Conheçam Nossa Senhora de La Salette!

espiritualidade

Tão importante quanto, Fátima, Lourdes e Guadalupe, a aparição da Virgem Maria chorando em La Salette tem muito a nos dizer.

CONHEÇAM LA SALETTE

HISTÓRIA DA COMOVEDORA APARIÇÃO DE MARIA SSMA. EM PRANTO

Pe. Dr. Simão Baccelli, M. S.

1952
EDIÇÕES PAULINAS

 

Visto por delegação do Superior
Sio Paulo. 2 de Dezembro de 1952
Pe. Guido Pettinati
Por parte da Pia Sociedade de S. Paulo
Pode-se imprimir
São Paulo, 30 de Maio de 1953
Pe. Celeste Lenta, S.S.P.
"Nihil obstat"
Rio de Janeiro, 19 de Abril de 1952
Pu. André Dugust, Sup. Prov., M.S.
"Nihil obstat"
Rio, 4 e Novembro de 1952
Mons. Henrique de Magalhães
(Censor deputado)
Imprimátur
Rio, 11 de Novembro de 1952
R. Costa Rego, Arceb. Tit.
Vigário Geral

 

Prefácio do Autor

Por ocasião das solenidades comemorativas do centenário da Aparição de N. Sra. De La Salette na capital do pais, um ilustrado e muito nosso amigo membro do operoso Episcopado brasileiro, perguntou-nos inopinadamente: "Então, não ha meio de termos um livro em condições sobre La Salette?" com voz baixinha respondemos que no estado embrionário andava-nos um projeto pela mente, mas...

Nesse malfadado mas apinhavam-se não poucas desculpas, como sejam, o serviço premente e contínuo de vigário duma populosa paróquia, as preocupações do superiorato, a já bem adiantada idade, e também, obstáculo maior, a nossa deficiência no idioma português.

Esse rico idioma não recebemos dos lábios maternos, mas a nós veio como que à força, numa época da vida em que da adolescência só tínhamos a saudade, resultando, - por demais o percebemos - num instrumento assaz impróprio em nossas mãos.

Fique isso liminarmente declarado, não para provocar os costumeiros "não apoiados", mas no sentido de sincero apelo à benevolência do prezado leitor, bastante bondoso pra relevar as nossas imperfeições, quiçá, os nossos erros de linguagem.

Em nosso caso, aliás, não se trata de literatura, senão dum acontecimento religioso da maior importância, que é a maravilhosa Aparição de Maria SSma. em que ela, debulhada em lágrimas, como até agora não aconteceu em nenhuma das suas manifestações, verberou larga, enérgica e maternalmente os profundos males religiosos e morais da nossa época, e por esse motivo foi tão combatido por alguns mal-intencionados e particularmente pelos inimigos declarados da Religião.

No campo católico, muitos, esquecidos quase por completo da finalidade verdadeira da mensagem da Virgem - isto é, a volta do povo ao Cristo - limitando-se a obstinadamente ao fato, de todo secundário, dos segredos, gabaram-se erradamente de os ter desvendado e foram sonhando com hediondezas morais e apregoando catástrofes e o próximo fim do mundo, atirando assim o desprestígio sobre a mesma aparição.

Finalmente outros, mantendo na penumbra virtudes acrisoladas, e demonstrando-se por demais admirados, com uma ponta de escândalo, por certos aspectos do procedimento dos videntes, produzem dúvida e perturbação nas almas.

Esse conjunto de contrastes resulta num claro-escuro que obnubila o pensar de não poucas pessoas, ótimas, porem mal informadas a respeito da Aparição; e, para esclarecê-las, não existia em português nenhum escrito apropriado, - precisamente outra cousa não quis dizer o Exmo. Sr. Bispo.

Neste ano de 1952 em que transcorrem o centenário da Congregação dos Missionários de N. Sra. de La Salette e o cinquentenário da sua chegada ao Brasil, no intuito de atender à manifesta necessidade, resolvemos divulgar o presente livro, no qual tentamos, como Deus é servido, não somente entrar no âmago do assunto, ilustrando-lhe a radiosa verdade, como também examinar-lhe os contornos e penetrar nos arrais dos inimigos, dos oponentes e com a devida vênia, dos iluminados, para lhes analisar e rebater os desarrazoados,; finalmente, apontar as tão benéficas irradiações da celeste Aparição.

Para tanto, fomos compilando o que lemos em numerosos livros, mormente dos atuais intrépidos defensores e ilustrados glorificadores do grande acontecimento. eles, bem o sabemos, manusearam cuidadosamente os documentos originais.

Com efeito, existe a mais ampla documentação a respeito do fato La Salette, como comprova a bibliografia, embora incompleta, logo de início apresentada.

Permiti, ó N. Sra. de La Salette, Rainha e Mãe nossa, que este vosso humilde missionário deposite aos vossos pés, esta modesta obra que ele, já no ocaso da vida, executou para ainda cumprir a vossa ordem terminante: "Pois bem, meus filhos, transmitireis tudo isso a todo o meu povo". Sobre ela, deitai vossa poderosa benção para dar-lhe valor, deixai cair uma vossa lágrima para dar-lhe calor, e assim no coração do vosso povo que porventura ela atingir, faça penetrar fundo as vossas dores e a vossa mensagem, externadas, por entre lamentos, lá no vosso escolhido Monte de La Salette.

Pe. Dr. Simão Baccelli, M. S.

 

 

CARTA DO SUPERIOR GERAL DOS MISSIONÁRIOS DE N. SRA. DE LA SALETTE AO AUTOR

Meu Padre,

Foste bem inspirado em querer por ao alcance das nações de idioma português a história da Aparição de N. Sra. de La Salette. Essa nações, com efeito, são privilegiadas, pois a Bem-aventura Virgem Maria para elas manifestou-se nas aparições de Fátima, cuja repercussão aumenta cada vez mais e alcança rapidamente todo o mundo cristão. Ora, Fátima nada é senão a repetição e o prolongamento da misericordiosa manifestação em La Salette.

Por esse motivo, os católicos do Brasil vos serão gratos por lhes fazerdes conhecer o acontecimento de La Salette sob seu verdadeiro aspecto, despojando-o de tudo o que certos espíritos, e não dos menores, tentaram acrescentar-lhe nestas últimas décadas, sob inspiração do pretendido segredo de Melânia. Rendeis assim testemunho à própria mensagem primitiva e pública, a única que tenha a Igreja a seu favor e só teve aprovação do Ordinário responsável, D. Felisberto de Bruillard, Bispo de Grenoble, na sua Carta doutrinal de 189 de Setembro de 1841, na qual declarava: "que os fiéis tem fundamento para acreditar que a Aparição de La Salette é certa e indubitável.

Queira Deus que a vossa obra suscite novo impulso na devoção mariana tão fortemente evocada na Aparição de La Salette, devoção que reanima nossa fé e nossa confiança no amor misericordioso de Maria para com as nossa pobres almas pecadores e nos concita a coadjuvá-la com nossas orações e nossos sacrifícios a afastar da nossa infeliz humanidade os justos castigos de Deus!

Esperançoso, pois, faço os melhores votos pelo sucesso o vosso empreendimento nessa terra do Brasil, tão devota a Maria, e vos abençoo de todo o coração.

Roma, 30 de Março de 1952.

J. Imhof. M. S.

Superior Geral

 

PRIMEIRA PARTE

O GRANDE ACONTECIMENTO

CAPÍTULO PRIMEIRO

UMA "BELA SENHORA" EM LA SALETTE

§ I - Os preliminares

"La Salette", imensa e belíssima concha, cuja orla nada é senão o desenrolar imponente de altíssimos cumes da cordilheira dos Alpes, cujo findo, cheio de relevos, é feito de prados, torrentes, aldeiazinhas com o repuxo da torre da pequena e vetusta igreja paroquial. Há nessa orla uma única brecha, por onde se sai para ir à vila e decanato de Corps, Diocese de Grenoble, sudeste da França, a uns 70 quilômetros, em linha reta, da fronteira italiana.

Em Corps nasceu no dia 27 de agosto de 1845, Maximino Giraud, e a 7 de novembro de 1831, Melânia Calvat. Esta, desde os 8 anos de idade, andava empregada como pastorinha fora de Corps. Maximino era também pastor, porém não se conheciam. Encontraram-se, pela primeira vez, na vida, na quinta feira de tarde, a 17 de setembro de 1846, lá nas alturas dos montes, no território de La Salette (1).

No dia seguinte, encontrando-se novamente, travaram mais amplo conhecimento e brincaram "de recortar, com seus canivetes, quadradinhos na relva" (2). Na manhã do sábado, o grande dia, 19 de setembro de 1846, após terem galgado as íngremes e muto escarpadas encostas, de novo estavam eles cuidando naturalmente do seu gado, porém brincando e tagarelando. Aos toques da "Ave-Marias", pelo meio dia, o patrão de Maximino mandou que ele levasse já as vacas a beber. "Vou chamar a Melâniazinha e lá vamos". E foram eles tangendo o gado até uma fonte, na encosta norte dum terreno chato, chamado Planalto, a bem 1800 metros de altitude. Depois que as vacas beberam, na Fonte dos Bichos, fizeram-nas atravessar o pequeno riacho por nome Sézia e as deixaram nos penedos dos Gargas, monte de 2.200 metros.

Subindo uns cinquenta metros acima, foram sentar-se à beira do Sézia, perto duma nascente, a Fonte dos Homens, e comeram pão com queijo, beberam água fresquinha e, carregando os seus alforjes, desceram até a fontezinha então seca e lá, deitados na relva do valãozinho, contra seu costume, adormeceram. Não se chegou a saber quanto tempo dormiram os pastorinhos.

(1) De Brulais - L'Echo de la Saint Montagne - Bibliografia 30.

(2) Nortet - Notre Dame de La Salette. bibliografia 58. Notes Lagier - Manuscrits Bossan - Bobliografia 3. Bibliografia 14.

 

§ II - A Aparição

Quem primeiro acordou foi Melânia que, bastante preocupada, chamou: "Menino, vamos ver onde estão as nossas vacas". Subiram apressados a encosta até o Planalto e viram, perto as vacas, ruminando, placidamente deitadas. Sossegados, iam descendo para apanhar os seus alforjes, quando Melânia exclamou: "Menino, olha essa claridade!" "Onde?" "Lá em baixo". Então ambos viram, enchendo o barranco, um globo enorme, dum raio de três a quatro metros, muito mais luminoso que o sol. Este, no entanto, fulgurava no firmamento sem nenhuma nuvem.

Eis que o globo, abrindo-se, deixa aparecer, na expressão dos videntes, uma "Bela Senhora" ainda mais brilhante que o globo, assentada nas mesmas pedras em que, há pouco, eles se tinham sentado, com os cotovelos apoiados nos joelhos, o rosto escondido nas mãos, o corpo curvado para frente ao peso do sofrimento, os pés no leito da fontezinha, parecendo chorar. Seriam pelas duas a três da tarde, hora em que, no hino das primeiras vésperas de Na. Sra. das Dores, canta-se: "Oh! quantas lágrimas inundam o semblante da Virgem Mãe!"

Visão tão inesperada e tão extraordinária assustou sobremaneira os pastorinhos, especialmente a medrosa Melânia, que erguendo os braços, gritou: "Meu Deus!" - Maximino, porém, mais valente, disse: "Pega o teu bastão Melânia, eu tenho o meu e se ela nos fizer alguma coisa, dou-lhe uma pancada."

A "Bela Senhora" levanta-se, recolhe as mãos dentro das largas e compridas mangas, coloca o braço direito em cima do esquerdo, adianta-se um pouco e, com voz suavíssima, chama: "Venham, meus filhos; não tenham medo, aqui estou para lhes contar grande nova".

Atraídos irresistivelmente por tão maternais palavras, eles correm e se colocam em frente à "Bela Senhora": Melânia à sua esquerda e Maximino à sua direita; e "tão perto, que uma pessoa, disseram eles, não poderia passar entre nós e Ela". O cãozinho veio, deitou-se aos pés de Maximino e dormiu.

Totalmente arrebatados, puderam então os felizes pastorinhos contemplar a maravilhosa visão. Melânia, mais atenta, foi mais favorecida, pois o menino, vislumbrado, não conseguiu ver o semblante da Senhora. Conforme permite a linguagem humana, Melânia deu a seguinte descrição: "Toda Ela era só luz, de regular altura, bem proporcionada, rosto branco e formoso, um tanto alongado, de finos traços. Uma touca muito alva, cobria-lhe a cabeça, os cabelos, a fronte até por cima dos olhos, as orelhas e o pescoço, coroada a "Bela Senhora", com magnífico diadema, de refulgentes raios de luz, adornado na base com rosas de variadas cores, de cujos centros surgiam jatos luminosos. O vestido branco, recamado de pontos brilhantes como pérolas, fechado até a base da touca, ia descendo até cobrir parte dos pés. É bastante amplo para não ressaltar as formas do corpo. Da cinta, chegando até um dedo acima da orla do vestido, pende uma avental cor de ouro".

Cobre-lhe os ombros um chale da cor do vestido, porém sem pérolas, cruzado no peito, com um nó por trás, os contornos adornados por uma grinalda de rosa, parecidas com as do diadema, e por uma espécie de galão de ouro, da largura de três dedos, cujo desenho aparenta uma corrente feita de elos não entrelaçados, apena justapostos.

No peito, pendente do pescoço por uma correntinha, um crucifixo duns vinte e cinco centímetros, cujo Cristo resplandece mais que todo o resto. No braço da cruz, do lado direito, uma torquesa entreaberta, e do lado esquerdo um martelo; tudo tem o brilho do mais fino ouro. Calçados brancos, recamados de perolas, com fivelas de ouro e grinaldas menores, porém do mesmo feitio e matizes daquelas do diadema.

Mostrava-se tão aflita que, no dizer do videntes, parecia uma infeliz mãe a quem os filhos tivessem maltratado, sempre chorando. "Eu bem vi correrem as suas lágrimas", afirmava Melânia. ela assim falou, no idioma francês: "Se meu povo não quiser submeter-se, hei de ver-me obrigada a deixar cair o braço do meu Filho; é tão forte e tão pesado, que não posso mais sustê-lo. Oh! há quanto tempo sofro por vós! Se quero que meu Filho não vos abandone, tenho de lho rogar sem cessar , e vós, disso não fazeis caso. Por mais que rezeis, por mais que façais, nunca me podereis re­tribuir os penosos cuidados que tive por vós. Dei-vos (3) seis dias para o trabalho. reservei-me o sétimo e não mo quereis conceder. É isto que torna tão pesado o braço do meu Filho. Os que conduzem carroças não são capazes de praguejar sem interpor o nome do meu Filho, cujo braço, por estas duas coisas, se torna tão pesado. Se a colheita se estraga é por vossa causa. Bem vo-lo mostrei o ano passado, com as batatas; mas não fizestes caso, pelo contrário, encontrando-as estragadas, praguejáveis, interpondo o nome do meu Filho. Vão continuar a se estragar e pelo Natal já não haverá mais".

Muito impressionado, Maximino, exclamou: ''Tanto assim não, as batatas não desaparecerão todas. sempre algumas hão de se encontrar."

Melânia, ouvindo a palavra "batatas" que ela, no seu dialeto, só chamava de "trufas", virou-se para Maximino para pedir esclarecimentos, porém a "Bela Senhora" prevenindo-a disse: "Ah! não entendeis o francês, esperai, vou falar de outro modo". (4). Recomeçou em dialeto da região com estas palavras: “Se a colheita se estraga ...” até ''não haverá mais"; prosseguiu no mesmo dialeto: “Se tendes trigo não o deveis semear, pois tudo o que semeardes, os bichos (insetos) o comerão; e o que vier, tornar-se-á em poeira quando for moído. Sobrevirá uma grande fome, mas antes, as crianças de menos de sete anos serão acometidas de tremores e morrerão sob os olhos das pessoas que as tiverem nos braços; os adultos farão penitência pela fome. As uvas apodrecerão e as nozes(5)se tornarão ruins". Aqui a "Bela Senhora" virou-se para Maximino que, sem no­tar alteração no tom da voz, recebe um segredo. Melânia nada ouve, embora veja o movimento dos seus lábios. Por sua vez ela recebe o seu segredo e Maximino nada ouve. Os segredos :foram ditos em idioma francês.

Fazendo-se ouvir pelos dois juntos. ela continuou em dialeto: "Se se converterem, as pedras e os rochedos se tornarão em montões de trigo e as batatas hão de se­mear--se na terra per si.. (6).

Então perguntou-lhes: "Fazeis bem a vossa orações meu filhos?"- "Oh! não, Senhora, não muito" - responderam com franqueza. “Ah! meus filhos, disse Ela, é preciso fazê-la bem, de manhã e de noite: quando não tiverdes tempo, dizei pelo menos um Padre Nosso, e uma Ave Maria e quando puderdes dizei mais."

"Só vão à missa umas mulheres idosas. Os outros trabalham no Domingo, durante todo o verão; e no inverno, quando "não sabem o que fazer, vão à missa só para zombar da religião. "Na quaresma vão ao açougue como se fossem cães"(7).

Mais uma pergunta fez Ela: "Nunca vistes trigo estragado, meus filhos?" Maximino logo respondeu pelos dois: "Não vimos, não Senhora''. - "Mas tu, meu filho, bem o viste uma vez, perto de Coin (8), com teu pai. O dono dum terreno disse a teu pai: ''Vinde ver meu trigo estragado". Ambos lá fostes. Pegastes duas ou três espigas em vossas mãos e as esfregastes e tudo se desfez em pó. Depois voltastes. Quando estavas a meia hora de caminho de Corps, teu pai te deu um pedaço de pão, dizendo: "Toma, meu filho, come pão ainda este ano; não sei quem o comerá para o ano, se o trigo continuar a se estragar desta maneira".

- Respondeu Maximino: "É verdade, minha Senhora, agora me recordo, ainda há pouco não me lembrava."

Então a "Bela Senhora", voltando a falar em francês, disse: "Pois bem, meus filhos, comunicai isto a todo o meu povo!'

Desviando-se para a esquerda Ela passa à frente das crianças, atravessa o riacho pondo o pé numa pedra e, sem parar, sem se voltar, repete em francês: Pois bem, meus filhos, comunicai isto a todo o meu povo."

(3) Subentendido: "O Senhor disse." Os profetas antes de Cristo, por vezes dirigiam-se ao povo como se o próprio Deus falasse. Aqui é a própria Mãe de Deus quem fala.

(4) Para melhor entendimento, note-se que em francês batata chama-se "pomme de terre". e que "pomme'' significa "maçã"', e Melânia, por causa das poucas palavras francesas que sabia, não compreendia.

(5) As nozes eram uma das grandes produções daquela região.

(6) Relembremos o leite e o mel da Bíblia, a correrem na terra Prometida.

(7) Tal modo enérgico de verberar o mal encontra-se na S. Escritura. O pecador que recai no seu pecado é como o "cão que volta ao seu vômito" (II Ped. 2, 22).

(8) Coin é uma aldeola situada um terreno formando uma cunha entre duas torrentes a uma légua de Corps.

 

III - A volta para o céu

A “Bela Senhora", deslisando por sobre a relva, foi subindo, devagar, a mesma encosta galgada anteriormente pelos pastorinhos; descreveu em seu caminho um traçado em forma dum S meio aberto, verdadeira reprodução, embora em ponto diminuto, da via dolorosa, percorrida por Jesus na subida ao Calvário, conforme averiguaram muitos romeiros de Jerusalém.

Os dois videntes vão acompanhando-a: Maximino, seguindo-lhe as pisadas, e Melânia, cortando por uma reta, vai andando na frente.

Lá no alto, Ela para uns instantes, eleva-se depois um metro e pouco acima do chão, fica suspensa nos ares durante um meio minuto, levanta os olhos ao céu, baixa-os em seguida para a terra e fixa-os na direção do sudeste, isto é, da Itália, de Roma.

Melânia para melhor contemplá-la colocou-se bem diante dela e notou que já não chorava mais, embora muito aflito o seu semblante. Nesse momento a radiosa Visão foi gradual e rapidamente desaparecendo.

"Derretia-se", na expressão das crianças, primeiro a cabeça, depois os braços, finalmente os pés. Breve ficou apenas uma nesga de luz e mais nada. Quando ainda se lhe viam os pés, Maximino, pelo grande desejo de apanhar uma das rosas do calçado, estendeu rápido o braço, porém, tudo sumiu.

Melânia, recordando as imagens dos nichos nas igrejas, exclamou: "Era talvez uma grande santa” - Maximino, respondeu: "Se o soubéssemos, eu lhe teria dito que nos levasse com ela". Assim se expandiam, continuando a olhar por algum tempo para o alto, na esperança de ver de novo Aquela que os empolgara com seus indizíveis encantos, suas lágrimas, sua voz melodiosa suavemente penetrante. Maximino notava:

"Nós lhe comíamos as palavras" - Ela, porém, se fora para sempre, após ter-se mostrado e ter conversado com os pastorinhos durante meia hora, conforme o tempo que levaram para narrar o extraordinário acontecimento.

É mister notar que durante todo esse tempo, ape­sar das idas e vindas, do diálogo prolongado em voz alta, o cão de Maximino, bicho muito atento e arisco, fi­cou quieto, deitado no mesmo lugar, sem se mover, nem latir.

Desapareci;da a "Bela Senhora" os pastorinhos "que ficaram contentes'' no dizer de Maximino, foram levando o seu gado ao pasto, trocando suas impressões. De repente, o menino perguntou a Melânia: ''Escuta, que foi que Ela ·te disse, quando mexia os lábios sem falar nada?" "Ela disse alguma coisa, respondeu a menina, mas disso não quero falar, pois Ela mo proibiu". “Ah! estou bem satisfeito, sabes, Melânia, pois Ela me confiou uma coisa, mas também não quero dizer'', retorquiu Maximino (9).

Dessa maneira foi que os dois ficaram sabendo do seu respectivo segredo. Em seguida passaram a outros assuntos e continuaram a brincar como se nada acontecera.

(9)Nos · manuscritos do Pe. Bossan,.. Bibliografia no 4.

 

CAPITULO SEGUNDO

FALA-SE DA "BELA SENHORA"

§ I - Primeiras narrativas

Lá por trás dos montes escondia-se o sol. Então Maximino e Melânia, tangendo o seu gado, foram descendo pelas fraldas e chegaram, à noitinha, à casa dos seus respectivos patrões.

Pedro Selme, vendo o seu empregadinho, conforme declaração por ele próprio feita em 28 de setembro de 1847, pergunta: "Então, Maximino, você não veio procurar-me no meu terreno, como tínhamos falado?"

"Ah! é que o sr. não sabe o que aconteceu. Encontramos uma Bela Senhora que muito nos ocupou. Pri­meiro tive medo, mas Ela nos chamou: "Vinde, meus filhos, não tenhais medo, aqui estou para vos contar uma grande nova". - Então o pequeno fez ao patrão a narrativa que sempre repetiu a todos que o interroga­ram" (10).

Admirado, Pedro Selme resolveu ir imediatamente procurar a Batista Prá, no intuito de ambos interrogarem a Melânia, que ainda cuidava do gado no estábulo.

A sra. Prá foi chamá-la: "Conta, Melânia, o que viste com Maximino". - "Pois eu vi o que ele viu; se ele falou, já sabem." E fez também a sua narrativa. Ouvindo as crianças falarem à noite numa língua que de manhã elas ignoravam, coisas que não seriam capazes de inventar, todos ficaram profundamente impressionados. A mãe de Batista Prá, jã muito idosa, ponderou: “Essa Bela Senhora que vistes, é certamente Maria SSma., porque só ela tem no céu um Filho que nos governa". E virando-se para Tiago, seu filho mais moço:

''Ouviste o que a Mãe de Deus disse a esta menina? De­pois disto vai ainda trabalhar no Domingo".

Tiago, para desculpar-se, respondeu: "Pois sim! Eu vou acreditar que essa pequena viu Maria SSma., ela que nem faz oração". Os moradores da aldeia, alvoroçados, aconselharam que se falasse com o vigário.

Entre os presentes, achava-se um funcionário da prefeitura que se apressou em levar o caso ao conhecimento do prefeito, Sr. Peytard, repetindo-lhe do melhor modo que pôde o que escutara. Pela manhã do dia seguinte, domingo, as duas crianças bateram à porta da casa canônica. Quem a abriu foi a boa da Fran­cisca, empregada, que logo declarou: "Falar com o vigário? Não, Não é possível, está muito ocupado". Mais ousado, Maximino insistiu: "É que viemos anunciar-lhe uma grande nova". - "Pois então, contai-ma a mim, que é a mesma coisa".

E as crianças contaram, mas o vigário que ouvira, apresentou-se e quis diretamente saber do fato. Era um santo velhinho, o Pe. Tiago Perrin. Comovido, exclamou de olhos marejados: "Ah! meus filhos, foi a Virgem SSma. que vistes ontem na montanha".

E o bom do vigário, sem cogitar de prudência, de leis na Igreja que proíbem falar de novas aparições, rabiscou umas linhas e no sermão da missa, por entre soluços, tentou repetir as palavras da "Bela Senhora".

Bem poucos o entenderam, salvo o prefeito que estava a par, como sabemos. O prefeito, na reunião dos ve­readores perguntou: "Quem pode explicar o que o vigário quis dizer?" Só o Sr. João Moussier, pai de dois futuros missionários de Na. Sra. de La Salette - vizinho de Pedro Selme - disse algo que ouvira na véspera.

(10) Manuscritos Bossan - Melle. des Brulais, Echo de la Sainte Montagne; - Biog. 3.

 

§ II- Inquérito do sr. Prefeito

O prefeito resolveu, por conta própria, abrir inqué­rito. Foi de tarde, à procura dos pastorinhos. Só encontrou Melânia, pois Maximino já estava em Corps.

Em casa de Batista Prá, foi interrogando a menina, com habilidade, esforçando-se, de todos os modos, para fazê-la cair em contradições. Não o conseguindo, ofereceu lhe umas lindas moedas de prata, com a condição de que ela deixasse de contar o acontecimento. Melânia, embora, tão necessitada, repeliu com desprezo as moe­das: "Mesmo que me désseis esta casa cheia de dinheiro, não me importaria, nada me há de levar a dizer o contrário do que eu vi e ouvi". Então o prefeito lembrou-se de lançar mão das ameaças: "Melânia, porque estás a mentir? Eu te mandarei prender, julgar e pôr na cadeia". Calmamente respondeu Melânia: "Todas as vossas ameaças, não me amedrontam, nem o vosso dinheiro me agrada. Eu disse tudo o que aquela Senhora me mandou falar."

Diante de tão enérgica resposta, calou-se o prefeito e se retirou. A respeito desse interrogatório, Batista Prá pondera: "Quando vi a maneira pela qual o Sr. Prefeito interrogou minha empregada, fiquei certo de que era verdade, acreditei; tanto mais que o prefeito fez os seus estudos, e é homem ilustrado; antes não acreditava, mas depois dessa discussão com a menina ele também acabou acreditando como eu". (Relatado por escrito pelo Pe. Lagier, em Fevereiro, 1847).

O prefeito, Sr. Peytard, na segunda-feira, 21 de setembro, lá se foi cedo a Corps ter com Maximino e, chamando-o a sós, disse-lhe brutalmente; "Ó desgra­çado! O que fizeste? estás espalhando uma história que tira o sossego de toda a gente e terá as piores consequências. Eu não queria estar no teu lugar, preferia ter matado alguém, a ter inventado o que tu e Melânia andais a contar."

