Heitor Lima? Porventura o triste fato, quando delegado no governo de Hermes da Fonseca?! Deverá S. S. se lembrar do motivo da própria demissão, que foi a consequência do “fato” supra-referido. S. S. procure outras vítimas para suas investidas. Esta música está muito gasta. Acenda uma luz, sr. Heitor Lima, porque o sr. anda no escuro! O sr. Heitor Lima escreve semanalmente nas colunas do “Correio da Manhã”. O divórcio é o seu cavalo de Troia. Mas não fica nisso; não, ataca a Deus e o mundo. Uma vez que não pode escrever mais nada sobre o divórcio em si, passa a atacar os homens que por motivos, dignos de louvor, se opõem à introdução do divórcio no Brasil. Tenha o articulista de defesa do divórcio, no “Correio da Manhã”, a bondade de expor a todos o valor e as vantagens do divórcio, com estatísticas e documentos insofismáveis! Nós podemos oferecer dados em abundância para provar a finalidade nefasta do divorcio; o sr. Heitor Lima nunca nos convencerá que o divórcio já produziu bons frutos em país algum, em que se intrometeu como um ladrão”.
Começando, eu pensava em refutar unicamente os erros grotescos e libertinos do sr. Heitor Lima; mas vendo a verdade tão ignorada, deturpada, julguei necessário, para deixar ideias claras na mente do leitor, fazer uma exposição completa da verdade. Esta exposição constituirá o assunto do artigo que seguir.
Não basta destruir: é preciso edificar. Não basta conhecer o erro: é necessário conhecer a verdade, porque os erros são muitos e a verdade é uma só.
Se me tiverem escapado, no fogo da polêmica, umas expressões mais duras e pesadas do que era mister, peço desculpas ao caridoso leitor. Não o peço, entretanto, ao sr. Heitor Lima que precisava de uma lição vigorosa, por ter atacado, vilipendiado, blasfemado as leis da natureza, as leis sociais e as leis religiosas.
A tais nulidades, que pretendem embasbacar o povo com sofismas, calúnias e falsidades, a religião levanta-se digna, mais firme, de fronte erguida para rebater os ataques, e ensinar um pouco de catecismo elementar àqueles que pretendem erigir-se mestres e e condutores sem terem nem capacidade nem saber.
Tenho respondido ao sr. Heitor Lima, cuja pessoa respeito, mas cuja perversidade repilo, e cuja pretensão ignorante revolta o nosso brio. No campo de batalha, não é com sorrisos e abraços que o soldado pretende a vitória, mas terçando armas com o adversário. As nossas armas são, da parte do sr. Heitor Lima: a ignorância, a má fé, a perversidade, a mentira e a hipocrisia; da minha parte, é a sinceridade, a lealdade, a verdade, o destemor e a fé sincera e fundada na doutrina de Jesus Cristo e de sua santa Igreja.
O leitor julgará o resultado desta polêmica, e dirá se o infame divórcio não é uma praga horrenda; — e se o matrimônio não deve ser indissolúvel como o proclama a razão, a sociedade e a lei divina!

Matrimônio e divorcismo perante a razão, a sociedade e a religião
Após a refutação das ideias bolchevistas do sr. Heitor Lima, sobre o divórcio, é necessário expor aqui, brevemente, a doutrina racional, social e divina sobre o assunto.
A Igreja combate o divórcio, porque é um atentado contra a lei natural, social e religiosa, embora tal atentado não alcance diretamente os católicos.
Estes últimos, de fato, não se contentam com o contrato civil, que tem apenas efeitos civis, mas recebem o sacramento do matrimônio. Ora, este sacramento é indissolúvel, e não é da alçada do poder civil, de modo que o católico considera sempre o casamento indissolúvel, qualquer que seja a atitude dos legisladores civis.
Entretanto, é certo que o sacramento recebe do contrato civil uma nova segurança, um apoio, embora não tenha nada de comum com ele no terreno da religião. Um católico não pode contentar-se com o contrato civil; tem de casar-se perante Deus.
Sendo assim, o contrato civil exclusivo é apenas o casamento dos que não são católicos, e nada faz à instituição divina do sacramento.
A Igreja deve, entretanto, combater o divórcio, como devem combatê-lo os homens de brio, porque a Igreja deve defender para todos a lei natural e a lei social, indiretamente ligadas com a lei divina.
Os próprios protestantes, que não têm o sacramento do matrimônio, são obrigados a reconhecer a indissolubilidade do casamento; de modo que o divórcio é, como sempre foi, o ideal, a grande aspiração dos gozadores, dos boêmios, dos libertinos, e a repulsa de todos os homens de bem. Esta, sim, é a verdade inegável.
Examinemos aqui as diversas teses, para, do meio da confusão, salientar a única tese da verdade.

I. A teoria divorcista
No fundo, apesar de todo o palavrório paradoxal dos divorcistas, o divórcio resume-se na seguinte teoria: A finalidade do matrimônio é procurar sensações, é o prazer e o gozo.
No dia em que, por uma razão qualquer, tais sensações deixarem de existir, o matrimônio não terá mais razão de ser. A ruptura absoluta e definitiva entre os cônjuges tornar-se-á a coisa mais lógica do mundo.
E os filhos? Sua educação? O escândalo? São uns tantos preconceitos! Procuro outra companheira e tenho razão.
A lama?... A lama não suja mais, visto o divórcio ter sido inventado, para que a gente possa Volver-se na lama, sem sujar-se. Conforme a lei do divórcio, não existe matrimônio que não possa ser dissolvido.
A sua esposa deixou de agradar-lhe? Não se incomode; o legislador reserva-lhe todos os meios de separação: é só escolher.
Incompatibilidade de gênio... rugas precoces...
adultério com verificação do delito, estão à alçada de todas as fraquezas, de todas as covardias, de todas as traições.
Será preciso avisar a consorte de sua repudiação?
Para quê?! basta mandar dizer-lhe por um criado: — “Madame, juntai a trouxa e saí, não vos quero mais em casa, Saí depressa, pois estou esperando uma outra que vem tomar o vosso lugar”.
Entre os romanos pagãos, isto era costume, era lei como os divorcistas querem que seja para nós. Escutem o que diz Estrabão, daqueles tempos: “Os patrícios romanos fazem entre si permutas de mulheres. Catão cedeu a sua mulher a Hortênsio; isso é costume.”
A gente casa-se na esperança de divorciar; o divórcio é como o fruto do matrimônio. Mudam a lei e não podem fazer outra coisa senão a do adultério.
Com a religião nupcial o pudor desaparece; e os mesmos homens, as mesmas mulheres que excitavam a admiração do mundo pela sua pureza, excitam agora o espanto pela luxúria: estes fantasmas de uniões passageiras, todas de prazer e de interesse, desgostam-se do matrimônio e esgotam a fonte da vida.
A população diminuiu, e Roma não teve mais soldados para defender-se contra a invasão dos bárbaros. Eis o progresso, a felicidade que o divórcio trouxe para Roma, para a Grécia, e para outros países, e que traria para o Brasil, se a perversidade do divorcismo chegasse a implantar-se entre nós.
A santidade do matrimônio é sacrificada à paixão, diante da qual todo joelho deve dobrar-se no século XX.
A luz, a civilização, o progresso, a própria ciência, parecem demonstrar que a solidez das instituições sociais está subordinada aos caprichos, às fantasias, aos apetites baixos dos homens.
Outrora, pensava-se o contrário. Ensinava-se que a salvação e a estabilidade da sociedade deviam dominar os impulsos da natureza, e que o matrimônio, em particular, era destinado a meter um freio ao furor das ondas, como diz o poeta.
Mas tudo isso, grita o divorcista moderno, era preconceito, era idiotice, era escravidão... Nada mais de peias, de quebra-ondas... Seja tudo submergido, engolfado: — tal é a lei nova.
O divorcista, para legitimar a sujeira do divórcio, raciocina como segue: A lama pode somente sujar quem estiver limpo; volvendo-se na lama... não há mais sujeira: é sujo sobre sujo, lama sobre lama; tudo fica sujo... e o contraste entre limpo e sujo não existindo mais, permanece apenas uma questão de palavras: o sujo não existindo mais, tudo é limpeza; a própria lama é limpeza...

II. A instituição matrimonial
Para bem compreender o mal do divórcio, é necessário ter uma ideia clara do que é o matrimônio no sentido cristão. Perante a Igreja católica, o matrimônio estabelece-se em uma tríplice essência:
a) Instituição natural; b) Instituição social; c) Instituição religiosa.

a) Instituição natural
É uma instituição natural, porque a constituição original da humanidade a exige para completar cada, indivíduo, dando-lhe a auxiliar semelhante a ele, de que fala a Bíblia; e depois para assegurar a nutrição da espécie nas condições suficientes ou felizes.
A indissolubilidade do matrimônio é de direito natural, porque a família é anterior à sociedade, como o homem é anterior ao cidadão.
Antes de pertencer ao Estado por um direito civil, o homem já pertence à família, por um direito natural.
Não se trata aqui de fatos, mas da natureza das coisas.
Ora, o casamento é um contrato conjugal. Este contrato consta de três partes essenciais: a união, o princípio e o fim.
A união — é a mais perfeita que se pode imaginar: é o enlace de dois corpos num só corpo, de duas almas numa só alma.
O princípio — é a constituição da família, ou ligação inseparável entre o pai, a mãe, os filhos.
O fim — é uma pessoa humana: o filho.
E não há poder nenhum, humano ou divino, que possa impedir o filho de ter com seus pais a relação de filiação e nem os pais de terem a relação de paternidade para com o filho. Ora, tais relações só têm realidade na indissolubilidade do vínculo conjugal. A dissolução da união entre o pai e a mãe importa a dissolução da união com o filho.
Na família, a união do filho com o pai e a mãe não se refere a dois seres, mas a um só.
O filho quer o pai e a mãe na unidade pessoal. Nãa quer sua mãe com um segundo marido; nem quer seu pai com uma segunda mulher.

b) Instituição social
Pelo fato de o matrimônio estabelecer-se como ponto de origem, ele torna-se uma instituição social.
De fato, se é natural ao homem contratar com uma mulher uma união duradoura, é necessário que os consortes se harmonizem, e que um regime familiar assegure, de um lado, o direito do indivíduo: e de outro lado, dê satisfação às exigências coletivas.
O divórcio é, radicalmente, contrário à lei social, porque quer desfazer o que não pode ser desfeito, isto é, a paternidade, a filiação, os vínculos de sangue que unem os indivíduos do mesmo lar e da mesma estirpe.
Tudo isso é indestrutível, como é indestrutível a árvore com suas raízes, tronco e ramos. Cortar um é matar o outro.
A família é um verdadeira árvore de vida, cujas raízes são os pais, cujos filhos formam o tronco, cujos ramos são os descendentes.
Separando as raízes, o tronco morre, e a morte do tronco destrói os ramos.

c) Instituição religiosa
Enfim, as mesmas razões farão do matrimônio uma instituição religiosa, porque a religião, legando ao homem a sua origem primária, é impossível que a religião não tome a seu cuidado o direito individual e o direito social do homem, para confirmar a ambos, pela sua autoridade.
Ora, deste tríplice fato resultam as seguintes consequências: Sendo o matrimônio uma instituição natural, segue-se que os indivíduos casados não podem vergá-la ao seu talante. Poderão entrar nela ou não entrar, mas, uma vez dentro, têm de respeitar o modo imposto pela natureza, para seu desenvolvimento.
Pelo fato de o matrimônio ser uma instituição social, segue-se que as leis devem conhecer uma instituição, em que a sociedade encontre o seu primeiro fundamento.
E pelo fato de ser o matrimônio uma sociedade religiosa, compreende-se que a religião imponha aos seus filhos, durante e depois do matrimônio, certas condições que podem parecer duras à carne, mas que motivos superiores justificam.
Tal é a concepção cristã do matrimônio. Basta compreendê-la, para ter a resposta clara e peremptória a todos os sofismas e erros dos que fazem do matrimônio um simples instrumento de prazer ou de perversidade.
Compreende-se que esta tríplice instituição não pode, de nenhum modo, ser modificada, nem pelo poder individual, civil ou religioso; só o autor destas três partes, só Deus podia derrogar esta tríplice instituição.
O russo Tolstoi escreveu, em qualquer parte, esta grande verdade: “Fora da morte, não há nada mais importante, nem mais irremediável que o matrimônio”.
Ele disse bem. Uma e outra, de fato, cada um a seu modo, fixa o destino; e se o matrimônio o fixa menos que a morte, fixa-o melhor, pois, como escreve Pascal, o homem das palavras terríveis: — “A gente morre só, mas casa-se a dois”.
A dois, e nem basta, pois a este matrimônio estão ligados os filhos, os netos e talvez gerações inteiras, que se fixam neste tremendo momento.
Eis por que só a Igreja de Jesus Cristo, só ela, contra todas as seitas e todas as paixões, tomou uma atitude firme e decidida, lançando o seu “non licet” aos legisladores e aos povos que proclamam o divórcio.
Ela ensina, ela sustenta inabalavelmente a indissolubilidade do matrimônio, como sendo o princípio da união, da felicidade, do progresso e do amor.

III. A tese sociológica
A tese sociológica abrange os elementos constitutivos do matrimônio, que são os laços que prendem os esposos entre si e os filhos. Estes laços são de seis espécies:
1) o laço natural.
2) o lago psicelógico.
3) o laço biológico.
4) o laço social.
5) o laço moral.
6) o laço fisiológico.

1) O laço natural

O regime natural das relações hétero-sexuais é aquele de uma sociedade estável, comportando uma medida de estabilidade a ser determinada por lei religiosa.
É o que se chama o regime do matrimônio, ou contrato peio qual o homem e a mulher se associam, dando-se direitos mútuos, em vista de atos determinados, aptos à propagação da espécie humana.
Eis a tese; demonstremo-la e provemo-la agora: Pode-se admitir uma certa evolução acidental ma forma do contrato matrimonial, porém a natureza do regime deve ficar intangível.
Para formular as leis e o regime que devem governar as relações sexuais, é preciso determinar o caráter natural e a finalidade destas relações; devendo estas leis e este regime participar da necessidade e da intangibilidade do próprio caráter e da própria finalidade.
Por que esta união inseparável entre estes dois elementos? Porque este regime é o meio necessário para alcançar este fim, e porque o meio deve adaptar-se ao fim.
O regime normal das relações seria, pois, aquele que exige o caráter íntimo e a finalidade deste regime. Ora, um e outro (regime e fim) exigem uma união estável, uma vida de sociedade — o matrimônio.
As relações entre o homem e a mulher tendem a um termo natural: — a aproximaçon sexual, união cuja intimidade está expressa na Bíblia: — Serão dois numa mesma carne (Gn 2,24).
Pode uma tal união existir, não sendo durável?
Não se sente uma repugnância instintiva em admitir que uma tal intimidade seja concedida ao primeiro que chegar?

2) O laço psicológico
Considerando o laço psicológico e afetivo que acompanha esta união, compreende-se que almas e corações se deem e se fundam nesta aproximaçon, com toda a força de sua liberdade e de sua paixão exaltada.
Ora, este elemento afetivo tem como corolário natural o exclusivismo e o ciúme, a vontade de conservar para si o ser amado, isto é, de formar com ele uma união duradoura, uma sociedade.
O fruto natural da união dos sexos é a produção de um novo ser vivo. Ora, as condições em que se faz esta produção mostram que, no plano da natureza, a união dos pais deve ser estável.
Homem e mulher são princípios de vida, porém são princípios incompletos, que se devem unir para completar e exercer o seu poder.

3) O laço biológico
Assim unidos, eles formam um princípio novo, único, suficiente para produzir um efeito comum: a criança.
Duas vidas unem-se para produzir uma terceira que, em sua unidade, realiza e prolonga a fusão das vidas progenitoras.
Os pais ficam unidos e identificados em seu fruto, e por isso devem ficar unidos fora deste fruto.

4) O laço social
A criança é o símbolo vivo da sociedade criada entre os pais, pelas suas relações. A este símbolo corresponde um estado de alma, em harmonia com as realidades físicas.
Ao nascer a criança, manifesta-se nos pais um sentimento particular: o sentimento da paternidade e da maternidade. A alma e o coração dos pais ficam ligados à criança, em que encontram e amam a continuação da própria vida.
Deste modo cada um dos progenitores forma uma sociedade com o seu filho. E eles encontram-se neste filho, associados para educá-lo, como foram associados para gerá-lo. Gerar e educar são dois elementos que se completam na síntese destas duas vidas.

5) O laço moral
Um laço moral vem ajuntar-se a este laço biológico.
Gerando um ser incapaz de viver sem o seu auxílio, eles se comprometem a satisfazer as suas necessidades, eles tomam a responsabilidade desta vida.
Um dever gravíssimo liga a vida dos pais à vida de seus filhos, e, tendo eles obrigações para com o mesmo filho, ficam ligados entre si, para educá-lo.
E isso não é somente em virtude das leis fisiológicas e psicológicas, mas, sobretudo, em nome das leis morais, em nome da vida da criança, em nome da existência da espécie humana; e do ato gerador estabelece obrigatória entre o homem e a mulher uma sociedade estável, condenando, sem restrição, o amor livre.

6) Laço fisiológico
E não é somente o interesse da espécie humana que exige a forma social nas relações do homem e da mulher; são também os interesses dos mesmos indivíduos; o homem e a mulher são física e moralmente dois seres completamentares um do outro, e, em consequência, exigem a vida em sociedade.
O “adjutórium simile sibi”, do Gênesis, “a auxiliar semelhante a ele” é, pois, em geral e nas circunstâncias normais, uma necessidade e uma lei da natureza. A este respeito, união livre é anti-humana.

Resumo
Eis princípios sociológicos, irrefutáveis, que ninguém pode negar e que provam a necessidade do matrimônio indissolúvel, indestrutível, formando uma sociedade estável, duradoura, entre os esposos.
Tal sociedade é exigida pela natureza e a finalidade das relações sexuais entre os esposos, finalidade que é a consequência normal destas relações.
O que prova que a razão, que exige esta sociedade, não está numa questão de fato: o nascimento efetivo do filho; não, ela está nos direitos e nos deveres, que formam as leis essenciais destas relações e as consequências normais, que são aptas a produzirem de si mesmas.
O regime que estas relações exigem dimana de sua natureza. Estes argumentos provam claramente o caráter social e estável entre o homem e a mulher, condenando, deste modo, a desordem da união livre ou da promiscuidade. Estas duas pragas não têm entre si uma diferença essencial ou de princípio, mas uma simples diferença de degrau, mais ou menos.
O regime normal é, pois, a sociedade de duração indefinida, ou o matrimônio. Este regime é imposto pelo caráter psicológico do homem e da mulher, pelos seus instintos profundos, pela necessidade da raça humana, pelo caráter social do homem em geral, e pelo caráter complementar dos sexos. A união livre está em oposição com as exigências racionais do homem, e fica condenada por elas.

IV. O divórcio excepcional
O que acabo de dizer é a condenação formal, radical e absoluta da união livre. A união livre, enquanto comporta relações hétero-sexuais sem matrimônio, é uma verdadeira fornicação, de que São Paulo disse: Sabei que nenhum fornicador receberá em herança o reino de Cristo e de Deus (Ef 5,5).
Mais uma outra questão apresenta-se aqui. Admitindo que o matrimônio seja necessário, não se pode, em certos casos, admitir o divórcio?
A resposta já está incluída nos princípios precedentes, mas sendo o tal divórcio a grande meta, o ideal dos divorcistas, convém estudar aqui o assunto em sua base, e pôr os princípios sólidos e inabaláveis da verdade. É o que vou fazer aqui.
O regime, segundo as provas supracitadas, é, pois, de absoluta necessidade; é preciso provar agora que a perpetuidade desta regime o seja igualmente. Todos estão de acordo em dizer que tal regime deve ser perpétuo, em prática, mas uns — e estes são os divorcistas — pretendem que, em certas circunstâncias anormais, tal perpetuidade comporte um direito de ruptura ou de divorcio,
Examinemos esta tese, e resolvamos o problema, não simplesmente afirmando, mas provando.
Certo é que as duas teses sendo opostas uma à outra, não podem ambas ser verdadeiras: uma é falsa, a outra é verdadeira.
E aqui assinalo imediatamente a discrepância entre católicos e divorcistas; pois este ponto de desacordo, sendo básico, conduz necessariamente a duas conclusões diversas.
Para os divorcistas, o matrimônio é um contrato bilateral, nascido do consentimento das partes; e por este título, concluem eles, ele pode, como qualquer contrato bilateral, tomar fim pelas causas que o ocasionaram.
Tal raciocínio é legalmente exato, porém a base do raciocínio é falsa...
O matrimônio, como já o disse na refutação à tese divorcista do sr. Heitor Lima, não é um simples contrato; é mais que um contrato: é uma lei da natureza, uma lei social e uma lei divina. O regime do matrimônio é determinado pela determinação de sua finalidade.
O regime perfeito não existe neste mundo, onde tudo é contingente e imperfeito; devemos, pois, adotar o regime normal, estabelecido pelo autor da natureza; e este regime normal constitui uma lei geral que rege a instituição do matrimônio.
Mas poderá esta lei geral admitir uma exceção, por certas razões graves? Sim; se tais exceções são compatíveis com o bem prosseguido pela lei; — Não, se tais exceções não podem, em prática, ser admitidas sem arruinar a própria lei.
Temos, pois, diante de nós a dupla tese da indissolubilidade e a do divórcio.

V. A tese da indissolubilidade
Examinemos primeiro a tese da indissolubilidade, para opor-lhe depois a do divórcio, para assim, pela comparação, ver aquela que pode prevalecer como sendo a tese normal, senão perfeita, que deve ser adotada.
Como já disse, o termo normal das relações matrimoniais sendo os filhos, pode-se dizer que tais relações existem antes de tudo para a espécie humana, cujo interesse geral suplanta qualquer interesse particular.
Tudo no matrimônio deve ser dirigido em vista de favorecer este interesse: nascimento, conservação e educação da prole.
Eis uma prova da premissa certa e irrefutável. Escutem agora a segunda premissa não menos incontestável: Ora, em geral, a indissolubilidade, assegurando a estabilidade da sociedade familiar, favorece a procriação sem restrição da prole, e assegura-lhe as melhores condições para educá-la, visto ser a obra combinada do pai e da mãe.
A conclusão é certa: A indissolubilidade deve ser adotada como a norma normal do matrimônio.
Ao contrário, sob o temor do divórcio, desde que este possa ser previsto como provável, os casados evitarão sistematicamente o nascimento da prole, a qual, em caso de ruptura, constituiria um sério embaraço.
Quando se produzir o divórcio, haverá geralmente prejuízo grave para a prole; a educação ficará mutilada pela ausência de um dos progenitores. É inútil insistir sobre verdades tão simples, quão capitais.
Os fins secundários do matrimônio também exigem a indissolubilidade.
Sem ela, as uniões far-se-ão levianamente, em vista de poderem ser desfeitas sem dificuldade.
Sem ela, os gozadores juntar-se-ão provisoriamente, dando-se com reserva, na perspectiva de uma futura separação.
Entre os filhos e os pais divorciados não pode haver sociedade, sendo os filhos condenados a viver separados de seus pais ou a viver como parasitas, nas novas famílias fundadas pelo pai ou pela mãe, casados pela segunda ou terceira vez.
Enfim, o divórcio será quase sempre uma injustiça, porque, enquanto um dos dois divorciados chegar a fazer-se uma nova vida, o outro, e a mulher sobretudo, ficará condenada à mais irreparável solidão.
Reflitam bem sobre esta tese, simples, mas profunda, certa e irretorquível, e vejam depois a tese do divércio.

VI. A tese divorcista
Vejamos agora a tese divorcista, não a tese dos boêmios que querem apenas o divórcio, para melhor satisfazer as suas inclinações carnais; mas daqueles que julgam que o divórcio tem uma base racional, social.
Raciocinam do seguinte modo: “O acordo de duas vontades, nascido do amor, é a razão de ser do laço conjugal, tanto de sua criação, como de sua persistência. Ora, o amor não existindo mais, de modo que as duas vontades não estejam mais de acordo, o tal laço deve desa- parecer”.
E por que deve desaparecer? Porque, dizem eles, cada um tem direito à felicidade, o direito de viver a sua vida.
Examinemos esta tese felicista e divorcista... Dizem que tem o direito de viver a sua vida. Para eles é a palavra final de toda moralidade entre o homem e a mulher; é dizer que se afastam desde o princípio da finalidade primária do matrimônio, para só querer a finalidade secundária. Não querem o encargo, querem apenas o prazer; rejeitam os deveres, para só conservar os direitos; desprezam a lei racional, para segurar apenas a lei animal. Tal princípio é monstruoso, e entretanto é o único que serve de base ao divórcio.
Para compreender o lado falso e até ridículo de tal princípio, basta aplicá-lo aos outros meios de felicidade que o mundo nos apresenta, como a fortuna, as honras, a saúde, etc.
Se o homem tem este direito absoluto à felicidade pelo divórcio, ele tem o mesmo direito à fortuna pelo roubo, às honras pelo assassínio, à saúde pelo ociosidade.
Que direito mais sagrado tem o homem que o direito à vida? Entretanto este direito é muitas vezes subordinado a deveres imperiosos que expõem a perder a vida; por exemplo: os filhos a tratar dos pais, o médico a tratar de epidêmicos, o soldado a defender a pátria em perigo.
E os esposos mal casados, desde que o amor ou a simpatia desaparecem, teriam o direito de separar-se, de divorciar-se? Mas, então, o filho, perdendo a simpatia aos pais, pode também abandoná-los; o médico, não simpatizando com o doente, pode deixá-lo morrer; o soldado, não sendo da política corrente, pode trair a sua pátria?
O princípio é o mesmo, pode ser aplicado tão bem nestes casos, como no caso do divórcio. O homem tem direito à felicidade, sim; porém. tal direito é relativo, é subordinado às imposições do dever contraído, O dever dos casados é de suportarem-se mutuamente, é de perdoarem as faltas recíprocas, e cuidarem dos filhos, de educá-los, encaminhá-los na vida; e tudo isso deve fazer-se, mesmo se o amor desaparecer.
O amor, de fato, é um auxiliar, não é um princípio.
O princípio específico da vida individual e social é a lei divina e humana, e não o capricho muitas vezes cego do amor.
O divorcio peca, pois, pela base; parte de um princípio falso, desnatura a lei fundamental, e como tal não tem direito a uma existência legal.

VII. A grande objeção
Aqui temos diante de nós a grande objeção dos divorcistas. Formulemo-la e demos-lhe a resposta exata.
Pela indissolubilidade do vínculo matrimonial, uma quantidade de infelizes, que não combinam com o consorte, está condenada a uma vida lamentável, sem outra esperança de libertação, a não ser a morte.
Tal é, em sua brutalidade, às vezes verdadeira, a objeção pessimista, e tal objeção à primeira vista impressiona; mas examinemos bem o caso, sem nada exagerar, nem nada diminuir.
É certo: a indissolubilidade sacrifica umas vidas de casados infelizes. É triste, é duro, é quase desesperador para um homem viver ao lado de uma mulher carrancuda, raivosa, linguaruda, sem carinho, sem amor, ainda mais, sem entranhas.
Não é menos horrível para uma mulher viver ao lado de um homem brutal, jogador, bêbado, grosseiro, materialista, boêmio, infiel, colérico. Basta um destes vícios para envenenar a vida de uma esposa e fazer dela uma mártir a fogo lento e devorador. É horrível!...
É um purgatório!.
E quando chegam ao ponto de não poder nem olhar um para o outro? que sentem arrepios ao ouvir a voz da consorte... que se sentem gelados ao aproximar-se um do outro... então é um inferno!... Tudo isso é horrível! Mas... mas... será verdadeiramente invencível, indomável este sentimento, este humor, este caráter?
Penso que não, pois: Neste mundo há remédio para tudo, diz o provérbio, exceto para a morte. Corrijam-se, pois, dominem o mau humor, transformem o caráter, abrandem o gênio!...
A santidade do matrimônio não está à disposição de sua perversidade: mas é a sua perversidade que deve ceder o passo e desaparecer para deixar intacta a estabilidade do matrimônio. Não é esta, aliás, a linguagem da razão e do bom senso?
O serviço militar, obrigatório para todos, deverá ceder diante da covardia do desertor?
O imposto é vexatório para os pobres, obrigados, às vezes, a passar fome para poderem pagar o que devem.
Deverá o imposto ser suprimido, por causa de uns pobres?...
Não; toda lei tem suas exceções; toda lei é dura para uns; é o que fazia dizer aos romanos: — Dura lex, sed lex!... — A lei é dura, mas é lei.
O matrimônio pode ser duro para alguns; mas é o matrimônio e o matrimônio indissolúvel, pela sua natureza, não deve e não pode amoldar-se às inclinações ou disposições de cada um. É uma lei, e a lei não deve vergar.
Por que há lares infelizes? Porque nestes lares há ausência de virtudes; entre os esposos domina a ânsia desmedida do gozo sensual.
Mas sejamos francos: deve haver lares infelizes.
A razão é muito simples. Qual é a condição da vida humana onde não há sofrimento? É impossível suprimir a dor, os desgostos, as aflições, mas nem por isso é permitido transgredir ou violar as leis sociais...
Não se pode permitir o furto porque há pobres.
Não se podem proibir as viagens porque há desastres. Não se pode deixar de alimentar-se porque há indigestões.
Não se pode deixar de dormir porque há mortes instantâneas.
Assim, também, não é permitido destruir a família, porque há casais infelizes.

VIII. Remédio, cura e morte
É certo o que acabo de expor; tais situações existem, poucas, mas existem. A indissolubilidade sacrifica umas vidas de casados, mas o divórcio estará isento destas desgraças? O divórcio deve ser um remédio, na opinião dos próprios divorcistas; — mas, há remédio e remédio; há remédio que nada faz, há remédio que cura e há remédio que mata... A estricnina é um remédio: Tomada na dose de uns 5 miligramas, cura, às vezes, a paralisia; tomada na dose de 25 miligramas, causa a morte instantânea. O divórcio é um remédio, mas é um remédio que mata. Em vez de curar o mau casamento, mata o casamento. O remédio é pior que o mal.
Mata, digo, e notem ainda que não mata o culpado, mas, sim, o inocente. De fato, são os inocentes que são sacrificados pelo divórcio; entre eles o primeiro inocente é a prole. Se o divórcio nasce das faltas dos esposos, — faltas animadas pela esperança do divórcio — um novo matrimônio será a recompensa de seu vício. É o vício recompensado na pessoa dos pais, é a inocência sacrificada, na pessoa dos filhos.
Se um dos esposos é culpado, o divórcio recompensará a sua culpa, permitindo-lhe desposar o cúmplice de suas desordens. Quem é o sacrificado? A esposa inocente e o filho.
Verdade é que, em certos casos, o inocente pede para ser libertado. No regime da indissolubilidade ele seria, pela falta do outro, uma vítima, sem esperança; no regime do divórcio, ele poderia refazer a sua vida.
Não nego esta consequência, faço notar que as vítimas, as mais interessadas, as mais inocentes, são de ordinário aquelas que, depois de tal catástrofe, pensam menos em recomeçar a sua vida.
Quem primeiro nisto cogita são aqueles que arruinaram o seu primeiro lar.
E depois, este sacrifício é feito em prol do bem comum da humanidade, que tem um interesse capital em ver protegida a união matrimonial e assegurado o destino da prole.
Quanto ao resto, inocentes por inocentes, o regime do divórcio sacrifica um maior número deles que à indissolubilidade, pelo fato de que, regra geral, ele sacrifica os filhos.
Enfim, admitindo que a indissolubilidade não ofereça um remédio radical, ela concede, pelo menos, o único paliativo, contra o grande mal da separação, enquanto o divórcio, em vez de apresentar um remédio ou um paliativo, apresenta antes um encorajamento ao culpado e um estímulo ao desenvolvimento da paixão.
A indissolubilidade suavizará a infelicidade da parte inocente e salvaguardará a prole, se existe, muito melhor que um novo matrimônio dos pais.
Em suma, a indissolubilidade assegura, melhor que o divórcio, os interesses dos filhos, aos quais tudo deve ser subordinado no casamento.
Ela protege também melhor os esposos honestos contra os culpados, embora possa, às vezes, um ou outro inocente ser sacrificado. Notem, no entretanto, que tal inocente, que é a exceção à lei, não é sacrificado pela lei da indissolubilidade, mas pela perversidade do culpado.
O divórcio, ao contrário, sacrifica os filhos e os pais, violando, deste modo, a ordem essencial do casamento.
Entre os consortes, em prática, senão em teoria, é antes a mulher, por ser a mais fraca, que é sacrificada pelo homem, seja ele inocente ou culpado; e daí é o mal que é recompensado.

IX. A exceção à lei
Após as considerações acima, é impossível que um divorcista sincero não esteja convencido de que o divórcio não pode ser sancionado como lei, e que a única lei viável, racional, social, prática, seja o matrimônio indissolúvel.
Mas há ainda uma outra saída que convém fechar também. Sim, poderão dizer eles, aceitamos a indissolubilidade como lei, como regra geral, mas por que não admitir o divórcio, a título de exceção, para os casos em que ele é verdadeiramente justificado?
A objeção tem um lado atraente, mas não tem razão de ser. Se o matrimônio é indissolúvel pela lei da natureza, como ele o é, não pode deixar de sê-lo, senão por licença do autor da natureza.
Sendo também indissolúvel pela lei divina, só o autor desta lei podia derrogar esta lei.
Ora, Deus não deixou esta licença, e decretou que o matrimônio, legitimamente contraído como contrato sacramental, fosse indissolúvel: O homem não pode separar o que Deus uniu, diz ele mesmo (Mt 19,3).
A lei natural, tal qual foi determinada, rege o matrimônio em geral, e não se determina segundo os acidentes variáveis dos casos particulares.
Além disso, as exceções na matéria presente não podem ser admitidas, sob pena de arruinar a própria lei.
Não se pode abrir uma entrada ao divórcio, por pequena que seja, por causa das paixões que estão em jogo. Abririam lugar a uma larga brecha, até derrubar o muro inteiro e introduzir o amor livre.
Os casos de divórcio, não sendo determinados senão pela lei civil, esta admitirá, aos poucos, casos cada vez mais numerosos e mais fáceis. Será um verdadeiro “quem mais oferecer” da parte dos legisladores. Breve chegarão ao divórcio por consentimento mútuo, e depois por consentimento de um só.
Com que direito, diria eu, ao juiz, no caso, o sr. recusa a um só a pretensa justiça que se concede a dois?
A questão de número nada muda aos princípios! E nada teria o juiz a responder ao meu argumento.
Logicamente, o princípio que faz admitir o divórcio deve necessariamente terminar na união livre. Hipótese pessimista! dirá alguém; não; é apenas o resultado da experiência bem verificada.
Querem uma pequena estatística? Ei-la, simples, curta, mas fulminante... Tomo-a do livro do Padre Leonel Franca.

X. Estatísticas assustadoras
Divórcio entre mil matrimônios, na Alemanha:

Anocatólicosmistosprotestantes
1895 — 19059,627,740,0
190711,126,942,0
190913,234,447,8
191114,334,947,5
191316,140,451,5

É curto, mas quanto significativo.
O número de divórcios entre protestantes é quase três vezes maior do que os entre católicos, e entre os indiferentes, é mais de quatro vezes maior.
De ano em ano o número de divórcios vai aumentando, mas aumenta sobretudo, e de modo desastrado, entre anticatólicos:
São da revista francesa “Revue de PAlliance Nationale”, edição de Janeiro deste ano, os dados abaixo, que foram extraídos de um estudo publicado na referida revista sobre o crescimento da população francesa.
Esse estudo, que é interessantíssimo, faz a estatística dos divórcios verificados de 1913 a 1929 em 20 países e assinala a progressão assombrosa observada em alguns desses países, onde a nefasta medida vai assumindo a proporção de verdadeira calamidade social.

Países19131926192719281929
Alemanha16.65734.10536.49939.4249.434
Inglaterra5772.6223.1904.0183.396
Áustria---5.7036.003
Blégica1;0272.3492.3512.3512.164
Dinamarca8011.19042.1332.3072.265
Estônia-560553566671
Finlândia273670672734855
França do esgoto14.99819.84418.15818.82210.353
Hungria-5.8585.6665.6155.162
Letônia-1.2561.1771.3103.339
Noruega501680589803791
Países baixos1.1182.3682.5712.7412.851
Romênia-7.4037.7987,6817.718
Suécia7701.7801.9732.1412.188
Suíça1.6162.2772.5073.5452.733
Thecoslováquia-5.0335.2285;4165.379
Canadá-608748785816
Estados Unidos112.036180.85392.037195.939201.468
Austrália-1.63111.8961.828-
Nova Zelândia-739722783843
Japão59.53650.11950.62649.11931.222

Entre o grande número de pessoas que no ano passado se suicidaram nos Estados Unidos, 52% eram divorciados; 26% viúvos; 12% casados e 10% solteiros.
Se pensarmos que em todo o país o número de pessoas casadas é muito superior ao número de pessoas de outros estados de vida, ainda mais clara se torna a conclusão que havemos de tirar dessa estatística.
O divórcio não traz a satisfação ou felicidade que esperam ou apresentam os divorcistas, não é uma base de felicidade, mas a destruição de uma felicidade.
É a destruição do afeto e da união que constituem o grande ideal e a grande ventura da juventude, é o rompimento da aliança firmada com tantos protestos e juramentos; é o golpe mais cruel contra os sentimentos do amor paterno.
O fruto não pode ser uma nova felicidade, mas sim o remorso, o isolamento, o enfado, o desespero.
Pelo contrário, o matrimônio indissolúvel prende os esposos e pais ao cumprimento fiel e dedicado de seus deveres e nesta dedicação encontram verdadeira felicidade e a coragem de lutar contra todas as dificuldades e suportar todas as provações da vida. O matrimônio indissolúvel é, por isto, a base sólida da ordem social e da pátria, ao passo que o divórcio é a dissolução da célula-mãe da sociedade, isto é, da família, e há de trazer como consequência a decadência do país e da nação.