Com toda a calma, respondeu Maximino: "Nós falamos apenas o que vimos e ouvimos."

Como na véspera, o prefeito recorreu, sem maior resultado, à força do dinheiro e das ameaças: polícia, juiz, cadeia. - "Pois bem: concluiu o Sr. Peytard; Domingo próximo, estarás lá na montanha". - Efetivamente, no Domingo, 27 de setembro, no lugar do acontecimento, achavam-se o prefeito, Maximino e Melânia, e também o sargento de policia. Novamente as crianças repetiram a narrativa como tantas vezes já tinham feito. No momento julgado oportuno, o sargento irrompeu: "Mentes, Maximino, eu vou te amarrar as mãos e te levar para a cadeia". E foi desenrolando as cordas que de propósito trouxera. O menino um instante estremeceu, mas logo respondeu: "Todas as vossas ameaças não me levarão a dizer o contrário do que vimos e ouvimos".

- Pois bem! Dize-me, para onde foi aquela Senhora?

- Desapareceu numa luz e a luz não nos deixou ver aonde é que ela foi.

- E depois nunca mais a viste?

- Não senhor: · Ela não voltou para nos dizer aonde foi.

- No entanto foi encontrada, e soldados prenderam-na e a levaram para a cadeia.

- Oh! muito esperto será quem conseguir prendê-la!

Esses pormenores, o próprio prefeito, atendendo ao pedido que lhe fora feito, comunicou, por carta com data de 2 de outubro de 1847, a D. Villecourt, bispo de La Rochelle, Concluindo: A narrativa das crianças, no dia 27 de Setembro de 1846, foi a mesma que tinham feito no Domingo anterior e que fizeram ainda hoje" (11).

(11) Villecourt - Verité sur l'evenement de La Salette - Bibliografia 19. Texto completo da carta, na obra: "L'Apparition de Notre Dame de La Salette" - I volume, pagina 70 - Bibliografia no 70.

 

III § - Um arcipreste atento e prudente

O Pe. Mélin, arcipreste de Corps, mostrou-se mais frio que o vigário e menos apressado do que o prefeito de La Salette. Não procurou pelos videntes. Maximino tivera de contar o fato à madrugada, à avó e a Angélica, sua irmã. Esta no sábado 26 de Setembro falou ao arcipreste: "V. Revma. sabe que meu irmão viu Nossa Senhora?"

- Pois bem! diga-lhe que venha me falar depois da minha missa.

Aconteceu que Melânia. nesse mesmo dia, veio a Corps visitar uns parentes. O arcipreste convocou portanto os dois, que chegaram juntos à casa paroquial. Mal tinham entrado, o Pe. Mélin os separou. Melânia, na cozinha e Maximino, com ele, no salão.

Terminada que foi a narrativa do menino, perguntou: "Só isso?"

- "Não, mais alguma coisa, mas ela mo proibiu de contar” .

Depois ouviu Melânia, a quem fez a mesma pergunta, recebendo a mesma resposta. Assim ficou compreendendo que fora confiado um segredo a cada um.

Fez umas perguntas com toda a ponderação e os despachou, sem dizer "nem sim, nem não".

Dois dias depois, isto é, segunda-feira, 28 de setembro de 1846, acompanhado pelo sacristão e mais quatro pessoas, o Pe. Mélin estava no lugar da Aparição, junto com Maximino e Melânia, que ele e outros crivaram de perguntas, até com ares de mofa, levando-os para cá e por lá, nos lugares da visão, procurando fazê-los cair em contradições. Debalde. Assim como com o prefeito, os videntes sempre repetiam a todos o que tinham dito anteriormente. Apesar de aparente frieza, ficou o Pe. Mélin comovido e convencido como confessou mais tarde. Tanto ele como as demais pessoas, caíram de joelhos e fizeram uma oração.

Notando que alguém quebrava a pedra em que se assentara a "Bela Senhora", não só proibiu, mas ainda, colocou-a, nas costas do sacristão Feliz Blane, de 15 anos que, mais tarde, quando padre, contava com alegria, ter ele com Maximino levado a pedra até Corps.

O Pe. Mélin, quando todos iam descendo de volta, mandou Maximino encher uma garrafa da água da fonte que nascera no local da visão, lembrado que a sua paroquiana, sra. Aglot, tão doente, poderia dela fazer uso.

· De fato, a enferma recuperou a saúde. Seu estômago, desde muito tempo, não suportava alimento algum. Ela usou a água, fez uma novena a Nossa Senhora e, terminada a novena, estava completamente curada.

Compreendeu então o Pe. Mélin que era de sua obrigação levar ao conhecimento da autoridade eclesiástica todos esses acontecimentos e informações colhidas.

Nesse intuito, escreveu, a 4 de outubro de 1846, uma carta ao Exmo. Sr. D. Felisberto de Bruillard, bispo de Grenoble, relatando todos esses pormenores. Assim ini­ciou-se uma correspondência que deveria prolongar-se durante vários anos (12).

(12) Esses acontecimentos acham-se relatados na revista " Annales de Notre Dame de La Salette" reproduzidos pelo Pe. Hostachy em Histoire Séculaire de La Salette, pf. 37, 38, 39 - Bibliografia no 71.

 

CAPITULO TERCEIRO

QUEM ERA A "BELA SENHORA"?

§ I – Realidade do grande acontecimento

Para conseguirmos a resposta verídica e indiscutível à pergunta de tão capital importância: "Quem era a Bela Senhora?", procederemos com prudência e gradualidade, de modo a levar a bom termo o nosso intento. Veremos pois:

1o) que temos toda a certeza de que Maximino e Melânia narraram o grande acontecimento conforme ficou relatado no Capítulo anterior;

2o) que Maximino e Melânia não quiseram enganar em sua narrativa;

3o) que Maximino e Melânia, mesmo querendo, não poderiam enganar em sua narrativa;

4o) que Maximino e Melânia não foram enganados em sua narrativa.

§ 1.0 - Temos toda a certeza de que Maximino e Melânia narraram fielmente o grande acontecimento, conforme ficou acima relatado. Com efeito, lemos essa narrativa em documentos que pessoas merecedoras de confiança escreveram, na mesma época em que o fato se realizou, enquanto Maximino e Melânia lhes estavam falando ou respondiam às perguntas que lhes eram feitas. Apresentaremos aqui os documentos principais, acrescentando umas notas históricas.

1) - Documento denominado "Relatório Batista Prá". Referimos no capítulo anterior que o Prefeito de La Salette, no Domingo 20 de setembro de 1846, interrogou prolongadamente a Melânia em casa de Batista Prá. Mal o Prefeito se retirou, o mesmo Batista Prá chamou seus vizinhos João Moussier e Pedro Selme.

Então, a seu pedido, Melânia ia narrando enquanto ele escrevia as palavras da "Bela Senhora". Esse escrito, intitulado ingenuamente por esses campônios: "Carta ditada pela Virgem Santíssima a duas crianças na montanha de La Salette", assinado pelos três, constitui o primeiro documento.

Dele possuímos cópia manuscrita - pois o original extraviou-se - feita pelo Pe. Lagier, de quem logo falaremos, com estes dizeres: "Por cópia conforme o original que me foi comunicado por Batista Prá, filho da V. Prá. Corps, 28 de fevereiro de 1847" (13).

2) - Relatório de José Laurent, natural e morador de Corps, onde nasceram os videntes, de 27 de novembro de 1846, com hino a N. Sra. de La Salette, hino esse cantado no lugar da Aparição a 28 de novembro de 1848, em agradecimento por curas milagrosas a favor de pessoas da sua família. Esse Relatório foi impresso na cidade de Grenoble, em Dezembro de 1846.

3) - As extensas notas do Pe. Lagier, vigário, também natural de Corps, onde se achava, no mês de fevereiro de 1847, devido à doença do seu pai: "Aproveitando a oportunidade, resolveu fazer um inquérito no intuito de desmascarar a impostura".

Interrogou os Videntes separadamente, e depois em conjunto, horas a fio, no próprio dialeto da região; ficou procurando, por todos os modos levá-los a cair em contradições. Sendo baldados tantos esforços, acabou convencendo-se da realidade do grande acontecimento.

Agora conhecia não só as palavras da "Bela Senhora", mas também circunstâncias anteriores e posteriores ao fato, em seus pormenores.

4) - O Relatório de F. Long, tabelião e na ocasião Juiz substituto de Corps. Tendo a autoridade pública resolvido intervir, o procurador do rei deu ordem ao juiz local de abrir inquérito rigoroso. Cumprindo essa ordem, o juiz Long convocou Maximino e Melânia, advertindo-os severamente das penalidades em que incorreriam se mentissem à justiça; e, devidamente assistido pelo escrivão Giraud que redigia a ata, submeteu os atemorizados pastorinhos a muito habilidoso interrogatório, tanto em separado como em conjunto. A 23 de maio de 1841 remeteu ao procurador o seu Relatório oficial, que nada era senão as já conhecidas narrativas, separadamente apresentadas. Foi publicado esse Relatório em 1850, no livro do Pe. Rousselot “Novos documentos sobre o acontecimento de La Salette".

5) - Relatório do Pe. Lambert. de 29 de Maio de 1847, vigário na diocese de Nimes, sul da França, que tinha ido a La Salette, onde passou seis dias. Nesse do­cumento lê-se a narrativa em separado de Maximino e Melânia, com as palavras em francês ou em dialeto, conforme as pronunciara a "Bela Senhora". Narrativa escrita palavra por palavra, sob o ditado das crianças, com a presença de seis testemunhas.

Existem outros treze Relatórios escritos de fim de 1846 a meados do ano de 1847, porém ou não são tão completos - sendo apenas um resumo das narrativas, conforme os autores, padres aliás, lembraram dias após ter ouvido as crianças, - ou foram comunicados só depois do ano de 1850 (14). Como livros daquela época limitamo-nos a mencionar: "L'Echo de la Sainte Montagne" (Eco da santa Montanha, da Srta. des Brulais,

diretora de um pensionato da cidade de Nantes, que subiu a La Salette, a 10 de setembro de 1847 e lá voltou outros sete anos, passando meses em Corps, aproveitando todas as oportunidades para ouvir e interrogar a Melânia e a Maximino; e os livros do Pe. Rousselot.

Pois bem, de todos esses documentos consta claramente que Maximino e Melânia narraram pela primeira vez o grande acontecimento a 19 de Setembro de 1846, e que as narrativas por eles feitas posteriormente, na expressão do juiz Long em seu Relatório oficial, "em nada diferem daquilo que contaram aos seus patrões, ao chegarem a casa na tarde do mesmo dia da Aparição. Se existe alguma diferença, é nas palavras, mas o fundo é o mesmo; é pelo menos o que Pedro Selme tem contado" (15).

É mister portanto concluir:

Temos toda a certeza de que Maximino e Melânia narraram o grande acontecimento como acima foi relatado.

(13) Fotocopia desse manuscrito do punho do Pe. Laqier acha-se na obra: ''N. D. de La Salette'', III vol., pg. 54 - Bibliografia n. 10.

(14) Os originais doa dezoito Relatórios mencionados, encontram-se, parte no arquivo da diocese de Grenoble, parte no arquivo dos Missionários de N. Sra. de La Salette que os imprimiram todos na obra ''Notre Dame de La Salette" - 2o vol. pg, 131, e 3o vol. pg. 88. Bibl. 70.

 

§ II – Os videntes Maximino e Melânia não quiseram enganar

Não é possível supor que os pastorinhos de La Salette tenham feito propósito refletido, combinado entre si, de enganar conscientemente e sempre, seus patrões, seus parentes, seus conterrâneos, o mundo inteiro, pois seria o mesmo que acusá-lo de serem mentirosos impru­dentes, impostores refinados, criminosos da pior marca, verdadeiros fenômenos de hipocrisia, de audácia, de astúcia, de perversidade, enfim uns monstros. Com efeito, nada Parecido com isso há no quadro que dessas crianças esboçaram pessoas conceituadas, merecedoras de crédito e de comprovada sagacidade, que as conheceram, examinaram e frequentaram.

O Pe. Mélin, vigário dos videntes, “homem de espírito vigoroso e grande prudência" na opinião do bispo D. Ullathorne (16), assim escrevia dos seus pequenos paroquianos, em sua carta ao bispo de Grenoble de 4 de outubro de 1846: ”Eu os tenho interrogado. as autoridades os ameaçaram, ofereceram-lhes dinheiro.
Com vagar tomei informações, e nada, absolutamente nada consegui descobrir que demonstrasse mentira ou trapaça".

O prefeito de La Salette, após seus inquéritos acima relatados, escreveu: "Confesso que minha incredulidade foi derrotada e que fiquei totalmente convencido de que essas duas crianças nada falavam que não fosse a pura verdade (17).

O próprio bispo destinatário dessa carta, de volta da sua romaria a La Salette, realizada em 1847, notava: "Em Maximino logo transparece a candura e o encanto da sua alma. . . Melânia, muito silenciosa, singela, no falar. . . é ingênua e sem rodeio” (18).
O companheiro desse bispo, o cônego Latta, em carta de 16 de agosto de 1847: "Há nos dois pastorinhos de Corps inimitável e ingênua simplicidade. Não será em almas semelhantes que haverá astúcia e impostura. Nem sequer são capazes de tal pensamento".

De Maximino, o seu patrão Pedro Selme, dizia: "É um inocente sem malicia". A srta. des Brulais, em sua primeira romaria a La Salette, em 1847, assim ia dialogando com seu guia: "É verdade que ameaçaram levar preso a Maximino?" - é verdade, senhora; o sargento da Polícia, gritou-lhe: Mentes! e apertou as cordas que o atavam. - Esse menino é franco, dizem – Oh! minha senhora, vereis, é duma naturalidade! não sabe mentir''.

- Seus companheiros acreditam que éle conta a verdade?

- Todos acreditam.

- Nunca o trataram de mentiroso?

- Não, senhora. Nem é possível."

Ela prossegue em seu livro "Eco da Santa Montanha" (19):

"Na minha volta, ouvi um padre dizer que ele mesmo tinha perguntado às crianças da escola: ''Maximino fala mentira, quando conta tudo isso, não é?

- Oh! não, senhor, ele fala a verdade".

É sabido com que facilidade entre companheiros descobrem-se as mentiras. Depois de ter ela mesma interrogado o menino, declara: "É levado, mas é incapaz de pregar uma mentira, menos ainda sustentá-la."

A madre superiora do colégio onde estavam Maximino e Melânia disse ao padre Arnaud: "Quando eles faziam alguma travessura, por vezes procuravam des­culpar-se por meio de palavras lá não tanto exatas, porém não eram capazes de sustentar por muito tempo as suas pequenas mentiras, pois logo se confessavam culpados" (20).
Essas mentirinhas sem importância em nada prejudicavam a veracidade dos depoimentos das duas crianças. Aliás que motivos os levariam a mentir?

Amor próprio e vanglória não tinham. Quando perguntavam a Maximino: "Que é que você fazia antes de ser empregado?" - Respondia: Estava em casa dos meus pais e andava recolhendo estrume pelas estradas" (21).
“Melânia é notável pelo seu retraimento e grande modéstia, não gosta que se ocupem com ela. A respeito do acontecimento: "Preferia não ter de contá-lo, afirmava: com a condição de que os outros o saibam, e que Ela não me encarregasse de contar."

- Por que?

- Isso me obriga a mostrar-me (22).

Pelo gosto de mentir? Então deixariam logo de fazer a sua narrativa. Aborrecido de que tanta gente viesse interrogar o filho, o pai de Maximino, já no dia seguinte ao acontecimento, proibiu-lhe que atendesse.

Vendo pessoas falarem com ele, bateu no menino com violência (23).

O mesmo se deu com Melânia. Mons. Dupuch relata: “O meu criado ia perguntando; eu, que estava ouvindo, pelas respostas soube das pancadas que Melânia recebeu do pai" (24).
Para ganhar dinheiro?

Vimos, pelos testemunhos relatados acima, como eles repeliram as ofertas com toda energia. As suas fa­mílias continuaram pobres. Eles falavam com franqueza. Em sua narrativa contaram que, à Pergunta da "Bela Senhora": "Fazei bem vossa oração?" responderam singelamente: "Não, Senhora". Temos portanto toda certeza de que Maximino e Melânia não quiseram enganar.

(15) Pedra Selme foi o patrão de Maximino durante a semana da Aparição.

(16) Carta ao Bispo D. Villecourt. - Bibliografia 19.

(17} A Santa Montanha de La Salette, tradução de Almeida Garret, Bib. 32.

(18) Villecourt - Nouveau recit. - Bibliografia 19.

(19) Bibliografia 30.

(20) Amaud. Souvenirs intimes d'un Péler" Septembre 1847. Pag. 64. Bibliografia 20.

(21) Rousselot - La verité sur l'evenement de la Salette - Bibliografia 21. Foi esse autor quem fez a pergunta.

(22) Des Brulais. Echo de la Sainte Montagne. Bibliografia 30.

(23) Nortet - Notre Dame de La Salette - Paris 1879 - Bibliografia 28.

(24) Mons. Dupuch - Venez avec moi a La Salette - 1855. - Bibliografia 34.

 

§ III – Maximino e Melânia, mesmo querendo, não poderiam enganar.

Quando o sr. Giraud, pai de Maximino tendo ouvido o que narrou Pedro Selme, chegando em casa, de volta do botequim, hora tardia da noite de 20 de setembro de 1846 - acordou o filho para que lhe contasse o que acontecera, ficou escutando até certa altura e de repente exclamou: "é muito esperta a pessoa que te meteu tão depressa todas essas coisas na cabeça; enquanto que eu, foi com muito custo que consegui, em três anos, ensinar--te o Padre-nosso e a Ave-Maria". E, não querendo mais saber de nada, foi dormir bastante mal humorado" (25).

Órfão de mãe, entregue à madrasta, tão má que por vezes lhe negava comida, descuidado pelo pai, por estar este ou na oficina ou no botequim, Maximino, apenas com 11 anos de idade, esperto e vivo, quase sempre fugindo da escola e do catecismo, levava vida de vadiação, pelas ruas de Corps ou pelas encostas dos morros, cuidando, junto com seu cachorrinho, apenas duma cabra (26).

Melânia, com perto de 15 anos, de medíocre e delgada estatura, aparentando 11, devido à grande pobreza da sua família, desde os oito anos de idade colocada por seus pais, vivia continuamente empregada, só se achando na casa paterna durante os três meses do inverno.

Ficava então ajudando sua mãe, cuidava dos seus irmãozinhos, longe da escola, ausente do catecismo.

A vidente sabia o Padre-nosso e a Ave-Maria, que lhe tinha ensinado sua mãe. Esta, porém, dizia ao Pe. Arbaud: "Melânia tem a cabeça dura" (27).
Depois da Aparição, já interna do colégio das irmãs levou 18 meses preparando-se para a primeira comunhão (28).

Ambos só falavam o dialeto da região, embora soubessem algumas palavras da língua francesa. Maximino sabia um pouco mais, tendo maiores oportunidades em Corps, vila dum certo movimento, por estar situada na estrada nacional.

O Pe. Arbaud perguntou à mãe de Melânia: "Como é que sua filha não compreendia o francês uma vez que a sra. está falando regularmente essa língua?" - "Por certo, respondeu, Melânia compreendia algumas palavras francesas, quando lhe apareceu a Virgem SSma. e poderia saber mais se tivesse ficado na casa paterna; mas ela morava, a maior parte do ano, em lares onde é costume só falar-se o dialeto" (29).

Embora naturais de Corps, suas famílias residiam em pontas opostas da vila; por isso Maximino e Melânia só travaram conhecimento na tarde de 17 de setembro de 1846, ante véspera do grande acontecimento (30).
Atendendo pois à sua pouca idade, ponderando todas as circunstâncias, considerando a sua incapacidade intelectual, sua dificuldade enorme em adquirir conhe­cimentos religiosos; recordando a sua rudimentar educação, examinando o ambiente em que viviam inclusive as pessoas, muito impróprio para lhes proporcionar os elementos indispensáveis para a criação de cenas e atitudes fantásticas; e mais, não havendo em nenhuma capela da região o modelo da Virgem tão caraterística de La Salette, trazendo a cruz com martelo e torquesa; e finalmente, refletindo sobre a narrativa daquele deslizar por cima da relva, forçoso é concluir que Maximino e Melânia eram totalmente incapazes, por mais que quisessem, de compor, em prazo tão reduzido, e guardar na memória, o discurso em língua em parte por eles quase desconhecida, e com trechos de elevado alcance religioso, enfim tudo que eles narravam com minuciosa exatidão.

Temos, pois, toda a certeza de que Maximino e Melânia, mesmo querendo não poderiam enganar relatando o que lhes falou a "Bela Senhora".

(25) Norbert - livro já citado. - Bibliografia 68.

(26) Bez. Pélerinage à la Salette - Bibliografia 18.

(27) Livro já citado. Bibliografia 20.

(28) Dea Brulais. Echo de La Sainte Montagne. Bibliografia 30.

(29) Souvenirs intimes d'un Pélerinage, 19 Set. 1847. Pag. 79. Bibliog. 21).

(30) Notes Lagier. Bibliografia, 14.

 

§ IV - Maximino e Melânia não foram enganados nem por si próprios, por alucinação nem por outrem.

Lê-se no Dicionário Enciclopédico Brasileiro Ilustrado, de 1943: "Alucinação: Anomalia sensitiva que leva o doente a perceber objetos ou fenômenos que de fato não existem".

Ora, logo vão bordando: “Há o mundo surpreendente da alucinação, mundo movediço e incerto, mundo misterioso onde uma luz estranha, mas, dizem, idêntica à luz do dia, ilumina por vezes maravilhas nunca vistas" (31).

A alucinação provém pois dum estado bastante doentio, em que a pessoa, com o sistema nervoso excessivamente excitado e a imaginação por demais exaltada, cuida perceber objetos que, na realidade, não existem.

Ora, Maximino e Melânia gozavam perfeita saúde, e não viviam nesses ambientes agitados, cheios de epi­sódios românticos e frequentemente mórbidos, sacudidos e infeccionados por violenta e corrupta crônica policial; mas eram oriundos de ascendentes sadios, campônios rústicos, preocupados, além de escassos e rápidos atos religiosos, apenas com sua lavoura e seu gado, alheios a misteriosas cogitações.

Maximino e Melânia nunca tiveram, até o dia do grande acontecimento, o menor contato com os assinalados ambientes que os pudesse contaminar. Sua desapercebida vida, em afastados recantos, ao ar puro das montanhas, decorria no remanso da natureza campestre, debaixo do sol do bom Deus.

Neles, portanto, não existia sequer o mínimo germe que, depositado no famigerado subconsciente, pudesse evoluir ou explodir reproduzindo o que eles narraram. da "Bela Senhora", porque, é de clareza meridiana, que ninguém dá o que não tem e nunca teve.

Mais ainda, na alucinação, espontânea ou provoca­da por droga, estando a pessoa como que fora de si, tendo perdido o controle das suas ideias, surgem só incoerências e cenas caóticas do já mencionado "mundo movediço e incerto".

Pois bem, o grande acontecimento que Maximino e Melânia narraram, tanto na visão, como nas palavras e nas atitudes, constitui um conjunto magistralmente coordenado, uma harmonia maravilhosa.

Eles se conservaram senhores de si, ao acordar, não cogitam de coisas extraordinárias, simplesmente de encontrar o seu gado; a palavra de Maximino: "Guarda o teu bastão, Melânia..." denota a maior presença de espírito. Durante a Aparição, eles reagem normalmente, respondendo com precisão às perguntas da "Bela Senhora". Melânia, querendo saber o significado da palavra ''batata", vira-se com toda naturalidade para Maximino, como qualquer pessoa que quer pedir um esclarecimento. Fora o que lhes ficou na mente, do grande acontecimento, eles continuaram tais quais como dantes, em seu modo de agir e pensar.

A hipótese, por conseguinte, duma alucinação, é a respeito deste assunto, num artigo da revista "The Month", fevereiro de 1933, lê-se o seguinte: "O desagradável é que para a maioria desses problemas, como os de Fátima, Salette, Pontmanin e Beauraing, não se apresenta nenhuma esperança de solução satisfatória. Resta-nos, apenas, esperar até que o estudo da psicologia anormal e mórbida tenha feito progressos tais que nenhum dos que atualmente vive sobre a terra provavelmente chegará a vê-los (citado em La Salette, m, 66) (32).
Pedimos vênia para ponderar:

1.o A semelhantes progressos em outros campos e a leis ainda desconhecidas, recorrem os incrédulos para negar os milagres do próprio N. S. Jesus Cristo.

2.o Confessando o autor que a psicologia em seu estado atual nada explica, será que ele está seriamente acreditando que dia virá em que alguém, por ser anormal, dará o que não tem e nunca teve?

Será por acaso, que alguém, ou talvez alguns impostores idearam e depois ensinaram, como lição, todas as circunstâncias do grande acontecimento a Maximino e Melânia que, naturalmente cúmplices da criminosa impostura, concordaram em divulgá-la obstinadamente?

É só relembrar as provas acima aduzidas da candura e sinceridade dos pastorinhos, da sua memória tão rebelde que foram necessários vários anos para lhes ensinarem o Pai-nosso e a Ave-Maria e bem dezoito meses de ensino diário, ministrado pelas Irmãs Religiosas para eles adquirirem os conhecimentos doutrinários indispensáveis para serem admitidos à primeira comunhão e que eles se encontraram pela primeira vez na tarde da ante véspera do grande acontecimento e imediatamente se conclui que, em tão curto prazo, eles não poderiam decorar tão extensa e complicada lição, em duas línguas diferentes, sendo uma por eles quase ignorada, com todos os circunstanciados pormenores da Aparição; era simplesmente total essa impossibilidade.

Aliás, sabemos pelo testemunho de Pedro Selme, patrão de Maximino, que pessoa alguma com eles se encontrou até as doze horas de 19 de Setembro de 1846, dia da Aparição.

Aqui vai pois a declaração de Pedro Selme, toda repassada de singela sinceridade: "No Domingo 13 de Setembro de 1846, fui a Corps procurar um menino que pudesse cuidar das minhas vacas, pois o pastor, meu empregado, estava doente. Não achando nenhum, dirigi-me ao meu amigo Giraud, rogando-lhe que me confiasse o seu filho por uns oito dias. Recusou primeiro. Insisti muito e ele acabou cedendo.

Giraud tinha mandado seu filho Maximino dar um recado ao Sr. Vieux, na aldeia de Saint Julien. Tendo o menino chegado já à noite, esse senhor não quis deixá-lo partir e fê-lo dormir em sua casa. Ali fui buscá-lo no dia seguinte, segunda-feira, 14 do mesmo mês, pelas três horas da madrugada e levei-o comigo.

Maximino era um menino inocente, sem malícia e nada previdente.