XI. O divórcio e a lei antiga
Para o católico tudo está aí. Deus ordena: tem, pois, de ser obedecido. Não houvesse nem lei natural, nem lei social que o obrigasse, bastaria a lei divina para o orientar na vida.
“Pouco importam, dizia São João Crisóstomo, as leis do divórcio votadas pelos poderes seculares. Não são estas leis que nos julgarão, mas a lei divina” (Hom.
2 de Matrim).
A lei de Deus é positiva. Escutemo-la. Conheceis a primeira página da Bíblia? Deus acaba de criar o mundo sideral, mineral, vegetal e animal, e à medida que estas obras esplêndidas saem de suas mãos, o artista divino aplaude a si mesmo, e diz: Muito bem! Vidit Deus quod esset bonum (Gn 1, 25).
Cria então o homem à sua imagem e semelhança.
FÉ a mais perfeita de suas obras, entretanto não está satisfeito. Olha e diz: Não é bom que o homem esteja só; façamos-lhe um adjutório semelhante a ele (Gn 2, 18).
Mandou um profundo sono a Adão, e criou-lhe uma companheira, indicando-lhe e fazendo-o promulgar ele mesmo a lei que deve presidir a união dos esposos: O homem deixará seu pai e sua mãe e se unirá à sua mulher e serão dois numa só carne (Gn 2, 24).
É a indissolubilidade do matrimônio solenemente afirmada, e pela mesma lei é o divórcio formalmente condenado. É condenado, não porque é intrinsecamente mau, mas extrinsecamente. Os teólogos dizem: malum quia vétitum, e não vétitum quia malum.
Deus o proibiu, e eis por que é um mal. Se Deus retirasse a proibição, o divórcio deixaria de ser um mal perante Deus.
No decurso dos séculos, na lei antiga, devido à corrupção do paganismo, o soberano Legislador chegou a atenuar momentaneamente o rigor de sua lei. Tolerou o divórcio, durante algum tempo, embora com muitas reservas, para limitá-lo.
Podia fazê-lo, pois, sendo o divórcio extrinsecamente mau, o divino Legislador podia dispensar desta lei; o que não podia fazer, se fosse intrinsecamente mau.

XII. O divórcio e o evangelho
Um dia os fariseus aproximaram-se de Jesus para o tentar, e perguntaram-lhe se era permitido divorciar-se por qualquer motivo (Mt 19,3). A questão levantada era uma das mais ardentes da moral judaica.
As duas célebres escolas de Hillel e de Schammai lutavam, com acrimônia, sobre a significação de um texto do Deuteronômio (Dt 24, 1-4). Uns pretendiam que Moisés autorizava o divórcio, e outros que estava limitado ao caso de adultério.
O Salvador não se deixa prender na maliciosa armadilha. Vê mais longe e mais alto. — Então ele responde: Não lestes que, quem criou o homem no princípio, criou-os homem e mulher? e disse: Por isso deixará o homem pai e mãe, e juntar-se-á com sua mulher, e os dois serão uma só carne. Portanto, não separe o homem o que Deus juntou (Mt 19, 4-6).
A esta resposta inesperada, os auditores, surpreendidos, procuram opor a fraqueza humana: Se tal é a condição do homem a respeito de sua mulher não convém casar.
Em vão lembraram-lhe a lei de Moisés autorizando o divórcio. Jesus Cristo, cada vez mais claro e afirmativo, mostra-lhes o exagero em que laboram, “julgando ser ordenado o que tinha sido apenas tolerado por causa da dureza de seus corações, e, como tal, para evitar um mal maior, impondo limites a suas paixões, permitindo o divórcio em certas condições mais ou menos onerosas; porém, continua o Salvador, no princípio não foi assim — ab initio autem non fuit sic (Mt 19,8).
De hoje em diante é preciso voltar à indissolubilidade primitiva: Eu, pois, vos digo que todo aquele que repudiar sua mulher, a não ser por causa da fornicação, e casar com outra, comete adultério; e o que casar com uma repudiada comete adultério (Mt 19, 9).
Eis o que é claro e decisivo. Ou temos de rasgar o evangelho ou reconhecer que a lei divina, restaurada por Jesus Cristo, proclama a indissolubilidade do matrimônio.
Mesmo se a razão não prescrevesse o divórcio, teríamos de condená-lo ainda, pois uma proibição divina resolve toda dúvida.
Podia-se recusar a discussão no terreno moral, individual, familiar e social, pois há um argumento inelutável: — é a ordem de Jesus Cristo: “Não separe o homem o que Deus juntou” (Mt 19, 6).

XIII. O divórcio e a Igreja
Esta verdade é tão categórica e absoluta que, desde São Pedro até ao papa Pio XI, a doutrina e a prática nunca variaram. Às pessoas casadas, São Paulo dizia desde os albores do cristianismo: Aqueles que estão unidos em matrimônio, mando — não eu, mas o Senhor — que a mulher se não separe do marido; e, se ela se separar, fique sem casar, ou reconcilie-se com seu marido. E o marido igualmente não repudie sua mulher (1 Cor 7, 10,11).
Quando o Apóstolo assim falava não ignorava que as leis civis do seu tempo tinham a pretensão de legitimar o matrimônio dos esposos divorciados.
Entretanto, ele que pregava, em termos tão enérgicos, a obediência aos poderes constituídos, não hesitava em proclamar nulas e sem valor, em consciência, todas as leis autorizando o divórcio, porque são contrárias à lei divina: Ordeno, não eu, diz ele, mas o Senhor.
É inútil citar as solenes afirmações dos Santos Padres, dos Doutores, Papas e Concílios, defendendo a mesma doutrina através dos séculos.
Limitemo-nos a uns dois trechos das encíclicas de Leão XIII e de Pio XI, de saudosa memória. Para nós, católicos, a voz do Papa é a voz de Cristo. Perante o trono de Cristo, infalível em si e em seu representante na terra, todas as opiniões e todas as paixões devem calar-se. Não houvesse outra lei, seria o bastante a voz do Papa para dirimir todas as discussões e fazer triunfar a verdade, por ele ensinada.
E esta verdade é aquela que acabo de expor, e que encontra nas encíclicas do pai da cristandade a sua base e a sua confirmaçon.
Escutem este trecho da encíclica “Divinae Sapientiae consilium”, de Leão XIII: “O divórcio destrói a afeição mútua; fornece perigosos estímulos à infidelidade; é um embaraço à educação e à procriação dos filhos; é uma ocasião de dissolução das sociedades domésticas; derrama germes de discórdia entre as famílias; deprime a dignidade da mulher. E como nada há mais eficaz para destruir a família e quebrar as forças dos estados que a corrupção dos costumes, vê-se também que nada há mais contrário à prosperidade das famílias e dos estados que o divórcio, que nasce da perversão dos costumes dos povos. As famílias perecem, não pela indissolubilidade do laço conjugal, mas quando consideram o casamento como gozo e não um dever; quando cessam de desenvolver a força moral que resiste às paixões; quando esquecem que o fim último do homem não está na terra e que é preciso procurar mais alto a satisfação de seus desejos”.
Todos os Papas exprimem-se com a mesma firmeza, porque tal é a doutrina da Igreja de Jesus Cristo. Leiam os hesitantes esta obra-prima, monumento doutrinal, do Papa Pio XI, na admirável encíclica sobre o casamento cristão. Todos os erros estão aí refutados, e a verdade exposta com deslumbrante lucidez.
Depois de ter citado os diversos pretextos alegados em favor do divórcio, o Santo Padre conclui: “Contra todas estas insânias, fica de pé a lei de Deus, amplamente confirmada por Cristo, e que não pode ser abalada por nenhum decreto dos homens, opiniões ou vontade dos legisladores: Não separe o homem aquilo que Deus uniu (Mt 19,6). Se o homem injuriosamente tenta separá-lo, o seu ato é completamente nulo, porque o próprio Cristo afirma: Todo aquele que repudia a sua mulher e casa com outra, comete adultério, e quem casa com a repudiada é adúltero (Lc 16,18). Estas palavras de Cristo referem-se a qualquer matrimônio, mesmo somente natural e legítimo; pois, de fato, é próprio de todo o verdadeiro matrimônio aquela indissolubilidade, em virtude da qual ele fica subtraído completamente, quanto à dissolução do vínculo, ao arbítrio das partes e a todo poder civil. Deve relembrar-se igualmente aqui o solene juízo com o qual o Concílio Tridentino (sessão 24, cânon 5) feriu de anátema essas coisas: Aquele que disser que o vínculo do matrimônio pode ser dissolvido pelo cônjuge, por motivo de heresia, de molesta coabitação ou de ausência simulada, seja anátema”
Tal é a linguagem divina de Cristo e de sua Igreja, dos Concílios e dos Papas. Linguagem nobre, majestosa, eterna, que domina os espaços e os tempos e contra a qual nunca prevalecerão as portas do inferno.

XIV. As dispensas católicas
Temos a resolver uma última objeção; e esta é decisiva para a mente dos divorcistas. Acusaram a Igreja católica de anular casamentos a peso de dinheiro.
Devagar! Para acusar alguém, é preciso, pelo menos, qualquer prova. Ora, os divorcistas não encontrarão na história verdadeira um único caso em que a Igreja católica tenha anulado um casamento legitimamente contratado e consumado. As histórias falsificadas citam destes fatos, porém são puras invenções de maldade, são calúnias sem fundamento.
Não se deve confundir anulação de um casamento com declaração de nulidade.
Um médico, encontrando um doente, diagnosticando-o, não anula a saúde do doente, mas declara apenas a existência da moléstia.
Assim faz a Igreja. Examina o fato do casamento; e como pode haver casamentos nulos por falta de consentimento, que deve ser anterior, livre, manifestado, absoluto, simultâneo, legítimo e atual, pode acontecer que umas destas qualidades substanciais do consentimento faltem.
Depois do exame rigoroso, encontrando qualquer falta essencial, a Igreja declara autenticamente que o matrimônio não existiu, que o contrato nunca foi válido.
Isso nada tem de comum com uma ruptura do laço existente ou divórcio.
De fato, existirão realmente anulações de casamentos? Não. Há, em primeiro lugar, o privilégio paulino, do nome do apóstolo que o promulgou (1 Cor 7,12-15).
O matrimônio entre os infiéis, mesmo consumado, é declarado nulo de pleno direito, quando um dos cônjuges se converte, o outro ficando na infidelidade e recusando uma coabitação pacífica.
Haveria ainda declaração de nulidade, quando, depois de um casamento entre fiéis, antes da consumaçon, um dos cônjuges se consagrasse solenemente a Deus; porém tal caso é antes teórico que prático.
Último caso: o matrimônio não consumado, dos fiéis, pode, por motivo graves, ser declarado nulo pela autoridade suprema da Igreja. É um poder recebido de Jesus Cristo.
Mas notemos bem, mesmo tais exceções não são propriamente ditas uma anulação, mas sim a manifestação de uma nulidade, ou ainda uma separação, uma espécie de desquite.
A indissolubilidade, de fato, não é alterada pela separação da união e de habitação, mas só pela anulação do laço matrimonial, que é o divórcio.
A Igreja declara apenas que não houve sacramento do matrimônio, e não tendo havido sacramento de ambos os lados, não passa de um contrato natural; de outra parte, o tal contrato pode, em certos casos, ser anulado em favor da parte que recebeu o sacramento, mas isso só pela autoridade religiosa, nunca pela autoridade civil.
Uma vez recebido validamente o sacramento, e os esposos tendo tido união conjugal, nenhuma autoridade, religiosa ou civil, pode romper este vínculo, Nunca Roma desliga alguém nestas condições.

XV. Os exemplos históricos
Numerosas são as calúnias dos protestantes, sobretudo contra a firmeza da Igreja católica em manter a santidade do vínculo matrimonial... mas convém notar: são calúnias, citam Papas, citam datas, citam fatos, mas sem prova nenhuma; são todas meras invenções sem fundamento e sem aparência de verdade.
Temos muitos exemplos da resistência dos papas às exigências do poder; não temos nenhum exemplo de fraqueza ou concessão criminosa.
Citemos apenas os seguintes fatos: No século IX o Papa Nicolau I resiste a Lotário, rei de Lorena, que havia repudiado a sua mulher, Teutberga, com o fim de desposar Waldrada. E nada fez vergar a firmeza do Papa; nem as ameaças, nem o assédio de Roma feito pelo imperador Luís II, irmão de Lotário.
Mais tarde, são os Papas Celestino III e Inocêncio III que se levantam contra o rei Filipe Augusto, que repudiou a sua esposa legítima, Ingelburga, para casar-se com Inês de Meran. O Papa Celestino declara publicamente ilegal, nula, a sentença de ruptura; enquanto o Papa Inocêncio III, seu sucessor, lançou o interdito sobre o reino da França. Em vão Filipe Augusto promete fazer uma cruzada para obter o divórcio. A lei de Deus antes de tudo, respondeu-lhe o Pontífice.
O rei Filipe I deu a seus súditos o exemplo de todos os vícios. Repudiou a rainha Berta, sua esposa, pretendendo casar com Bertrada, que raptou a seu marido Fulco.
Julgava extorquir à custa de promessas e ameaças a licença do Papa, porém o soberano Pontífice sustentou os direitos do matrimônio e da justiça.
Depois de ter avisado paternalmente a Filipe, o Papa ameaçou-o de excomunhão, ameaças que foram executadas mais tarde pelo Papa Urbano II, no concílio de Clermont.
O mesmo abuso da parte do imperador da Alemanha, Henrique IV, e a mesma firmeza da parte do Papa Gregório VII.
E quem não conhece a firmeza do Papa Clemente VII com Henrique VIII da Inglaterra?
Se o Papa tivesse consentido a repudiação de Catarina de Aragão e o casamento da Ana Bolena, talvez a Inglaterra inteira teria ficado católica em vez da separação heresiarca protestante. Havia aí em jogo um interesse máximo. Pouco importa: A lei de Deus antes de tudo. O Papa não cedeu.
Uns objetam o divórcio de Napoleão com Josefina, e seu matrimônio com Maria Luísa. É falso. A Igreja nunca ratificou este ato. Quando o Papa Pio VII conheceu o fato, protestou vivamente contra a legalidade da sentença de divórcio, pronunciada pelos oficiais de registo de Paris. E este protesto foi tão bem compreendido que treze cardeais presentes em Paris recusaram assistir à celebração do dito casamento no Louvre.
E assim por diante. Em face das paixões dos príncipes como em face dos povos, a Igreja ficou firme, afirmando a lei divina. Esta lei divina, promulgada desde a origem do mundo e restaurada por Jesus Cristo, proclama a indissolubilidade absoluta do matrimônio e condena o divórcio.

XVI. Conclusão
Grandes questões passaram diante de nossos olhos, durante a exposição das verdades tratadas. Tenho procurado ser claro, inteligível, ao alcance de todos, pois estou convencido de que os divorcistas pecam mais por ignorância que por perversidade. Não é bastante ter ideias superficiais sobre estes grandes assuntos da atualidade; é preciso conhecê-los a fundo.
A doutrina católica não teme a luz da ciência e do bom-senso, e nem os raciocínios dos filósofos; ela teme apenas a ignorância e o vício.
Se os divorcistas não são viciados, mas apenas ignorantes, as provas citadas em defesa da tese devem convencê-los de que estão errados e que as idéias por eles espalhadas são contrárias à natureza, à sociedade e à lei de Deus.
O simples bom-senso mostra-nos o divórcio como uma lepra vergonhosa que tem desonrado a história, e que perverte a sociedade e a família,
Quando se estuda a vida dos povos antigos que adotaram o divórcio, não se pode impedir um sentimento de nojo, à vista dos excessos em que têm caído.
Descobriram em certos papiros do Egito o contrato de matrimônio, estipulando a união para um ano.
Entre os judeus, o Talmud chegou a permitir ao marido repudiar a mulher, pelo fato de ela tér deixado queimar a sua refeição.
Na Grécia, viram-se maridos dar suas mulheres aos amigos e até aos escravos: tal Péricles, Sócrates, e outros.
Por isso ouviu-se ecoar no meio do teatro popular este brado deprimente: Entre todos os seres vivos, nós, mulheres, somos a raça mais miserável!
Assim aconteceu na Roma pagã, e assim se dá em todos os países em que penetra o divórcio. Os dois sexos rivalizavam de libertinagem e de inconstância... Os maridos repudiavam a mulher, como alguém se liberta de um sapato que o fere ou incomoda.
E os modernos divorcistas chamam isso progresso, liberdade, emancipação da mulher, quando é simples e brutalmente o regresso ao paganismo estúpido, à escravidão, à prostituição e ao adultério público.
Não! não! o divórcio não corresponde às aspirações do coração humano; não passa de uma lepra nojenta, de uma praga horrenda.
O matrimônio deve ser a doação mútua, amorosa, que fazem de si dois seres humanos. Ora, a experiência no-lo atesta: o coração destes dois seres não pode estar satisfeito se esta doação não for total e perpétua.
Dar-se pela metade, alugar-se para um tempo, eis o que contraria as justas exigências do amor. Só o matrimônio indissolúvel corresponde às aspirações profundas do coração humano.
Pode ser que não sejam estes, sob a influência das paixões, os sentimentos de tal ou tal indivíduo; porém. são bem os sentimentos da alma e da verdadeira natureza humana. Ora, é a natureza humana que faz aqui a lei, e não os indivíduos isolados, que devem submeter-se à lei geral.
Querer regulamentar a sociedade em vista de uma minoria de degenerados, é procurar a regra naquilo que deve ser o objeto. E chamam isso progresso! A ciência chama isso regresso! E não venham falar de outros países. Cada país tem coisas boas, mas tem também coisas ruins. Imitemos o que ele tem de bom; deixemos o que tem de ruim. O homem não vive de imitação; não é macaco; ele vive de princípios: — é um ser racional.
Em certos países há, também, o alcoolismo, a jogatina, a prostituição, a criminalidade, o bolchevismo. Será preciso então imitar tudo isso?
Existem também os selvagens: polinésios, africanos, hotentotes, zulus, e todos eles praticam o divórcio.
Uma nação deve viver de princípios. O Brasil deve ser brasileiro, e não americano, russo ou africano.
Temos a nossa civilização, nosso progresso, nossa raça, nossas glórias e nossos ideais, e tudo isto vale bem o que têm os outros países.
É o eterno pessimismo patriótico. Tudo o que é do estrangeiro é belo e bom, e o que é brasileiro não presta.
E isto é dito por brasileiros! Mania de desprezar o que é nosso, para engrandecer o que é dos outros. São os antípodas do patriotismo.
A Itália não é hoje inferior a nenhuma nação, e ela não admite o divórcio.
O divórcio, diz muito bem um jurista italiano, E. Cenni, é um mal absoluto. Por si não tem entidade, não sendo mais que a morte do matrimônio...
Não é um bem, e nunca poderá sê-lo. Nasce da corrupção dos costumes. Não é possível justificá-lo aos olhos da religião, da moral, da filosofia, do direito e da razão.
Não se pode admitir o divórcio como instituição civil, porque é contrário à natureza e é antijurídico.