Antes que ele partisse para conduzir nossas vacas à montanha, cuidávamos que ele tomasse a sopa e colocávamos no seu saco a comida para o dia. Pois bem, pelo caminho, comia tudo, dando parte do que levava ao seu cãozinho. Quando lhe dizíamos: "Mas que é que você vai comer durante o dia?" Maximino respondia: "Mas eu não tenho fome". Esse menino foi, nesse mesmo dia 14 de setembro e nos dias seguintes, cuidar das nossas quatro vacas no terreno que possuo, na vertente sul da montanha de Baisses. Receando que o pequeno Maximino não vigiasse com bastante cuidado as minhas vacas que poderiam facilmente cair nos inúmeros despenhadeiros da montanha, fui pessoalmente trabalhar no referido terreno; segunda-feira 14 de se­tembro e na terça, quarta, e sexta-feira da mesma semana.

Declaro e atesto que não o perdi nem um só instante de vista. o pequeno garoto. Era para mim muito fácil vê-lo, em qualquer uma parte do meu terreno onde ele estivesse, porque ali não existe nenhuma colina. No primeiro dia, levei Maximino até o planalto para lhe mostrar o riacho onde deveriam abeberar-se as vacas.

Aí ele as conduzia sempre pelo meio dia, depois voltava imediatamente a colocar-se sob a minha vigilância. Na sexta-feira, 18, eu o vi que brincava com a pequena vizinha.

Essas duas crianças iam ambas de manhã muito cedo para os seus terrenos e só voltavam à noitinha e iam dormir depois de ter tomado a sua sopa.

Durante os quatro dias e meio que o garoto cuidou das minhas vacas, eu não o perdi de vista; e atesto que não vi nem sacerdote, nem leigo aproximar-se dele para falar-lhe.

A pequena Melânia foi várias vezes cuidar das suas vacas no terreno do seu patrão, enquanto Maximino estava comigo. Atesto ainda que a vi continuamente só, e se alguém tivesse vindo falar com ela, eu teria notado, porque o meu terreno e o de Batista Prá são contíguos, na mesma encosta da montanha. Os dois terrenos tem a superfície plana, sendo suficiente portanto ficar em pé, para dominá-los inteiramente e para os abranger nu­ma vista d'olhos.

Esquecia-me dizer que num dos dias da semana o pequeno Maximino foi apascentar as vacas no outro terreno; mesmo assim, não ficou só, sendo vigiado, como nos outros dias, ou por minha mulher ou por mim (33).

No intuito de confirmar que Maximino e Melânia se encontraram pela primeira vez, na antevéspera da Aparição, quinta-feira, 17 de setembro, apresentamos aqui o diálogo que eles tiveram respectivamente, com a Srta. Des Brulais: Melânia no dia 13 de setembro, e Maximino no dia 14 de setembro de 1847, e que ela copiou:

- Ó Melânia, havia muito tempo que você e Ma­ximino se conheciam?

- Havia dois dias.

- Como é que você não conheceu a Maximino antes?

- Ele estava com seu pai em Corps.

- Em que dia você conheceu Maximino?

- Na quinta-feira.

- Ó Maximino, quando foi que você esteve com ela?

- Na quinta-feira eu a vi.

- Você a conhecia?

- Não. Encontramo-nos pela primeira vez nesse dia (34).

É por conseguinte indiscutível que durante todo esse prazo não sobrou vaga para nenhum impostor ensinar a suposta lição.

Temos pois toda a certeza de que: 1o, Maximino e Melânia não foram enganados nem por alucinação, nem 'por impostor nenhum, a respeito do que narraram acerca da "Bela Senhora". 2o, eles mesmos, querendo, não poderiam enganar. 3o, eram incapazes de enganar, devido à sua sin­ceridade e candura; logo, o que eles narraram é um fato real, certíssimo, isto é, que lhes apareceu uma "Bela Senhora" em condições extraordinárias.

(31) Queroy - Les Hallucinations, voL n. Pag. 29; tado por Jaunem La Grace de La Salette"; pag. 29. Biografia 13.

(32) O autor é o Pe. Thurson, S. J.

(33) Declaração em Rousselot, La vérité sur l'evenement de La Salette, Bibliografia 2, (reproduzido em Notre Dame de La Salette n, pg. 59- e 60. Biblig, 70).

(34) Des Brulais, Echo de la Sainte Montagne, 1852, pag. 'i0-71. - Bibl. 30. Em Notre Dame de La. Salette, vol. II, pag. 80 - Bibliografia 70.

 

§ V - Um Documento do Célebre Educador Mons. Dupanloup

Para ilustração dos argumentos apresentados acima, transcrevemos aqui os trechos mais caraterísticos duma carta que escreveu a um amigo, no dia 11 de ju­nho de 1848, Mons. Dupanloup, futuro bispo de Orleans, sem dúvida alguma um dos mais competentes e experimentados educadores do século passado. Mons. Dupanloup foi à Salette no começo de Junho de 1848, onde encontrou, examinou e interrogou a Melânia e a Maximino com quem ficou bem 14 horas. Ouçamos-lo:

“Empreendi essa romaria, confesso, com opinião antecipada pouco favorável; os próprios relatórios que eu tinha lido com cuidado me incutiram preconceitos contrários. É mister confessar que, se o meu testemunho acabar sendo a favor dessas crianças, não será pelo menos um testemunho suspeito; não terei sido, por certo, seduzido por elas.

Embora essas crianças muito me desagradassem antes da sua narrativa e continuassem a me desagradar depois, devo confessar que, recitando-a, fizeram-no com tanta singeleza, gravidade, seriedade e um certo respeito religioso, que fiquei sobremodo admirado, pois o contraste era completo com o tom sempre vulgar e geralmente grosseiro do menino e do modo tão geralmente enfadonho da menina.

Sim. Tornam-se de repente tão graves, sérios, tomam uma atitude como que involuntária que tem algo do singelamente simples e ingênuo, algo de tão grande respeito para si próprios e para com aquilo que estão dizendo, a ponto de comunicar esses sentimentos a quem os escuta, impondo a todos um quê de temor religioso para com as coisas que dizem, um quê de respeito para com suas pessoas. Percebi constante, e por vezes, mui fortemente essas impressões e no entanto nunca deixei de achá-los bastante desagradáveis.

Quando falam do grande acontecimento de que fo­ram testemunhas, ou às perguntas mais insidiosas dão respostas espantosas e irretorquíveis, além de toda expectativa, não manifestam a menor vanglória: ficam impassíveis, nem sequer o menor sorriso lhes vem aos lábios.

É um fato que, tanto um como outro, não gostam de falar desse acontecimento que os torna tão célebres, limitando-se a responder com simplicidade e ficando no estrito necessário.

Por mais indiscreta que seja a pergunta, a resposta é sempre adequada, nunca indo além de certa medida; por mais que se insista, há neles sem que o notem, algo de invencível.

Quem sabe o que são as crianças, essas naturezas levadas, curiosas, vãs, tagarelas, indiscretas. Quem fizer as tentativas que eu fiz, há de compartilhar da minha estupefação, perguntando a si próprio, se foi vencido pelas duas crianças ou por alguma força superior e divina.

Não aparentam nada de cumplicidade; aliás, fora necessário um talento inaudito, para ficarem constantemente de acordo consigo mesmos, desde há dois anos que perdura e prossegue ininterruptamente esse tremendo e rigoroso inquérito...

Essa é a primeira nota da verdade que verifiquei nas crianças.

Admirei Melânia nas suas numerosas respostas, realmente espantosas, perfeitamente inesperadas, que desconcertam os interrogadores, liquidam todas as per­guntas indiscretas, resolvem simplesmente, profunda­mente, absolutamente as maiores objeções, todas elas acima da sua idade e de seu alcance.

Aqui vão algumas:

Perguntaram-lhe:

- Você disse que a tal "Senhora" desapareceu.

De certo, sumiu-se dentro duma nuvem.

- Não havia nuvem.

- Ora, é fácil meter-se dentro duma nuvem e desaparecer.

- Então meta-se o senhor dentro duma nuvem e desapareça.

- Essa "Senhora" falou francês e você não compreendia; como é que se lembra? É que ela repetiu muitas vezes... ?

- Não, falou uma só vez e me lembrei. Aliás, o que tem isso? se eu não sabia compreender, quem sabia o francês havia de compreender, é quanto basta .

- A "Senhora" confiou-lhe um segredo, mas Deus o revelou a uma religiosa. Desejaria. pois, que você o dissesse, para ver se fala a verdade.

- Se essa religiosa sabe, que o diga; eu não o direi.

- Você tem que dizer o segredo ao confessor, a quem não se deve esconder nada.

- O meu segredo não é pecado; ao confessor há só obrigação de contar os pecados.

- O seu anjo da guarda bem que sabe o seu segredo.

- Sim, mas o meu anjo da guarda não é do povo.

- A "Senhora" que você viu foi o demônio que veio perturbar a Igreja.

- Mas o demônio não leva a cruz no peito.

Ora essa ! O demônio que levou a Jesus até ao alto do templo de Jerusalém, bem que pode levar a cruz.

- Não senhor, Deus não havia de deixar o demônio levar a cruz, pois foi na cruz que Ele morreu.

- Se se deixou levar a si próprio?

- Mas foi pela cruz que ele salvou o mundo. Jesus ainda não fora glorificado.

A beleza e a profundeza desta resposta fizeram que todos se calassem.

A Maximino:

- A "Senhora" se enganou, pois anunciou fome, no entanto a colheita é ótima.

- Nada tenho com isso. Ela falou, o mais é com ela, ou talvez tenham feito penitência.

- A ''Senhora" que você viu era uma nuvem?

- Nuvem não fala.

- Você é um mentiroso, não acredito.

- 'Que me importa! estou encarregado de dizer e não de obrigar a crer.

- Talvez foi o demônio que lhe confiou o segredo que você fala.

- O demônio não leva cruz e não proíbe blasfêmias.

- O seu segredo é por certo a bem das almas, então escreva, ponha-o num envelope fechado e mande-o à secretaria do sr. Bispo e quando você morrer ele abrirá o envelope e você terá guardado o seu segredo.

É que alguém poderia ser tentado a abrir a carta, depois eu não conheço quem é que está na tal secretaria; (pondo a mão no coração) a melhor secretaria está aqui.

- Você quer ser padre; pois, eu falo com o sr. Bispo e me encarrego de tudo, se você me disser o segredo.

- Se para ser padre tenho que dizer o meu segre­do, nunca o serei.

- Se você tivesse de escrever o seu segredo ou morrer, que faria?

- (Com firmeza) Morreria.

- E que foi que você sentiu - perguntou um padre - depois da Aparição?

- Sentimo-nos bem felizes.

- E nos dias seguintes?

- Foi como V. Revma.: muito fervoroso na celebração da sua primeira missa, um pouco menos na segunda, e depois como toda a gente.

Prossegue Mons. Dupanloup: - ''Maximino pen­durou-se no meu braço e não mais me deixou o dia todo. Descemos assim da Montanha juntos. Fi-lo almoçar e jantar comigo". Então Mons. Dupanloup re­novou suas insinuações para conseguir o segredo. Baldados esforços.

"Eu tinha, diz ele, uma maleta, cujo cadeado abria e fechava por meio de segredo. Sendo o pequeno mui­to curioso, mexendo com tudo, olhando tudo, viu que eu abria sem chave e me perguntou como é que eu fazia: Respondi: "É um segredo... Pediu com muita in­sistência que lhe mostrasse. Aproveitando o ensejo, eu lhe disse: "Meu filho, é meu segredo; você não quis me dizer o seu eu não lhe direi o meu...

- Não é a mesma coisa, logo atalhou.

- E por quê?

- Porque estou proibido de dizer o meu segredo, e ao Sr. ninguém proibiu dizer o seu.

A resposta era sem réplica. Mas continuei:

- Uma vez que você não me quer dizer o seu se­gredo, eu também não direi o meu.

Ia de propósito fechando e abrindo o cadeado sem que ele desse pelo segredo, isso durante horas; ele sempre implorando, implorando. E apaixonado, como que ardendo: “Mas diga-me!"

Está bem! eu digo, mas você tem que me dizer o seu.

Então a sua curiosidade sumia-se. Vendo-o sempre firme:

- Diga-me ao menos se o seu segredo é para bem ou para mal.

- Não posso! respondeu.

Compadecido, Mons. Dupanloup ensinou-lhe o segredo. O menino, pulando de alegria, foi várias vezes abrindo e fechando a maleta. Mons. Dupanloup pondera: "Bem poderia ele ter-me contado qualquer história, se a Aparição fosse um invento deles". Continuando: "Um caso particular me levara a trazer comigo quantia vultosa em ouro. Maximino ia de novo olhando tudo, mexendo em meus objetos, farejando e de repente encontrou a bolsa com as moedas de ouro.

Pegou nelas com rapidez e colocando-as em cima da mesa, brincava de contá-las, empacotando-as e desmanchando o pacote. Quando percebi que ele já estava todo encantado, arrebatado em contar, segurar e tocar esse ouro, julguei o momento oportuno para experimentar e conhecer com certeza a sua sinceridade. Disse lhe com tom de amigo: "Pois bem, meu filho, se você me dissesse o segredo, pelo menos parte do que pode dizer, eu poderia lhe dar todo esse ouro para você e para seu pai. Eu daria tudo já e não se preocupe que tenho mais para minha viagem.

Então vi um fenômeno moral de certo muito especial, e contando-o sinto-me ainda impressionado. O menino estava todo possuído pelo ouro, gozava imenso em vê-lo, tocá-lo. De repente, ouvindo minhas palavras, ficou triste, afastou-se rápido da mesa e da tentação e me disse:- Senhor, eu não posso.

Insisti:

- No entanto, você teria o suficiente para ser feliz junto com seu pai.

Respondeu mais uma vez:

- Não posso! - e pronunciou essas palavras com voz tão firme que me senti vencido.

Disfarcei porém, e com voz a um tempo mal humorada e irônica:

- É que talvez você não queira dizer porque não tem nenhum segredo. Você está apenas gracejando".

Não se mostrou ofendido pelas minhas palavras e respondeu com vivacidade:

- Oh sim! tenho um, mas não posso dizê-lo.

- Quem lho proibiu?

- A virgem Santíssima.

Parei. Senti que a dignidade do menino superava a minha.

Coloquei então, com amizade e respeito, a minha mão na sua cabeça e fazendo uma cruz na sua fronte, disse-lhe: - Adeus, meu querido filho, espero que a Virgem Santíssima, há de me perdoar todas as minhas insistências que eu lhe fiz. Fique fiel toda a vida à graça que recebeu" (35).

Semelhante documento, quer pelo seu conteúdo, quer pelo seu autor, constitui testemunho de altíssimo valor que muitíssimo corrobora toda a nossa argumentação. Esta é a nossa conclusão: -"Uma Bela Senhora mostrou-se realmente a Maximino e Melânia em La Salette, no dia 19 de setembro de 1846, nas condições extraordinárias por eles descritas, e pronunciou o discurso por eles relatado, e essas condições demonstram claramente que Ela não era um ser do mundo presente.

(35) Essa carta foi publicada no jornal da época: "Ami de la Relision", no 7, ele abril de 1849.

 

CAPÍTULO QUARTO

A "BELA SENHORA" É MARIA SSMA. MÃE DE DEUS E MÃE DOS HOMENS.

§ I - Preliminares

Recorda-se por certo, o leitor, de que logo no mesmo dia do acontecimento, a mãe de Batista Prá declarou:

“Meus filhos, vistes a Virgem SSma.” No dia seguinte, Domingo, o vigário de La Salette, já pregou sobre N. Sra. de La Salette, e na segunda-feira, 28 de setembro, o Pe. Mélin, arcipreste de Corps, conforme confessou ulteriormente, ficou convencido de que se tratava duma aparição de Maria SSma. (36)

Julgamos atualmente um tanto apressada essa crença. É que nós julgamos mais dum século depois. Eles porém achavam-se em contato direto com Maximino e Melânia, eram conhecedores imediatos do ambiente, das qualidades e das deficiências desses pastorinhos, nada lhes obstava a aceitação do fato.

Os professores do seminário maior de Grenoble, consultados, se externavam com mais reserva; e embora admitindo a candura simples e firme das crianças, eram de parecer que o fato fosse examinado pela autoridade Eclesiástica a fim de se tornar incontestável, e melhor ainda, que fosse confirmado por milagres, verdadeira marca da intervenção divina. Era muito prudente essa atitude (37).

Para conseguirmos, portanto, plena certeza de que a "Bela Senhora" é a própria Maria SSma., Mãe de Deus e Mãe dos homens, vamos proceder gradualmente:

1o Examinaremos o que Ela disse.

2o Apresentaremos prodígios maravilhosos que se preliem ao grande acontecimento.

3o Lembraremos alguns milagres propriamente ditos, que comprovam ser a "Bela Senhora" a própria Mãe de Deus.

4o A decisão da competente autoridade eclesiástica.

5o La Salette em Roma.

(38) Carta do P. F. Blanc - Anales de Notre Dame de La Salette - Agosto de 1874 - Bibliografia 52.

(37} Rousselot. Nouveaux documents sur l'evénement de La Salette, 1850, Pag. 1$; Bibliografia 21.

 

§ II - Exame das palavras da "Bela Senhora" em La Salette.

Comprovada no capítulo anterior, de modo irrefragável, a realidade completa do acontecimento, torna-se necessário estudá-lo com algum apuro, pois trata-se dum fato religioso, para descobrir se, porventura, nele se encerra algo contrário à divina Religião.

Pois bem, examinemos o discurso da "Bela Senhora".

Vejamos antes de tudo, a admirável unidade, a forte coordenação desse discurso, em estilo direto "eu" - "vós".

Nota-se logo que é uma advertência, a um só tempo, severa e maternal ao povo cristão, bastante culpado.Na primeira frase: "Se o meu povo não quer sub­meter-se"', a Oradora indica o mal na sua universalidade, isto é, a revolta geral contra Deus, provocando ''o braço forte e pesado" da divina Justiça, que Ela, intervindo em nosso favor, se esforça por aplacar. "Há muito tempo que sofro por vós (38), vejo-me forçada a rezar sem cessar por vós", com apelo às almas generosas: "Por mais que façais, por mais que rezeis..."

Sendo a revolta pecado do espírito, isto é, particularmente o orgulho, logo temos o anúncio do castigo da alma: ‘Se quero que meu Filho não "vos abandone", o tremendo afastamento de Deus!

Em seguida, Ela especifica esses pecados: A violação do Domingo e a blasfêmia. Ora o que motiva esses pecados é o afã do lucro, a vontade ansiosa de possuir mais e mais bens materiais; para tanto ''trabalha-se no Domingo e se conduzem carroças". é lógico, pois, que venham castigos que atinjam esses bens: “A colheita se estraga, não haverá mais batatas; o trigo torna-se em pó, as uvas apodrecem, as nozes se estragam" (39).

Intercalam-se agora os segredos que, pelo pouco que o Papa disse, são a continuação dos castigos. O discurso apresenta depois o remédio para tantos males: "Se eles se converterem", e logo a recompensa: "As terras se acharão como que semeadas por si próprias e as pedras se tornarão em montões de trigo (40).

Falar de coisas tio ínfimas, tão materiais! exclamam alguns. Como se a dona da casa do pobre carpinteiro de Nazaré e a Mãe de Quem multiplicava pães e peixes, até os assava, não pudesse designar os alimentos dos pobrezinhos, pelos nomes que o povo lhes dá!

Indica então os meios para a perseverança na conversão, de modo indireto: a mortificação, censurando com energia "que se vá ao açougue como cães"; queixando-se de que "não vão à missa", portanto é necessário ir participar do sacrifício do Cristo, fonte de graça e salvação; a oração: "Fazeis bem a vossa oração?

- Não senhora. - É preciso fazê-la bem" (41).
Finalmente recomenda confiança nela. Lembra o episódio da terra de Coin, em que o trigo ficou estragado, cruel a decepção para o lavrador: e o que se passou com o pai de Maximino, de antemão aflito por talvez não ter mais pão para dar ao filho, episódios esses que apresentam, de modo tão expressivo e confortador, a providência maternal de Maria SSma. interessando-se "por nós e tão de perto nos acompanhando.

Conclui logicamente o seu discurso com esta ordem: "Pois bem, meus filhos, comunicai isto a todo o meu povo", para que a sua advertência alcançasse a todos e que portanto a sua intervenção não ficasse infrutífera, mas que Deus fosse melhor servido e seu povo reconduzido ao seu Filho.

(38) É claro que ali Maria SSma. intercede por nós. Pois bem, houve quem visse um conflito entre Jesus e sua Mãe! No. D. Salette, I, p. 17. Bibliografia 70.

(39) Gustavo Thibon, lavrador e grande escritor disse: "A mensagem da Virgem resume-se nestas palavras: Se não procurardes o Céu, perdereis a terra". Em La Salette, Temoignages.. p. 180, em 1946. Bibliografia 79.

(40) Linguagem da S. Escritura, em que Deus promete uma terra onde hão de correr leite e mel (Ex. m, S. 1,1). No Evangelho, o próprio Cristo exige "se adore a Deus em espírito e verdade'', e anuncia: ''Eu vos preparo um reino, como o meu Pai mo preparou, para que comais e bebais, à minha mesa, no meu reino” (Luc. 22. 19).

(41) Jesus também perguntava: "Quantos pães tendes?" Isto para esclarecer a quem pretende que se fosse Maria SSma., não faria tal pergunta porque Ela já sabia que não faziam oração.

 

§ III - Em La Salette a Visão fala e age como Mãe e Medianeira doe homens.

Analisando, embora rapidamente, esse discurso de tão rija e harmoniosa estrutura, dirigido, na pessoa das duas crianças, a todo o povo, não só nada nele se encontra que seja contrário à doutrina Católica, mas pelo contrário nela se nos apresenta Maria SSma. com aquelas dignidades e prerrogativas que a Igreja de Cristo dela proclama e que nela honra.

Para ilustrar essa nossa asserção e dela tirar as consequências próprias para o assunto em foco, julgamos desnecessário prender em demasia a preciosa atenção do leitor, aduzindo as elevadas explanações dos mestres da doutrina, que são os teólogos.

Será suficiente, ao nosso ver, referirmo-nos às orações, às invocações, com que a Santa Igreja, por boca dos fiéis, · exalta a suplica diariamente a Virgem Nossa Senhora.

Na Ave Maria, na Salve Rainha, na Ladainha, clara e indiscutivelmente, Maria SSma. vem repetidamente sendo proclamada Mãe de Deus, Mãe dos homens, rainha universal; é também invocada como Advogada e Medianeira junto ao Cristo em favor dos homens.

No discurso em La Salette, igualmente, a "Bela Senhora" fala e age como sendo mãe de Deus, Mãe doa homens, Rainha universal, advogada e Medianeira junto a Cristo em favor dos homens.

Mãe de Deus. Logo de início: "O braço" do meu Filho é tão forte é tão pesado, que já não o posso suster (42) também: "Se quero que meu Filho não vos abandone"... Ela como que se identifica com o próprio Deus, ao mencionar os mandamentos: '"Dei-vos: seis dias para o trabalho, só me reservei o sétimo... "

Mãe dos homens. Ela os convida para ouvir sua Mãe: “Vinde meus filhos, estou aqui para vos contar uma grande nova”. Indaga, como fazem as mães cristãs: ''Fazei bem à vossa oração, meus filhos?" e logo acrescenta o conselho, antes, a ordem: "é preciso fazê-la bem". Isso para o bem da alma, como primeiro tinha aconselhado para o bem do corpo: "Se tendes trigo, não deveis semeá-lo, porque os insetos vão comê-lo".

As mães deste mundo, embora tanto o queiram, não podem acompanhar os seus filhos por toda parte, como Ela faz lá do céu; pois, no caso da terra de Coin, estava vendo e ouvindo o lavrador, Maximino e seu pai.

Rainha universal. Na sua fronte refulge o diadema real. Na sua primeira e na sua última palavra, dirige-se ao seu povo, frisando: "A todo o meu povo", ao qual recorda os divinos mandamentos como sendo suas leis. . . “Dei--vos seis dias e não mos quereis conceder". Apresenta-se como sendo Ela quem decretou penalidades pelas infrações das leis: “Se a colheita se estraga é por vossa causa, bem vo-lo mostrei no ano passado com as batatas".

Ela mesma se declara Advogada e Medianeira junto a Cristo em favor dos homens, nas seguintes palavras: . "Se meu povo não quer submeter-se, vejo-me forçada a deixar cair o braço do meu Filho. É tão forte e tão pesado que não posso mais sustê-lo. Há muito tempo que sofro por vós. Se quero que o meu Filho não vos abandone sou obrigada a rezar sem cessar por vós. . . Nunca me podereis retribuir os penosos cuidados a que me dei por vós.

"Eu sofro". - Ora no Céu não há sofrimento, ponderam alguns. Para que todos compreendam bem esta palavra, pedimos Vênia para transcrever aqui os seguin­tes esclarecimentos dum teólogo contemporâneo:

“É preciso considerar o S. Coração de Jesus como sendo cruelmente ferido pela ingratidão dos homens... como sendo digno da nossa compaixão".

Sem dúvida, Jesus não sofre mais por parte dos homens, porém não deixa de ser um fato que os homens fazem, por parte deles, tudo o que é preciso para fazê-lo sofrer. É mister dizer que esses ultrajes repercutiram, certo dia, em seu coração. esses ultrajes Ele sofreu, quando ainda podia sofrer. Em sua Paixão, Ele não padeceu somente ultrajes dos judeus e dos romanos, não padeceu somente pelas ingratidões dos seus conterrâneos e pelo abandono dos seus amigos. O futuro e o passado repercutiram na Paixão, nela se reconcentraram. Se, pois, Jesus · não sofre no presente, sofreu do presente: e os fiéis não estão errados quando imaginam Jesus sofrendo, uma vez que Ele sofreu pelos ultrajes de agora; aliás nada impede remontar ao passado para compadecer-se de Jesus, o futuro de então sendo o presente de hoje" (43). Pois bem! sendo Maria SSma. a Corredentora, o que ficou dito para Jesus, com toda certeza, embora nas devidas proporções, deve ser dito para ela. Haverá, de vez em quando exageros no modo de exprimir-se a esse respeito, isso porém não altera a verdade profunda acima apresentada.
Há por conseguinte pleno acordo entre a doutrina da Igreja Católica e o discurso da "Bela Senhora" em La Salette, a respeito de Maria SSma...

Ora, em nossa conclusão do capítulo anterior de­claramos, como fato real, que a "Bela Senhora" não era um ser do mundo presente. "Não vi nem padre nem leigo" declara Pedro Selme.

- Trata-se, por conseguinte, dum ser do mundo futuro, do mundo de além túmulo. Não há negar que o Anjo mau é um ser do mundo de além túmulo; mas, como notavam já Maximino e Melânia, o Anjo mau, o demônio não exige e não aconselha, sob pena de castigos, que os homens sirvam a Deus, observem os seus mandamentos, evitem as blasfêmias, façam penitência, assistam missa, se convertam, façam oração; por conseguinte, seria blasfêmia horrenda só pensar no anjo mau.

Ficou pois completamente explanado que esse ser do mundo de além túmulo, age e fala como a Igreja católica ensinam que age e fala como Maria SSma. Logo, a "Bela Senhora" é de fato a própria Maria Santíssima, Mãe de Deus e Mãe dos homens, Medianeira e Advogada nossa.

(42) Da força desse braço ela falou no "'Magnificat", Luc. 1, 51.

(43) J. BainveL - Dictionaire de Theologia de Vacant et Maginot; vol 3, co1. 28S, article: Coeur Sacré de Jésus

 

CAPÍTULO QUINTO

PRODÍGIOS COMPROVANTES DA APARIÇÃO DE MARIA SSMA. EM LA SALETTE

§ I - Prodígio da Ordem Material - A Fonte Milagrosa

“Convém aproximar-se das fontes com respeito. To­do início, todo começo é misterioso, especialmente quando se trata do início, do começo, da origem duma série de benefícios. Comprido, muito comprido será o caminho da Água" (44).

Lindas reflexões essas que se aplicam maravilho­samente bem à Fonte que surgiu no próprio lugar da santa Aparição em La Salette. As perguntas feitas a Melânia a este respeito, ela respondeu: "Eu lhe disse que onde adormecemos não havia fonte, porém na segunda-feira, vi uma fonte onde pousaram os pés da Virgem Santa.

- Quando viu essa fonte, na segunda-feira, que é que você pensou?

- Pensei que corria, porque tinha chovido.

- Parece pois que nesse lugar às vezes vem água?

- Não sei. nunca vi".

Com efeito, no mesmo interrogatório, ela disse:

"Sim, voltei na segunda-feira, pois no Domingo cho­veu" (45). Nessa fonte de fato, só havia água quando chovia muito ou se derretiam as neves. Nessa mesma segunda-feira, outras pessoas notaram o fato, particularmente Batista Prá, que declarou ter subido à montanha, pelo meio dia, a verificar se a fonte fluia, conforme lhe dissera Melânia. Viu que a menina não mentira, tanto que levou água para beber durante q trabalho no seu terreno (46).

O Pe. Luiz Perrin, vigário então de La Salette, após ter subido ao lugar da Aparição, uns 25 dias depois do grande acontecimento, escreveu: "A fonte fluía medianamente como sempre; dando mais ou menos o volume de água que sairia da ponta dum cano de espingarda, excetuando as grandes chuvas, quando vem um pouco mais forte" (47).

Desde então nunca cessou, nem sequer em época das maiores secas. Embora todas as outras fontes da montanha secassem, a fonte milagrosa sempre permanecia fornecendo, nessas ocasiões, água suficiente para as enormes construções, os operários, a lavanderia e cozinha da hospedaria.

Até o dia 10 de setembro do ano seguinte ficou no primitivo e natural estado. Nenhuma obra fez. Do tapete de grama que encobre o rochedo, a água fluía por vários fios que se reuniam num minúsculo tanque ali perto, cavado pelos pastores. Formando pequena sanga no gramado, ia cair no córrego Sézia. Os romeiros, porém, cada vez mais numerosos, movidos por piedosa devoção, arrancavam a grama para levá-la qual preciosa lembrança. Isso turvava a água e não era mais possível dela fazer uso.

O Pe. Vigário compreendeu que umas obras tornavam-se necessárias.

"No verão de 1847, escreve ele, mandei colocar um cano de ferro que aduzia a água da fonte". Assim foi possível à enorme multidão do dia do aniversário da Aparição, 19 de Set., dela fazer uso".
"Continuando, prossegue o vigário, vendo que os animais e os romeiros estragavam tudo, no verão de 1848, mandei cavar perto da fonte um tanque cercado e coberto de alvenaria, com porta e chave; e um cano de ferro por onde passava, límpida, toda a água da fonte. Nesse estado deixei o local quando me retirei da paróquia em Maio de 1851" (48). Atualmente a fonte milagrosa, fluindo por baixo da estátua da Virgem Chorando, chega por um condutor até para fora da grade de ferro que cerca os lugares da Aparição, ao completo alcance dos romeiros.

Dessa água, sempre muito fria, mesmo na época de grandes calores, beberam e ainda bebem, milhares de pessoas, suadas por causa da penosa subida - o que inúmeras vezes deu-se com quem escreve - e nunca houve queixa, nem se ouviu dizer - que lhes sobreviesse a menor indisposição.

Aqui vai o testemunho dum romeiro, o Sr. Simillen, em seu livro Pélerinage a La Salette (49). Após ter advertido quanto seja perigoso geralmente para quem está suado beber água das fontes das montanhas, acrescenta: "Todo o contrário se dá em La Salette. Desta água eu tomei não apenas um gole, não só às exigências da minha sede, mas segundo a capacidade do meu estômago. O meus dentes ficaram regelados, isso logo ao chegar, com as vestes ensopadas de suor, a ponto de podê-las espremer. Em seguida, descuidando--me até de continuar a caminhar para conservar o calor do corpo, fazia oração na capela úmida e sombria, onde ficava por largo tempo, numa completa imobilidade. No entanto, atesto perante Deus, que esse meu modo de proceder não provocou nem o mais leve resfriado, nem o menor incômodo pulmonar. O meu caso não é único, consultem--se os demais romeiros, todos· hão de concordar.'"
Mais ainda: a análise química feita pelo mesmo sr. Similien, formado em ciências, professor de matemáticas, de ciências físicas e químicas, comprovou que na água da Fonte da Aparição não se encontra nenhum dos elementos curativos que se acham nas águas minerais; é água simples e puríssima.

Igual resultado deu, a nosso pedido, a análise feita anos atrás pelo técnico químico da Alfândega do Rio de Janeiro, quando levantaram dúvidas, por ocasião duma remessa da água da Fonte de La Salette.

A respeito dessa água de nenhum valor medicinal, porém muito "maravilhosa em seus efeitos"", o bispo de Grenoble escreveu em sua carta pastoral, de 19 de Se­tembro de 1851: "Anunciavam-se curas extraordinárias, obtidas em várias partes da Europa e do estrangeiro, até nas regiões mais afastadas.

Trata-se de doentes desenganados pelos médicos, próximos da morte, que diziam, tinham recuperado perfeita saúde, por ter invocado a N. Sra. de La Salette e feito, com fé, uso da água da fonte do lugar onde apareceu a Rainha do céu a dois pastores'".

O "Mensageiro de Nossa Senhora de La Salette, desde que veio a lume no ano de 1917, publicando inú­meras e extraordinárias graças alcançadas com o piedoso uso da água da Fonte da Aparição, de norte a sul do Brasil, vem demonstrando que N. Sra. de La Salette, está de modo peculiar abençoando a terra brasileira.

Melhor do que isso, essa água maravilhosa, na expressão do mesmo bispo de Grenoble, sarou muitas almas e ocasionou a conversão de grandes pecadores, a quem pessoas caridosas deram de beber, por vezes sem eles saberem, dessa água.

Compreende-se porque essa água é levada pelos romeiros até as mais longínquas regiões e pedida também dos mais afastados países.

Nascida, por assim dizer, das lágrimas da Virgem poderosa, por toda parte leva os seus maternais benefícios.

No ano de 1855, D. Dupuch, bispo de Argélia, de volta da sua romaria, assim cantava poeticamente a Fonte milagrosa!

"Doce Fonte da Virgem de La Salette, graciosa e irrecusável testemunha da passagem da Minha Mãe, para impedir que teu pacato murmurar se levante acima da voz sonora das torrentes e dos abismos, fora necessário rechaçar de vez em quando as tuas inestancáveis ondas!

"Doce Fonte da Virgem de La Salette, mais nume­rosos que as flores sem conta que atapetam as tuas margens com suas azuladas corolas já foram os pés daqueles que a ti vieram para unir suas lágrimas às lágrimas de Maria, para lhe oscular os traços! Não seriam elas, porventura, esses riozinhos sagrados que até agora te alimentaram? Praza a Deus continuem ali correr cheios de encantos e de celestes graças!

"Doce Fonte da Virgem de La Salette, o eco da tua bendita solidão, nunca, por certo, repetiu uma só palavra que fosse culposa desde que tu redizes maternais lamentos! A melodia tão acariciadora de tuas ondas, outra coisa não é senão a imagem, o único eco, das lágrimas e dos cantos de muitos e muitos que às tuas águas chegaram seus lábios sedentos!

Oh! fica sempre unindo os cânticos da terra aos hinos do céu!

"Doce Fonte da Virgem de La Salette, nenhum dos que sorveram teu divino cristal, bebeu a morte com o erro. Oh! tens por demais o paladar da verdade, para que ninguém se possa iludir!

"Doce Fonte da Virgem de La Salette, antes que eu prossiga na minha jornada, anelante dessa verdade e dessa felicidade, ainda mais que de humanos esforços, deixa que ainda molhe, embora um só instante, os meus lábios ressequidos, minha pena sedenta, em teu cristal tão puro!

“Oxalá possa nele, em meu último alento, colar os meus lábios!

"Doce Fonte de La Salette, recordas aquela hora fugaz da minha vida que tão rápida lá se foi, como tuas ondas impacientes, pelos declives da montanha, mas que perdura e sempre há de durar em meu coração?

Então perguntava-te, de bruços Sobre tuas frias águas, cujos perfumes inebriaram-me, como nunca fora inebriado, nem sequer no dia da primeira missa e da minha sagração... nem sequer à beira das cisternas de Hipona, perguntava-te se não é antes do céu que te derramas de que desses terrestres outeiros, e se tua recordação até lá iria me acompanhar.

"Doce Fonte de La Salette, nascente tão cristalina, tão calma, tão puro espelho, que nenhum impostor poderia fazer de repente surgir deste rochedo queimado pelo sol, não poderia fazer fluir sem interrupção, sempre a mesma, durante estes últimos nove anos" (50).

(44) Ver Louvel Da revista "'Vie Spirituelle" de 1944. Citado por Hostachy M. S. Histoire Séculaire, p. 278.

(45) Notes Lagier, reproduzido esse diálogo na Obra "Notre Dame de La Salette"', III vo1., p. 131. Bibliogr. 70.

(46) Essa declaração de Batista Prá, com data de 27 ele Nov. de 1847, foi publicada na revista "Annales de N. D. de La Salette", em Maio de 1909. Bibl. 52.

(47) Manuscritos Perrin, 887, citado por P. Rostachy, ibid. Pl· 2'18. BibL 7 e 70.

(48) Ibid. n. 891.

(49) Ver a bibliografia 25.

 

§ II - Prodígio da realização das predições de Maria SSma. em La Salette

Só Deus conhece o porvir. O fato, portanto, de anunciar com grande antecedência acontecimentos que depois se realizam, demonstra participação na ciência divina; por conseguinte, a intervenção direta ou indireta do próprio Deus.

Pois bem! Em La Salette a “Bela Senhora" anunciou com antecedência fatos que se realizaram.

Ela disse: "As batatas vão se estragar e para o Na­tal não haverá mais". Ora, em 17 de Janeiro de 1847, por ocasião da abertura do Parlamento, a rainha da Inglaterra, após ter assinalado, na fala do trono, a escassez de viveres que assolava o reino acrescentou: "Na Irlanda particularmente a falta do alimento comum, a batata, ocasionou cruéis sofrimentos, epidemias e aumento de mortalidade".

Na França, o Governo teve de proibir a exportação e facilitar a importação da batata, por decretos de 19 e 25 de janeiro de 1847. Ela preveniu: “Não deveis semear o trigo, porque os insetos vão comê..los. e o mais tornar-se--á em pó . . . " - O Jornal “Univers" em 15 de maio de 1852, publicava a carta seguinte: “Abri as espigas já secas: numas não havia grão nenhum; com certeza foi roído na eclosão. Outras encerram grão, porém ressequido e minguado, que nada vale. Encontra-se nestas e naquelas espigas uma espécie de pó amarelo, como pequenos vermes que, sem dúvida, produzem tal devastação. Qualquer um pode verificar o mesmo fenômeno. Donde proviriam?" perguntava o autor da carta. E respondia: "A nossa opinião é que esses pequenos vermes são apenas agentes secretos, os ministros cegos duma vontade superior e que a doença que seca o trigo é da mesma espécie da que estraga as batatas". Os jornais da época assinalam o mesmo flagelo por toda a Europa.

Ela anunciou: “Sobrevirá uma grande fome".

Ora, o jornal "Constitutionnel", início de Março de 1856, escrevia: "Embora não seja concluída a estatística do movimento do estado civil para o ano de 1855, te­mos fundados motivos, pelos resultados já conhecidos, que nesse ano terá havido excepcional mortandade, de mais de oitenta mil falecimentos por causa da escassez de víveres".

Pelo mesmo jornal, em 1854, deram-se sessenta mil falecimentos e pior foi ainda no ano de 1856. Em dois anos morreram, na França, duzentos e cinquenta mil pessoas de fome. Avaliam-se que em toda a Europa houve um milhão de vitimas.

Ela anunciou: "As nozes vão se estragar".

Ora, um relatório enviado ao ministério do interior, assinalava: "As nogueiras no centro da França se acham acometidas por doença desconhecida e que na região do Isére (isto é de La Salette), a colheita das nozes está totalmente perdida". No ano seguinte as próprias nogueiras tinham desaparecido.

Ela anunciou: "As uvas apodrecerão".

Ora, em 1847 apareceu o terrível flagelo "oidium.", que destruiu quase todos os vinhedos da França. Che­garam ao extremo, para destruir o inseto, de inundar as videiras, o que produziu outro flagelo que só pode ser debelado pelo sulfato.

Ela anunciou: “As crianças morreriam".

Ora, na França, terrível doença - uma espécie de peste - vitimou milhares de crianças que, acometidas por intensíssimo frio, morriam, tremendo, nas condições profetizadas.

Desde aquela época bem sabemos, por dura experiência, que os flagelos aumentaram assustadoramente no mundo.

Futuro anunciado pela "Bela Senhora" e futuro doloroso e rigorosamente realizado; portanto Ela é aquela a quem são manifestados os segredos divinos. Tanto que a Igreja em seu Ofício, a Ela, isto é à própria Mãe de Deus, aplica o que a S. Escritura diz da Sabedoria (51).

Num livro intitulado: "Exposição de História e Geografia do Brasil" do Dr. Ferreira de Araújo, editado no
Rio de Janeiro em 1889 e "Alguns dias na Pauliceia" por Henrique Raffard, em 1890, encontramos o seguinte na página 225: "Quando falhar a colheita da batata, a carestia tornar-se-á eminente. Foi justamente o que aconteceu na Irlanda e no norte da Europa, em 1847, no momento da grande invasão da moléstia da batata.

Flagelo esse que foi um dos mais poderosos incentivos do movimento emigratório da Europa para o Novo Mundo".

(50) O bispo D. Dupuc:h isso escrevia em 1855 no seu livro "'Venez avec moi à La Salette" . Bibliografia 34.

(51) Todos esses dados acham-se no livro "La Salette", por Bertrand 1888, p. 197 a 204. Bibliografia 61.

 

§ III – Prodígios da ordem moral – Conversões.

Maravilhosas e repentinas conversões mesmo de pecadores obstinados, obtidas pela intercessão de N. Sra. Reconciliadora de La Salette.

Trata-se de fato de verdadeiros prodígios, pois a conversão, isto é, a completa abjuração do erro religioso e leal aceitação da verdade católica, ou a renúncia ao estado de pecado e volta ao estado de graça, manifestam direta intervenção de Deus, pois Ele só, por meio da sua graça eficiente, pode mudar as vontades e transformar os corações.

Ora, em La Salette, a "Bela Senhora" em seu discurso deu claramente a entender que se dariam conversões, quando disse: "Se eles se converterem". No livro já assinalado (pág. 54), D. Ullathorne, bispo de Birmingham, declarava em 1852: “O maior milagre que tem dimanado de La Salette é o milagre da graça".

O Pe. João Berthier, missionário de N. Sra. de La Salette, escreve no seu livro "As Maravilhas de La Salette" (pág. 241): "De 1862 a 1898, tivemos o consolo de passar, quase todos os anos, parte do verão na santa Montanha. Somos portanto fiéis testemunhas dos frutos de salvação que nas almas produz a devoção à N. Sra. de La Salette. Como missionário temos exercido o santo ministério, durante largos anos, em várias dioceses e em diversos ambientes; em parte alguma, porém temos ouvido, como em La Salette, grandes pecadores endurecidos exclamarem: “nunca eu poderia acreditar que Deus pudesse dar-me semelhante contribuição”. Os primeiros lugares beneficiados pela misericórdia “Reconciliadora dos Pecadores”, foram, como achamos natural, as regiões onde Ela se dignou apare­cer. "Conforme escreve (pág. 152) o mesmo bispo inglês, todos os relatos e informações, nada podia dar-se mais lastimoso para um país católico, do que o estado da região nos distritos circunvizinhos de La Salette na época da Aparição. Pouco tempo depois, em consequência dela, a condição religiosa da totalidade daquela parte do país já se achava inteiramente mudada".

Com efeito, o pároco de La Salette, Pe. L. Perrin, escrevia: ''Os fiéis ficaram atemorizados com esse grande golpe do céu, as orações tornaram-se mais fervorosas, as conversões frequentes, cessaram as blasfêmias e o trabalho nos Domingos. Derramaram lágrimas, quando eu pregava sobre a bondade maternal da Virgem SSma. para com os habitantes de La Salette" (52).

Em Corps nenhum sacerdote podia passar sem que fôsse insultado, como aconteceu ao arcipreste Pe. Mélin em 1841. Pois bem, esse mesmo padre comunicava em Abril de 1847, ao Exmo. Sr. bispo: "Durante a quaresma grande foi a boa vontade, devido a esse excelente pregador e primeiro confessor que foi a "Bela Senhora". Ela concedeu tantos favores espirituais extraordinários que todos manifestaram ótimas disposições e muitos desses pobres e velhos pecadores choraram ao confessar os seus pecados" (53). E nesta Páscoa, dos 1300 paroquianos só trinta deixaram de fazer a comunhão (54).

Entre os primeiros convertidos apresentou-se o S. Giraud, pai de Maximino. Lembra-se o leitor de que ele não quis escutar a narrativa do acontecimento até o fim. Só quando o seu filho lhe disse : "Mas ela me falou do senhor", foi que ele despertou. “Oh! Que diz ela?" Ouvindo o episódio do pão que ele dera ao filho, ficou tão impressionado, tão comovido, que tratou logo de se confessar, perseverando toda a vida como um bom católico.

Assim foi nas outras paróquias do Decanato de Corps e nas mais longínquas regiões. Em 1847, Monsenhor Villecourt, bispo de La Rochelle, portanto na outra extremidade da França, escrevia: ''Essas admiráveis disposições notaram-se, pela maior parte, na diocese de Grenoble, mas também nas dioceses circunvizinhas e até nas mais afastadas. Numerosos pecadores que desde há muito viviam longe de Deus, acorriam derramando lágrimas ao tribunal da penitência".

Passemos a relatar alguns casos particulares.

(52) Manuscritos Perrin, 862. Bibliografia 3 e 7.

(53) Manuscritos Bossan no 831. Bibliografia 38.

(54) Des Brulais "Echo de la Sainte Montagne", p. 8, citado por Hostachy "Les Curés de La Salette", p. 130 Bibllografia 71.

 

§ IV – Conversões repentinas

Pregando no Santuário, o superior dos missionários de N. Sra. de La Salette, narrou o seguinte: "A 19 de Setembro de 1854, um oficial, por mera curiosidade, subiu a santa Montanha! Ficou observando e não atinava com o motivo de tanto movimento em semelhante deserto. Esse oficial, de há muitos anos, do cristão apenas tinha o nome. Não quis retirar-se sem, por cortesia, fazer uma visita ao superior. Agradecendo a gentileza, recomendei-lhe: "Olhe, não desça sem ir beber um pouco de água da Fonte que lá está", e apontei o lugar. "Pois não", disse ele, "para lhe ser agradável''. Pela parte da tarde, alguém veio dizer-me: “Padre, um do Estado Maior, retido aqui como que contra a vontade, acha-se prostrado, debulhado em lágrimas, pede para se confessar". EIe assim me falou:

“Padre, aqui tendes um grande pecador. Aquele copo de água convulsionou-me o ser todo...; já não posso mais viver sem fazer as pazes com Deus". Tempo depois, um Pe. jesuíta, romeiro, dizia-me; "O vosso oficial, é o modelo da nossa cidade. Um verdadeiro missionário entre seus colegas" (55).

Em 1859 um sentenciado na penitenciária de G. na Bélgica, depois de largos anos de crimes e de irreligião, caiu gravemente enfermo. O capelão tentou falar-lhe dos Sacramentos e foi repelido com violência. Aproveitando a ocasião em que o doente dormia colocou sobre ele uma pequena medalha de N. Sra. de La Salette e retirou-se. Mal chegou ao seu quarto, vieram dizer-lhe que o doente queria confessar-se. Apressou-se e, com efeito, o doente, soluçando, recebeu todos os sacramentos e teve morte de predestinado (56).

No hospital da cidade de Hyéres, sul de França, um doente estava gravemente enfermo. As irmãs de caridade sugeriram-lhe: "E' bom reconciliar-se com Deus"'.

"Não! não quero". Uma irmã, tempo depois: "Se o sr. prefere, podemos chamar o vigário". Em vez de responder, o doente irritou-se, ficou furioso e disse aos seus vizinhos: "Estou arrependido de não me ter declarado protestante quando aqui entrei''. Vendo isso a irmã, a mando da Superiora, foi acender uma vela diante da imagem de La Salette e deitava água da Fonte Milagrosa nos remédios do colérico doente.

No dia seguinte; "Irmã, quero confessar-me; mas de que jeito? Há tanto tempo que não me confesso!"

A irmã chamou o padre, o doente rebelde recebeu os sacramentos e sossegado morreu no mesmo dia" (57).

Em 19 de Setembro ele 1855 um romeiro dizia ao padre de quem acabava ele ajudar a missa: "Eu sou um velho pecador, um jornalista; escrevi no meu jornal artigos contra N. Sra. de La Salette. Vim aqui no ano passado para melhor examinar a "superstição, ganância e impostura". Nada disso eu aqui encontrei. Retirei-me preocupado: o pensamento de La Salette não me dei­xava. Voltei aqui mais duas vezes e fiquei vencido.

Ajudo à missa para fazer penitência, e conto, na volta, mostrar-me a todos qual verdadeiro cristão" (58).

Um outro escreveu: "Fui a La Salette, unicamente para acompanhar minha mulher. Ia olhando tudo com a maior indiferença, tanto que entrei na igreja, não me ajoelhei, nem me persignei e logo saí. No dia seguinte, vendo romeiros perto da Fonte, fui e também bebi; logo senti-me impressionado. Fui à igreja. Desta vez me ajoelhei. Dentro de mim produziu-se uma transformação completa. Chorando, fiz minha confissão, após trinta e tantos anos" (59).

(55) Pe. Berthier - Mervellle s de La Salette - Biografia 80.

(56) Annales de Notre Dame de La Salette. Fev. 1889. - Biblig. 52.

(57) Annales de la Salette, ibid.

(58) Sanctuaire de Marie por Boismard.

(59) Annales N. D. Salette. Maio, 1868.

 

§ VI – Conversões de protestantes

Um pastor protestante que não podia perdoar aos católicos o culto que prestam a Maria SSma., encontrando, por curiosidade, no lugar da Aparição, piedosas mulheres a rezarem com fé ingênua e ardorosa, caiu de joelhos, vencido por uma força irresistível, aos pés da Virgem, possuído de indizível emoção. Retirou-se da santa montanha sem se converter ainda, porém, qual inglês muito positivo que é, quis ver se numa segunda viagem experimentaria as mesmas emoções. Voltou, pois, e pouco demorou. Mas a Virgem de La Salette concedeu-lhe graça igual. Partiu, porém desta vez para fazer sua obrigação em Genebra e tornou-se católico sincero (60).

Aos 8 de Setembro de 1888, pelas seis horas da tarde, numeroso clero achava-se na capela-mor do Santuário. Por entre compactas fileiras de romeiros, o bispo de Grenoble, chegado no véspera, de sobrepeliz e estola, ia para o altar; eis senão quando uma jovem, vestida de branco, vinha rompendo a massa do povo. Para ela volveram-no todos os olhares, pois no rosto transparecia-lhe o júbilo e grandes emoções lhe invadiam a alma.

Tratava-se de uma senhora protestante, de família importante, que havia seis dias tinha ido a La Salette para acompanhar uma sua parenta. Repentinamente a luz da fé ilumina-lhe a alma e confessando que a Religião católica é a única verdadeira, implora à S. Excia. Revma. se digne de admiti-la no grêmio da Igreja. Receosa, com justo motivo, de que fosse inválido o batismo recebido na sua seita, pede também queira S. Excia. batizâ-la. Solicita esse favor com tanto ardor que imediatamente o bispo administra-lhe o batismo e logo seguida a crisma (61).

(60) Bertbier, Mervellles, p. 243.

(61) No mesmo livro, pag. 244, Merveilles de La Salette. Bibliografia 60.

 

§ VII – Conversão de notáveis homens contemporâneos

Léon Bloy que influiu muito na conversão de homens merecidamente ilustres, teve a alma como que possuída pelo mistério de N. Sra. de La Salette. O seu grande amigo e mestre o Pe. Tardif, sepultado no cemitério da Santa Montanha, disse a Léon Bloy: "Vamos a N. Sra. de La Salette e lá vereis o que a Virgem San­tíssima vos infundirá no coração". E Léon Bloy escreve: "Foi muito simples. Ela mesma nele se colocou como uma brasa, e todos os crimes que de certo eu cometi, desde então não puderam fazê-la sair".

Seguindo o exemplo de Léon Bloy, converteram-se o sr. Jaques Maritain e Sra. Raissa Maritain, dos quais aquele foi padrinho de Batismo. O grande geólogo Pedro Termier (62), Van der Mecr, Stanislas Fumet.

Jacques Maritain é neto materno de Jules Favre, grande advogado, que num processo, de que falaremos mais adiante, defendeu a realidade do fato de La Salet­te. Ora, Jacques Maritain, então embaixador francês junto à Santa Sé, escreveu por ocasião do centenário da Aparição:

"Caro Senhor:

Tivestes a bondade de me pedir a minha contribuição aos testemunhos que coligis por ocasião do centenário da Aparição de N. Sra. de La Salette. Trata-se, na verdade, menos de testemunhar do que de render graças, e creio que aquilo que importaria mais dizer, o que se refere ao íntimo da alma, interessa mais o público dos Anjos, que o dos piedosos leitores". Aliás, se alguém se interessar por aquilo· que os afilhados de Léon Bloy pensam a respeito de La Salette e pela parte que ela teve nos acontecimentos de sua vida e de vários de seus amigos, encontrará essas coisas narradas melhor do que eu poderia fazê-lo, nos dois volumes de recordações que Raissa Maritain escreveu, durante nossos anos de exílio, em homenagem à grande renascença espiritual que se realizou na França, entre as duas guerras" .

Jacques Maritain deixa discretamente entender que à N. Sra. de La Salette muito devem ele e D. Raissa que se externa do seguinte modo:

“Por nossa vez, chegamos ao conhecimento de La Salette através de Léon Bloy. A Aparição de Nossa Senhora em La Salette é um dos acontecimentos mais importantes que se deram desde há séculos. Mesmo Lurdes, apesar de mais conhecida, á menos extraordinária. Apesar de curas milagrosas de Lurdes, o acontecimento de La Salette apresenta-se com excepcional grandeza e beleza." (63).

"A 24 do Junho de 1907 fomos a La Salette, onde chegamos no dia 28 às 7 horas da noite. Oh! solidão!

Oh! silêncio!... Nesse elevado retiro preparamo-nos para o Sacramento da Confirmação, que recebemos a 6 de Julho em Grenoble com assistência de Pedro Termier" (64).