Conservei-me o mais possível, nesta polêmica sobre o infame divórcio, ao ponto de vista da observação simples, para demonstrar melhor, e como fazer tocar com o dedo a identidade entre a lei da Igreja e a realidade; entre o ensino da experiência e o da revelação divina.
Em seu esforço para conservar-se a natureza social termina precisamente a regra de que a religião fez um dogma: — o dogma da indissolubilidade do matrimônio. Não separem, pois, os homens o que Deus juntou. Tal é a lei intangível de Cristo; e ela é profundamente sábia, justa e racional.
O homem não tem o poder de reformar o plano divino... e querendo reformá-lo, deforma-o e o destrói, e isso para sua desgraça e para a desgraça da sociedade; e eis a razão por que a família é hoje abalada e a sociedade vacila.
Terminemos estas considerações pelo solene protesto contra o divórcio, que deve ser o brado unânime de todos os homens de bem e de ideal.

XVII. O “brado católico”
Devia dizer o brado da natureza, o brado da sociedade, o brado da lei divina, pois tudo isso se une num único brado para protestar contra a decadência, a imoralidade, o abuso do divórcio. Católicos do Brasil inteiro, protestai contra a infâmia do divórcio, porque:

É a decadência de um país;
É a lei da libertinagem;
É o código da escravidão;
É a ruína da pátria;
É o cancro da sociedade;
É a perversão da moralidade;
É o triunfo da devassidão;
É a porta do adultério;
É o inimigo da paz doméstica;
É a desmoralização da família;
É a morte da fidelidade conjugal;
É a extinção do amor mútuo;
É o rebaixamento da mulher;
É a escravidão da esposa;
É o desterro da mãe;
É a desgraça dos filhos;
É a excitação ao suicídio;
É a provocação do assassínio;
É a causa dos infanticídios;
É o abandono dos filhos;
É a devassidão dos maridos;
É a recompensa da infidelidade;
É o veneno do matrimônio;
É a suspeita dos esposos;
É o entorpecimento do amor nobre;
É o desamparo da orfandade;
É o ciúme, o ódio e a vingança;
É a limitação da natalidade;
É a sanção do crime;
É a beira do precipício;
É a perda do pudor;
É o reino da imoralidade;
É a entrada do amor livre;
É o interesse da brutalidade;
É a divisão das famílias;
É a ilegitimidade dos filhos;
É o ideal do egoísmo sensual;
É a lama da voluptuosidade;
É o lodo fedorento das paixões;
É o ideal do bolchevismo;
É a chegada do anticristo.

Protestai todos contra o divórcio! Deus o quer!
O divórcio é contrário à lei da natureza.
Repugna à lei social;
É proibido pela lei de de Deus;
É condenado pela Igreja;
É contrário aos costumes cristãos;
É contrário às esperanças brasileiras.
Abaixo o infame divórcio!
O matrimônio é e será sempre indissolúvel.

 

DÉCIMO TERCEIRO LAMPEJO
A moral sexual

Refutação de um livro perverso
Um distinto amigo apresentou-me um livro “Moral Sexual”, da lavra de um médico do Rio, o dr. José de Albuquerque, tendo anotado à margem certas idéias e certas opiniões que julgava errôneas. As anotações denotam muito bom senso, muita imparcialidade e um espírito sinceramente cristão.
Percorri o livro, superficialmente, — pois não quero brincar com fogo — e encontrei nele ao lado de idéias boas, de demonstrações científicas, um acervo de idéias perniciosas, fanáticas e preconcebidas.
É bom lembrar o velho adágio: Cada macaco em seu galho. Enquanto o dr. José de Albuquerque trata de medicina, revela-se um homem inteligente e entendido; infelizmente não soube limitar-se a este ramo tão vasto, e pretende dogmatizar, atacar a Bíblia, a Igreja, os Padres e até os dogmas mais sagrados da nossa santa religião; aqui — permita-me o dr. José de Albuquerque dizer-lhe a verdade — aqui se revela de uma ignorância estupenda, de uma pretensão sem limites, de uma fatuidade de bobo de circo.
A medicina, meu caro doutor, é uma ciência séria, que exige muitos estudos — mas a religião é também uma ciência, e uma ciência sagrada, que exige muito mais preparo, muito mais estudo, e que não se deixa penetrar senão pela assistência divina.
Para penetrar verdades divinas, é preciso uma luz divina, e esta luz é dada pela fé sincera, que parece lhe faltar completamente, a julgá-lo pelas suas elucubrações mal equilibradas.
Permita-me, pois, o dr. José de Albuquerque analisar aqui umas das inúmeras asnices contidas em seu livro, asnices que não deviam sair da pena de um homem sincero, que se diz cultor da ciência e propagandista da verdade.

I. Moral sexual empírica
No prefácio do livro citado, o dr. José de Albuquerque diz muito bem: “Toda vez que me abalanço a empreender o estudo de qualquer assunto, o faço sem ideias preconcebidas; sem simpatias, nem antipatias pelas doutrinas, teorias ou conceitos, que a elas se refiram”.
Se isso fosse sincero, o dr. não teria escrito o que escreveu, nem dogmatizaria sobre verdades que ignora redondamente. A imparcialidade é uma qualidade necessária para um escritor, mas a qualidade essencial é o saber, é o conhecimento do assunto que se quer tratar.
Enquanto o dr. José de Albuquerque se limita à ciência por ele cultivada, revela-se mestre, mas desde que quer entrar em terreno exegético, teológico e até moral, mostra-se uma criança sem preparo; — uma criança que julga saber, mas que nada sabe; e isso é um crime quando se trata de assuntos que se ligam à religião e à vida moral do homem.
No mesmo prefácio o autor diz que a sua finalidade é determinar o que, em ciência sexual, se entende por moral e imoral. Muito bem! mas um médico devia ficar na parte fisiológica e não percorrer a Bíblia, para citar exemplos de imoralidades, dando-os como exemplos de moralidade, dando a textos falsificados uma Significação que absolutamente não possuem.
Mas vamos por partes; e citemos os erros enunciados pelo distinto clínico, mas péssimo moralista.
No terceiro capítulo de seu livro, o dr. José de Albuquerque escreve: “Toda moral sexual deve se assentar sobre dados científicos. As que se apoiarem no empirismo ou forem frutos da moral religiosa, que por sua natureza é empírica, além de não poderem ser universais, terão um período de duração efêmero”.
Tal frase mostra a mentalidade empírica do autor e a sua ignorância religiosa. Tal raciocínio é de criança ou de um obcecado. Então, só os cientistas podem ter moral, os pobres analfabetos, que ignoram o mecanismo da fisiologia sexual, são todos uns imorais! Pena é que tais frases saíram da pena de um homem que se diz médico.
Diga-me, caro doutor, quem é o autor do organismo humano? É Deus! E o autor da religião verdadeira?
Deus ainda. Ora, como é que Deus pode estar em contradição em duas obras que emanam de suas mãos?
Deus fez o homem e Deus fez a grande lei moral, que é o Decálogo. Como pode haver antagonismo entre a obra e o legislador? Toda moral verdadeira nada tem com a ciência, mas, sim, com a lei divina.
A lei divina domina a ciência, como a certeza domina a dúvida, como o absoluto domina o contingente e como o fato domina a hipótese.
Um ato é moral quando concorda com a lei divina, e não com as leis das ciências que, muitas vezes, são hipotéticas, pois toda ciência progride, se desenvolve; enquanto a regra moral é de uma imutabilidade completa, porque é divina.
As ciências se dirigem à inteligência; — a moral dirige-se à vontade; ora, um ato da inteligência é distinto de um ato da vontade. Nihil volitum, nisi praecognitum, dizem os filósofos, A. inteligência precede; a vontade segue, de modo que sem consentimento voluntário e deliberado não há ato humano, ou ato moral, enquanto pode haver ato da inteligência involuntário e indeliberado.
E Nada direi dos absurdos que o autor vai buscar nas leis antiquadas, no Kama-Sutra, no Alcorão, no Savary e outros autores sem moral, para apresentar-nos conceitos “que ninguém aceita nem repele, porque são conceitos“ de povos incultos e ignorantes, não passam de imposições sem moral e sem ciência. Não é preciso ir tão longe.

II. Adão e Eva
0 nosso ilustre esculápio foi meter o no até no paraíso terreal, para aí descobrir erros graves na pessoa de nossos primeiros pais. Pena é o Pai eterno não ter consultado o grande dr. José de Albuquerque - antes de criar os nossos primeiros pais... ah! então, sim, a coisa teria sido outra: a inteligência fulminante do médico teria dado lições formidáveis ao próprio Deus.
Com ares de exegeta, o Doutor empírico escreve: “Na Bíblia, um fato é muito demonstrativo de sua empírica moral; é o que se encontra no Gênesis, com o nome de pecado original”.
E o ilustre médico faz acreditar que o pecado de Adão e Eva foi um pecado sensual, e que por terem praticado um ato conforme as leis biológicas, foram castigados por Deus.
Pobre Doutor, parece até que nunca viu uma Bíblia! Qualquer criança de nossas escolas lhe dirá que o pecado de Adão e Eva foi um pecado de desobediência à proibição de comer o fruto de uma árvore proibida (Gn3) e nada mais.
Foi um pecado de orgulho, e não um pecado de sensualidade, o que é muito diferente.
Isso é muita igorância, caro doutor, para um homem que diz escrever somente depois de estudar muito. Estou duvidando muito de seus estudos, e um pouco de sua capacidade.
Desculpe-me, sim, a franqueza; mas à mentira é preciso opor a verdade e à ignorância, a instrução.

III. Sodoma e Gomorra
O nosso esculápio quer absolutamente apoiar suas idéias errôneas sobre a Bíblia e para isso baralhou tudo, sem nada entender.
Outro pedacinho interessante: “Ló na sua velhice habitou com suas duas filhas. Estas últimas cometeram um duplo incesto — foi um crime contra a religião, e contra a moral”.
A Bíblia cita o fato, não para aprová-lo, mas para mostrar a corrupção da raça humana.
E o nosso doutor a exclamar que Deus abençoou este crime! Onde ele viu isto? Não sei..., deve ter sido em sonho!
Não, meu caro doutor, a Bíblia não aprova estes fatos; conta-os como exemplo de perversidade, mas sem aprová-los: — condena-os como incestuosos pelas duas razões que a sua moral sexual cita: pela consanguinidade e pelo estado de embriaguez. A sua moral sexual nada inventou, mas copiou apenas o que a religião condena neste fato.
A sua moral veio muito tarde, doutor; há oito mil anos que os homens já conhecem e praticam o que o sr. quer ensinar-lhes hoje, como novidade de sua invenção... Não merece prêmio de invenção, não!

IV. Labão e Jacob
De asnice em asnice, o doutor quer provar a sua tese, e prova apenas a sua ignorância religiosa.
É a Bíblia, que ele não compreende, que deve pagar o pato e o vinho. Jacob pretendia casar-se com Raquel, filha de Labão. — O pai enganou o pretendente e fê-lo casar com Lia, a filha mais velha, sob pretexto de que era costume casar em primeiro lugar as mais velhas.
Jacob ficou trabalhando mais sete anos para merecer a mão de Raquel que muito amava; e depois deste tempo, recebera também Raquel como esposa. É uma cena dos costumes patriarcais dos primeiros tempos.
O nosso doutor fica escandalizado e exclama: “Quanta imoralidade resume esta página!” Imoralidade em cabeça de ignorante, doutor, não em um espírito sensato e a par da história daqueles tempos. A monogamia é doutrina primordial, modificada depois do dilúvio por simples tolerância e restabelecida por Jesus Cristo.
A poligamia existia, pois, no Antigo Testamento; era tolerada, não prescrita; como lemos no Êxodo, o texto que o doutor devia ter lido antes de gritar pelas imoralidades da Bíblia. Leia bem, doutor: “Se lhe tomar outra (mulher), não diminuirá o mantimento desta (da primeira) nem o seu vestido, nem a sua obrigação marital” (Ex 21,10).
E ainda lemos no Deuteronômio: Quando um homem tiver duas mulheres, etc. (Dt 21,15).
Tal era a lei dos judeus; não é a lei dos cristãos, pois Cristo aboliu este ponto, restaurou o matrimônio na unidade e indissolubilidade primitivas.
Ciente destes princípios, o doutor compreenderá (se quiser compreender) que não houve nenhuma imoralidade da parte de Jacob, em casar-se com a filha mais nova (Raquel) de seu sogro Labão.
Não valia a pena dar tão altos gritos por tão pouca coisa. Só para manifestar a sua ignorância da lei antiga.
O dr. Albuquerque ignora, de certo, que David e Salomão tinham grande número de esposas e de concubinas, senão teria gritado a não poder mais sobre a imoralidade destes reis. É que ele julga a sociedade antiga pela moderna, e a lei antiga, patriarcal, pela lei de Jesus Cristo.
A primeira era a figura da segunda, imperfeita, incompleta e incomparavelmente inferior à lei da caridade, promulgada por Jesus Cristo.
Mas temos mais outro escândalo. O nosso doutor é uma alma cândida e pura a que tudo escandaliza. Cada uma das duas esposas de Jacob quer ter mais filhos que a outra, e daí novas cenas; entram em jogo as concubinas ou servas das esposas.
Para nós tudo isso seria escandaloso, é certo; porém, deve-se julgar os fatos conforme os tempos e os costumes; e, como já disse, é preciso julgar os fatos antigos, não pelo microscópio moderno, mas pela lei e a tolerância daqueles tempos primitivos.
Tal tolerância, para facilitar e apressar o povoamento do universo, tolerava a bigamia e a poligamia, como vemos na lei de Moisés e nos costumes dos patriarcas.
Sendo tolerado não há, pois, nenhuma imoralidade; pois não há discrepância com a lei moral divina.

V. Falsificação dos textos
Até aqui o dr. José de Albuquerque derramou, à vontade, a bílis de sua ignorância religiosa, envolta na baba de sua impiedade, sobre as páginas do Antigo Testamento. Parece que devia, pelo menos, ter poupado a santa e imaculada Mãe de Jesus!...
Mas não; “a lesma suja tudo que toca”, é assim que o apóstolo da “moral sem moralidade” quer macular a própria Mãe de Deus.
É inútil, doutor: “Quem cospe para o céu, o cuspo lhe cai sobre o nariz”.
Escutem o que ele escreve, ou melhor, o que ele baba (pág. 54): “Outra passagem da bíblia, eivada também de imoralidade, é a que se refere ao nascimento de Jesus Cristo”.
A passagem é conhecida: A Virgem Santa devia dar à luz o Filho de Deus, concebido em seu puro seio por obra do Espírito Santo. São José, desconhecendo o milagre operado por Deus em favor de sua santa esposa, vendo-a grávida, e não querendo difamá-la, resolveu deixá-la secretamente; mas conservou-a por ordem de Deus, que lhe revelou que o que nela estava gerado era obra do Espírito Santo.
a Tudo isso é claro, e conhecido por todos. Agora o “nosso doutor vai derramar sobre este admirável mistério o duplo veneno de sua ignorância e de sua impiedade. Notem bem a conclusão. Ele continua: “E José, “despertando do sono, recebeu sua mulher, mas não a conheceu senão depois que deu à luz o seu filho”.
Por que, meu caro doutor, além de não compreender o texto citado, falsificá-lo, e fazê-lo dizer o contrário do que diz? Isto é de falsário!... Isto é indigno de um homem de pergaminho, que pretende dirigir e instruir os outros. Se tivesse consultado, pelo menos, um evangelho católico, teria encontrado o seguinte texto, de significação radicalmente contrária à do seu texto falsificado: “E José, despertando do sono, fez como o anjo do Senhor lhe havia mandado, e recebeu a sua mulher. E não a conhecia até que ela deu à luz o seu filho (Mt 1,25).
V. S. sabe ler e escrever; faltam-lhe, apenas, a sinceridade e a instrução religiosa. Diga-me pois qual a diferença que há entre estas duas citações:
1) Não a conheceu, senão depois que deu à luz o seu filho.
2) Não a conhecia até que ela deu à luz o seu filho?
É a tradução literal do latim: Et non cognoscebat eam donec peperit filium suum.
A oposição é completa. A primeira citação nega um primeiro fato e afirma um segundo. A segunda citação nega absolutamente o primeiro fato e nada diz do segundo.

VI. Exemplos elucidativos
É como se alguém dissesse: Não tomei café senão depois do meio dia: — e outro: não tomei café até meio dia.
O primeiro afirma ter tomado café depois de meio dia. O segundo nega ter tomado café, desde a manhã até meio dia, sem afirmar ter tomado depois; — diz apenas o que não fez.
Na linguagem vulgar, tais expressões encontram-se a cada passo. Por exemplo: o dr. José de Albuquerque escreveu asnices antes de estudar. Isto não prova que ele tenha estudado depois.
Ainda mais: Este homem morreu antes de casar-se: — Provará isto que ele se tenha casado depois de morto?
Ou ainda: Operou-se a cura deste doente, antes que se aplicasse o remédio. — Quer dizer isto que o tenha aplicado depois de ele estar curado?
Só o dr. José de Albuquerque pode sustentar tais absurdos. Pois bem, este é o sentido da passagem citada.
A aludida frase: José não a conhecia até (antes) que ela deu à luz o seu filho (Mt 1,25). Esta frase indica que se operou um efeito, sem a intervenção de sua causa natural e ordinária.
O evangelista nos mostra que Jesus Cristo foi gerado de modo singular e prodigioso, sem que os dois esposos tivessem coabitado, donde não se pode inferir que coabitassem depois.
Eis o que é claro, e o que é moralíssimo... infinitamente acima da “moral imoral” do nosso dr. José de Albuguerque.