Foi nessa ocasião que enviaram um cartão postal a Ernesto Psichari. Da. Raissa narra também que achando-se gravemente enferma, ela e o Sr. Maritain, a pe­dido de Léon Bloy recorreram a N. Sra. de La Salette.

Chegou a ser ungida. E escreve: "Minha cura começou e completou-se rapidamente".

Na hora da morte do seu pai, diz a mesma senhora, "após orar a todos os Santos, sobretudo a N. Sra. de La, Salette, de repente o venerando ancião, convertido como eu, do judaísmo, declara: "quero ser batizado".

Imediatamente o Sr. J"acques Maritain administra-lhe · êsse Sacramento com água da fonte de La Salette.

Dias após falecia, venerando também uma medalha de N. Sra. de La Salette.

(62) Pedro Termier, após a leitura do Que Léon Bloy es­creve no seu livro Le Femme pauvre tomou-se fervoroso devoto de Maria SSma. em pranto. Ver "Les Grandes Amitiés-", por Raissa Maritain, I voL, pg. 229-255 e passim.

(63) "'Les Grandes Amitis", I voL pag. 252.

(64) Ibid. pag. 210.

 

§ VIII - Conversão de Ernesto Paichari (65)

Entre os convertidos podemos enumerar de modo certo, o neto de Renan, que, graças à N. Sra. de La Salette, reencontrou o Deus negado por seu avô, e cuja volta ao Cristo e à sua Igreja foi, provavelmente, causa de outras conversões; pelo menos deu à mocidade contemporânea um exemplo magnífico de fé e piedade e também de acrisolado patriotismo pela sua morte heroica no campo de batalha.

Eis aqui a história dum cartão postal que Jacques Marita:in enviou lá da Santa Montanha ao seu amigo no longínquo deserto da Africa: "A mãe de Ernesto Psichari era a própria filha de Renan (66), e seu pai, um grego cismático, impio pior do que Voltaire, como dirá o próprio filho: Compreende-se que num semelhante ambiente familiar o jovem só pudesse achar, segundo suas próprias palavras, uma alma, sem defesa contra o mal, sem proteção contra os sofismas e preconceitos do mundo. Aos vinte anosvadiava sem convicção por todos os jardins envenenados do vício. Enjoado de tudo, ao sair de Saint-Cyr (escola dos oficiais) levava vida de almofadinha. De repente apaixonou-se por viagens e excursões militares, porém, no intuito de "lançar a todos os céus a sua maldição". No entanto ficou muito impressionado pelo céu de Marrocos e salutar lhe foi a solidão do deserto. Ele descreveu as fases da sua volta a Deus num romance que só veio à lume depois da sua morte, e que teve um sucesso extraordinário: "A viagem do Centurião". Certo dia, narra ele de Maxêncio, herói do romance (que é ele mesmo), certo, dia, no deserto de Saara, chegou-lhe um cartão postal, que leu com prazer. O cartão porém lhe causou certa admiração e inquietação. Era uma estampa da Virgem de La Salette, chorando, e, no reverso, havia estas simples linhas: "Maxêncio, nós rezamos por ti no alto da santa Montanha. Parece-me que ela está chorando por ti, essa Virgem tão linda, e que ela te chama. Será que tu não vais escutá-la? Teu irmão e amigo: Pedro – Maria.''

Ele não a escutou e fez ouvido de mercador por bastante tempo.

Revoltou-se até contra o chamamento do seu ami­go e contra essa Virgem dorida que parecia censurar lhe o procedimento".

Apesar de tudo, Ernesto Psichari confessa: "Pela primeira vez, Maxêncio percebeu que uma aragem de ternura lhe vinha das Gálias longínquas.

Não acreditava de modo nenhum na oração, e no entanto parecia-lhe que o amava melhor que os outros quem rezava por ele; era mesmo só quem o amava".

Esse amigo, Jacques Maritain, era um convertido pelo grande devoto de N. Sra. de La Salette, Léon Bloy, neto de Júlio Favre e professor no Instituto Católico de Paris. Tinha rezado pelo centurião que estava tão distante, por ocasião da sua romaria a La Salette e testemunhava-lhe melhor assim o seu amor junto do amor duma Virgem que chorava pelos seus filhos tresmalhados.

O duplo espetáculo espiritual da Virgem e do seu “Orante" abalou o descrente sacudindo-o do seu torpor. Mas Psichari não demorou em cair de novo nas suas dúvidas, suas fraquezas, suas paixões malsãs.

“Vã, escrevia, vã, por todas aparências, foi a aparição da Virgem chorando, no início das suas estradas no deserto. Vã essa estranha saudação daquela que é coroada e cingida de rosas. Vi essa saudação da rosa ao cardo".

Pouco a pouco, no entanto, “a rosa mística", irá embalsamando o cardo rebelde, coberto de areia e de pecado. Mal acabava de terminar a sua meditação so­bre N. Sra. de La Salette, Maxencio marchava à frente da sua tropa para desbaratar um bando de salteadores no deserto.

"Maxencio coloca na areia a Virgem chorando, que o vento leva; manda selar alguns camelos e atira-se à frente dos seus homens. Corrida louca!"

Mais louca era a carreira que realizava novamente para satisfazer suas péssimas paixões sensuais. "Sombrio delírio apoderara-se dele. Três dias seguidos, ele foi escravo duma escrava... no aviltamento da sua alma, da sua alma entregue totalmente ao demônio".

Eis senão quando, numa certa tarde, a Virgem que se evolara, voltava para perto do seu filho culpado e arrependido.

"Quando ia entrando na tenda, bruscamente pensou no seu amigo Pierre, e a imagem dessa Virgem chorando apareceu-lhe. Era a mesma que recebera outrora e que o vento do deserto tinha levado para longe.

Sentiu dor espantosa, dor que ele não conhecia. Esse coração, desde sempre devotado ao remorso, experimentava um. sofrimento novo: sofrimento misterioso, indizível, em que, num único soluço, misturavam-se o céu e a terra".

Maxêncio tinha muito chorado sobre si mesmo.

Nesse dia, porém, "o seu olhar não podia desviar-se da Senhora muito longínqua que os pecados dos homens faziam chorar''.

Era sim, a mesma "Bela Senhora" que tinha apare­cido a Maximino e a Melânia e cujas lágrimas, após ter conquistado esses dois pequenos representantes dum povo de campônios, acabava de tomar seu cativo um intelectual, tipo desses eternos espíritos errantes que na literatura vão à procura do amor humano através dos mais lindos painéis da natureza, sem cogitar da alta e cristalina fonte do Amor de Deus.

De volta à França, Psichari convertia-se e no dia 4 de fevereiro de 1913 abjurava a heresia ortodoxa grega, na qual tinha nascido, ajoelhado diante duma estátua de N. Sra. de La Salette na capela do seu amigo Maritain.

Lemos no "Journal" de Mme. .Maritain estas poucas linhas escritas no mesmo dia da cerimônia: "Terça-feira, 4 de fevereiro de 1913, o Pe. Clérissac e Ernesto, chegam às 16 horas. A nossa pequena capela está toda adornada com flores, as velas estão acesas, duas lindas velas bentas, Domingo, dia da Candelária. Ajoelhado perante a estátua de N. Sra. de La Salette, com voz forte, embora muito emocionada, Ernesto fez a profissão de fé de Pio IV e a de Pio X. O padre está de pé, testemunha diante de Deus; Jacques e eu estamos escutando de joelhos, tremendo de emoção. Após essa leitura, saímos. Ernesto faz a sua confissão geral. Enquanto isso não cessamos de orar. Finalmente chamam-nos.

Achamos Ernesto transformado, radiante de alegria.

Seus olhos são novos, lavados por água do céu. Estou pensando nos olhos luminosos e puros do meu pai depois do seu Batismo. No dia 8 de fevereiro seguinte ele foi crismado por D. Gibier, bispo de Versailles, e tomava o nome de Paulo, em reparação dos ultrajes do seu avô contra o grande Apostolo" (67).

Tombou gloriosamente a cabeça atravessada por uma bala, na Bélgica, na batalha de Charleroi, na tarde de 22 de agosto de 1914. Em torno das mãos trazia enrolado um terço, parecido com aquele que coroava e cingia a "Reconciliadora dos pecadores", que o fora procurar lá no deserto.

Ernesto Renan, o avô apóstata, acolheu com desprezo a Aparição de Nossa Senhora de La Salette e escreveu a um seu amigo de Grenoble que era necessário combater e desmascarar a nova superstição. A resposta da Virgem misericordiosa foi a conversão de Ernesto Psichari e sua morte de herói cristão (68).

Todos esses prodígios, com inúmeros outros aqui forçosamente omitidos, proclamam, com toda eloquência, que lá na montanha de La Salette apareceu “Santa Maria, Mãe de Deus que roga por nós pecadores."

(65) Na brochura La Salette - Témoignages. Paris, 12 de agosto 1946. B. 79.

(66) Apóstata, autor do livro "'Vie de Jesus" que é uma voluntária deformação dos Evangelhos e porisso levou inúmeras pessoas à incredulidade; Nasceu em 1823, morreu em 1892.

(67) Les Grandes Amitiés, 2 voL, Pg· 170. Bibliografia 65.

(68) Artigo do P. Hostachy, M. S. na sua brochura ''La Sallete- dans les lettres françaises" . Pag. 107 ss.

 

CAP1TULO SEXTO

A APARIÇÃO DE MARIA SANTÍSSIMA EM LA SALETTE, INDISCUTIVELMENTE PROVADA PELO TESTEMUNHO DE DEUS, ISTO É: OS MILAGRES ESTRITAMENTE DITOS.

§ 1 - Preliminares

Deus se exprime numa linguagem que Ele só pode falar, isto é, o milagre: quer dizer, um fato, devidamente verificado, que demonstra que, no caso, foram suspensas, alteradas, dominadas as próprias leis da natureza e de tal maneira, que, houve intervenção do mesmo Criador.

O próprio N. S. Jesus Cristo apelou claramente para os seus milagres, para provar a sua divindade. "Vós dizeis que eu blasfemo por ter dito: que sou Filho de Deus? Se eu não faço as obras do meu Pai não creiais: porém, se as faço, quando não queirais crer em mim, crede ao menos nas obras que faço, para que conheçais e acrediteis que o Pai está em mim e eu no Pai" (69).

Apresentaremos algumas curas milagrosas, precisamente aquelas que a Comissão de inquérito, nomeada pelo bispo de Grenoble, admitiu como sendo milagres no sentido estrito (70).

Dissemos que o fato do milagre deve ser realmente verificado. Para isso nada melhor e mais convincente do que a exposição certa e sincera do fato, o atestado do médico, declarando que os recursos naturais, as forças humanas se averiguaram insuficientes, ineficazes, e frequentemente, corroborado pela sentença da competente autoridade religiosa por ser o milagre uma intervenção do próprio Deus, e condição indispensável em nosso assunto, obtida pela intercessão de N. Sra. de La Salette.

(69) Evangelho de S. João capitulo 10 versículos 38, 37, 38.

('70) Dom Giray publicou em 1821 uma obra em dois volumes: ''Les miracles de La Salette". Bibliografia ?(ilegível).

 

§ II - Cura de Maria Antonieta Bollenai, na Paróquia de Avallon, em 1847

Da relação do Pe. Gally, vigário da miraculada, extraímos os seguintes trechos: "Desde 1843 o estado de saúde de Maria Antonieta Bollenat, durante quatro anos seguidos, foi sempre piorando. Sofria horrivelmente, a ponto de cair em frequentes desmaios, e dia 11 de novembro, todos - o médico mais do que os outros - julgaram ter chegado a hora do desenlace fatal.

Vieram me chamar. Ela se confessou entre desmaios e horrendos sofrimentos.

Ficou resolvido recorrer-se a N. Sra. de La Salette, tanto mais que tinham água da Fonte, e Maximino e Melânia tinham prometido rezar uma Ave Maria cada dia da novena que, começada no dia 12 de novembro, prosseguiu sempre com o uso da água da Fonte.

Os sofrimentos não abrandavam; o menor toque na região epigástrica a fazia gritar dolorosamente e não tolerava nenhum alimento. "No dia 21 de novembro, último, da novena, levei-lhe a sagrada comunhão, que muito a confortou, porém sempre em estado de prostração devido a dores intoleráveis.

A uma hora da tarde, tomou água da Fonte milagrosa pela última vez, a quantidade de costume, isto é, três colherinhas! E depois de beber, ficou toda esperançosa, anunciando uma cura que nada poderia fazer supor.

As duas horas, com vontade de comer pediu caldo com pedacinhos de pão, que ela tomou sem experimentar o menor sofrimento. Acreditou que tivesse chegado a hora da sua cura. Tentou, debalde, levantar-se.

Então rápida dúvida lhe passou pela mente, mas logo recuperou toda a confiança em Deus e tomou a resolução de aguardar a sua hora.

Pelas cinco horas e meia, de repente, as palpitações, as dores, tudo estava terminado. Com toda a calma levantou-se, vestiu-se e foi pedir alimento que comeu com apetite. A cura era completa.

Avallon, 13 de Fevereiro de 1848.

Pe. Gally, vigário.

 

Atestado médico

"Eu abaixo assinado, formado em medicina, na faculdade de Paris, morador de Avallon, certifico que tratei o doente Maria Antonieta Bollenat, desde 1830 até 1847, tendo em resumo observado o seguinte:

1o Há 17 anos Antonieta Bollenat vomitava tudo o que comia, digeria apenas umas colheradas de leite e de caldo. Nos últimos 3 meses até 21 de novembro nada mais digeria. Em 21 de novembro pelas 6 horas do tarde, sem transição alguma, sem a menor crise, ela comia, digeria muito bem uma sopa substanciosa.

2o Há três anos que Antonieta Bollenat não andava, ficando só deitada de costas, podendo apenas mover as extremidades dos membros inferiores. Em 21 de novembro, Antonieta Bollenat levantou-se, pôs os seus vestidos, suas meias e passeou pelo quarto.

3o Há dez anos que Antonieta Bollenat não podia se deitar do lado esquerdo e quase não conseguia mais dormir. - Em 21 de novembro Antonieta Bollenat deitou-se do lado esquerdo e dormiu toda a noite.

4o Há dezenove anos que as dores de estômago, quase que intoleráveis, por fim, não lhe davam tréguas. Em 21 de novembro não havia mais dor alguma, na região epigástrica, nem tão pouco em parte alguma do hipocôndrio esquerdo.

5o Há sete anos um tumor enorme existia na parte superior média lateral do ventre, e desde muito eu não receitava nenhum remédio, seja para curar esse tumor, seja para impedir se desenvolvesse. - Em novembro dia 21 o tumor desapareceu por completo, não se deu nenhum movimento crítico, nenhum derrame purulento ou qualquer outro por via nenhuma.

6o Em 19 de novembro Antonieta Bollenat apresentava todos os sintomas de morte iminente. Em 21 de novembro e nos dias seguintes a temos visto gozando perfeita saúde.

E por ser verdade, assino o presente atestado que declaro sincero e verdadeiro.

Avallon, 4 de Dezembro de 1847.

Ass. : Dr. Gagnard

 

Sentença judicial do Exmo. Sr. Bispo Diocesano

"Mellon Jolly, pela divina misericórdia e favor da Santa Sé Apostólica, Arcebispo de Sens:

Atendendo ao relatório da Comissão por nós nomeada, em 24 de Fevereiro de 1848, para proceder a um inquérito judicial sobre os fatos relativos a uma cura extraordinária, que sucedeu em Avallon, no dia 21 de novembro de 1847, na pessoa de Antonieta Bollenat, depois de ter feito sua novena à Virgem SSma.; aten­dendo também aos depoimentos das testemunhas e do facultativo, datados de 7 e 8 e 14 de Fevereiro de 1848; igualmente, atendendo aos certificados e documentos anexos dos interrogatórios, e também atendendo ao relatório que nos foi apresentado em 28 de Fevereiro de 1849 pelo Pe. Chauvan, nosso Vigário Geral, encarregado do exame desse acontecimento e da discussão dos fatos; atendendo finalmente às conclusões que se deduzem do mesmo relatório, e depois de ter ouvido o parecer do nosso Conselho e invocado o nome de Deus:

Nós declaramos, para a glória de Deus, da Virgem Santíssima, e para edificação dos fiéis, que a cura de Antonieta Bollenat, sucedida em 21 de Novembro de 1847, depois duma novena à SSma. Virgem Mãe de Deus, invocada sob o título de N. Sra. de La Salette, apresenta todos os caraterísticos duma cura miraculosa e constitui um milagre de terceira ordem.

Dada em Sens, sob o nosso selo e do contra-selo do nosso Vigário Geral, secretário particular, 4 de Março do ano da Graça de 1849.

(S. G.) - Assinado: Mellon

Arcb. de Sens.

De ordem do Exmo. Sr. Arcebispo E. Chauveau

Vigário Geral (71).

(71) Bousselot - La Vérité sur l'évenernent de La Salette - Bibliografia 21.

 

§ III – Cura da irmã Francisca de Sales

''No ano de N. S. Jesus Cristo de 1849, a 26 de Julho, nós abaixo assinados, Vigário Geral de S. Excia. Revma. e bispo de Rennes, visto:

1o O certificado médico seguinte: Nós abaixo assinados doutores em medicina, fomos chamados para o tratamento da Sra. Maria Francisca de Sales, religiosa da Visitação. Essa religiosa padecia, há muitos anos, de hipertrofia do coração com lesão das válvulas. Uma inchação enorme se estendia desde a clavícula até a última costela. Desde que chegou de Paris a Sra. Maria Francisca de Sales, sentiu o mal aumentar. As crises de sufocação que padecia há muito, iam se tornando cada vez mais frequentes, e chegaram a ponto que ela já não podia mais colocar-se na posição horizontal. A deformação das costelas tornou-se enorme, o coração parecia querer pular para fora e toda a árvore arterial esquerda começou a hipertrofiar-se. O Sr. Fretanneau, conceituado especialista, verificou o mal que assinalamos. O seu diagnóstico foi o que acabamos de apresentar. As pernas incharam, tornaram-se vermelhas, e se abriram feridas. A inchação subia para cima dos joelhos. A doente passou cento e dez noites e cento e dez dias sentada numa poltrona.

Todos os recursos da medicina foram usados e não conseguiram impedir o desenvolvimento rápido dessa horrenda moléstia que durante alguns dias desistimos de tratar.

A sra. Maria Francisca de Sales desejava que se fizesse uma novena. As crises iam cada vez tornando-se mais agudas e a doente entrou em agonia; um suor frio porejava pelo rosto; as pupilas, imóveis e insensíveis.

As pessoas presentes aguardavam o último suspiro. De repente ela pediu de beber, tomou sem dificuldades a bebida que lhe apresentaram, pediu também caldo que lhe foi servido. As Pernas desincharam imediatamente, dormiu perfeitamente a noite toda. e quando chegamos, no dia seguinte, não encontramos nenhum vestígio de doença. As pernas tinham recuperado o seu volume e sua cor normal. A inchação e a deformação das costelas tinham desaparecido. Os ruídos do coração não anunciavam mais alguma anormalidade. A sra. Francisca de Sales caminhava, subia toda a escadaria sem que se notasse aceleração nas pulsações do coração. Ótimo apetite, digestão fácil e desde então a Sra. Maria Francisca de Sales pode colocar-se na posição horizontal no leito e dormir calmamente.

Há três meses que se deu essa transformação e sua saúde continua perfeita. A Sra. Maria Francisca de Sales talvez seja a mais forte de todas as pessoas da comunidade e dessa horrível moléstia só nos fica recordação. A presente ata foi feita e atestada por nós, três meses depois da doença, a 3 de julho de 1849.

Visto:

2o O relatório a nós apresentado, escrito em parte pela doente e em parte pela enfermeira: "No principio de março do ano corrente, o médico comunicou à minha família que minha doença não tinha mais cura. Minha irmã mais velha pediu ao Vigário de La Salette uma novena de missas e enviou-me água da fonte milagrosa, pedindo-me que eu bebesse, e também tomasse parte na novena. Custei a consentir, pois desejava morrer; mas, por obediência, fiz a novena com todas as Irmãs. As minhas crises foram tornando-se cada vez mais agudas; sofria horrivelmente, nem sequer podia engolir a minha saliva. Só esperava pelo meu último momento".

(Agora fala a enfermeira:)

"No dia 26 de março, pelas 6 horas e 30 da tarde, a Irmã Maria Francisca de Sales teve uma crise que bem parecia a última: delírio, olhos fixos e mais sintomas da morte. O Pe. Capelão veio apressadamente administrar-lhe a Extrema Unção. Todas as Irmãs estavam tão certas de que ela ia morrer que prepararam todo o necessário para o enterro.

A agonia prolongou-se por 22 horas. Ela já não engolia. Só lhe molhávamos os lábios com água da Salette. De repente a febre diminuiu muito, ela pôde pedir e receber o Santo Viático pelas quatro horas da tarde".

(De novo fala a própria doente:)

"Ao receber Nosso Senhor, eu não via nem o Padre, nem as luzes, só sabia que ia comungar. Recuperei os sentidos; o meu mal queimava-me o corpo. Nosso Senhor me disse: Eu posso e quero curar-te. - Fiat! respondi. Entretanto meu lado esquerdo se movia todo, o meu coração como que se virou e se colocou no seu lugar, com movimento tão violento que me assustei.

Notando porém que nada mais sofria, pelo contrário, que um bem estar geral se difundia pelo meu ser todo, compreendi que estava curada.

Após meia hora de ação de graças, resolvi comunicar o fato à nossa Madre Superiora."

Declaramos que também nós presenciamos várias vezes os crises padecidas pela doente, estamos convencidos do que não podia haver, por meios naturais, cura instantânea.

Consideradas todas essas declarações, examinando o atestado médico, julgamos que a cura da Irmã Maria Francisca de Sales deu-se de modo extraordinário, fora das leis fisiológicas e patológicas, portanto autorizamos se faça cópia da presente ata".

Seguem as assinaturas do Vigário Geral, do capelão, dos dois médicos e de sete Irmãs.

"A presente ata foi vista e aprovada por nós, bispo de Rennes, 2 de agosto de 1849 (72).

G., bispo de Rennes".

('12) Rousselot - Nouveaux Documents. Bibliografia 21.

 

§ IV – Cura da srta. Paulina Burton, em Namur - Bélgica.

Relatório do S. Delvaux, doutor em medicina em Rochefort, província de Namur, documento esse conservado no Arquivo da Igreja de Ciney.

“A Srta. Paulina Burton nasceu de pais que gozavam boa saúde, proprietários e lavradores, com meios de vida largamente suficientes. Teve educação bem cuidada; passou vários anos num pensionato dirigido por religiosas, onde adquiriu instrução própria para seu estado. Sua saúde, embora não muito sadia , man­tivera-se regularmente boa.

De volta em casa dos seus pais, tratou dos afaze­res domésticos, no entanto preferia o trabalho mais sossegado - costura, bordado, - de maneira que a sua vida, mesmo no campo, foi bem a vida duma sedentária.

Na idade de dezoito para vinte anos, fez um exercício violento e desde então não gozou mais boa saúde.

Pálida, sofredora, tristonha, digerindo muito mal; respiração ofegante; suas forças foram diminuindo. Tor­nou-se anêmica, padecendo contínuas dores; rápidas palpitações declararam-se, bem como todos os sintomas de hipertrofia do coração e pontadas nos pulmões denotaram perigo de tísica pulmonar.

O estômago ficou também atacado de peculiar modo, e a região epigástrica tornou-se tão dolorida que o menor contato provocava síncope. Dores nas costas e as apófises das vértebras dorsais, sensíveis em extremo, indicaram alguma moléstia da medula espinhal. Os órgãos do ventre, por sua vez, contaminaram-se, etc.

Nesse estado ela viveu durante dezenove a vinte anos, com intervalos de menor sofrimento. Só podia caminhar com a ajuda de alguém para ir à igreja. A maior parte do tempo sofria tanto que devia ficar acamada, conservando sempre a mesma posição e sofrendo horrivelmente, com tanta violência por vezes, que esperava-se que ela sucumbiria. Várias vezes recebeu os últimos sacramentos.

No mês de março de 1850, a Sra. Burton piorou muito: os sofrimentos aumentavam e os remédios nada adiantavam. Até essa época podia fazer ainda alguns servicinhos: bodados, costura, arrastar-se até a igreja. Foi preciso deixar tudo, ficar no leito, com as dores mais cruciantes. Recusou todo e qualquer alimento; aliás, o seu estômago nada suportava; náuseas, vômitos sobrevieram; as palpitações do coração eram tão fortes que se escutavam a distância do leito. Nenhum sono, nenhum repouso.

A tantos males veio acrescentar-se suor tão considerável que a roupa, tanto a do corpo como a da cama, ficava molhada em pouco tempo. E não havia nada que estancasse esse suor. Uns quinze a vinte litros de suor por vinte e quatro horas. A 11 de dezembro declarei à família que estava próximo o desenlace e retirei-me, certo de não mais ver a doente. Dias depois recorreram à intercessão de N. Sra. de La Salette. Não vacilo em declarar que a cura instantânea que se deu então é fato milagroso. Impossibilitado de voltar, só vi minha antiga doente 15 dias depois do acontecimento. Encontrei-a de pé, alegre. Repito, passar sem convalescênça o leito da morte a estado perfeito de saúde, é coisa sobrenatural (73), um verdadeiro milagre.

Rochefort, 22 de julho de 1852.

Delvaux

É necessário ponderar que não é só por meio de atestado médico que se pode Verificar milagres verdadeiros (74). Para os de N. S. Jesus Cristo não há nenhum atestado médico. É suficiente o testemunho dos presentes, como se deu por exemplo com a cura miraculosa da Srta. Apolônia Hermite, paralítica desde muitos anos que ficou curada meia hora depois do meio dia de 26 de agosto de 1874, após ter sido colocada pela pessoa caridosa que dela cuidava à beira da fonte milagrosa, no próprio lugar da Aparição, fazendo orações.

Nessa hora chegaram os missionários e todo o clero, que uniram as suas suplicas às dos fiéis, enquanto a enferma conservava os pés dentro da água. O Revmo. Pe. Superior, rezava as ladainhas de N. Sra. de La Salette, clero e fiéis imploravam: Rogai por ela, curai-a.

Por várias vezes repetiram orações. Debalde, parecia tudo debalde. No entanto a pobre enferma muito sofria com os pés dentro da água fria.

Os Padres resolveram retirar-se, mas a protetora da paralítica pediu, por favor, continuassem a rezar; e recomeçaram as orações. Ela filialmente implorava: ''É uma pobre órfã, sem recursos; curai-a, ó Virgem Santa!" De repente, no entusiasmo da sua fé, deu ordem à paralítica que se ajoelhasse. A pobrezinha, com esforço imenso, segurando a grade, colocou de vagar os joelhos no chão. Então começaram a rezar: "Lembrai-vos". De repente a doente sentiu-se o corpo perpassado de intensa emoção e, levantando-se, ficou firme em pé. - "Milagre! Milagre!" bradaram as trezentas pessoas que lá se achavam, acompanhando a miraculada que ia, com passo apressado, cantar com todos no Santuário: "Ave Maris Stella" (75).

(73) Rousselot - un nouveau Sanctuaire - Bibliografia 21.

(74) O Papa Benedito XIV, no seu tratado da beatificação e canonização dos servos de Deus, citado p. D. Giray.

(75) Semaine Religieuse (Boletim diocesano) de Grenoble, 3 Set., 1874.

 

§ V - Cura milagrosa obtida especialmente no intuito de comprovar a verdade da aparição de Maria Santíssima em La Salette.

Deu-se a 16 de abril de 1847, com a Irmã São Carlos, Religiosa Hospitalar em Avignon, França, que sofria de tuberculose pulmonar, no último grau.

A Superiora escreveu: "No dia 14 de fevereiro de 1847, a Irmã São Carlos recebeu a extrema unção. Ouvindo falar dos milagres operados pelo uso da água de La Salette, primeiro duvidei Devido porém à cura duma "Irmã do S. Coração, tive mais confiança e lembrei-me de propor uma novena à nossa querida enferma.

Embora gostasse de vê-la curada, o meu intento maior era a glória da Virgem SSma., a confirmação da sua aparição aos dois pastorinhos e a conversão dos pecadores.

Por esses motivos, por entre as nossas muitas doentes, escolhi minha irmã São Carlos, por ser a mais conhecida, devido à sua prolongada doença e portanto a mais própria para o meu intento.

Comuniquei-lhe o meu pensamento; mostrou-se totalmente indiferente, declarando-me que não fazia questão de recuperar a saúde pois isto seria afastá-la da eternidade, que preferia morrer ou mesmo ficar no estado em que se achava, conquanto Deus fosse servido.

Insisti várias vezes. Achando-a sempre com os mesmos sentimentos, resolvi recorrer à minha autoridade.

Tendo conseguido uma pouca água da fonte de La Salette, disse-lhe que não devia só pensar em si, mas também que maior glória de Deus e incremento do culto da Virgem SSma. resultariam duma cura tão extraordinária.

Dei-lhe ordem de unir-se à novena que para ela faria a comunidade e de tomar a água que eu lhe traria.

Na quinta-feira, 16 de abril, a doente desmaiou e vomitou muito sangue assustando-nos, a ponto que eu disse-lhe: “A Virgem SSma. vai curar-vos, mas é colocando-vos no Céu".

Na sexta-feira, dia 17 de abril, enquanto estávamos assistindo a missa de Mons. Prilly, bispo de Chalons, ela cogitava de pedir para o dia seguinte mais uma comunhão geral. De repente, deu-se na enferma uma transformação completa. Sentindo-se inteiramente curada, levantou-se, vestiu-se e desceu sozinha à capela para também ouvir missa, ocasionando entre nós o maior espanto...

Há quinze meses que se deu essa cura, e minha Irmã São Carlos, prossegue fazendo todos os exercícios da comunidade. Levanta-se às cinco horas da manhã, gozando perfeita saúde. Assino pois este relato, atestando que é conforme a mais estrita verdade.

J. Pineua, Superiora das Religiosas Hospitalares de São José.

 

ATESTADO MÉDICO

Clarice Pierron, com 30 anos de idade, de elevada estatura, de temperamento nervoso, sanguíneo, entrou, a 21 de novembro de 1834, no convento das Religiosas Hospitalares de S. José em Avignon, recebendo o nome de soror São Carlos...

Embora de constituição fraca, nunca tinha estado doente. De repente, a 22 de junho de 1838, sofreu hemoptise. Esse mal desapareceu depois de dez meses de tratamento com os Drs. Rocha e Chauffard.

Em Julho de 1839, sobreveio-lhe violenta disenteria, que os esclarecidos cuidados do Dr. Martin curaram, ficando porém paralisadas as extremidades inferiores durante oito anos.

Como consequência da inflamação crônica do aparelho digestivo, a dos pulmões voltou de tal modo que os vários tratamentos alternativamente aplicados pelos distintos médicos acima citados, não conseguiram impedir que o mal progredisse.

Em 1845, soror São Carlos foi confiada aos meus cuidados.

A hemoptise dá-se frequentemente, a tosse quase contínua, a expetoração é por vezes sanguínea e por vêzes purulenta; existe uma dor do lado esquerdo do peito, insônia, emagrecimento, febre e grande prostração muscular.

Os vários médicos aos quais recorri, nenhuma melhora conseguiram, pois a doente foi cada vez piorando.

Pelos fins de 1846, sobrevieram aftas no céu da bo­ca, na língua, na laringe; uma dor na garganta, com grande dificuldade para articular sons e engolir. Os remédios próprios para esse estado ficaram sem efeito.

Em fevereiro de 1847, todos os sintomas tinham aumentado; as faces profundamente alteradas e cento e cinquenta pulsações por minuto. A doente só tomava umas colheres da água, leite e caldo por vinte e quatro horas. Sendo desesperador o seu estado, e o doutor Rocha, que a via de vez em quando, tendo pronunciado o mesmo prognóstico, tive forçosamente que desenganá-la.

Mas que surpresa! no dia 16 de abril próximo passado, pelas oito horas do manhã, após uma noite de agonia, por assim dizer, operou-se uma revolução que, do repente, transformou o estado mórbido em estado normal. "Não posso exprimir, diz ela, o movimento que convulsionou o meu ser todo, mas o que posso dizer é que, num só instante, senti a minha cabeça, a minha garganta, o meu peito e meu lado como que desvencilharem-se, meus membros retomarem força, agilidade e minha voz a sua sonoridade".

Após essa transformação inesperada e estranha, ela se levanta, veste-se, anda, pula, sobe e desce esca­das correndo, vai percorrendo todos os aposentos da casa que visita pela vez primeira (76), atravessa pátios, jardins, e depois de lauta refeição, manda-me chamar.

Encontrei-a no seguinte estado: Estava trabalhando na sala comum com outras religiosas. Sua fisionomia, que refletia nos dias anteriores abatimento e sofrimento, irradia grande alegria. O pulso baixou a 100 pulsações. Sua voz é sonora. Sobe e desce com rapidez a escadaria. Carregando um fardo de 70 quilos, caminha depressa. O apetite voltou. No dia 17 de abril, nos dias subsequentes, ela trabalha, come, bebe e pratica os exercícios religiosos.

Agora que a cura de Soror S. Carlos não se desmentiu, se me perguntarem como foi que se deu, eu devo responder que, medicalmente falando, ela não acompanhou as fases comuns. Será porventura fato natural que um doente, em estado grave, recupere a saúde sem convalescença mais ou menos prolongada e penosa? Será porventura coisa natural que, numa doença grave, repentinamente o facies se transforme e que, de súbito, as forças e o apetite voltem? Por mim, confesso, que nunca vi coisa semelhante.

Av:ignon, 31 de maio de 1847.

Gérard, médico.

 

"O abaixo assinado, doutor médico chefe do Hospital de Avignon, após 36 anos de atividades, declara que a volta inesperada e imprevista dum estado medicalmente julgado mortal, na pessoa de soror São Carlos, a um estado de perfeita saúde, sob todos os aspectos funcionais e orgânicos, efetuou-se repentinamente sem intervenção dos recursos da arte e que por conseguinte trata-se dum prodígio.

Dr. Rocha, médico.

Por cópia conforme - Avignon, 24 de Junho de 1848.

(C. Persyse; Semaná, Barrêre, vigários capitulares, em Giroy: Les Miracles de La Salette, vol. I. pag. 340 e 375).

Quem aqui escreve não pode furtar-se à satisfação de narrar uma sua recordação. Lá pelo ano de 1902, quando ainda seminarista maior dos Missionários de N. S. de La Salette, ia subindo à querida Montanha, onde fez o noviciado. No caminho alcançou um venerando ancião, de cabelos branquinhos, galgando penosamente a íngreme encosta. Após os usuais cumprimentos, travou-se a conversação. O velhinho disse: "Há trinta anos que neste mês, cada ano, faço setenta quilômetros à pé, bem fielmente, para vir agradecer a N. Sra. de La Salette o grande milagre que Ela me concedeu; pois há trinta anos eu vim aqui completamente cego e voltei para a casa com minha vista completamente boa e assim se conserva. Estou porém com mais de 72 anos de idade, as minhas velhas pernas já me não querem levar, esta é pois a minha última romaria. Maria SSma. sabe, Ela há de me desculpar".

Recordando--lhe a maternal bondade de Nossa Senhora, sosseguei o bom do velhinho que mais não vimos cujas feições tão serenas, donde promanavam fé e gratidão, me calaram fundo na alma.

(76) Soror São Carlos viera para essa casa de maca.

 

§ VII – Milagre em favor de Colete Yver

Transcrevemos a narrativa da merecidamente célebre escritora católica, por muitos apreciada em seus livros no Brasil, Colete yver.

“A Na. Sra. de La Salette" Como se paga uma dívida, uma dívida muito suave, venho aqui contar, com toda singeleza, em honra da Virgem Maria, o benefício que Ela, sob as feições de Na. Sa. de La Salette, concedeu-me na minha infância.

Na encantadora cidade de Segré, França, vivia, faz bem uns sessenta anos, uma menininha, que então contava apenas três anos, adulada com mimos pelos seus quatro irmãos e irmãs mais velhos, dotada de muita vivacidade, tanto que a sua mãe dava-lhe o apelido de "Azougue". Não era capaz de ficar parada. Ria e brincava sem descansar.

Essa benjamina que apreciou, numa família cristã, todo o calor verdadeiro do ninho é que, sendo agora uma velha literata, guardou muito vivas ainda as imagens dessa infância - recordações tão indeléveis essas, e que tanto vibram! - julga-se feliz hoje em colher piedosamente, no frêmito dessas recordações mais longínquas, como uma pedra duma casa desmoronada: - um acontecimento maravilhoso, um doce milagre da Virgem Santíssima.

Ainda vejo o quarto bem grande dos meus pais, o leito com alto baldaquino donde caiam compridas cortinas de musselina que o envolviam como santuário, onde o Crucifixo que ali reinava era um quadro grande, desenhado a carvão pelo irmão mais velho a mesa redonda bem no meio, por baixo da qual eu passava em pé a minha pequena poltrona de vime. Sim, te­nho tudo isso diante dos meus olhos, mormente a pequena poltrona ajeitadinha à minha altura. Era, da minha mobília pessoal, a peça principal. Ainda vejo-a fechando os olhos. Sentada nela, brincava de boneca, bem pouco mais acima do chão.

Certo dia minha mãe me chamou. Procurei levantar-me: impossível! as minhas pernas se tomaram inertes.

Minha mãe insistiu, acreditando numa desobediência. Eu respondi: "Estou grudada na minha cadeira!" Nada, com efeito, poderia melhor exprimir o que se passara porque era-me impossível ficar em pé. É sempre permitido pensar numa brincadeira, num gracejo, numa ocasião dessas, por parte duma criança. Os familiares, já aflitos, tinham ido chamar o meu pai lá no terreiro - espalharam bombons de chocolate pelo chão, dizendo que eu viesse apanhá-los. "Mas se estou grudada na minha cadeira, respondi, como é que posso levantar-me".

Chamaram o médico da família, o bom do doutor Poitevin que, vendo-me, ficou estupefato. Renovaram na presença dele a experiência do chocolate.

Apalpou os meus joelhos e as minhas articulações.

Tétrico foi o seu diagnóstico. O pior era que eu não sofria nada. Não se tratava pois de reumatismo. Por força teve de declarar que era paralisia. Naquele tempo a eletricidade ainda não tinha invadido o cam­po da terapêutica. A que recorrer, humanamente falando? A levadinha cabeça de beija-flor e como este passarinho sempre a se mexer, ali acometida de paralisia, estaria para sempre condenada. sem recursos?

O doutor meneava a cabeça, confortando do melhor modo os meus pais.

Por parte minha, não me lembro de ter sofrido nem mesmo um pouquinho. Era mesmo o sinal mais assustador do mal...

Essas coisas passaram-se em 1877, portanto, trinta e um anos depois que, na montanha de La Salette, em 1846, a Virgem Santa, rasgando, a favor de duas crianças. o véu que nos esconde o invisível, viera visitar a terra , na França. O país, convulsionado por diferentes modos de sentir e de pensar, padecia os assaltos do chamado ''livre pensamento". Mas no coração da minha província sossegada e ponderada, reinava serena e tranquila a paz das ideias. Ali a fé cristã permanecia inalterável. O vigário, O Pe. Villette - seja por motivo duma promessa do povo, seja oferta de alguma devota paroquiana, não sei - tinha mandado vir, para colocar na capela do cemitério, uma estátua, que julguei monumental, de Nossa Senhora de La Salette, com sua touca do feitio dum turbante, entre Maximino e Melânia, as duas crianças da montanha. Chegada que foi, verificou-se que a estátua era pesada de mais para poder ser levada até em cima dum altar ou duma coluna. Tinham-na colocado lá nas lages mesmo, na entrada da igreja do cemitério, encostada à parede do lado direito. Minha mãe, verdadeiro modelo de mãe cristã, aflita pela enfermidade da filhinha, resolveu, uns dias depois, recorrer à Virgem Santa e particularmente implorá-la sob a figura um pouco bizantina com que Maria se revestiu em 1846.

Menina paralisada que era, eu, não podia ir ao cemitério andando com os meus pezinhos inertes. Foram buscar no sótão o meu carrinho dos primeiros tempos, um lindo carro de vime, conforme uso da época, e a ama da minha irmã ficou encarregada de empurrar o carro de rodas fortes, embora de madeira e um tanto pesado, até à capela do cemitério.

Na porta da capela trocaram uma linda vela que puseram nas minhas mãos e pondo-me no chão disseram: "Vai levá-la a Nossa Senhora", e eu fui correndo. Desde então, nenhum sinal de paralisia nunca veio recordar-me esses dias trágicos em que, afinal, o milagre de Maria fez de mim uma mulher incansável para caminhar.

Dois anos depois o meu pai, funcionário, foi transferido para Rouen. Deixei em Segré a querida imagem da Virgem do milagre" (77).

Para não tornar volumoso demais este nosso livro, limitamo-nos a esses milagres. Mons. Giray, bispo de Cahors, França, na sua importantíssima obra em 2 volumes ''Les Miracles de La Salette", publicada em Grenoble em 1921, apresenta, até o ano de 1879, sessenta e cinco milagres, dos quais nove canonicamente julgados, trinta. e cinco admitidos por Bispos e dezesseis de caráter secundário.

É certo, portanto, que numerosos e grandes milagres foram obtidos pela invocação de N. Sra. de La Salette. Ora é contra a sabedoria e infinita perfeição de Deus, que Ele faça milagres que possam ser apre­sentados como provas de fatos inexistentes e menos ainda, de ardilosas imposturas.

Logo devemos concluir: Maria SSma, realmente apareceu no monte de La Salette a 19 de Setembro do ano de 1846.

(77) Na brochura '"La Salette - T61ooipagea. p. 187 - Bibliografia 78.

 

CAPÍTULO SÉTIMO

TESTEMUNHO DA AUTORIDADE ECLESIÁSTICA

JULGAMENTO E SENTENÇA DO BISPO DE GRENOBLE

§ 1o - Comunicado e Delegados episcopais

Se no capitulo anterior temos apresentado milagres obtidos pela intercessão de N. Sra. de La Salette particularmente na época da Aparição, foi porque nesses milagres é que a Autoridade eclesiástica se baseou para declarar verídico e divino o grande acontecimento.

De N. S. Jesus Cristo recebeu a Igreja católica poderes para decidir a respeito de tudo quanto se refere à Religião e a qualquer intervenção divina. Pois bem: por lei da Santa Igreja é somente ao bispo da diocese, em cujo território se deu algum fato com circunstâncias extraordinárias e porventura sobrenaturais, que oficialmente compete examiná-lo e julgá-lo.

Ora. o monte de La Salette pertencendo - como ainda pertence à Diocese de Grenoble, cujo bispo era então D. Felisberto de Bruillard, somente a ele assistia o direito de examinar e julgar o caso da Aparição.

Procedendo com a maior prudência, ele logo de início mandou aos vigários a seguinte circular:

- Vigário:

Sem dúvida chegaram ao seu conhecimento os fatos extraordinários que se deram, pelo que dizem, na paróquia de La Salette, perto de Corps. Concito V. Revma. a reler os Estatutos Sinodais que eu dei à minha diocese, no ano de 1829. Eis aqui o que se lê na página 97: “Proibimos, sob pena de suspensão incorrida ipso facto. declarar, mandar imprimir ou publicar algum novo milagre, por mais divulgado que seja, a não ser de ordem da Santa Sé ou da nossa, após exame exato e rigoroso".

Ora, nada pronunciamos a respeito dos acontecimentos de que se trata. O critério e o dever impõe a V. Rvma, se mostre muito reservado, e particularmente guarde silêncio absoluto, sobre o assunto, na tribuna sagrada.

No entanto houve quem publicasse um desenho litografado acrescentando-lhe umas estrofes. Comunico-lhe, Senhor Vigário, que essa, publicação não tão somente não foi por mim aprovada, mas antes me tem bastante contrariado; e que a tenho formal e rigorosamente reprovado. Tome portanto cuidado e dando o exemplo da prudência, não deixe de recomendá-la aos outros.

Queira aceitar, sr. Vigário, a expressão do meu sincero e afetuoso devotamento.

Felisberto, bispo de Grenoble, 9 de outubro de 1846."

Entrementes, com todo o cuidado, o bispo ia recolhendo todas as informações, cartas e relatórios; mandou sacerdotes conceituados a La Salette, ver os lugares e interrogar os dois pastorinhos. Ouviu, ou melhor, leu todos os relatórios que eles fizeram. Em Dezembro de 1846 nomeou duas comissões, compostas de cônegos da catedral e dos professores do seminário maior, aos quais ordenou. após inquérito, fizessem em separado o seu relatório bem fundamentado sobre o já rumoroso caso.

Ambas as comissões, em seus relat6rios - já prontos, em 25 de dezembro - aconselhavam maior estudo, maior informação. A dos cônegos concluiu se abrisse "o inquérito jurídico". Sem a menor pressa o bispo, prudente, ia refletindo e finalmente resolveu abrir o inquérito pedido. "Considerando ser o nosso dever, dizia ele na Provisão de 10 de julho de 1847, obter informações jurídicas tanto em Corps e La Salette como nos outros lugares onde se fala de curas milagrosas, nomeamos o Sr. Rousselot, professor de teologia no seminário maior, cônego da catedral e vigário geral honorário e o Sr. Orcei, cônego honorário e superior do seminário maior, para, na qualidade de Delegados, abrirem inquérito e colherem todas as informações referentes ao Fato em foco.

Concitamo-los a convocar tantos sacerdotes e leigos quantos julgarem necessários para alcançar a verdade.

Exigirão particularmente os atestados médicos das curas obtidas pela invocação de N. Sra. de La Salette ou pelo uso da água da Fonte milagrosa."

Poucos dias após sua nomeação oficial, a 27 de julho de 1847, os Padres Rousselot e Orcei deixaram Grenoble e foram percorrendo nove dioceses. Escreveram em seu Relatório: "Detemo-nos em todas as cidades episcopais das nove dioceses e tivemos audiência de seis bispos. Esses ilustres prelados mantiveram conferências conosco sobre a finalidade da nossa missão. Por toda parte tivemos boa acolhida, por toda parte muito se fala da Aparição do N. Sra. de La Salette, da água da fonte milagrosa, de romarias feitas ou projetadas à Santa Montanha, dos milagres operados ou das graças alcançadas pela intercessão de N. Sra. de La Salette.

Vimos e interrogamos as várias pessoas que diziam ter sido curadas; por toda parte nos deram ou prometeram relatórios autênticos desses fatos maravilhosos.

No dia 25 de agosto seguinte, após feliz viagem, estávamos de volta, por Corps, à vila por onde é necessário passar, querendo visitar o lugar do maravilhoso acontecimento que, dum ano para cá preocupa a França inteira e tem repercutido em países estrangeiros.

Na tarde disse dia, interrogamos, um depois do outro, os dois pequenos pastores, que, sem que pareça até agora terem notado, se tomaram tão célebres, e são causa prima da prodigiosa afluência ininterrupta que se vê nessas altas montanhas. na extrema fronteira sudeste da diocese de Grenoble".

Finalmente no dia seguinte, “com um tempo frio e nublado" por caminhos estreitos, penosos. íngremes'", os dois inquiridores, os primeiros que agiam oficialmente, alcançavam o planalto da Aparição, Vinham acompanhados das duas crianças, do Pe. Mélin, arcipreste de Corps, do Pe. Luiz Perrin, vigário de La Salette, do Pe. Paquet, vigário de Treminis; vários outros padres e quarenta romeiros se tinham unido a eles.

Momento solene, uma vez que nesse primeiro confronto oficial dos dois pequenos videntes dependeria a decisão autêntica da realidade ou da falsidade da sua visão.

Os dois delegados episcopais, de volta a Grenoble, apresentaram, primeiro por palavra, o resultado do seu mandato; depois o Pe. Rousselot redigiu por escrito o resultado do seu inquérito, num extenso relatório que seguidamente seria o primeiro livro que publicaria sobre o acontecimento de La Salette. Concluía em data de 15 de outubro de 1847, do modo seguinte:

“Tudo o que podemos ver pessoalmente, tudo o que ouvimos de testemunhas insuspeitos, todos os documentos autênticos que temos colhido sobre o fato extraordinário de La Salette, nós aqui apresentamos com fidelidade, boa fé, simplicidade. Se externamos, se defendemos nosso modo de pensar, é para levar ao conhecimento de V. Excia. nossa convicção pessoal.

Essa convicção vem sendo compartilhada, quer na diocese, quer fora dela, pela maior parte das pessoas com quem entramos em contato, que temos interrogado, ou que pessoas. espontaneamente comunicaram-nos as suas impressões.

Todos os eclesiásticos e leigos que vimos, aguardam pressurosos o julgamento doutrinai de V. Excia. sobre esse caso. Todos fazem votos para que essa decisão seja para a maior glória de Deus, incremento da devoção à augusta Mãe de Deus e salvação do povo. Por causa do fato em si, independentemente de qualquer decisão autêntica e solene, as multidões se movimentaram e se encaminham, vindas de todos os lados, para a montanha de La Salette. Quanto maior não há de ser o efeito, quando for revestido, esse fato, do selo da autoridade episcopal" (78).

(78) Rousselot - Livro já citado. Bibliog. 21.

 

§ 2o - Comissão examinadora

Prosseguindo na sua prudência, o chefe jurídico da diocese, longe de pôr o seu selo em documento que certificasse o fato da Aparição, resolveu nomear ''uma comissão numerosa - conforme suas palavras - composta de homens conceituados, piedosos e ilustrados, que deveria maduramente examinar e discutir o fato da Aparição com suas consequências".

Era composta essa comissão de dezesseis membros: os dois vigários gerais titulares, o superior do seminário maior, os oito cônegos da catedral e os vigários das cinco paróquias da cidade episcopal.

O bispo submeteu ao seu estudo o Relatório dos seus dois delegados. Do 8 de Novembro a 13 de Dezembro da 1847, a comissão realizou oito reuniões numa das salas do paço episcopal, sob a presidência do próprio D. Felisberto de Bruillard que dirigia os debates. Maximino e Melânia compareceram juntos e em separado. Como na Montanha, repetiram as palavras e atitudes da Aparição, sem nada modificar.

Em 4 de novembro, o bispo tinha mandado uma carta de convocação aos vigários da cidade, na qual se notavam particularmente estas palavras: "Desejosos de lhes dar prova da sua estima e confiança, resolvera associá-las aos seus vigários gerais e aos membros do seu colendo cabido, no intuito de ouvirem e discutirem todos juntos o Relatório a ele apresentado".

Determinava, com antecedência, hora e lugar para cada reunião, exigia rigoroso segredo e pedia orações para o feliz êxito do empreendimento, as luzes do Espírito Santo e o auxílio da Virgem.

"As reuniões, ordenava, terão início segunda feira próxima, no palácio episcopal, à uma hora e quinze da tarde, numa das salas do segundo andar; e prosseguirão nos dias seguintes à mesma hora, sendo indispensáveis o comparecimento exato e o segredo inviolável até decisão final.

Para pronunciar sentença doutrinai sobre o fato importante que há de nos ocupar durante várias sessões, necessito do socorro do Céu.

Haveis de me ajudar a consegui-lo, rezando, assim como eu, na Santa Missa nos dias de reunião, as orações do Espírito Santo e da Bem-aventurada Virgem".

A Sua carta de convocação anexou um “regulamento sobre a ordem a ser seguida nas reuniões". Esse regulamento foi comunicado" a todos os membros da comissão e particularmente especificava que na abertura e no encerramento das reuniões haveria oração.

Foram previstas seis sessões e cada uma com seu assunto claramente determinado. Isso aliás não impediu as digressões que obrigaram o bispo a chamar à ordem a douta e loquaz assembleia.

No fim da quarta sessão, interveio com certa severidade. "Senhores, disse, não ficareis admirados se na quarta sessão, salientando que nas duas primeiras compareceram os dois videntes, eu vos dirijo uns avisos... O debate sobre o grande acontecimento da Aparição se realizou com plena liberdade, como devia ser, e a oposição usou largamente do seu direito de falar. Colocou frequentemente até pedras pelo caminho por onde anda a comissão e a marcha, embora não impedida, ficou prodigiosamente retardada.

Pareceu-nos que se perdeu muito tempo. Evitemos esse mal, pois o tempo é precioso. Aliás vossa intenção não há de ser de prolongar exageradamente os nossos debates e as nossas reuniões".

A oposição, de quatro membros, sendo o mais ativo o Pe. Cartellier, vigário de São José, procedia com tenacidade, apesar do acordo contínuo dos doze membros.

Foram precisas oito sessões para esgotar todos os assuntos. No entanto, a votação a favor do Relatório e das mais questões levantadas foi sempre com grande maioria de votos, umas até com unanimidade; e as soluções das objeções apresentadas foram adotadas também pela grande maioria".

No dia 13 de dezembro de 1847, o bispo declarou encerradas as sessões, agradecendo aos membros da assembleia a frequência e zelo, e acrescentando que em tempo oportuno pronunciaria seu julgamento doutrinai".

Como fazia notar, D. Ginoullac, sucessor de D. Felisberto, o bispo não necessitava do exame de comissões tão numerosas para pronunciar o seu julgamento sobre a Aparição. Nem tão pouco era necessária maioria tão grande como foi em todas as reuniões, para que pudesse agir". D. Felisberto porém fazia questão de afastar a menor possibilidade de errar e de "cercar-se de todas as luzes possíveis sobre o assunto, e obter esclarecimentos sobre os pontos mais dificultosos. Embora, dizia ele mais tarde, a nossa convicção fosse completa no fim das sessões da comissão, não quisemos ainda pronunciar julgamento doutrinai sobre fato de tanta importância".

Limitou-se a dar sua aprovação, no ano seguinte, ao relatório dos dois Delegados, autorizando a sua publicação. Essa obra, feita com toda ciência e imparidade, intitulada: ""La Vérité sur l"Avenement de La Salette... (A Verdade sobre o Acontecimento de La Salette) impressa com aprovação do bispo, denota com que grande cuidado foi examinado o assunto e prolongado o exame" (79).

(79) Rousselot - na obra assinalada e Manuscritos do Pe. Bossan. M. S. arquivo dos Miss. de N. Sra. de La Salette. Bibliografia 3, 7, 21.

 

§ 3o – Julgamento e sentença do Bispo diocesano

Entre a publicação do relatório e a divulgação da Carta Pastoral do julgamento, decorreram quatro anos, e durante esse prazo surgiram vários casos de que falaremos mais abaixo; a oposição desenvolveu atividades que alguns trataram de "satânicas", que aliás se prolongaram ainda por mais seis anos depois da sentença episcopal.