VII. Puereza e virgindade
O nosso impagável doutor quer mais imoralidade ainda, para provar a sua incomparável moral moderníssima, Escutemos o que escreve, em outras palavras, o que blasfema: “Ainda uma outra imoralidade que decorre do nascimento de Jesus Cristo, é a que se refere a Maria ter se conservado virgem, antes do parto, no parto e após o parto”.
E o incomparável doutor, feito teólogo, pergunta:
“Maria deixaria de ser pura, se desse à luz a Jesus, como todas as demais mulheres?”
E como conclusão, o homem escreve: “É o que parece que a Bíblia quis demonstrar com essa passagem, considerando impuro, e, quiçá, imoral, o ato do parto, como ele o é, e até mesmo, como seu corolário, toda a maternidade, que se processasse, da forma pela qual se processou a da Virgem Maria!” Isso é fenomenal! Meu caro doutor, que bela lógica, que silogismo, que dialética!... e isto foi inventado em 1930, no Rio de Janeiro!
É de pasmar! Mas, enfim, a Bíblia já o disse: doctrina stultorum fatuitas (Prov 16,22).
Primeiro, caro doutor, deixe de falsificar os textos.
— Isto é indigno de um homem educado. Aqui não se trata só de pureza; trata-se de virgindade, o que é completamente outra coisa.
Maria santíssima é virgem antes do parto, no parto e após o parto, como o sr. disse linhas acima.
E depois de falar de virgem, v. s. começa a falar de pureza. Será ignorância ou maldade?
Uma moça pura é virgem, como uma virgem é pura; — porém, sendo casada, é diferente: uma senhora casada, fiel a seu marido, mãe de família, é pura, mas não é mais virgem. — Compreendeu esta diferença?
A virgindade é uma qualidade absoluta; a pureza é relativa; de modo que a pureza de virgem é diferente da pureza de uma senhora casada; cada uma pode ser pura em seu estado próprio.
Não se trata, pois, aqui de desprezar o matrimônio, que é um sacramento, chamado por São Paulo “grande sacramento”, mas de salientar a virgindade perpétua da Mãe de Jesus.
Tiremos a conclusão: Maria santíssima podia ter dado à luz o seu filho, como todas as demais mulheres, e ficar pura, pois era casada, porém deixaria de Ser virgem, não seria mais a virgem Maria.
A Bíblia não quer, pois, ensinar que as outras mães sejam impuras mas que Maria santíssima, além de pura, é virgem, e que o fruto do seu seio puríssimo é obra de Deus e milagre acima das obras humanas.
Estamos, pois, em frente de um grande milagre.
Ora, caro doutor, o milagre é uma exceção às leis da natureza... Como é que v. s. quer explicar um fato, acima da natureza, pelas leis da natureza?
Isto é impossível! Seria querer comparar o organismo humano vivo, a um aparelho mecânico morto.
O aparelho mecânico segue necessâriamente a marcha automática de suas peças; — o organismo vivo, sendo voluntário, segue a imposição da vontade, que é superior às leis da matéria.
Um gramofone, em condições normais, deve transmitir a voz gravada em seu disco. — A voz do homem reproduzirá o som, se quiser e do modo que quiser.

VIII. Conclusão
Se v. s. tivesse estudado um pouco melhor, e isso é da medicina, a psicologia e a fisiologia, não escreveria tais asnices, indignas de um homem de estudo e de saber.
Está vendo que a sua nova moral sem moral, que não passa de ignorância e de blasfêmia, não alcança o trono de pura e imaculada Virgem Maria; e a todos os seus esforços, para buscar o sol resplandecente que o ilumina, não produz outro efeito senão aquele que produziria um morcego, quando quisesse interceptar a luz do sol.
A ignorância, caro doutor, faz sorrir e evoca compaixão e não convence a ninguém! As suas pretensas imoralidades bíblicas não passam de uma descrição subjetiva, de si mesmo, que mostra o estado mórbido de sua alma e o estado ignorante de seu espírito.
Medice, cura teipsum (Lc 6, 23). Cuidado... que as imoralidades descobertas não sejam o reflexo da alma que as descobriu! In quo enim judicas, teipsum condem- nas, eadem enim agis quae judicas (Rom 2,1). Leia bem isto, sr. doutor.

 

DÉCIMO QUARTO LAMPEJO

A continência e a moral


O nosso dr. José de Albuquerque, ao envergar a túnica de teólogo, julgava, sem dúvida, enfeitar-se com penas de pavão; infelizmente deixou perceber as plumas da gralha, fazendo tristíssima figura sob esta plumagem emprestada. Dizia o velho Fedro:
Contentus nostris si fuisset sedibus, Nec hanc repulsam tua sentiret calamitas.
O médico foi um tristíssimo teólogo. Vamos ver se o teólogo não será melhor médico... pelo menos de “bom-senso” e de dignidade.
Na discussão passada rebati uma das mil asnices, ignorâncias e impiedades, contidas no livro Moral Sexual.
Para este esculápio puríssimo como os anjos do céu, tudo é imoral, desde os nossos primeiros pais, até à pura e imaculada Mãe de Jesus; o fanático moralista encontra manchas e nuvens em todos e em toda parte. Em acreditá-lo, só ele, e ele somente, entre os mortais, é o ser privilegiado, desconhecendo o pecado, como desconhece a virtude, ignorando o mal, como ignora o bem; versado em todos os ramos da ciência humana, como parece, pelos títulos de seus livros, versado em tudo o que é podridão e imundície.
Tudo é relativo neste mundo; o urubu faz seu festim daquilo que afugenta as outras aves; há passarinhos que sugam o mel das flores e há outros que chupam a podridão dos estrumeiros.

 I. Novos ataques de ignorante
Assim, há médicos para os quais a medicina é um verdadeiro sacerdócio, uma coisa santa; e há outros que a consideram como um meio de corrupção e de vinganças.
Após o que tenho refutado no artigo precedente, relativo à Sagrada Escritura e à santa Mãe de Deus, a ninguém causará espanto que o mesmo médico ataque a continência e o celibato dos padres católicos. Isto já era de prever. Julgou encontrar nova carniça... e mostrou mais uma vez a sua estupenda ignorância, não mais da Bíblia, mas até das leis e funções biológicos, que pretende estudar e ensinar aos outros.
Que um médico seja um péssimo teólogo e um horrendo exegeta, passa ainda; mas que seja um ignorante das leis fisiológicas, psicológicas, e até patológicas, isto não se desculpa.
Pois bem, não só afirmo isso, mas quero prová-lo aqui cientificamente, mostrando que, em toda a exposição do seu livro, não há senão fanatismo, ódio e ideias preconcebidas, ignorando até os princípios mais comezinhos de uma ciência que pretende revelar aos outros.
Passo em silêncio muito pontos do seu livro nojento e refuto apenas as passagens indicadas pelo amigo, que mandou o tal livro, pedindo a refutação das passagens anotadas.

II. A continência em face da moral
É o título de um assunto que o dr. empírico pretende tratar do alto do seu grande saber. O capítulo abre-se com relâmpagos e trovões; falta só a faísca elétrica. Parece Moisés do alto do Sinai, bradando a lei de Deus ao povo idólatra, prostrado diante do bezerro de ouro. Só há uma diferença: é que aqui é o bezerro que brada contra Deus e contra os homens.
Escutemos o grande “princípio de toda sabedoria” ditada pelo doutor: “Toda vez que um indivíduo, em gozo pleno de sua saúde, se entregar ao regime da continência, incide num grande delito de moral sexual”,
De um tal princípio vê-se logo onde o furibundo empirista quer acabar. O certo, meu caro doutor, é que v. s. não incide neste delito, — não há perigo — acalme os seus relâmpagos... Quem escreve tais princípios de moral mostra logo que não está em pleno gozo de sua saúde... mental. O princípio não é, pois, aplicável a v. s., que está fora de combate neste ponto.
Agora escutem a continuação. É de tirar-se o chapéu!
“Acarretando a continência a degradação física, moral e mental do indivíduo... torna-se um atentado inominável à biologia (atenção à casa dos expostos, doutor) que um indivíduo hígido de corpo e de espírito se submeta voluntariamente, oferecendo seu organismo a tão nefanda obra de degradação, ou, como dizem, com garbo e com ufania, de mortificação”.
Uma tal explosão de indignação termina, naturalmente, pelos padres... não pelo dr. José de Albuquerque, que nunca, talvez, soube resistir ao brilho da podridão. Ele continua: “Um dos motivos que levam os padres da Igreja a se votarem voluntariamente à continência, e mesmo à mortificação a que procuram submeter o corpo... é... intolerável, aberra de toda ética, é injustificável, é imoral, imoralíssimo”.
Atenção, doutor, ao manicômio! Tal esforço pode seriamente abalar os seus nervos, já fracos. Nos manicômios há pouquíssimos padres, — mas há muitos que não gostaram, nem gostam da continência!
Após um esforço tamanho, o nosso dr. deve ficar de camisa ensopada de suor. Vá, doutor, tomar um banho para refrescar a cabeça... depois raciocinaremos.

III. A continência e a castidade
Refuta-se um erro, ensina-se um ignorante, repele-se uma afronta, despreza-se um doido. Não sei o que devo fazer no caso... Penso que é melhor ensinar o ignorante, pois o caso é para isto, e v. s. é mais tolo que ruim.
O que o nosso dr. nega, eu devo afirmar, mostrando que a continência é uma virtude que os libertinos não sabem praticar, naturalmente, que tal virtude é possível, e até útil; que favorece o pleno desenvolvimento físico, moral e intelectual do homem.
É uma coisa: procurarei ser breve num assunto tão longo. Para evitar mal entendidos, em que cai continuamente o nosso dr. convém dizer que a Igreja católica entende por continência a abstenção completa, no indivíduo normal, do exercício das funções sexuais.
Para nós, continência implica castidade, e sem esta julgamo-la uma utopia. Claro está, portanto, que, por continente, não tomamos um indivíduo que, privando-se do exercício normal das funções genitais, se entregue ao vício solitário ou a outros piores.
A continência assim definida, na sua significação teológica, que abrange o afastamento dos maus pensamentos, más intenções, profanação da vida, do ato sexual, esta continência nunca trouxe e nunca trará inconveniente algum a quem a pratica. “Nunca vi uma doença sequer causada pela castidade”, diz o sábio Mantegazza (Higiene do Amor).
“Esta continência é uma virtude sublime que eleva o homem acima do seu egoísmo, dando-lhe força para moderar e regular seu apetite natural”, diz o dr. Mario de Vilhena (Continência e seu Fator Eugênico).
“Sim, diz Foerster, em Problema Sexual, a castidade é hoje privilégio daqueles que são levados por um heroico amor à sua prole ou por força de convicções religiosas e filosóficas”.
Seria instrutivo, sem dúvida, tratar dos pormenores, da higiene física e moral necessária para a prática da continência... pode-se até dizer, higiene absolutamente necessária, porém tal assunto é delicado e para poucos bem compreensível. O nosso dr. nos compreenderá, como compreenderá talvez que é por causa das ocasiões de perigos, de tentações e excitações a que se expõem certas pessoas, que lhes é moralmente impossível a continência. O divino Mestre o disse: Quem se expõe ao perigo, nele perece.
Vamos, pois, às autoridades, para provar a possibilidade da continência ou da castidade.

IV. A castidade é possível e é útil
Ninguém pode citar uma única prova séria e fundada contra esta asserção. A afirmaçon contrária é um preconceito anticientífico, irreverente e blasfemo.
“Não venham dizer, diz Gibergues, que a castidade é contra a natureza. Também a obediência, a paciência, a caridade, o trabalho, a fraternidade, todas estas admiráveis virtudes são contrárias à natureza, contrárias ao egoísmo de cada um. Mas são belas, convenientes, necessárias; combatem os germes viciosos e os princípios de morte, que existem entranhados na pobre natureza humana; e desenvolvem todas as aspirações nobres e generosas. Assim a castidade.”
O dr. Luís Antunes Serra, professor da universidade de Coimbra, disse: “Posso afirmar-vos que não se lê em parte alguma de literatura médica, autenticamente científica, nada absolutamente que vá de encontro à castidade”
E tal é a opinião de todos os médicos sérios e conscienciosos que escutam a voz da ciência em vez de escutar a voz da libertinagem. É tão certo que, em alguns países, por exemplo na Holanda, as professoras de instrução primária são obrigadas ao celibato. E, ainda agora, o conselho municipal de Londres decidiu que as médicas não sejam admitidas nos hospitais da Inglaterra, desde que venham a contrair matrimônio.
E ninguém se escandalize, pois o sábio médico Georges Surbled não receia escrever: “O celibato, por ser necessário, não pode ser nem impossível, nem perigoso”.
E ao mesmo tempo, afirma: “Os males da incontinência são conhecidos, incontestados, mas os resultantes ruins da castidade são imaginários, são inventados” (Celibato e Matrimônio). »
E Fonsagrives confirma, escrevendo: “As estatísticas despidas de toda prevenção deixam ver que a continência voluntária, em vez de ser perigosa, é antes a origem de grande vigor físico e de grande energia moral”.
E assim por diante, caro doutor. É inútil prolongar estas citações. A continência é o espantalho dos libertinos... e a glória dos homens de caráter e de dignidade. Para mim, eu penso que médico que ataca a continência dá prova insofismável de sua nulidade e de sua corrupção.
O dr. Paulo Good diz mais ou menos a mesma coisa. Escreve: Os que dizem o contrário fazem pornografia médica, mas são indignos do nome de servidores da ciência.

V. A continência e o bom-senso
Não é com talco ou pó de arroz que se enfeita a inteligência, como se enfeita o rosto; precisamos de um pouco de raciocínio, e não de palavrório oco e altíssono, sobretudo numa obra que pretende ser científica, como a do dr. José de Albuquerque.
Temos no organismo humano diversas funções fisiológicas, umas necessárias, outras úteis, Entre as necessárias figuram a digestão, a absorção, a respiração, a circulação do sangue e da linfa. Entre as úteis figuram a função dos sentidos e a de geração.
Não discutimos das primeiras; o seu não-funcionamento é causa certa de moléstias e até de morte, porque todas são essenciais à vida.
Quanto às funções simplesmente úteis, eu desejava que o ilustre clínico me provasse que o homem seja obrigado a fazer uso delas.
Vejo o que quero ver, e minha vista nada sofre, nem age contra a ciência visual, se eu baixar os olhos diante daquilo que não quero ver.
Ouvindo uma música agradável, escuto; — um ruído enervante bate no tímpano: tapo as ouças; e as ouças nada perdem com isto.
Um cheiro agradável acaricia a pituitária olfativa, cheiro; mas um cheiro nauseabundo atinge o olfato: tapo o nariz; e o organismo olfativo nada sofre com isso.
E assim adiante com o paladar e o tato: nada sofrem com a abstenção ou o não-exercício de seus respectivos órgãos.
As funções da geração são necessárias para a procriação, como os olhos para a vista, porém não são necessárias à vida, como não são necessários os olhos para viver.
Ora, se não são necessárias para a vida pessoal, nenhum inconveniente pode advir de seu não-funcionamento, como nada advém pelo mau funcionamento dos outros órgãos, simplesmente úteis.
As pessoas casadas e honestas podem, à vontade, usar ou abster-se de usar do matrimônio, e deste modo ter ou não ter filhos (pela completa abstenção). Por que então haveria obrigação de usar de uma função simplesmente útil, mas não necessária?
Por que, ó doutor? Não há perigo que o mundo pereça por falta de filhos. Haverá sempre bastantes casados que se encarregam do povoamento do mundo, para que possam viver em paz aqueles que não se sentem atraídos para o casamento, ou que por amor de Deus renunciam aos prazeres sensuais para entregar-se inteiramente a Deus e às almas.
Isso não é para todos, caro doutor. Nem o sr. seria capaz disso; porque lhe falta a fé e o amor de Deus: — bases indispensáveis para conservar-se continente e casto.

VI. Degradação e imoralidade
Depois do simples raciocínio do “bom-senso”, sem recorrer ainda às provas patológicas, o raciocínio supra seria o suficiente para abater as muralhas de seu castelo de erros e de aberrações, e mostrar, claramente, que a continência é uma virtude sublime, em vez de ser, segundo o seu palavrório, uma degradação intolerável, aberrando de toda ética, injustificável e imoral!
O que é degradação intolerável, inexplicável, são as as suas opiniões eróticas, lúbricas e francamente imorais, imoralíssimas. Que pode haver de mais “imoral que estimular os instintos perversos da humanidade, acariciar inclinações sensuais, e fazer acreditar que o homem não passa de um animal? O animal segue o instinto da sua natureza; o homem deve seguir as leis de seu Criador e não os apetites desordenados de gozo e de prazer.
O que é imoralíssimo, doutor, é querer tirar da frente do homem o que ele tem de mais nobre, de mais sublime: o ideal de uma vida espiritual. O homem sem ideal é um retrógrado! o homem sem religião é um monstro — o homem sem moral é um animal.
E v. s., como médico, tem a triste coragem de querer rebaixar o homem em nome da ciência; e de fazer acreditar ao público que uma virtude que o sr. não sabe praticar seja impraticável para os outros.
Isso não, doutor! O sr. não pode julgar os outros por si. o seu metro moral descrito em seu livro é curto demais, para medir a virtude de homens de brio e de fé. Pode gemer sobre a corrupção pessoal, mas não negar a virtude dos outros!
Como conclusão desta prova, eu lhe peço apenas que nos prove, cientificamente, que o homem não seja livre de usar de órgãos que o Criador lhe deu para utilidade, e não para a necessidade. Prove-nos que temos obrigação de tudo ver, de tudo ouvir, de tudo cheirar, de tudo gostar, de tudo apalpar. Provando isto, poderemos concluir que temos a obrigação de procriar.
Evitando o mal? Isto é apenas o lado negativo de nossa vida: Declina a malo et fac bonum (SI 36,27).
O lado positivo é: fazer o bem. Este bem é a luta contra as nossas inclinações perversas, fruto do pecado original; é, sobretudo, a continência, a castidade, a prática de uma virtude celestial que faz do homem um anjo, enquanto o vício oposto faz dele um demônio.
O livro em questão — fazendo acreditar na impossibilidade da castidade — ensina a imoralidade, porque o homem, perdendo o ideal do aperfeiçoamento, cai necessariamente no abismo do vício. Ele não pára: ou sobe ou desce; ou vai a Deus ou cai nas garras do demônio.
Isto compreendido, será mais compreensível a terceira parte da refutação e a sua conclusão final.

 

DÉCIMO QUINTO LAMPEJO
O celibato e a castidade

A refutação ao livro “Moral Sexual” está feita.
Tenho provado que o livro, em questão, é uma obra indigna e francamente imoral, Nenhuma de suas opiniões desastradas sobre a religião fica em pé: é uma limpeza completa.
O que falta agora é construir, sobre as ruínas do castelo imaginário do clínico empírico, o edifício da verdade católica. É a parte principal, é a conclusão destas discussões. Veremos como médicos e teólogos estão em pleno acordo sobre o caso da continência. Provemos, em primeiro lugar, que a continência é possível.

X. Possibilidade da continência
Será possível a guarda da continência? Sim, sim e sim; e não somente é possível, mas é salutar, e não causa dano a ninguém: só danifica a cabeça do dr. José de Albuquerque. Eu desejaria que o ilustre médico me provasse que existe uma necessidade sexual! Prove isto, doutor. O ensino fisiológico é que existe apenas um estímulo sexual.
Há necessidades físicas e higiênicas no homem, as quais absolutamente devem ser satisfeitas.
Pode protelá-las, por algumas horas, porém não por muito tempo. Há necessidade de comer, de beber, de defecar, de urinar, de dormir. São necessidades criadas pelo vácuo ou pela repleção do órgão próprio, e estas necessidades têm de ser satisfeitas.
Mas a experiência prova e a medicina confirma que o desejo sexual pode desaparecer, embora permaneçam cheias as ampolas; e mesmo pode persistir, depois de elas serem esvaziadas, por simples influência psíquica.
Que prova isto? Prova, evidentemente, que não há necessidade, mas simplesmente estímulo sexual. Não havendo necessidade, o homem é livre de fazer ou de omitir; e sendo livre ele é dirigido pela sua vontade.
E este estímulo será tão forte que o homem não possa resistir? Não, nunca! Sem falar aqui da graça divina que se alcança pela oração, pode ser abafado por processos derivativos, por considerações morais, pelo raciocínio, pelo trabalho.
Negar isto, seria negar as primeiras e máximas autoridades médicas que o nosso doutor devia conhecer.
Anos atrás, houve um apelo de vinte universidades alemãs (Alemanha, Austria e Suíça), confirmado pela Conferência Internacional de Profilaxia de Bruxelas, que reconheceram e proclamaram aos quatro ventos, não só a inocuidade, mas também a necessidade da continência.
Uma autoridade de primeiro valor, como é James Forster Scott, escreve: “A continência está em perfeita harmonia com a boa saúde. É errônea a crença, tão extensamente divulgada, de que a conservação da saúde requeira como condição imprescindível o exercício das funções sensuais” (Sexual instinct, p.95).