O venerando Prelado enfrentou a luta sem temor e com sábia e nobre longanimidade. "Todos sabem, havia de escrever na sua Carta pastoral, que não faltaram os contraditores. Qual a verdade moral, qual o fato humano e mesmo divino que não os teve? No entanto, para modificar a nossa crença num acontecimento tão extraordinário, tão inexplicável sem intervenção divina, cujas circunstâncias e consequências unem-se para apontar o dedo de Deus, fora necessário um fato contrário, tão extraordinário e tão inexplicável como o de La Salette, ou pelo menos que explicasse este último de modo natural; ora tal coisa não encontramos, e por esse motivo, publicamos, alto e bom som, a nossa convicção" (80).

Quiseram contestar o seu direito de pronunciar o julgamento. Até o seu Metropolita, o arcebispo de Lião, tentou avocar, a si, com insistência, o caso de La Salette. Ora ele apenas poderia recomendar cuidado e prudência; o julgamento, porém, de acordo com o Concílio de Trento era da alçada do bispo diocesano, e o bispo de Glenoble estava certo do seu direito.

“D. Felisberto, afirmou mais tarde D. Ginoullac em sua Carta Pastoral de 4 de novembro de 1854, consultou pessoas muito conceituadas em Roma para saber das leis e de vários lados teve resposta que lhe assistia o direito de se pronunciar sobre o fato da Aparição e erigir um santuário na montanha de La Salette.

Tomava o bispo todas as cautelas, para não dar nenhum passo errado. E para completar o plano de uma Carta Pastoral dirigiu--se ao seu colega de La Rochelle, D. Villecourt, futuro cardeal que, romeiro de La Salette no ano seguinte ao da Aparição, fizera inquérito pessoal e publicara um livro em que proclamava com força a sua convicção. Esse bispo pôs-se ao dispor de D. Felisberto. Pronta que foi a carta pastoral redigida, em colaboração, pelos dois prelados, D. Felisberto remeteu o documento a Roma para submetê--lo às luzes e ao juízo do eminente Príncipe da Igreja, o cardeal Lambruschini, prefeito da Sagrada Congregação dos Ritos e antigo Secretário de Estado de Gregório XIII. A resposta foi: "Está tudo muito bem, nada há a desejar".

Depois disso, quis ainda que uma comissão composta dum vigário geral e dos cônegos da Catedral examinasse o trabalho, o que eles fizeram estudando o documento frase por frase, com toda a atenção, assinalando apenas umas leves alterações julgadas necessárias, que o venerando Prelado de bom credo aceitou, levando assim a prudência ao extremo. Nada mais faltava.

Resolveu finalmente o bispo de Grenoble publicar a sua Carta Pastoral, na qual, após minucioso relato dos fatos, das cautelas tomadas, dos trabalhos das Comissões, das orações feitas, das objeções dos adversários luminosamente rebatidas, ele pronunciava o seguinte julgamento e sentença:

“Baseando-nos sobre os princípios ensinados Papa Benedito XIV e seguindo as normas por ele traçadas na sua imortal obra da Beatificação e da Canonização dos Santos (Livro II, cap. 31, n. 12); visto o relatório escrito pelo Padre Rousselot, nosso Vigário Geral, intitulado: A verdade sobre o Acontecimento de La Salette visto igualmente o livro Novos Documentos sobre o Acontecimento de La Salette, publicado pelo mesmo autor em 1850, ambas essas obras por nós aprovadas; ouvidas também as livres discussões realizadas em nossa presença, sobre os fatos, nas sessões de 8, 15, 16, 17, 22, 29 de novembro, 6 e 13 de dezembro de 1847; visto ainda e ouvido tudo quanto foi escrito e dito, desde essa época, em favor ou contra o Acontecimento; considerando, antes de tudo, a impossibilidade em que Nos achamos de explicar o fato de La Salette de outra maneira a não ser por intervenção divina, seja qual for o modo como o consideremos, quer em si mesmo, quer em suas circunstâncias, quer em sua finalidade essencialmente religiosa; considerando, em seguida, que as consequências maravilhosas do fato de La Salette apresentam-se como sendo o próprio testemunho de Deus, manifestado por meio de milagres, e que esse testemunho é mais forte que o dos homens e suas objeções; considerando que esses dois motivos em separado, e ainda mais em seu conjunto, devem predominar em toda a questão e tirar toda espécie de valor às pretensões e suposições em contrário que declaramos perfeitamente conhecer; considerando, finalmente, que pela nossa docilidade e submissão o Céu nos pode poupar numerosos castigos de que estamos ameaçados e que por demasiada e prolongada rebeldia nos podemos expor a males sem remédio; a pedido formal de todos os membros do nosso colendo cabido e dos sacerdotes da nossa Diocese (81); no intuito, igualmente, de atender à justa expectativa de muito avultado número de almas piedosas, tanto da pátria como do estrangeiro, que acabariam por nos censurar por mantermos a verdade cativa; invocando novamente o Espírito Santo e o auxilio da Virgem Santíssima declaramos o seguinte:

Artigo 1o: julgamos que a Aparição da Virgem Santíssima a dois pastores, em 19 de setembro de 1846, num monte da cordilheira dos Alpes, situado na paróquia de La Salette, do Decanato de Corps, encerra t§das as cir­cunstâncias características da verdade e que os fiéis têm fundamento para acreditar que é certa e indubitável.

Artigo 2o: Cremos que esse fato adquire um novo grau de certeza da espontânea e imensa afluência dos fiéis ao lugar da Aparição, bem como dos inúmeros prodígios que foram consequência do referido acontecimento, grande número dos quais não oferece a menor dúvida, sem violar as regras do testemunho humano.

Artigo 3o: Por isso, para testemunhar a Deus e à gloriosa Virgem Maria a nossa profunda gratidão, autorizamos o culto de N. Sra. de La Salette. Permitimos seja pregado e possam tirar-se as conclusões práticas e morais desse acontecimento.

Artigo 4o : Proibimos no entanto, terminantemente, se publiquem formulários particulares de orações, cânticos, ou livros de devoção, sem nossa autorização, dada por escrito.

Artigo 5o : Proibimos terminantemente aos fiéis e aos sacerdotes da nossa diocese que se declarem publicamente por palavra ou por escrito contra o fato que hoje proclamamos e que portanto todos devem respeitar.
Artigo 6o : Queremos e mandamos que esta nossa Carta Pastoral seja lida e publicada em todas as igrejas e capelas da nossa diocese, na missa principal ou de comunidade, no domingo imediato ao seu recebimento.

Dado em Grenoble, sob o Sigilo e Selo das nossa Armas e Contra-Sigilo do nosso Secretário, a 19 de setembro de 1851 (quinto aniversário da Aparição)."

Fellsberto, bispo de Grenoble.

De ordem de S. Exa. Revma.: Auvergne, Cônego honorário, Secretário.

Os dois artigos 6 e 7, referem-se respectivamente à construção dum santuário no lugar da Aparição e à devoção dos fiéis, para que aproveitem e pratiquem as advertências e os ensinamentos de Maria SSma. em sua Aparição.

Tendo sido porém retardada a remessa, essa Carta Pastoral só foi lida, no dia 16 de novembro de 1851, nas seiscentas igrejas e capelas da diocese de Grenoble e teve ótima acolhida pela grandíssima maioria dos padres e dos fiéis.

Fora da diocese, igualmente, a Carta Pastoral foi recebida com aplausos quase gerais.

O Pe. Rousselot escreveu: O bispo de Grenoble, que pelo modo como tratou do acontecimento de La Salette, nada tinha que recear do juízo, nem de Roma, nem dos seus venerandos colegas, houve por bem remeter a sua Carta Pastoral aos bispos da França, a personagens de vulto de Roma e a alguns prelados no estrangeiro.

Os jornais religiosos da França e do estrangeiro, notadamente de Roma, publicaram a Carta Pastoral. Vários bispos mandaram publicá-la em sua diocese. Outros escreveram, por essa ocasião, cartas circulares para levar o fato ao conhecimento dos seus diocesanos.

A carta Pastoral de D. Felisberto foi logo traduzida em italiano, alemão, inglês e flamengo. O bispo recebeu, como resposta da remessa da sua Carta Pastoral, numerosas e lindas cartas de adesões públicas e particulares, da maior parte dos bispos, vigários gerais, superiores de Ordens religiosas e de toda espécie de pessoas da alta sociedade.

O arcebispo de Milão lhe dirigiu carta admirável. O bispo de Ryent, Inglaterra, mandou reimprimi-la e publicar junto com outra sua.

Todos os sucessores de D. Felisberto. até o atual, D. Caillot, aprovaram essa Carta Pastoral e se demonstraram devotados ao culto de N. Sra. de La Salette. O sucessor imediato de D. Felisberto foi o defensor estrênuo da Aparição e do Julgamento doutrinal. É que D. Ginoullac era homem de grande talento e profundo teólogo. Nas suas três Cartas Pastorais - de 30 de setembro, de 4 de novembro de 1854, de 19 de setembro de 1857 - de magistral valor e lógica irresistível, repeliu os ataques dos adversários rebatendo com ciência e energia os argumentos em contrário, e os reduziu ao silêncio.

A autoridade religiosa competente pronunciou sentença oficial, declarando fato certo que Maria Ssma. apareceu na Montanha de La Salette. Cremos portanto que a "Bela Senhora", era, na verdade, a Mãe de Deus.

(80) Carta Pastoral de 18 de setembro de 1851.

(81) Por ocasião do retiro espiritual, 240 padres assinaram uma súplica solicitando ao bispo uma declaração favorável. só 17 contra.

 

CAPÍTULO OITAVO

LA SALETTE E A SANTA SÉ

§ 1o - Esclarecendo

Para evitar todo e qualquer mal-entendido. iniciamos este Capítulo transcrevendo aqui uma resposta da Sagrada Congregação dos Ritos, do dia 12 de Maio de 1877. Fizeram a essa Sagrada Congregação a seguinte consulta:

"A Santa Sé aprovou as aparições e as revelações que, ao que dizem, se deram e foram causa do culto prestado a N. Sra. de Lurdes e N. Sra. de La Salette?"

A Sagrada Congregação respondeu: "A Santa Sé nem tem aprovado, nem tem condenado essas aparições e revelações; permitiu somente que se lhes dê piedosa crença de fé meramente humana, baseada na narrativa que delas fazem, narrativa aliás confirmada por testemunhos idôneos e por documento. Nada por conseguinte impede que os Ordinários..." (Decreta Autêntica, 3419, Dubium, 2).

Por conseguinte, nunca a Santa Sé, a respeito de Aparições e revelações, pronuncia julgamento doutrinário como fez D. Felisberto para a Aparição de N. Sra. de La Salette; pois a resposta acima bem claro dá a entender que tal julgamento Compete aos "Ordinários", isto é, aos bispos.

''É de fé meramente humana" porque a fé divina é só para a revelação que Deus fez à humanidade; essa revelação terminou com a morte do último Apóstolo de N. S. Jesus Cristo. É a respeito daquilo que se refere direta ou indiretamente a essa revelação divina que a Santa Sé, o Papa, pronuncia julgamento doutrinário definitivo.

Escusado é portanto querer o leitor encontrar neste Capitulo frase como esta: A Santa Sé aprovou no sentido do julgamento de D. Felisberto a Aparição de N. Sra. de La Salette encontrará, no entanto, provas de sobejo que a Santa Sé, na expressão da Sagrada Congregação, “permitiu se desse crença e culto a N. Sra. de La Salette".

 

§ 2o - O Papa Pio IX e seus breves em favor de La Salette.

Na época da Santa Aparição era chefe da Igreja o Papa Pio IX, que muitos favores concedeu para incrementar o culto de N. Sra. de La Salette (82).

Vimos que o bispo de Grenoble, antes de publicar o seu julgamento, enviou a sua Carta Pastoral ao Cardeal Lambruschini, prefeito da Congregação dos Ritos, que a 7 de outubro de 1851 respondeu: "Assim que as minhas ocupações mo permitiram, li com a máxima atenção a Carta Pastoral de V. Excia. Eis aqui o meu parecer. O prelado narra o fato, de certo extraordinário, sem prevenção e com a exatidão histórica tão recomendada na Sagrada Escritura e de conformidade com as Regras da Santa Igreja.

Tudo está muito bem, nada deixa a desejar, especialmente a respeito do exame do acontecimento, que foi conduzido com edificante e muito louvável rigor. Faço apenas notar que talvez, por sábia prudência, é melhor omitir o canto do "Te Deum", para não atestar com 'tão magna solenidade, em nome da Igreja, a verdade do Fato de que se trata".

Após tais palavras não é de admirar que o "Osservatore Romano" jornal do Vaticano, tenha publicado na quinta feira, 1o de abril de 1852, "com a autorização da censura", depois de rigoroso exame, a Carta Pastoral de 19 do mesmo ano.

O jornal 'acrescentava: "Recebem-se, nos escritórios do Osservatore Romano as ofertas para a referida Peregrinação".

Logo de início a Santa Sé concedeu favores espirituais. "A prova mais decisiva de proteção e favor dado à nova Peregrinação pela Santa Sé, é o número tão extenso das graças espirituais que o Sumo Pontífice tem concedido ao Santuário de N. Sra. de La Salette.

1o Por um Rescrito de 24 de agosto de 1852, o Soberano Pontífice declarou o altar mor do Santuário de La Salette, altar privilegiado perpétuo.

2o Por um Rescrito de 26 de agosto de 1852, concede a faculdade de celebrar a missa votiva da Ssma. Virgem a todos os padres que forem à La Salette, em todos os dias do ano, exceto nas grandes festividades e férias privilegiadas.

3o Por um breve de 26 de agosto de 1852 o Sumo Pontífice concede aos membros da Confraria de La Salette:

1. Indulgência plenária no dia da admissão;

2. Indulgência plenária na hora da morte;

3. Indulgência plenária uma vez no ano, no dia da principal festividade da Confraria;

4. Indulgência de sete anos e sete quarentenas, quatro vezes por ano, em quatro dias determinados;

5. Sessenta dias de indulgência por cada obra de caridade que praticarem.

4o Por um indulto de 2 de dezembro de 1852, Pio IX concede, a pedido do bispo de Grenoble, a permissão de solenizar, todos os anos, no dia 19 de setembro, o Aniversário da Aparição (vel ipso Apparitionis die) em todas as igrejas da diocese, ou no domingo seguinte, por uma missa solene e pelas vésperas cantadas de Nossa Senhora.

No mesmo indulto, o Papa autoriza o clero, se este o preferir, a celebrar a memória da Aparição (Memoriam hujus Apparitionis recolere) adotando o ofício inteiro, celebrando a missa do patrocínio da Bendita Virgem sob o rito solene duplo de segunda classe.

O mesmo Papa, de próprio punho, concedeu, em 10 de fevereiro de 1857, grandes indulgências à devoção de N. Sra. de La Salette estabelecida na Igreja dos Revmos. PP. Recoletos de São Trond, diocese de Liêge, Bélgica. E em 1858, concedeu iguais indulgências aos Revmos. PP. Passionistas de Buremonde, na Holanda (83) (No livro "Auguste Marceau, Capitaille de Frégate", 2a edição, II volume, pág. 429).

A Santa Sé, portanto, logo no início, permitiu o culto de N. Sra. de La Salette. Em 6 de agosto de 1867, o culto de N. Sra. de La Salette foi estabelecido publicamente em Roma, com autorização do Cardeal Patrizi, vigário do Papa, na diocese de Roma. Um quadro representando a Aparição foi exposto à veneração dos fiéis na igreja do São Salvador in Thermis. Na mesma igreja, a Confraria de N. Sra. Reconciliadora foi erigida e enriquecida com numerosas indulgências, pelo próprio Papa, que mandou inscrever o seu nome (84) em 16 de outubro de 1870. D. Baillés, antigo bispo de Luçon, oficiou na cerimônia.

Foi o padre Crévoulin, capelão da igreja de São Luiz dos Franceses, que erigiu a Confraria nessa igreja. Ele custeou as despesas da reforma de São Salvador em Thermis, para nela estabelecer o centro da devoção romana à Virgem dos Alpes (85).

Quando se levantaram os contraditores de La Salette, em 1854, Pio IX mandou escrever a D. Ginoullac, em 30 de agosto de 1854, uma carta para protestar contra os panfletos: "Sendo necessário, acrescentava o Santo Padre, é dever do vosso cargo e de vossa solicitude pastoral esclarecer o vosso rebanho a respeito dos perigos que cercam essa mesma devoção e pré muni-la contra eles ".
Por esse motivo, D. Ginoullac escreveu a sua Carta Pastoral de 4 de Novembro de 1854 em defesa do Fato e do culto de Na. Sra. de La Salette.

Um mês depois D. Ginoullac achava-se em Roma por ocasião da proclamação da Imaculada Conceição, e teve duas audiências de Pio IX, que tomou a iniciativa de falar de Na. Sra. de La Salette: "O Santo Padre, escreveu ele em 30 de janeiro de 1855, disse formalmente que é preciso manter a devoção a N. Sra. de La Salette, que confirmava a Carta que me tinha escrito e que na minha Carta Pastoral, que ele leu, eu tinha interpretado exatamente essa Carta".

Ora, na sua Carta Pastoral, D. Ginoullac assinalava o interesse especial do Santo Padre pela obra de N. Sra. de La Salette". O mesmo Papa, em Breve assinado do próprio punho, com data de 20 de novembro de 1869, felicitava o Sr. Similieu, de Angers, pelo seu devotamento ao altar de La Salette e pelos seus escritos conscienciosos vingando das calúnias e dos erros (vindicandae e calumniis et erroribus) a história dos fatos referentes à Aparição (86).

Em 10 de setembro de 1868, sabendo da morte do Padre Jacquet, missionário de La Salette, em Roma, no último dia do mês de N. Sra. Reconciliadora de La Salette, o Papa exclamou, levando os olhares para o alto:

"Oh! quanto é auspicioso para o céu! Gosto dessa devoção e estou contente por ver que ela se difunde" (87).
Parece até que a mensagem de N. Sra. de La Salette influiu na Encíclica de 1849 e nas cartas de Pio IX, conforme notava D. Ginoullac na sua Carta Pastoral de 1854. Com efeito, ele escrevia de Nápoles ao seu Vigário em Roma o Cardeal Patrizi, a 12 de outubro de 1867:

"Deploramos particularmente três males, a impiedade da blasfêmia, que se difunde infelizmente de modo particular no povo, a violação dos dias santos e a falta de respeito na casa de Deus. Esses males geralmente atraem a vingança divina, como a Sagrada Escritura e a história atestam.

Por conseguinte, compenetrado da santidade do nosso dever em vigiar pela glória de Deus e pela salvação das almas e de afastar do nosso povo, na medida do possível, os flagelos celestes, nós vos recomendamos de proceder em nosso nome e com plenos poderes à extirpação desses males... " São os próprios ensinamentos contidos na narrativa dos dois pastores.

(82) Bibliografia n. 7.

(83) Bibliografia 54.

(84) Bibliografia – Historie Secularie; p. 171 - Bibliografia 71.

(85) Lafond - La Salette. p. 49 nota.

(86) Semaine religieuse de Grenoble, 14 de novembro de 1858.

(87) Annales de Notre Dame de La Salette, abtil de 1890. Bibliog. 62.

 

§ 3o - Os Papas Leão XIII, Pio X, Benedito XV e Pio XI

O Papa Leão XIII muitos favores concedeu aos devotos de N. Sra. de La Salette. Vendo entre os membros da peregrinação a Jerusalém, um missionário de N. Sra. de La Salette dizia ele: “0h! de todo o coração, abençoamos La Salette e tudo o que é de La Salette".

O Bem-aventurado Pio X concedeu também a La Salette e aos seus benfeitores as suas mais largas bençãos (88). Pedindo vênia ao prezado Leitor, aqui recordo a bondade paternal com que esse Papa Santo, por ocasião da audiência na véspera da nossa vinda para o Brasil, nos disse que abençoava aos brasileiros e aos Missionários de La Salette, e concedeu, com toda facilidade, uma indulgência plenária aos agonizantes que osculassem o nosso Crucifixo de missionário.

O Papa Benedito XV nos dias 4 de novembro de 1916 e 20 de março de 1920, por ocasião das audiências que ele se dignou conceder aos Missionários de N. Sra. de La Salette e ao seu Superior Geral, dizia quanto essa cara devoção à divina Reconciliadora lhe parecia legítima e benfazeja, acrescentando que merecia fosse encomiada e desenvolvida, que estava satisfeito com seus progressos e por esse motivo abençoava os seus obreiros apostólicos e todas as suas obras" (89).

Igualmente, Sua Santidade Pio XI dizia numa audiência aos mesmos Missionários: "Tendes uma boa Nossa Senhora como Providência" (90).

Na última coletânea oficial das orações com indulgências, lê-se que Pio XI concedeu 300 dias de indulgências à oração “Lembrai-vos, ó Nossa Senhora de La Salette . . . '" e 100 dias à invocação "Nossa Senhora de La Salette, Reconciliadora dos pecadores, rogai sem cessar por nós que recorremos a vós".

(88) Giray. Les Miracles de La Salette - vol II, pág. 434. Bibliog. 68.

(89) Bulletin des Missionnaires de N. D. de la Salette, dezembro de 1918 e Maio de 1920.

(90) Na Revista acima. Fevereiro de 1928.

 

§ 4o - O Papa Pio XII

Foi particularmente por ocasião do Vo Congresso Mariano Nacional na França que Sua Santidade o Papa Pio XII manifestou seu paterno interesse pelo culto de N. Sra. de La Salette e seus missionários.

Em 31 de dezembro de 1943, em carta dirigida ao bispo de Chartres, no decurso das sessões preparatórias disse Congresso Mariano a realizar-se em Grenoble e La Salette de 2 a 8 de setembro de 1946, o Santo Padre convidava "a França, reino de Maria, em tantas provações nos atuais acontecimentos, a unir-se para festejar o Centenário da Aparição de N. Sra. de La Salette e avivar sua piedade filial para com sua augusta Protetora".

Ao então Superior Geral dos Missionários do N. Sra. de La Salette, Sua Santidade escreveu a seguinte carta autógrafa traduzida do original francês: "Caro Filho, Estevão Cruveiller, Superior Geral dos Missionários de N. Sra. de La Salette. Nossa devoção à SSma. Virgem, ao Coração Imaculado de Maria, ao qual consagramos a Igreja e o mundo, não pode senão dilatar-se diante das doces perspectivas que a vossa carta nos deixa entrever, do próximo Centenário da Aparição de N. Sra. de La Salette, cujo processo canônico então instruído resultou favorável.

É bem compreensível que a vossa Família religiosa, da qual D. Felisberto de Bruillard lançou a semente, "como perpétua memória da misericordiosa Aparição de Maria em La Salette" tenha tomado especialmente a peito, a comemoração secular da tarde bendita do dia 19 de setembro em que a Madona (Nossa Senhora), em pranto, conforme se relata, veio conjurar seus filhos a entrarem resolutos, na via da conversão a seu divino Filho e de reparação pelos inúmeros pecados que magoam a augusta Majestade Divina.

A Junta Nacional Francesa dos Congressos Marianos foi igualmente bem inspirada, decidindo, com pleno assentimento da Assembleia dos Cardeais e Arcebispos da França e de acordo com o nosso Venerável Irmão Alexandre Caillot, bispo de Grenoble, de celebrar, nesta ocasião, as sessões do V° Congresso, no lugar honrado há cem anos por esse insigne favor.

Vossa Congregação aliás, especialmente instituída para guarda do Santuário de N. Sra. de La Salette e irradiação de Maria Reconciliadora, não podia deixar de trabalhar eficazmente na realização desse magnífico projeto. É de mui bom grado que de Nossa parte, dirigimos a esse respeito, Nossos votos de encorajamento paternais aos queridos Missionários de N. Sra. de La Salette, na doce confiança de que a Virgem Santíssima há de querer, em retribuição, alcançar-lhes, para os seus múltiplos ministérios, até nos mais longínquos e duros campos apostólicos, abundantíssimas graças e consolações. Não há dúvida que a celebração desse Centenário contribuirá muito para o acréscimo de fervor espiritual e o reerguimento do mundo, ainda tão revolucionado pelas consequências da guerra, e particularmente da querida França, que há de querer soerguer-se cada vez mais; assim o esperamos, para a sua completa felicidade e plena prosperidade, no reino de Maria.

É portanto de todo o coração que almejamos completo e sobrenatural sucesso a essas solenidades jubilares, e que vos enviamos, assim como aos vossos caros filhos e a todos os que cooperarem nas mesmas solenidades com orações, trabalhos e generosidades, como penhor das melhores recompensas celestiais, a Bênção Apostólica".

Vaticano, aos 8 de outubro de 945 (91).

A Santa Sé, já no ano de 1943, tinha aprovado a missa e o ofício próprios de N. Sra. Reconciliadora dos Pecadores de La Salette. Durante o Centenário da Apari­ção de N. Sra. de La Salette concedeu:

1o Indulgência de Sete Anos cada dia dos Tri ou Novenas a N. Sra. de La Salette.

2o Indulgência plenária para as pessoas que assistissem ao Tríduo todo ou cinco dias duma novena a N. Sra. de La Salette.

3o Uma Indulgência plenária, para todas as pessoas que tomassem parte numa Romaria organizada, a um Santuário de N. Sra. de La Salette.

Terminamos este Capítulo mencionando mais duas provas do paternal interesse do Papa Pio XII por tudo o que se refere às obras salettenses. Por ocasião do Centenário da Congregação dos Missionários de N. S. de La Salette, o Santo Padre, em 22 de abril de 1952, por intermédio da Secretaria de Estado do Vaticano, se dignou escrever-lhes para dar-lhes as suas felicitações e fazendo os melhores votos, e acrescentou: "Do Santuário Mariano, berço da Congregação, os religiosos difundiram-se por inúmeros países, e hoje em dia levam até longínquas terras o espírito missionário mariano que caracteriza o Instituto". No dia 28 de maio seguinte Sua Santidade recebeu 70 religiosos salettenses numa audiência tão carinhosa que até consentiu ser fotografado no meio deles, jubilosos por tão grande honra. Concedeu 1000 dias de indulgências, toties quoties, a quem oscular os seus crucifixos de Missionários, falando-lhes com nímia benevolência “da vossa eminente Congregação". (92)

(91) Essa carta foi publicada no Diário Oficial da Santa Sé. Acta Apostolicae Sedis", de 1946, pág. 156.

(92) Annales de Notre Dame de La Salette. Maio-Junho de 1952.

 

CAPÍTULO NONO

OS SEGREDOS DE LA SALETTE

§ 1o - Os Segredos despertam a atenção

O Pe. Laggier, em seus interrogatórios, fez estas perguntas a Melânia:

- Então. Maximino ouviu o que Ela te falava?

- Não sei.

- Maximino não te disse?

- Não, ele não me disse nada. Quando Ela tinha desaparecido, Maximino me disse: "Ela ficou muito tempo sem falar, só lhe via mover os lábios. O que é mesmo que Ela falava?" Eu respondi: “Ela me falou alguma coisa, mas não posso te dizer: Ela mo proibiu."

- E você não lhe fez a mesma pergunta?