XI. Opiniões médicas
Ilustres clínicos, de fama mundial, e por centenas, repetem as mesmas opiniões. Citemos apenas umas, para envergonhar o nosso empírico doutrinador imoral.
O dr. Hericourt diz ser um preconceito achar a castidade difícil.
O dr. Surbled afirma que o celibato nem é difícil, nem perigoso.
O dr. Francotte protesta contra o que dizem em nome da ciência (como o nosso doutor) que a continência é impossível e nociva.
O grande neurologista alemão Gower declara: “Com toda a força de meus conhecimentos, da autoridade de minha experiência, sustento e afirmo que não existe homem algum, nem jamais houve, que no grau mais insignificante haja sofrido por guardar a castidade ou haja melhorado de algum padecimento por deixar de observá-la”.
Sir James Paget escreveu: “A castidade não é nociva nem ao corpo, nem à alma. Sua disciplina é preferível a qualquer outra. Nada é mais funesto à longevidade, nem diminui tão certamente o vigor da vida, nem favorece tanto o esgotamento como a falta de castidade na juventude”.
Mantegazza, professor de antropologia, diz: “Nunca vi uma só doença produzida pela castidade. Todos os homens, e particularmente os jovens, podem experimentar os benefícios imediatos da castidade: A memória é rápida e persistente, o pensamento vivo e fértil, a vontade enérgica e o caráter firme”.
Napheys exclama: “Condenamos energicamente como doutrina assaz perniciosa, firmada para servir o mal e encorajar o vício, a teoria que acredita haver um prejuízo qualquer no celibato castamente observado. Nenhuma condição da vida é mais completamente de acordo com o vigor físico e mental como a continência absoluta”.
Perier, de Paris, assim se exprime: “É uma ideia singularmente falsa e que é preciso combater, porque ela reside não só no espírito dos adolescentes, mas ainda no dos próprios pais, a ponto de os autorizar a tomar parte na má conduta de seus filhos: é a idéia dos perigos imaginários de uma continência absoluta. A virgindade dos jovens é uma salvaguarda física, moral e intelectual”.
Jullien, de Paris: “Foram definitivamente enterradas as famosas doenças da continência. A pureza jamais fez mal a ninguém; ela conserva os seres sãos, cheios de vigor, aos quais o casamento prodigalizará suas doces alegrias”.
Os médicos dos hospitais e os professores da Faculdade de Medicina, de Nova-York, unanimemente proclamaram: “Verificando a extensão dos sofrimentos, as doenças físicas, os resultados de uma deplorável hereditariedade e o mal moral, inseparáveis de uma vida impura, nós nos unimos para declarar que a castidade — isto é, uma vida pura e continente para ambos os sexos — é conforme às melhores condições de saúde física, moral e mental”.
A esta mesma conclusão chegou a “sociedade alemã para a luta contra as doenças venéreas”.
A Faculdade de Medicina da Universidade de Cristiânia, na Noruega, teve ensejo de publicar esta magnífica declaração, que tanto realce dá aos que a assinaram: “A asserção, feita recentemente por diversas pessoas e repetida pelos jornais e nas assembleias, de que uma vida moralizada e uma continência perfeita são maléficas para a saúde, é absolutamente falsa segundo a nossa experiência, o que afirmamos unanimemente; não conhecemos nenhum caso de moléstia e nenhuma espécie de prejuízo que possamos atribuir a uma conduta perfeitamente pura e moralizada”.
Em 1902, reuniu-se em Bruxelas, pela segunda vez, a Conferência Internacional de Profilaxia Sanitária e Moral, a qual aprovou, por unanimidade, o seguinte voto: “É preciso ensinar à juventude masculina que não somente a castidade e a continência não são nocivas, mas ainda que estas virtudes são as mais recomendáveis sob o ponto de vista simplesmente médico e higiênico”. Assinaram esta bela proposição todos os representantes das 14 nações reunidas em congresso e que eram: Alemanha, Bélgica, Brasil, Bulgária, Chile, Estados-Unidos, França, Itália, Japão, Noruega, Holanda, Romênia, Rússia e Suíça. Aí figuraram notabilidades como Lassar, Wolf, Neisser, Gailleton, Landouzy, Halloupeau, Tiberghien, Bertarelli, Peroni, Pawoloff, sendo nosso delegado o saudoso patrício e médico dr. Bruno Chaves.
O dr. Leonel Besle, professor de anatomia patológica da universidade de Londres, escreve por sua vez: “Nunca é demais repetir que a abstinência e a pureza mais absoluta são perfeitamente compatíveis com as leis fisiológicas e morais, e que a satisfação dos desejos genitais não encontra justificativa na fisiologia e na psicologia, como tão pouco se aprova pela moral e pela religião”.
Dr. Nopheys diz: é de ver nenhuma condição da vida está tão de acordo com o vigor físico e mental, como a continência absoluta.
Dr. Seved Rebbeng, professor de universidade, na Suíça, com 20 anos de prática médica, não encontrou um indíviduo ao qual a continência fosse impossível.
Dr. Faré escreve: Os que são capazes de castidade psíquica, podem guardar a continência.
Dr. Maegné: A continência pode sempre ser observada.
Dr. Isch Wall, de Paris: Para evitar os perigos de desmando, a continência é o único preservativo eficaz.
Dr. Querat: É necessário repetir bastante que a castidade não é em nada prejudicial... para a juventude, até pelo contrário.
Dr. Fourier, especialista em moléstias sifilíticas, diz: Tem-se falado, sem critério e levianamente, dos perigos da continência para os jovens. Confesso-vos que, se estes perigos existem, não me foi possível conhecê-los, e que eu, médico, não pude ainda até hoje verificá-los, embora me não hajam faltado casos de observação, onde poderia facilmente verificar.
Dr. Guibert faz esta judiciosa observação: “Desejais observações pessoais (da utilidade da continência)?
A vossa castidade terá arruinado alguma vez a vossa saúde ou dificultado o vosso trabalho? Na roda de vossos conhecimentos tereis observado pessoas cuja boa conduta está acima de qualquer dúvida; houve porventura alguma cujo vigor vital viesse, por motivo de castidade, a sofrer? Não tendes ouvido atribuir à pureza a força e a longevidade dos monges? Olhai para a categoria inferior, para os animais domésticos, aos quais o homem impõe a continência; tornam-se eles, por isso, menos robustos ou menos úteis?”
Dr. Naphez: Condenamos energicamente, como doutrina perniciosa, posta ao serviço do mal, e para estimular a pior forma do vício, a teoria que propugna que de um celibato, castamente conservado, possa resultar um dano qualquer (Transmissão de Vida).
Dr. Good: Terminemos estas citações por uma réplica veemente, à altura do ataque do nosso dr. José de Albuquerque, do ilustre dr. Good: “Tenho, muitas vezes, em razão da minha profissão, relações com missionários e sacerdotes e pude convencer-me de que a observância absoluta do voto de castidade não traz inconveniente algum. Desafio-vos a encontrar, em toda a história da medicina, em qualquer povo, uma enfermidade, uma só, ouvi bem, ocasionada pela continência. Percorrei as bibliotecas, consultai todos os médicos, dignos desse nome, em ambos os hemisférios, e se me apresentardes um testemunho assinado por um homem abonado, uma página de um livro sério, com autoridade na matéria, que faça menção de uma única enfermidade, motivada pela continência, eu, no mesmo instante, queimarei estas páginas... Não é sem motivo que digo: livros sérios e médicos dignos de tal nome. Uma literatura pseudo-médica explora a curiosidade mórbida de certos jovens e repete aforismos mais ou menos equivalentes ao preconceito vulgar: “É mister deixar passar a mocidade”, tudo isso para lisonjear as secretas paixões dos leitores, para aumentar o número das edições de seus livros. É uma pornografia médica, nunca, porém, merecerá o título honrado de serviço ou glória da ciência” (Higiene e Moral).
E assim por diante, podem-se citar centenas e centenas de asserções médicas em favor da continência em relação à saúde; só se encontram em oposição os devassos  e libertinos que, julgando os outros por si, procuram esconder sob a capa da ciência as imundícies de sua vida, e procuram convencer-se de que todos os outros fazem como eles; que poderá objetar contra isso o autor do imoral libelo: “A Moral Sexual”? Nada, senão mentiras e asserções frenéticas sem provas.


III. As vantagens da continência
Não somente a continência não prejudica a saúde, mas é até imensamente vantajosa, tanto para a inteligência como para o corpo. Citemos aqui a resposta que, sobre este assunto, deu o dr. Tanner de Abreu a L. P. M. atacando celibato: “Da observância da castidade, escreve ele, resultam benefícios corporais e intelectuais. São benefícios corporais o resguardo da saúde, muito especialmente contra a infecção sifilítica e blenorrágica, ambas de funestíssimas consequências, e a poupança de força nervosa; pois, como é sabido, a função genésica é a que maior soma destas forças consome e gasta. — Os benefícios intelectuais podem ser demostrados, praticamente, pela exemplificação. E eu mesmo, tendo sido consultado sobre este delicado assunto, tive oportunidade de acompanhar de perto a observação, entre outros, de dois casos exuberantemente probantes das grandes vantagens intelectuais que dois distintos jovens colheram da observação virtuosa da continência. De cada um deles eu posso afirmar que foi primus inter pares nos estudos acadêmicos. Hoje ambos ocupam posição eminente no mundo intelectual brasileiro”.
Muitos exemplos podiam-se citar de longevidade e de conservação da inteligência, pela prática da castidade; e nenhum exemplo se encontra de conservação prolongada entre aqueles que se entregam à famosa moral sexual, já descrita.
E fato conhecido por todos: os homens, que melhor conservam a saúde, a força e a inteligência são os padres e os monges, pelo fato de guardarem a castidade. Nos conventos da Europa, de Ordens rigorosíssimas, como os trapistas, encontram-se continuadamente religiosos robustos, fortes, sadios, em plena possessão de uma inteligência lúcida, contando perto, senão mais, de cem anos de idade.
Onde encontrá-los, no mundo, entre aqueles que satisfazem os seus apetites sensuais? Não existem.
Estes são fatos de experiência; — os dados fisiológicos não são menos expressivos e certos.

IV. Provas fisiológicas
Poderíamos retomar a comparação já citada do dr. Guibert; é um fato típico. O homem é um animal racional, dizem os filósofos. De fato, temos na parte animal do nosso ser todas as necessidades dos animais.
Ora, — desculpe-me, caro dr., o vulgar de comparação — quando um fazendeiro quer possuir um animal forte, robusto, resistente, seja boi ou cavalo, que faz ele?... Pela castração condena o animal à continência.
E este animal, de fato, se torna mais robusto, mais resistente e até mais longevo.
Ora, do lado do corpo, o homem participa das disposições dos animais. Como é que a continência robustece, engorda e fortifica o animal inferior e torna-se prejudicial ao homem? Explique isto, caro doutor...
Então a continência é boa para os animais e é nociva para os homens? O animal ressente as mesmas inclinações sexuais que o homem. Tirando-se-lhe a possibilidade de satisfazê-las, melhora consideravelmente a sua existência — enquanto o homem dotado de vontade, fazendo voluntariamente o que se impõe a este animal, arruinaria a sua saúde?
Pobre doutor! É muita cegueira! muita obcecação, ou então muita ignorância!... Uma tal ciência não pode ser aceita nem por um roceiro ignorante, que lhe apresentaria o exemplo de qualquer um de seus bois ou cavalos!
- E o roceiro teria razão... Parece entender mais medicina que o sr. doutor. A sua medicina é retrógrada de quatro mil anos. É fácil provar, fisiologicamente, as vantagens da continência:
O dr. Gley, em seus estudos (pág. 696), faz notar que o esperma contém quantidade de 20 por cento de cálcio. O uso do matrimônio faz, pois, perder quantidade de cálcio, produzindo aos poucos a descalcificação do organismo, preparando, deste modo, o caminho à invasão da tuberculose. A conservação deste cálcio só pode causar benefícios ao organismo.
O dr. Roger faz notar por sua vez que o não-funcionamento das glândulas exócrinas provoca o funcionamento das endócrinas, que dão aos nervos vigor e agilidade (Intr. à P Etude de la Médicine, p. 276). É a razão por que os lutadores boxistas, ou corredores e até futebolistas, conservam-se continentes debaixo de um regulamento que lhes veda toda intemperança.
Se o físico aproveita com a conservação da castidade, muito mais o aproveita o moral.

V. O celibato clerical
O que precede é o bastante para refutar as demais loucuras científicas (pobre da ciência!... tem as costas largas!) de tal “moral sexual” de um homem fanático, que enxerga tudo através do prisma multicor, da corrupção e da impiedade.
No capítulo: “O celibato em face da moral”, o triste cientista exclama enfaticamente: “O celibato obrigatório, imposto pela religião aos padres, não é justificado por nenhum fato de ordem moral, dele advindo, tanto para os clérigos, como para os fiéis, prejuízos não pequenos: aos primeiros pelos padecimentos a que se expõem pela prática destes regime, aos últimos, pelo fato de que, enfermo o mentor espiritual de suas almas, os fiéis se “veem privados da assistência regular, que se lhes fazia mister”.
Obrigado: doutor, pelo seu zelo em cuidar da existência dos fiéis. Vê-se que v. s. pouco recorre à direção do padre, pois observaria que geralmente os padres gozam saúde física, moral e intelectual.
Tal celibato, doutor, não é imposto pela Igreja; é livre e espontaneamente aceito pelos clérigos, pois ninguém é obrigado a ser padre; querendo sê-lo, eles já sabem que devem aceitar a prática de castidade.
Quanto aos prejuízos e moléstias do celibato, só existem em sua cabeça. Há 56 anos, caro doutor, que eu, o seu contendor, prático a castidade — e pratico-a mesmo séria e lealmente — e, entretanto, não sofro de nenhuma moléstia; sinto-me forte e robusto; e sem ser de uma inteligência talvez do brilho da de v. s., tenho ainda idéias bastante claras para refutar todas as asneiras que v. s. escreve, asneiras que denunciam a fraqueza de um cérebro pouco equilibrado, sem ter talvez alcançado a minha idade.
Isso, entretanto, é contrário a todos os princípios de seu livro, que se pode chamar infantil, pois aberra de todas as leis científicas e experimentais conhecidas, e adotadas por pessoas sérias e criteriosas.
E o que digo de mim, posso dizê-lo do meio milhão de sacerdotes celibatários, continentes e castos, todos eles em pleno gozo de saúde intelectual e mesmo física.
Procure uma vez opor-lhes meio milhão de pessoas casadas, para ver de que lado está a saúde e a longevidade.

VI. Contradições absurdas
Não revelo todas as contradições das asserções infantis do livro perverso em questão, porém há uma, que convém salientar aqui para mostrar a irreflexão e a falta de seriedade com que foi escrito este livro.
O autor admite (pág. 90) que o mundo eclesiástico tem dado muitas cerebrações. E ele responde: “A explicação deste fato reside no seguinte dado de observância regular: é que os clérigos mui raramente se sujeitam à continência, absoluta”.
Está enganado, meu caro doutor. Em qualquer agremiação há traidores, é certo; mas o que é mais certo ainda, é que não há corporação mais casta, mais inteligente, mais sadia e mais longeva, do que o sacerdócio católico; e isso então será o resultado da corrupção, de falta de continência?
É admirável isso! A medicina nos mostra consequências desastrosas e horríveis dos excessos venéreos: sífilis, blenorragia, cancro mole, com seus acidentes, epidemite, cistite, conjuntivite, artrites, irite, endocardites, enquanto ela não cita nenhuma moléstia proveniente da continência, nenhuma, nenhuma. Por favor, caro doutor, cite-nos a lista das moléstias, já observadas, pela abstenção das funções sexuais; nós, ignorantes na matéria, estamos todos prontos para receber as suas admiráveis descobertas.
Não basta bradar no deserto, e gritar que “o celibato religioso é imoral, vai de encontro às leis da ciência e às necessidades individuais e coletivas” (pág. 91), “que os clérigos estão sujeitos a tantos padecimentos”, Isto são fanfarronadas de taberna; cite-nos uma moléstia oriunda da castidade, sim?... uma só!...
Mostre-nos uma morte causada pela castidade, sim?... uma só... enquanto eu lhe mostrarei milhares e milhões feitas pelo excesso ou até pelo simples abuso de moral sexual. Fanfarronada não é medicina, doutor... é bobagem!
Sim, há no clero cerebrações extraordinárias, por ser o clero continente e casto; enquanto entre os gozadores da vida não se encontra senão embrutecimento e ignorância.

VII. Um abraço de Satanás
Outra falsidade... não digo mentira, porque é fruto da ignorância. Diz que o celibato foi prescrito por Gregório VII, para cortar os abusos do clero, e só pôde ser aplicado no fim do século XIII. A chegar ao século XIII, v. s. podia ajuntar mais uns séculos e dizer que foi invenção do século XIX. Um pouco mais de tolice, nada fazia ao caso. O certo é que não foi o dr. José de Albuquerque que inventou o celibato, nem o praticou, como não o recomenda... e eis a razão de sua cerebração ser tão pequenina, tão estreita e tão contraditória.
Está redondamente enganado, caro doutor. O celibato, a continência, a castidade são de invenção divina; são obra moral, divina, de Jesus Cristo.
Jesus Cristo foi celibatário, foi continente, foi casto, foi virgem, foi sem mancha. Nasceu de uma mãe virgem, por milagre, cercou-se de apóstolos celibatários, continentes, castos, e aconselhou aos outros o que ele mesmo praticava.
V. s. que foi meter o bedelho no paraíso terreal, para espiar o pecado de Adão e Eva;... que encontrou em gravíssima falta Labão, Jacob, Lia, Raquel e Lot...
que penetrou até na ermida de Nazaré para caluniar a Virgem santa, Mãe de Deus; que subiu ao céu, para censurar o Deus onipotente — v. s. devia também ter ido até ao inferno, onde teria encontrado Lúcifer, com os seus emissários diabólicos, todos eles puros e santos, adeptos de sua “moral sexual”... e aí, pelo menos, em vez do chicote de “O Lutador”, teria encontrado um sorriso amigo, um abraço, até um beijo dos lábios de Satanás, em recompensa das linhas pérfidas escritas na terra.
Esta é uma falta, caro doutor, não irreparável... mas inconsequente... Mas deixemos... a vida passa... o demo terá tempo bastante para esta omissão... Quer-lhe tanto...
V. S. fez tão bem a obra dele!...

VIII. Origem do celibato
Estava me desviando do assunto. Desculpe-me, doutor. O celibato, a continência, a castidade foram pratica dos, aconselhados pelo próprio Jesus Cristo, praticados na Igreja, desde o começo... e o serão até ao fim dos séculos.
Dito isto, provemo-lo, resumindo. Jesus disse ao mancebo do evangelho: Se queres ser perfeito, vai, vende o que tens, dá o valor aos pobres, e terás um tesouro no céu; depois vem e segue-me (Mt 19,21).
Vender o que a gente tem, dar o preço aos pobres, isso prova que não se pode ter mulher, nem filhos; senão seria condená-los à morte.
Em outra parte, ele diz: Há pessoas que ficam forçosamente virgens; mas há também pessoas que abraçam voluntariamente este partido, para chegar com mais
certeza ao reino do céu (Mt 19, 12).
E ainda: Todo aquele que tiver deixado casas, ou irmãos ou irmãs, ou pai ou mãe ou mulher, ou filhos, ou terras por amor de meu nome, receberá o cêntuplo e a vida eterna (Mt 19, 29).
São Paulo é o intérprete fiel das palavras do divino Mestre: É bom que o homem não toque mulher, diz ele (1 Cor 7,1). Digo porém, aos solteiros e às viúvas que lhes é bom, se ficarem como eu, continua ele (1 Cor 7,18). O solteiro cuida das coisas do Senhor; mas o que é casado cuida das coisas do mundo (Id. 32,33). Se alguém casar a sua filha, não peca... mas se a conservar virgem, faz melhor (Id. 36m=, 40), termina ele.
São Paulo não conhecia “a moral sexual” de nosso esculápio moderno. — E pena é que o nosso doutor não conheça esta epístola de São Paulo.
Conclusão: Casar é permitido, se for no Senhor, diz São Paulo, mas ficar continente e casto é melhor.
Jesus Cristo, tendo exposto aos apóstolos as tribulações dos casados, um deles exclamou: Se é assim, não convém casar! O Mestre respondeu: Não são todos os que compreendem esta palavra, mas somente aqueles a quem é dado (Mt 19,11). Não é dado a todos: É dado compreender isto às almas puras, briosas e generosas; aos boêmios da vida, isto não é dado; é um mistério para eles, como o é para o autor do livro que refuto.
Tal é a origem do celibato e da castidade. Se lhe opusesse a origem da “moral sexual”, já exposta, não é na vida de Jesus Cristo que era preciso procurá-la, mas nas tabernas, nos lupanares, nas casas de desordens, nos antros da podridão moral, física e intelectual; ali, vivem os seus apóstolos, e é ali, no embrutecimento das paixões, que se preparam livros e folhetos que cheiram por demais o lugar de sua origem.
A castidade sempre existiu na Igreja: — é a sua auréola divina. Ela vem de Jesus Cristo, por conselho, e foi sempre em honra entre os ministros do altar.
Tertuliano, que faleceu em 220, escreve: “Os clérigos são celibatários”.
Origenes, falecido em 254, escreve também: “Oferecer o santo sacrifício da missa pode-o somente quem para sempre e perfeitamente se consagra ao celibato”.

IX. A lei do celibato
O nosso perspicaz esculápio descobriu que Gregório VII fez a lei do celibato, que só foi praticada no fim do século XIII. Que sabichão! Nós, padres, não conhecemos nenhum papa, que tivesse introduzido o costume do celibato, mas o nosso doutor descobriu-o no arquivo de qualquer taberna...
Parabéns! São Gregório VII foi papa de 1073 a 85 e segundo o nosso doutor, é autor da lei do celibato. Ora, percorrendo as decisões dos concílios, encontro o decreto seguinte do concílio africano de 390: “Fica em vigor que que os bispos, sacerdotes e diáconos vivam em perfeita continência como convém aos santos antístites e sacerdotes do Senhor, e aos levitas e aos que administram os sacramentos... Pois, assim, nós também observamos o que ensinaram os apóstolos e observou toda a antiguidade”.
Este decreto é do ano 390, isto é, do século IV, e não é uma lei nova, mas é a manutenção da lei antiga.
E o nosso doutor quer impingir-nos que foi o papa Gregório VII que inventou tal lei no século XI, tendo sido aplicado no século XIII.
O doutor merece uma medalha de ouro pela ignorância. Compreendo que não inventou a pólvora, nem o rádio, mas inventou pelo menos a imoralidade da moral sexual. É já qualquer coisa... entre as nulidades humanas!

X. Conclusão
É tempo de terminar o nosso estudo. O livro em questão não valia tanto, porém. não é pelo livro, mas em consideração ao amigo, — um ilustre advogado católico — que me pediu estas elucidações.
Mais uma vez, as almas retas, sinceras e leais, verão o que são e o que valem os adversários do catolicismo. Escrevem mentindo, caluniando, dizendo puerilidades, encobrindo tudo isto com a capa de ciência, e bradando o seu “eureca”, como se tivessem achado o que nunca mortal algum soube descobrir. Desconfiemos desta triste literatura anticatólica; ela é sempre anticientífica.
A Igreja católica, depositária da verdade, não teme a luz nem a ciência; ela receia unicamente a ignorância, a presunção e o vício.
Procuremos conhecer a nossa santa religião. Estudemo-la, e encontraremos em seu seio luz para nossa inteligência, amor para nosso coração, força para a nossa vontade e até saúde para o nosso corpo: Pietas autem ad omnia utilis est: a piedade é útil para tudo, diz São Paulo (1 Tim 4,8).
Repilamos as obras da impiedade, da imoralidade e da revolta: — São obras de Satanás; e sob qualquer máscara que ele se esconda é sempre Satanás e sempre procura perder as almas. Diabolus tanguam leo rugiens: O demo é como o leão rugindo, à procura de quem possa devorar (1 Pd 5,8).
Possa o nosso doutor refletir, criar juízo, reconhecer o seu crime e a sua ignorância, para reconciliar-se com Deus e com a ciência verdadeira, que tão grosseiramente ofendeu e insultou.
É o meu grande desejo e minha prece sincera.

 

SEXTO LAMPEJO

O COMUNISMO

Abutres agoureiros: Comunismo e laicismo

 

O mundo civilizado está atualmente atravessando uma destas fases misteriosas, que não permitem ao historiador a análise dos fatos, nem dos princípios. É um labirinto, é um abismo, é uma treva geral.
Sentimos hoje um certo mal-estar, uma perturbação, uma moléstia, ao mesmo tempo endêmica e universal; um enfraquecimento de caráter, de vontade, de dignidade, que todos lamentam, que todos acusam e que todos sofrem, É um vento epidêmico que sopra sobre a humanidade! De onde vem para onde vai?... Ninguém o sabe!
Hoje observamos os seus efeitos, desaprovamo-los, e amanhã muitos aplaudem as suas façanhas e caem em seus laços. São verdadeiros abutres agoureiros.
Alerta, católicos! Abri os olhos!... os dois olhos!
Vede!... e de punhos cerrados, lutai para vos preservardes dos abutres agoureiros, da desgraça a vossa pessoa, a vossa família e a vossa pátria.

I. Os falsos sábios
A hora é de esperança, como é de tristes apreensões.
A impiedade, a corrupção e o ódio, representados pelo comunismo rubro e pela coligação negra pro-estado leigo, dois abutres dos baixos fundos da podridão e da revolta, voam por cima da sociedade cristã, ameaçando-a com suas imundícies, para sujar o que há de mais puro e desunir o que faz o encanto da pátria, do lar e do indivíduo.
A Igreja católica não receia abutres. Ela tem armas para abatê-los, como abateu todos aqueles que, em qualquer época, tiveram a ousadia de querer manchar a sua pureza ou conspurcar a sua autoridade.
Não basta, porém, ter as promessas divinas da vitória: As portas do inferno não prevalecerão contra ela (Mt 16,18). Estarei convosco até ao fim dos séculos (Mt 28,20).
É preciso ainda agir, lutar, defender a nossa fé, fazê-la triunfar, a exemplo de São Paulo, que pôde dizer, no fim da sua vida: Bonum certamen certavi — combati o bom combate, acabei a carreira, guardei a fé; por isto me está reservada a coroa da justiça (2 Tim 4,1).
Nós também devemos combater este bom combate, para podermos acabar a nossa carreira e guardar a nossa fé em Jesus Cristo e na sua Igreja católica, apostólica, romana, fundada por ele sobre São Pedro, — o primeiro papa: Tu és Pedro e sobre esta pedra edificarei a minha Igreja (Mt 16,18). — Quem vos escuta, a mim escuta; quem vos despreza, a mim despreza (Lc 10,16).
O ódio anticlerical, que parece ser moda, está na classe dos falsos sábios, que julgam que toda a ciência consiste em saber as quatro operações da aritmética, uns dois dedos de história do Brasil, um dedo de geografia e três dedos de literatura oca; com isto julgam ser os juízes do mundo, da religião e do próprio Deus.
Estes corifeus da impiedade nada entendem de filosofia, de teologia e nem sequer de catecismo; mas, apoiados sobre o seu orgulho e a sua ignorância do assunto, realizam ao pé da letra a palavra do Espírito Santo: Doctrina stultorum fatuitas. — A doutrina dos idiotas é a presunção (Prov 16,22).
Presumir saber e não saber nada, — presumir ser capaz de bancar o mestre de todos e ignorar o que o bom-senso ensina, — presumir ser o juiz supremo dos homens, das instituições e do próprio Deus, e esquecer-se, que amanhã descerá ao túmulo deixando apenas uma pá de podridão e depois uma mão de pó, enquanto a alma irá perante o tribunal do Criador prestar conta de uma vida que foi morte, e de uma morte que é vida.
Tudo isto é da presunção orgulhosa do homem insensato, sem religião e sem fé, o qual pretende na sua pequenez e, na sua miséria, derrubar o Deus eterno e as instituições por ele firmadas. Pobres insensatos! Vana spes et mendacium viro insensato! (Ecli 34,1).

II. O comunismo rubro
Muito se tem escrito sobre o nefando e perverso comunismo; nunca se poderá escrever bastante sobre tal doutrina; a doutrina da destruição e muitos ignoram o que é, o que quer, donde vem e para onde vai.
Procuremos penetrar nos seus segredos e aspirações.
O comunismo é uma utopia que não admite o pronome meu, nem seu: tudo é nosso.
Se estivéssemos num regime comunista, ninguém poderia dizer: — minha casa, meu jardim, meus animais, Casas, jardins e animais seriam comuns, pertenceriam a todos e a ninguém porque seria o governo quem distribuiria temporariamente essas coisas a quem quisesse,
Até a palavra: Meu Deus, ou nosso Deus é uma heresia comunista. Para eles Deus não existe: só existem o governo, os ladrões e os assassinos. Quer isto dizer que o governo é Deus, e os capangas são os anjos deste Deus.
Deus não existindo, como diz a doutrina comunista, os homens devem trabalhar unicamente para viver a vida do boi, do cavalo, do irracional, e ainda em piores condições, porque não se tem liberdade de comer quando se quer, nem de vestir a roupa que agradar; e, se alguém se revolta, será logo enforcado.
Aliás é lógico: Se Deus não existe, a nossa alma também não existe. Um homem sem alma é um animal, O animal é útil enquanto trabalha; não o podendo mais, enforcam-no e o estrangulam, ou então deixam-no morrer de fome e de miséria.
Assim faz o comunismo com os velhos, os enfermos, os inúteis, os incapazes de trabalhar.
Os comunistas não querem mais nem igrejas, nem sinos. Só querem o trabalho. Para eles, trabalhar é orar.
Só serve quem trabalha... mas quem trabalha para os outros, passando fome e miséria. Quem não trabalha não come. Quem não come, morre. Eis o grande código comunista.
O comunismo não conhece nem lar, nem pátria. A terra não é de ninguém. Anulam a idéia de pátria, como querem anular o amor materno, o amor filial, o amor conjugal e a fé em Deus; é o último golpe no coração do homem.
O mais bruto dos homens, como o mais civilizado, ama a terra em que nasceu, morre herodicamente para salvá-la da desonra, defende-a com o seu sangue contra a invasão do estrangeiro. Na pátria comunista não há estrangeiro, não há desonra, pois não existe honra.
Qual o brasileiro que quer uma tal pátria?...

III. O laicismo
O laicismo, geralmente, não é bem entendido pelo povo, tanto mais que se encobre com diversos nomes, para melhor esconder-se. Há “coligação pró-estado leigo, anticlericalismo, propaganda liberal”. Todos estes nomes exprimem o mesmo abutre agoureiro: a revolta, o ódio a Deus.
Vejamos bem o tal laicismo. A palavra leigo, na sua etimologia original, nada de mal exprime; serve para separar os dois estados: o estado clerical dos padres e o estado leigo das pessoas do mundo.
Em nossos tempos, a palavra leigo ou laico exprime outra ideia, e toma geralmente uma significação anticatólica e anti-religiosa.
Chama-se Estado leigo, ou governo leigo, o que na sua organização e vida desconhece a Igreja ou ignora, oficialmente, qualquer religião, procurando excluir de suas instituições os preceitos, os ensinamentos e a própria idéia de Deus. A legislação leiga inspira-se nas idéias ateístas e considera a sociedade humana como separada da influência de Deus e livre de obrigação para com ele.
Dominado por esta concepção falsa da sociedade, o Estado chegou a instituir a moral leiga, independente da religião revelada, formando assim uma regra de costumes sem Deus, sem vida futura, sem responsabilidades perante o Ser Supremo e sem sanção eterna.
Pode-se, pois, definir o laicismo, dizendo que é um sistema doutrinal e político, que se propõe eliminar Deus e a religião da família e da sociedade. Compreende-se logo o absurdo de tal doutrina e as consequências funestas, que derivam necessariamente de tais princípios.
A base é “falsa, O laicismo toma por base e ideal da sua doutrina esta espécie de axioma: o homem é livre.
Ora, tal axioma é a apostasia completa de Deus.
O homem é livre, porque é um ser racional; mas, como é criatura de Deus, depende do seu Criador. Se os corifeus do laicismo proclamassem apenas a liberdade do homem, nada teríamos que reclamar; mas querem dizer que o homem é independente; que não há um ser superior a ele; que pode fazer o que bem entende.
Disto dimana o ódio a toda autoridade, o ódio e a revolta contra Deus, contra a Igreja, contra a doutrina revelada, contra os padres.
É o anticlericalismo cego e odiento. É a calúnia, é a perseguição! O laicismo conduz deste modo ao comunismo.
O que o comunismo faz brutalmente, o laicismo o faz pelos erros dos princípios, pelo espírito e pelo orgulho.
O resultado é o mesmo. Comunismo e laicismo são dois abutres agoureiros, que volteiam sobre o Brasil, ameaçando a sua existência, o seu progresso e a sua religião.

IV. Associação de propaganda liberal
O anticlericalismo, com o seu nome próprio, pouco agradaria ao povo religioso e essencialmente católico da nossa querida pátria. O monstro é horrendo; para que possa apresentar-se, convém dar-lhe outro nome, outra capa, outra cara.
É o que aconteceu. O anticlericalismo fundou uma associação de propaganda liberal, com comité central em São Paulo. A base de tal associação é a propaganda ativa das idéias liberais, de oposição à atuação, na sociedade, do clericalismo (textual).
Tal associação está publicando livros e brochuras verdadeiramente nojentos, pela idéias, pelas mentiras e pela ignorância que os distingue.
Há livros como: Guerra aos Sinos. Há brochuras como: O marido da alma, a confissão, perigo negro, as escravas da Igreja, etc.
O seu código de anticlericalismo está encerrado nos seguintes mandamentos:
Não casar na Igreja.
Não fazer batizar os seus filhos.
Não assistir às cerimônias da Igreja.
Não ser padrinho.
Não fazer educar os filhos em colégios religiosos, etc.
Vê-se claramente que é o ódio a Deus, à Igreja, e à religião. Convém notar que a maior parte dos pastores protestantes fazem parte desta associação. Isto, aliás, é natural. Para estes hereges, antes ser budista ou maometano, do que ser católico. — Tudo serve, afora o catolicismo.

V. Doutrina comunista
Mas, examinemos de mais perto a doutrina comunista. O comunismo é a organização econômica da sociedade futura, em oposição ao sistema vigente do capitalismo.
Todos os bens devem pertencer a todos os cidadãos, e cada um recebe da massa coletiva segundo suas necessidades. Comunismo é a socialização da produção e do consumo.
Compreende-se logo que tal organismo não passa de utopia, absolutamente irrealizável. Sempre haverá neste mundo homens trabalhadores e outros indolentes; uns inteligentes, outros tolos; uns fortes e outros fracos, de modo que a sociedade nunca poderá ser igualizada.
Aliás é a palavra de Jesus Cristo que conhece as situações, as necessidades e as aspirações: Sempre tereis pobres entre vós, diz ele (Mt 26,11).
É uma condição inseparável da vida, é uma necessidade, oriunda da natureza humana e do progresso.
O comunismo não admite propriedade individual.
O indivíduo não tem nada seu: tudo é nosso. Assim é, teoricamente, mas praticamente é diferente. Tudo é dos chefes do governo, e o povo fica com... nada, senão a escravidão e a miséria. Os operários são os escravos dos governos.
Queixam-se, às vezes, da falta de trabalho. Esta falta existe, é certo, e sempre existirá, enquanto não houver mais justiça entre os homens; e como a justiça é o resultado da prática da religião, não haverá justiça se não houver religião.
A falta de trabalho é um problema social que só a religião pode resolver, pela justiça que deve ser praticada por todos. A falta de trabalho provém da desconfiança geral; ninguém quer expor-se a perder o que tem; e deste modo ficam paralisados empreendimentos, explorações minerais, etc. Os bancos fecham as suas portas, as transações ficam paralisadas, a circulação do dinheiro diminui, as indústrias não se desenvolvem, e o operário fica sem serviço.
Mas, não basta ver o fato, é preciso ver a causa deste fato; e a causa primeira é a falta de seriedade, de honradez, de justiça, proveniente da falta de religião.
Quem faz a propaganda do comunismo é a terceira Associação Internacional Operária. A primeira foi fundada em 1864, para a emancipação da classe operária,
pelos próprios operários: dissolveu-se pouco depois. A segunda foi fundada em 1889 e tinha por fim transformar o capitalismo em socialismo: dissolveu-se em 1914. A terceira foi reorganizada por Lenine e Trotsky, para estabelecer, no mundo, a ditadura do proletariado.
O fim verdadeiro, porém, é estabelecer a ditadura de um grupo de russos, ávidos de governar e oprimir a população, de se assenhorear da propriedade alheia em todos os países do mundo.
Para isso, pregam os comunistas russos que não existe senão uma pátria, que a terra não é de ninguém. Anular a idéia de pátria, como querem anular o amor materno, o amor filial, o amor conjugal e a fé em Deus, é o último golpe no coração do homem.
O mais bruto des homens, como o mais civilizado, ama a terra em que nasceu, morre herdicamente para a salvar da desonra, defende-a com o seu sangue contra a invasão estrangeira. Na pátria comunista não há estran- geiros, não há desonra, pois não existe honra.
Que seria do Brasil, se vingasse a doutrina comu- nista? Seríamos governados pelos ditadores de Moscou.
Entregaríamos à Rússia os nossos produtos agrícolas, os nossos produtos industriais para serem vendidos pelo governo russo por preço ínfimo, para forçar a baixa doa mercados dos países não comunistas, para arruiná-los, para vencê-los pela fome.
Para amenizar a idéia de pátria universal os comunistas russos vão mudar o nome do seu país. Provavelmente será uma confederação internacional comunista e o Brasil seria Estado da confederação internacional... Ora, como foi a Rússia quem iniciou o regime comunista, o centro, a sede do governo universal será em Moscou.
Se conseguissem implantar no Brasil o governo comunista, a nossa pátria seria governada pelos russos.
Seriam, portanto, traidores de sua pátria os miseráveis gue entregassem o Brasil aos comunistas sem pátria.
Outro absurdo do comunismo é o fazer acreditar que é a forma de governo que pode dar a felicidade ao povo. É um erro. Não é a forma de governo a principal causa da felicidade ou infelicidade dos povos, são os próprios povos que se fazem felizes ou infelizes.
É verdade que o governo republicano erra muitas vezes. Mas todos os governos têm errado. E o governo comunista errará mais que os outros, pois é ilógico, utopista, extravagante, sem consciência e sem Deus.

VI. Imagem do comunismo
Conta-se que Trotsky, quando estava ainda no governo da Rússia, foi um dia à cidade de Kiew para presidir a um comício comunista. Discursou que o comunismo salvou a Rússia, que livrou os operários, que trouxe felicidade aos trabalhadores. Depois perguntou se alguém queria contradizer-lhe, pois os sovietes garantiam a liberdade do pensamento.
Um operário, de nome Efimoff, pediu a palavra.
O auditório sentiu calafrios de medo por esta audácia.
Mas Efimoff teve a palavra e subiu à tribuna, levando nas mãos um bastão.
— Camaradas, começou, olhai para este bastão. Ele vos contará a história da revolução russa.
O público aguçou os ouvidos.
— Vedes o punho do bastão? — continuou Efimoff; — um punho de ferro. Antes da revolução o país estava governado pelos aristocratas que estão representados por este punho.
O auditório fitava o punho, inclusive Trotsky, e não perdia uma sílaba.
— Abaixo deste punho, está a parte média do bastão, a haste. Esta parte nos representa a nós, operários que trabalhamos. Os aristocratas nos tinham debaixo do punho.
Trotsky esboçou um aplauso.
— Abaixo do punho e da haste está a ponteira, que é também ferro. O punho está em cima. A ponteira são os presidiários, os exploradores, os comedores; a parte méria somos nós, os operários, os camponeses.
Efimoff calou-se e levantou com solenidade o bastão.
— Senhores, eis aí a revolução.
E virou o bastão, pondo o punho no chão, ficando a ponta para cima.
— Senhores, a revolução está feita; os aristocratas ficaram em baixo, os presidiários, os comedores e exploradores estão no alto. E vós, camponeses e operários?
Vós não mudastes de lugar, antes vos oprimia o punho, agora vos oprime a ponta.
Trotsky rugiu como um tigre. Efimoff, o operário que falara com franqueza, confiando na liberdade concedida, foi fuzilado naquele mesmo dia.

VII. O decálogo comunista
Mas nada é mais claro e mais positivo que o decálogo comunista, recolhido em várias publicações russas, Tal decálogo não precisa de comentários; basta percorrê-lo para compreender em toda a sua hedionda realidade o sistema comunista:

I MANDAMENTO
Odiar o Senhor, vosso Deus
Todo nosso sistema é ateu e não pode tomar outro rumo (Perri).
Religião é ópio para o povo e, como o álcool, obscurece a inteligência (Lenine, na obra: “Socialismo e Religião”).
O homem que se ocupa de venerar a Deus, suja-se no próprio cuspo (Lenine, ao amigo Lunatscharski).
Exigimos a separação completa da Igreja e do Estado para termos armas espirituais no combate contra Deus.
Fora os operários embrutecidos pela religião (Lenine, “Socialismo e Religião”).

II MANDAMENTO
Amaldiçoar nosso Deus e Senhor
Nós só devemos amaldiçoar a Deus e afastá-lo da sociedade (Le Peuple).
Odiamos e amaldiçoamos a cristandade e devemos considerar os cristãos, ainda os melhores, como nossos piores inimigos. Eles pregam, contrariamente aos nossos princípios, a caridade e o amor do próximo. Nós só devemos odiar; e pelo ódio, conseguiremos dominar o mundo (Kalinin).

III MANDAMENTO
Desprezar o dia do Senhor
As igrejas, conventos e capelas sejam destruídas e transformadas em salas de divertimentos públicos, cinemas e lojas (Stalin).
Escarro em tua religião e em todas as outras. (O comissário Karylenko diante do júri contra d. Cieplak, arcebispo católico da Rússia).
Abolição do domingo e instituição da semana, operária (Terceira Internacional).

IV MANDAMENTO
Desprezar pai e mãe
Conforme a doutrina comunista, pai, mãe e filhos não têm entre si relações mútuas. Nenhuma obediência, senão a igualdade seria impossível (Mallon).
Jamais será possível revolução enquanto existir a família e o espírito familiar. A família é uma instituição burguesa inventada pela Igreja... é preciso aniquilá-la (Federação feminina comunista de 1925).
Camaradas, ontem minha mãe ficou alarmada ao ver-me lendo a revista ateia “Besboschnik”. Agora vivemos separados em casa. Nossos pais ocupavam-se em venerar as imagens dos santos e a ler livros santos; nós então colocamos o retrato de Lenine e decoramos o “Besboschnik” (Carta de uma jovem russa de 16 anos, às suas companheiras).

V MANDAMENTO Matar
A violência tem de ser a alavanca da revolução.
Será para nós um prazer ver agonizar padres, burgueses e capitalistas. Vestidos de suas sotainas, os padres morrerão lentamente pelas ruas e sob nossas vistas.
Com prazer vendemos por uma boa garrafa de vinho o nosso lugar no céu para sentirmos este prazer. Que digo? Céu? Não, não o queremos. O que pedimos é o inferno, é o prazer que leva até lá (Ratie).
— Esta mão é um.
Esta outra é dois.
Com estas duas enforco os capitalistas.
Agora sou pequeno ainda,
Mas quando for grande
Matarei os capitalistas.
(Canção infantil do livro “Moscou desmascarado”, de Jos. Douillet).

VI MANDAMENTO
A impureza é o nosso prazer
Aqui poupamos aos leitores o desenrolar de uma fita de nauseabundas cenas de bestificação.

VII MANDAMENTO
Furtar
Esfolaremos os capitalistas quanto possível, e isso não deve ser qualificado de roubo (Vooruit, jornal comunista belga).
Roubai o mais possível, porque tudo foi roubado (Lenine).

VII MANDAMENTOS
Menti, se a mentira vos aproveitar
Evitemos de ofender o povo, dizendo-lhe o que desejamos; seria falta de tática (Der Vorwãrts).

IX MANDAMENTO
Desejar a mulher do próximo
Nenhum casamento; amor livre (Lei sobre o matrimônio de 1-1-1928).
A poligamia e a poliandria não são proibidas pela lei, e valem pelo casamento válido, quanto aos efeitos jurídicos (Gidulzeff, 1927).
Em Petrogrado, num ano, se realizaram 2.000 casamentos e foram declarados 1.705 divórcios.
O Comunista Schwartz, amigo de Lenine, chegou a casar-se 150 vezes. Citado perante o tribunal, o juiz só declarou que isso era nocivo ao prestigio do Estado.
Não se falou no resto.

X MANDAMENTO Preparai uma revolução universal
A bala o burguês; não se poupe dinamite (Perrant).
O proletariado não pode aceitar a forma de governo que existe atualmente, aniquilar este aparato (Lenine em “Estado e Revolução”).

VIII. Nos domínios da antropofagia
Recolhamos dos jornais umas amostras da incrível miséria a que chegou a desgraçada Rússia pelo regime comunista.
“Num artigo reproduzido por vários jornais, M. Vandervelde pusera em dúvida as afirmações acerca da carestia da vida na Rússia, publicadas pelo “Journal de Genêve”. Este responde, citando fatos, entre os quais o seguinte, proveniente da Sibéria, datado do mês de Setembro, isto é, depois da colheita.
“Estava numa situação privilegiada, porque, na qualidade de operária, tinha uma carteira alimentar.
Mas era impossível nutrir-me com ela. Desde a primavera que me não foi mais distribuída a farinha de trigo, mas uma mescla de farinha que me fazia adoecer as crianças. Resolvi-me então unir aos restos da elaboração do amido, na qual estou empregada, ervas e raízes que procurávamos nos campos.
Bastava atravessar a cidade para descobrir os cadáveres de pessoas mortas de fome. Uma parenta minha (a carta cita-lhe o nome, a direção e a data) foi morta pelo seu inquilino que a devorou em parte.
As autoridades não puderam esconder este fato e o homem foi condenado. Com grande indignação dos juízes comunistas que queriam apresentar o caso como um delito isolado, o réu declarou que se havia alimentado durante o inverno de carne humana, aliás teria morrido de fome.
Eu conheço pessoalmente mais de dez casos de antropofagia, cometidos nos arredores da minha casa.
Um soldado abriu diante de mim um saco onde estavam os despojos de uma criança morta para ser comida.
Ninguém se atreve já a deixar os filhos nas ruas com o receio de que eles venham a ser roubados e continuamente citam-se casos de crianças raptadas em lugares afastados, mortas e comidas. Tudo isto parece incrível, mas eu não me maravilho.
Parentes e amigos à procura de melhores condições de vida têm vindo até às regiões da Sibéria, do Cáucaso, da Ucrânia e também do norte. Em toda parte é mais ou menos a mesma, coisa... exceto em Moscou, onde pude comer pão.
Eu parti quando a colheita estava já em grande parte feita, mas a situação não me pareceu sensivelmente melhorada.
Ignoro se isto se explica pelo fato de a colheita, ter sido pior do que se esperava. Os jornais soviéticos contam que a carestia reina no estrangeiro, mas ninguém o acredita, como de resto ninguém acredita nas promessas do governo. Os que estão no poder são por todos amaldiçoados porque todos estão convencidos da sua responsabilidade na extraordinária miséria do povo”.
Esta carta vinda da Sibéria é eloquentíssima. Agora vai a tradução de outra, vinda do Cáucaso.

IX. Miséria em toda parte
“Em Tiflis, onde me encontrava em 5 de Setembro (portanto muitas semanas depois da colheita) vi cadáveres de crianças, abandonados nas estradas e apresentando os sinais característicos da fome: pernas emagrecidas e disformes e ventre inchado. Nos arredores da cidade vi gente a comer cascas de árvores e raízes”.
Garantindo a autenticidade destes documentos, o “Journal de Genêve” acrescenta que eles demonstram que a fome não é devida, como sr. Vandervelde quer fazer acreditar, a uma colheita má, mas única e simplesmente ao sistema comunista e marxista: “Os camponeses russos fizeram a revolução para valorizar as suas terras; Staline tirou-lhas e, levados pelos desespero, mataram o seu capital: 85 milhões de cabeças de gado. Como fazer a colheita embora abundante? E para que fazê-la se depois ficavam sem ela?
Testemunhos numerosos provam que em muitas localidades as colheitas não se puderam fazer porque as ervas más afogavam as boas, porque não havia modo de recolher o que a terra produzia. À fome não é sômente devida à falta de trigo, mas de leite, de carne, de tudo.
Durará a fome na Rússia enquanto durar o regime marxista, porque esta funesta doutrina tira ao homem todas as esperanças de melhoramento de vida e apenas lhe dá o terror como excitante ao trabalho.
Além destes fatos apontados pelo jornal suíço que, diga-se de passagem, é um jornal de imensa autoridade moral, cujas linhas não são vendidas nem com o peso de todo o dinheiro do mundo e cuja palavra de elogio a um personagem é o bastante para lhe dar notável reputação, eu passo a referir o que a agência “Offinor” nos disse, há dias, sobre a fome canibalesca da Rússia.
Diz ela: “Os jornais continuam a publicar documentos dolorosos acerca da fome na Ucrânia soviética.
Um dos documentos de maior significação é uma carta de um camponês a um seu irmão em Leópolis, que foi publicada no jornal “Dilo”: “Meu querido irmão. Atende aos nossos pedidos. Tem piedade de nós e ajuda-nos, pelo amor de Deus! Estamos todos inchados por causa da fome. Pedimos-te, suplicamos-te, querido irmão, que tenhas dó de mim e da minha desgraçada família. O fim da nossa vida aproxima-se. Temos comido tudo o que temos encontrado. Não temos mais nada. E se Deus e tu, meu irmão, não vierdes em nosso auxílio imediato, depressa morreremos todos. O nosso alimento compõe-se de água, sal e algumas raízes. Não queiras que o teu irmão, mas sobretudo os meus queridos filhos, morram de fome. Uma esmola, pelo amor da nossa mãe, pelo amor de Deus”.

X. Conclusão
Não há positivamente fibra de coração que não estremeça diante de fatos, narrados em cartas, que dizem do suplício mortal da fome, e da carnificina canibalesca dos famintos na pobre e desgraçada Rússia.
Quando lembramos o cerco de Paris, na guerra franco-prussiana, a nossa compaixão pelos parisienses é enorme, porque se viram obrigados a comer os gatos, os cães e os ratos. Os habitantes da Cidade da Luz passaram assim privações para resistir ao cerco das tropas inimigas, e a atitude inspira-nos comiseração e uma profunda simpatia. Foi o patriotismo que animou estas almas a tanto sacrifício.
Mas na Rússia não é o patriotismo que inspira os sovietes a matar à fome as populações. Lá não existem gatos nem ratos que possam servir de alimento às populações anêmicas e inchadas. Tudo já desapareceu. É a loucura selvagem de instalar em todo o mundo as doutrinas de Carlos Marx, cuja benigna prova temos à porta dentro dos limites da Espanha com a queima dos conventos, o incêndio das igrejas e a morte fácil de paisanos ou soldados que não têm o nome nas associações comunistas.
Na Rússia a fome entrou nos paroxismos do desespero: mata-se para não morrer; mata-se para comer; mata-se para elucidar o mundo inteiro de quanto é criminoso enfileirar-se ao lado dos inimigos, dos sem-fronteiras e dos inimigos da família, da propriedade e da pátria.

 

CONCLUSÃO FINAL


Ao começar a leitura destas páginas, o paciente leitor terá ficado admirado, de certo, pelo título do livro: Anjo das Trevas. Isso é o demônio, o Satanás, o diabo. É o Satanás das trevas.
Mas Satanás, expulso pela sua revolta do reino da glória, embora decaído de sua primitiva grandeza, não mudou de essência, e fica sempre um anjo; é um anjo decaído. Em vez de ser um anjo de luz, como era na glória celeste, é hoje um anjo das trevas, mas é sempre um anjo.
É como o homem que, rei da criação, pela sua natureza, tornou-se pela queda original, e pela sua fraqueza, como o escravo da criação. O homem é sempre rei, pela natureza, mas pelo pecado tornou-se um escravo.
Terminando esta leitura, o leitor compreenderá que o termo não é exagerado, e que verdadeiramente o anjo das trevas está neste mundo, trabalhando com tenacidade para perder os homens.
Entre muitos demônios, pode-se dizer que os seis citados são os mais perigosos. Sex sunt quae odit Dominus, diz o Espírito Santo. Estes seis demônios excitam, de modo particular, o ódio a Deus e à sua Igreja.
Católicos, alerta, preservai a vossa fé, a vossa dignidade, e o vosso brio religioso. Ninguém quer amizade com o demônio.
É um inimigo feroz; e qualquer que seja a forma que ele tome ficará sempre o mesmo inimigo. É sempre o mesmo demônio de que fala São Pedro: Vigiai, porque o demônio, vosso adversário, anda ao redor como um leão que ruge, buscando a quem devorar. Resisti-lhe fortes na fé (1 Ped 5,8,9).
Este demônio, ou anjo das trevas, não podendo mostrar-se pessoalmente, tal qual ele é, reveste-se da pele do cordeirinho, para melhor enganar os incautos e perdê-los com mais facilidade.
É ele, o Satanás, que se esconde no espiritismo, para arrancar ao homem a inteligência e conduzi-lo ao manicômio.
É ele que age pelas seitas protestantes, semeando a discórdia nas almas.
É ele que se fantasia pela máscara da maçonaria, para excitar o ódio e a perseguição contra a Igreja e seus ministros.
É ele que se cobre do véu do divorcismo, para lançar os homens no amor livre, no vício e na degradação.
É ele que se esconde debaixo da podridão asquerosa, mas brilhante do sexualismo, para ensinar o mal, desenvolver as paixões, tirar a inocência dos corações e dos corpos.
É ele e enfim, que blasfema e que mata, envolto no manto do comunismo, para destruir a família, a pátria, e o cristianismo. Cuidado, católicos...
Alerta, é ele, o demo rubro, nojento, o grande revoltoso, o pai da mentira, o mestre da corrupção, o inimigo de Deus e do homem.
Cuidado! Não se brinca com fogo nem com lama.
O anjo das trevas é o fogo da paixão, é a podridão do vício. Longe de nós o Satanás! vade post me, Satana (Mt 16, 23).
É Satanás mudando-se em anjo de luz: Satanas transfigurat se in angelum lucis (2 Cor 11,14). Mas é sempre o anjo das trevas. É sempre o inimigo de Deus e do homem. É sempre o grande mentiroso. É sempre Satanás com as seis coroas na cabeça: o espiritismo, o protestantismo, a maçonaria, o divorcismo, o sexualismo
e o comunismo. É todo um, é tudo o mesmo Satanás, prosseguindo os mesmo fins, sob nomes diversos. Alerta, católicos!... Faça o bom Deus que a leitura do que precede, que é a exposição simples e leal da verdade, abra os olhos dos adormecidos, desperte a religião dos vacilantes, e sacuda os que talvez tenham já um pé no abismo. O abismo pode ser cercado de flores e de perfumes, pode ter um atrativo para os sentidos, pode ter uma tabuleta dourada e um letreiro convidativo, pouco importa, em baixo é sempre o abismo hediondo, e no fundo deste abismo é sempre o demônio, o anjo das trevas, que se encontra.
Luta, pois!... e guerra ao eterno inimigo. Ódio ao anjo das trevas, e aos seus representantes na terra, às suas instituições, que temos aqui estudado. Uma primeira vez Deus lançou o demônio fora do céu. Uma, segunda vez Deus esmagou-lhe a cabeça no calvário.
A nós agora cabe expulsá-lo de nosso lar, de nossa pátria, e dos antros em que ele se instalou e pretende dominar, reinar, como déspota e como soberano. Não gueremos que ele reine sobre nós! Queremos a liberdade de filhos de Deus e não a escravidão de filhos das trevas.
Queremos o Cristo Rei, o Cristo Pai, e não queremos o imundo Satanás entronizado
nas sessões espíritas, nos cultos protestantes, nas lojas maçônicas, na lama divorcista, no impudor sexualista, no ódio comunista!
Longe de nós tudo o que é Satanás, suas obras, suas pompas, suas promessas.
Queremos Deus, que é nosso Rei, Queremos Deus, que é nosso Pai!
Só Deus! Ele nos basta!