- Não, porque antes de perguntar-lhe ele me disse:

“Oh! que contente que eu estou, Melânia! A mim também Ela falou alguma coisa, mas eu não te quero dizer (93).

Assim foi que os dois Pastorinhos ficaram sabendo dos segredos, mas não falaram nada a este respeito, quando narraram o grande acontecimento. A quem lhes perguntou, por que motivos não tinham falado, responderam: “Ninguém nos perguntou; uma vez que era segredo, não era preciso falar" (94).

Justamente por ser segredo é que todo mundo queria conhecer.

O cardeal de Lião, a cujo arcebispado pertencia e ainda pertence o bispado de Grenoble, respondendo a uma carta do Pe. Rousselot, que respeitosamente queixara-se de certos rumores em Lião sobre a Aparição, "Respondeu (95):

Arcebispado de Lião, 21 de maio de 1851.

Confidencial

Não me ocupei absolutamente do caso de La Salette, Sr. Padre, a não ser para fazer respeitosas representações a S. Excia. o bispo de Grenoble; de que, sem dúvida, o Sr. teve conhecimento, a respeito do Concílio de Lião. Hoje tenho de me ocupar do caso na qualidade de conselheiro do Papa e venho rogar-lhe me diga se Marcelino e sua irmã me confiarão os seus famosos segredos para transmiti-los a Sua Santidade.

Queira aceitar", etc.

Visto o duplo erro do nome e do parentesco do vidente, o bispo de Grenoble podia "concluir que o caso de La Salette estava sendo bem pouco estudado pelo clero de Lião".

No entanto apressou-se em ordenar se dessem Os passos necessários junto às crianças para obter delas os segredos, porque, acrescentava: ''A carta de Sua Eminência supõe evidentemente que o Papa manifestou algum desejo de conhecer os segredos das crianças" (97),

(93) La Salette, III - pág. 134, 135. Bibliografia 20.

 

§ 2o - Os segredos escritos para serem comunicados ao Papa

Não foi tarefa nada fácil. Vimos, especialmente Pela carta de Mons. Dupanloup, quão renitentes se mostraram as crianças. Foi preciso que os Padres Rousselot e Auvergne lhes explicassem quem era o Papa, a quem deviam obedecer; que não era possível que a Virgem SSma. tivesse proibido de contar os segredos ao Chefe da Igreja; pelo contrário, Ela queria que se obedecesse ao Papa. "Mas, disse Melânia, não é o Papa que está pedindo". Finalmente convenceram-se, Maximino mais facilmente, Melânia com multo maior dificuldade.

Consentiram, mas com expressa condição: “Somente ao Papa e a mais ninguém" (97).

A Srta. de Brulais perguntou ao Pe. Gerin, 21 de Setembro de 1851, se Maximino e Melânia se tinham mutuamente consultado, antes de resolverem confiar os segredos ao Papa: - "Ah! não, respondeu o padre, pois entre eles havia bem hora e meia de viagem". (98).

Imediatamente D. de Bruillard remeteu relatório exato dessas entrevistas ao Cardeal Arcebispo, que dois meses depois ainda nada tinham respondido. Esse inexplicável silêncio levou o bispo de Grenoble a fazer, por carta, pormenorizada exposição dos fatos à Santa Sé, cuja resposta foi que Ele podia comunicar diretamente os segredos ao Santo Padre o Papa. Foi o que se deu, como passamos a narrar apesar do pedido formal do Cardeal: "Escrevam as crianças os segredos e mos remetam" - chegado ao bispado nesses entrementes.

D. de Bruillard enviou um leigo conceituado, homem de sua confiança, sr. Dausse, buscar Maximino e trazê-lo ao bispado, a 2 de julho de 1851. O menino ao chegar foi introduzido numa sala do segundo andar e colocado diante duma escrivaninha, com todo o necessário para escrever. Para vigiá-lo, de 0rdem do bispo, veio também o cônego de Taxis. Tanto ele como os outros se afastaram. Maximino, de cabeça na mão, ficou refletindo uns instantes, coordenando ideias. De repente começou a escrever o preâmbulo que mostrou do Sr. Dausse: "No dia 19 de setembro. de 1846, eu vi uma Senhora Luminosa como o sol, que acredito ser a Virgem Santíssima, mas eu nunca disse que fosse a Virgem SSma. É a Igreja que deve julgar se é a Virgem SSma. ou outra pessoa. Ela me disse no meio do discurso, após estas palavras: as uvas apodrecerão e as nozes se estragarão..."

O Sr. Dausse achou que estava direito, então ele escreveu ligeiro. Quando parou, levantou-se e, deixando cair a folha de papel no chão, foi espiar lá fora pela janela. As testemunhas apanhando o papel, viram que não passava dum rascunho todo borrado. Obrigaram-no a recomeçar e desta vez ele escreveu muito direito.

Avisaram o bispo que veio e ordenou a Maximino colocasse o escrito no envelope e fechasse. Imediatamente foi lacrado com Selo episcopal. Nesse mesmo dia foram ao convento de Corenc, perto de Grenoble, buscar Melânia que, vendo chegada a hora de escrever seu segredo, pôs--se a chorar e recusou ir.

Levaram o resto do dia e parte da noite para fazer-lhe compreender o seu dever finalmente ela prometeu obedecer.

No dia 3 de julho, numa das salas da casa do capelão, em presença deste, Pe. Gerente e do Sr. Dausse, escreveu pausadamente, sem precipitação nem lentidão como quem não precisava pensar para achar as ideias e exprimi-las. Terminado que foi o escrito, ela assinou, colocou no envelope que fechou, com este endereço: "A Sua Santidade Pio IX".

Horas depois andava preocupada, tristonha e de repente pediu para falar com o Pe. Rousselot. “Era, disse, para colocar duas datas no seu lugar certo". No convento das Religiosas da Providencia, em Grenoble, dia 6 de julho, na presença do Secretário da bispado, Pe. Auvergne, e da Superiora do Convento, ela escreveu de novo o segredo, perguntou pela ortografia, de ''Antéchrist' e a significação de "infalliblement". Assinou e fechou: as testemunhas assinaram no envelope, atestando que o escrito era mesmo de Melânia.

96) Rousselot - Un Nouveau Santuaire, p. 65. Bibliografia 21.

(97) Rousselot, Un nouveau Santuaire, pág. 85, Bibliografia 21.

(98) Echo de la Sainte Montagne 256. Bibliografia 30.

 

§3o - Os Segredos em Roma

De posse dos Segredos, o bispo de Grenoble encarregou os Padres Rousselot e Gérin de levá-los a Roma, sendo também portadores da carta seguinte.

“Santíssimo Padre.

Vossa Beatitude vê dois bons sacerdotes prostrados aos seus pés para receber a sua bênção apostólica e me transmitir o que Vossa Santidade houvesse por bem mandar ao bispo de Grenoble e seus caros diocesanos.

Um é o Pe. Rousselot, há uns 40 anos professor de teologia do meu seminário maior e vigário geral honorário, autor de várias obras estimadas; outro é o Pe. Gérin, pároco de minha catedral, que já fez a viagem à Cidade eterna. Eu os enviei para esclarecimentos com Vossa Santidade sobre o Acontecimento de La Salette e depositar em suas mãos benditas o escrito que contém os segredos confiados na montanha da Aparição, um a Maximino Giraud, outro a Melânia Mathieu, pela Senhora que a eles se mostrou com proibição de os revelar a quem quer que fosse.

As crianças resistiram obstinadamente ao pedido que lhes fizeram de descobrir o seu segredo milhares de romeiros de toda categoria e de toda condição.

Mas elas compreenderam que havia, de direito, uma exceção para o Chefe supremo da Igreja,. uma vez que este manifestava vontade de conhecê-lo.

Meus dois enviados estão encarregados de me relatar o que Vossa Santidade houver por bem de pronunciar sobre o fato da Aparição da Virgem SSma.. No caso de resposta favorável, o Santíssimo Padre se dignaria consentir que o bispo de Grenoble declare, por Carta Pastoral, que julga que essa Aparição encerra em si todas as caraterísticas da verdade e que os fiéis estão fundamentados a crê-la verídica? Sua Beatitude haveria por bem de acolher nossos votos, abrindo os tesouros da Igreja, de que possui as chaves, em favor das pessoas que visitassem com piedade a Santa Montanha e também daquelas que, depois de confessadas tiverem a felicidade de comungar na capela? Seja qual for o parecer de Sua Beatitude, curvar-me-ia docilmente, perante a sua resolução: "Roma locuta est, causa finita est".

Tenho a honra de ser, com o mais profundo respeito" e prostrado a vossos pés, Santíssimo Padre, de Vossa Santidade o humílimo, obedientíssimo e devotado servidor e filho.

Felisberto, bispo de Grenoble".

Enquanto os PP. Rousselot e Gérin estavam em Roma, o Cardeal Arcebispo de Lião, de Bonald, passando pelo grande Convento dos Cartuxos, chegava a Grenoble e ia logo ao bispado, no dia 12 de Julho. Depois de homenageado pelo clero, compareceram Maximino e Melânia que responderam como de costume às suas perguntas. Quando, porém, ele abordou o assunto dos segredos, as crianças silenciaram. Quando, insistindo fez saber que ele falava em nome do Papa, e fez notar a sua dignidade, eles responderam que o Santo Padre já recebera os segredos, portanto não havia necessidade alguma de contá-los outra vez.

De fato, a 18 de julho de 1851, os delegados recomen­dados pelo bispo de Grenoble, entraram no Vaticano sendo recebidos em audiência por Pio IX.

Aqui deixamos a palavra ao Pe. Rousselot, um dos delegados, cujo relatório possuímos, por escrito.

"Sua Santidade, escreveu ele, abriu em nossa presença as três cartas, leu-as e começando pela de Maximino, disse: "Aqui está a candura e a simplicidade duma criança.” Respondemos: "Essas crianças são pequenos montanheses que só recentemente entraram em casa de educação" (99).

Para melhor ler as duas cartas, Sua Santidade levantou-se e aproximou-se duma janela e nós o acompanhamos. Após a leitura da carta de Melânia, Sua Santidade disse: "Tenho de ler essas cartas em hora de calma". Durante a leitura desta última, certa emoção manifestou--se no rosto do Santo Padre; seus lábios se contraíram e suas faces como que cresceram. Acabada que foi a leitura, o Santo Padre nos disse: "São flagelos que ameaçam a França, não é só ela culpada: a Alemanha, a Itália e toda a Europa é culpada e merece castigos. Tenho menos que recear da impiedade aberta, do que do indiferentismo e do respeito humano. Não é sem motivo que a Igreja é chamada de militante, e aqui lhe tendes o capitão (e colocou a mão no peito). Dirigindo-se ao P. Rousselot: Mandei examinar o seu livro pelo promotor da fé, Mons. Frattini; ele me disse que está satisfeito, que esse livro é bom e repassado de verdade'' (100).

Mais tarde, o mesmo Pio IX disse ao R. P. Giraud, superior geral dos Missionários de N. S. de La Salette, que lhe perguntava numa audiência privada, “se havia possibilidade de saber algo dos segredos de La Salette".

- Ah! Quereis conhecer os segredos de La Salette?

Pois bem! Eis aqui os segredos de La Salette: "se não fizerdes penitência, todos haveis de perecer".

Nada mais sabemos de modo autêntico e certo a respeito dos segredos de La Salette. A Santa Sé até a presente data não julgou oportuno divulgá-los, portanto, a ninguém assiste o direito de apresentar um escrito qualquer como sendo um autêntico segredo de La Salette.

Brevemente trataremos do pretendido segredo, publicado, dizem, pela própria Melânia.

(99) P. Carlier: Histoire de l'Apparition de la Salette, p.147 e seg. Bibliografia 66.

(100) P. Bertrand - La Salette - pág. 257.

 

§ 4o - A Santa Sé reprime os abusos a respeito dos Segredos. Decreto do Sto. Oficio.

Devido a frequentes abusos, a Santa Sé reagiu com energia. A Congregação do "Index" inscreveu duas obras que continham e comentavam o suposto segredo de Melânia no catálogo dos livros proibidos. Em 7 de Junho do 1901 condenava "Le Grand Coup avec sa date probable, étudo sur le secret de La Salette" (101), 1894; e no dia 12 do abrll da 1907: "Le Secret de Melanie, bergére de La Salette et la Crise actuelle" (102) 1906, ambos escritos pelo Pe, Combe. Tendo alguns editores tido a ousadia de publicar novamente esse segredo divulgado em 1904, a pretexto de slmples reedição ''ne varieter " (não variar mais) e com “Imprimatur" (103) (licença de imprimir) do mestre dos Sacros Palácios em Roma, P. Lepidi, a Congregação do Santo Ofício baixou, no dia 21 de Dezembro de 1915, um decreto da maior importância, transmitido no dia seguinte ao bispo de Grenoble.

Ei-lo: "Chegou ao conhecimento desta Suprema Congregação que há pessoas, mesmo do clero que, apesar das respostas e decisões desta própria Sagrada Congregação, continuam por meio de livros, brochuras e artigos publicados em revistas periódicas, sejam assinados, sejam anônimos, a tratar e discutir a questão, chamada de "Segredos de La Salette", dos diversos textos e suas adaptações aos tempos presentes ou aos tempos vindouros e isso não tão somente sem autorização dos Ordinários, mas até contra sua proibição. Para que esses abusos, que prejudicam a verdadeira piedade e atingem gravemente a autoridade eclesiástica, sejam reprimidos, esta mesma Congregação ordena a todos os fiéis, seja qual for o seu país, se abstenham de tratar ou discutir o assunto em foco, seja qual for o pretexto e seja qual for o modo - livros, brochuras ou artigos assinados ou anônimos ou de qualquer outra maneira. Aqueles que venham a transgredir esta ordem. do Santo Ofício sejam privados, sendo sacerdotes, de toda a dignidade que porventura tenham, e ficarão de ordem do Ordinário, suspensos, quer de ouvir confissões, quer de celebrar missa, e sendo leigos, não sejam admitidos aos Sacramentos, enquanto não se emendarem. Além disso, que tanto estes como aqueles se sujeitem às sanções decretadas, quer por Leão XIII na Constituição "Officiorum ac munerum" contra os que publicam, sem autorização dos seus Superiores, livros que tratam de coisas religiosas; quer por Urbano VIII no seu decreto "Sanctissimus Dominus Noster", baixado a 13 de março de 1625, contra os que difundem publicamente, sem autorização do Ordinário o que for apresentado como sendo revelações.

Este decreto, porém, em nada é contrário à devoção para com a Virgem Santa, invocada sob o titulo de "Reconciliadora de La Salette". Dado em Roma, no Palácio do Santo Ofício, a 21 de Dezembro de 1915".

Esse decreto foi publicado no Jornal Oficial da Santa: Sé "Acta Apostolice Sedis" - Vol. VII, pág. 594.

(101) O Grande Golpe com sua data provável, estudo sobre o segredo de La Salette.

(102) O Segredo de Melânia, pastora de La Salette e a crise atual.

(103) notemos que o "Imprimatur" ou licença de imprimir não quer dizer que quem dá essa· licença admite as ideias do autor, mas que não ha nada contra a fé e a moral.

 

§ 5o - Utilidade dos segredos

Alguns talvez pensam que ficando ignorados os segredos de nada adianta que N. Senhora os tenha confiado aos videntes. Pelo que acabamos de expor não é fora de prudência, dizer que os segredos eram exclusivamente destinados ao Chefe da Igreja.

Para corroborar essa nossa ponderação, aqui transcrevemos o testemunho seguinte: "Em 1860, narra o Padre Rousselot, um Religioso da Companhia de Jesus perguntava ao Santo Padre se era verdade que ele não tinha dado nenhuma importância aos segredos que lhe tinham levado os enviados do bispo de Grenoble. Pio IX respondeu: "Ainda bem que fomos avisados; do contrário ter-nos-íamos encontrado numa posição embaraçosa, donde não poderíamos sair" (104).

A respeito igualmente dos Segredos foi aduzido em 1859 pelo Pe. Doyen, no seu "Manual da devoção a N. Sra. Reconciliadora" - pág. 9 em nota, (ver Jornal de Muret, dezembro de 1862, pág. 426). Falando certo dia, desse Segredo (de La Salette) à pessoa que eu poderia nomear, Sua Santidade disse: Consideramo-nos bem felizes por se ter Deus dignado de nos fazer conhecer tais coisas". Quem seria essa pessoa, confidente de Pio IX?

No 3o opúsculo (Os últimos ataques) sobre os Segredos de La Salette, publicado pelo sr. Giraud, em 1873 encontra-se esta ponderação - pág. 82: "O Sr. Pe. Barthe, cônego de Rodez, afirma que Pio IX lhe declarou que lhe fora útil ter conhecido o conteúdo (dos segredos) nas circunstâncias dolorosas que a Igreja atravessa".

No mês de outubro de 1870 passava por Bordéus, indo ao Brasil, D. Sebastião, bispo do Rio Grande do Sul Este venerando Prelado voltava do Concílio do Vaticano. Na sua audiência de despedida, o Papa lhe disse : "A profecia de La Salette está começando a cumprir-se"." é o que se lê numa carta do Pe. Biard, de 5 de Janeiro de 1872, citado por Girard.

Esses dados acima, encontram-se na página 432, nota, do II vol. do Livro “Miracles de La Salette" por D. Giray.

O prezado leitor notou, por certo, a última frase do decreto do Santo Ofício: “Em nada contrário à devoção para com a Virgem Santíssima invocada sob o título de Reconciliadora de La Salette". Lembremos, de fato, que muitos lamentos. muitas admoestações e muitos maternais conselhos encontram-se na mensagem de Maria SSma. em La Salette. Aproveitemos, pois, o que a Mãe do Céu nos falou e não imitemos essas pessoas movidas pela curiosidade e os católicos de espírito apocalítico ou também irrequieto, que, pondo inteiramente de lado esses ensinamentos a recordarem-lhes as suas principais obrigações religiosas a necessidade premente de converter-se e fazer penitência, ficam totalmente hipnotizados pelo incógnito dos Segredos.

(104) Temoignage de Rousselot, 30 de Julho de 1851 citado em “Auguste Marceau, capitaine de Frégate - 2a édition, volum. II, pág. 430. Bibliog. 54, e Mermier – Mois de Setembre, 2a édition, 1869, - pág. 215 (mês de setembro, 2a edição, 1869 – pág. 215) citado por P. Hostachy: Histoire Séculaire de La Salette – pág. 177. Bibliografia 71.

 

CAPITULO DÉCIMO

SANTOS QUE FORAM DEVOTOS DE N. S. DE LA SALETTE

§ 1o- São João Maria Vianney e La Salette Foi precisamente, com perdão da palavra, o prurido profético e também desta vez por motivo de politica - essa política que o Padre Vieira dizia poder trocar de lugar com o diabo sem inconveniência, - que ocasionou o rumoroso caso acontecido na história da Aparição de N. Sra. de La Salette, denominado "Incidente de Ars'".

Uns fanáticos, partidários dum certo Richemond, que se declarava pretendente ao trono da França, se auto sugestionaram, a ponto de querer que os segredos de La Salette se referissem ao tal senhor. Para ter ocasião de conhecer o segredo, de tal jeito maquinaram o seu projeto, que conseguiram do tutor de Maximino, então de 15 anos de idade, com autorização do Juiz de Menores, licença de oito dias para levar o vidente junto com sua irmã Angélica, ao santo Cura de Ars sob pretexto de consultar sobre a sua vocação.

Lá em Ars, em lugar de consultar sobre sua vocação, Maximino teria desmentido a respeito da Aparição de La Salette, na sua entrevista com o santo Cura. Esse suposto desmentido constitui o “Incidente de Ars" (105).

A documentação que possuímos sobre o caso constitui verdadeira floresta, cortada. por inúmeros caminhos. Para não cansar o leitor numa viagem por todos esses caminhos, vamos limitar--nos aos seguintes fatos (106).

"Era a noite de terça-feira de 24 de setembro de 1850; o cocheiro da diligência de Ars desembarcou os seus passageiros na escadaria da igreja. Um grupo de 5 pessoas, três homens: Brayer, Verrier, Thibanat e um rapaz de 15 anos que era Maximino, e sua irmã Angélica, foram em busca do Padre Vianney, Como ele se encontrasse no confessionário, apresentou-se o coadjutor, Pe. Raymond, que não acreditava no fato de La Salette.

Ele subira aquela montanha num dia em que Maximino foi também. O menino negou-se a responder-lhe a certas perguntas e o P. Raymond, de temperamento belicoso, guardou contra ele forte animosidade. Esse simples fato bastou para. indispô-lo contra tudo mais, isto é, contra a própria Aparição.

“Convidei-os, escreve o P. Raymond, a passar alguns momentos na Providência (107) e perguntei-lhes pelo objetivo da viagem. Responderam que Maximino desejava consultar o P. Vianney sobre a sua vocação.

- "Pois bem! terá amanhã essa oportunidade!" Um dos viajantes perguntou-me: - V. Revma. e o Sr. Cura, que pensam a respeito de La Salette? . Respondi que não tinha juízo formado sobre esse particular e fiz notar que em alguns pontos não se havia guardado a reserva, nem toda a prudência que a Igreja exige. - "Como não crer, me replicaram, nessas crianças que não podem inventar o que narram?"

A conversa sabre este assunto tomou um tom áspero. O Pe. Raymond aduziu um suposto fato ocorrido havia 40 anos antes e que há poucos dias viera a saber: Três medidas entraram de acordo para impingir às suas famílias e ao povo a crença numa aparição da Virgem Santíssima. E só com a idade de 50 anos que uma das pretensas videntes confessou sua mentira (108).

E por sua vez, acrescentou o coadjutor do P. Vianney, encarando o pequeno Maximino: "Eu te recebo aqui e tu lá não quiseste falar. Mas aqui "vai haver te com um santo e aos santos se engana” (109). Maximino já cansado com a viagem e importunado com os propósitos daqueles desconhecidos, vexado pelas palavras ásperas e ofensivas do P. Raymond, deu a resposta que lhe era habitual, quando alguém falava com ar de pôr em dúvida sua veracidade: "Diga, se lhe apraz, que eu minto, que eu não vi nada!" "Da minha parte, diz P. Raymond, preveni o P. Vianney do que acabava de passar. Ele me agradeceu com benevolência. As 8 horas da manha seguinte falou a sós com Maximino na sacristia. Que tal foi essa entrevista? O senhor Cura não disse palavra. Somente observamos, o irmão Jerônimo e eu, que, dali em diante não quis mais benzer medalhas de La Salette". Até aqui o Pe. Raymond.
As crianças de La Salette mentem como aquelas três meninas.” Carta de Verrier ao P. Rousselot, Setembro de 1853. Este Verrier acompanhava Maximino na sua viagem; portanto ouviu estas palavras.

Nessa mesma ocasião, esse Padre disse a Maximino: "'Entrando eu de repente na sala de jantar do Pe. Mélin, vigário de Corps, ele ficou surpreendido e colocou rapidamente o guardanapo em cima da comida, carne com certeza, embora fosse sexta-feira. para eu Dão ver''. - "'Isso não, - respondeu Maximino. - conheço os hábitos do Pe. Mélin; ele costuma escrever as suas cartas até durante as refeições e quando chega uma pessoa estranha. ele cobre tudo para que ninguém veja o que está escrevendo e assim pode atender imediatamente". (Em Champon - Recits de Maximin, citado pelo P. Hostachy. M.S. no seu livro: Les Cures de La Salette, pág. 122). Bibliog. 71 .

O santo desde o principio acreditou na Aparição de N. Sra. de La Salette. Ele mesmo escreveu ao bispo de Grenoble: "Excia. Tinha grande confiança em N. Sra. de Salette, benzi e distribui uma grande quantidade de medalhas representando esse fato; distribui pedaços de pedra na qual a Virgem SSma. se teria sentado, mandei colocar um pedaço em relicário. Falei frequentemente desse fato na igreja. Acredito, Excia., que há poucos padres na sua diocese que tenham feito tanto como eu em favor de La Salette. Escusado é, que eu repita a V. Excia. o que eu disse a esses Senhores (os padres Rousselot e Melin em novembro de 1850).

Tendo--me o pequeno dito que não viu a Virgem Santíssima, senti-me mal uns dois dias. Aliás, Excia., a chaga não é tão grande assim; e se esse fato é obra de Deus, o homem não há de destruí-lo. João Maria Vianney - Cura de Ars". - É que Maximino lhe tinha escrito o seguinte: - Sr. Cura: - Acabais de dizer ao sr. Cônego Rousselot e ao Sr. Cura de Corps que vos confessei não ter visto nada e ter mentido contando a minha bem conhecida narrativa e ter prosseguido três anos nessa mentira por causa das boas consequências;

Acrescentastes, Sr. Cura, que tendo-me pedido autorização de comunicar essa confissão ao Sr. Bispo de Balley (bispo do Pe. Vianney) e o meu endereço para poder-me escrever sendo necessário, eu lhe dei essa autorização e ia dar esse endereço, e logo depois, recusei tanto este como aquela. Esse relatório que fez o Sr. Rousselot, prova que eu não soube fazer-me compreender por vós, Sr. Cura; e, permiti que vo-lo diga, com toda sinceridade: houve mal-entendido completo de vossa parte. Eu não quis dizer-vos, Sr. Cura, e não disse seriamente a ninguém não ter visto nada, nem ter mentido fazendo a minha narrativa, nem ter persistido três anos nessa mentira vendo as consequências. Eu vos disse unicamente, Sr. Cura, saindo da sacristia, na porta, que eu vi alguma coisa e que não sabia se era a Virgem Santíssima ou outra senhora. Nesse momento caminháveis pelo meio do povo e nossa conversa cessou.

"Pouco depois mandaram-me de novo falar-vos se eu devia voltar para a minha diocese ou ficar em Lião. Tornastes a dizer-me que eu devia voltar para a minha diocese e acrescentastes umas palavras que eu não pude compreender. Eu não vos ouvi absolutamente falar do bispo de Belley, nem me pedir o meu endereço; e tenho certeza de não vos ter dado esse endereço, nem pedi que se escrevesse ao bispo de Belley. Faço e escrevo esta declaração com toda a minha alma e em consciência, e consinto em ser expulso do seminário menor, onde me acho muito satisfeito, até mesmo sofrer tudo, se esta declaração é de qualquer modo oposta à verdade.

Grenoble, 21 de novembro de 1850.

Maximino Giraud."

- Antes dessa carta Maximino já tinha negado qualquer desmentido seu, por declaração escrita em 2 de novembro de 1850, em vários interroga­tórios, por exemplo no seguinte, expressivo, espontâneo . O Cônego Henrique de Grenoble, encontrando casualmente a Maximino disse-lhe: Ah! meu menino, sempre gostei muito de você, mas agora gosto mais ainda.

- Porque, sr. Cônego!

- É que você já é um menino muito bonzinho. Antes você era um pequeno mentiroso, mas hoje você acaba de confessar a sua mentira em Ars, hoje você é um garoto muito sincero, muito franco.

- Mas senhor cônego, eu não me desmenti.

- Já sabemos, meu filho, o que pensar. La Salette não é mais nada. Bonzinho como é você, confessou.

Agora não há mais segredo.

- Mas sr. cônego, eu não me desmenti.

- Pois nós sabemos o contrário, você desmentiu tudo; por isso é que agora gosto tanto de você.

- Mas, senhor cônego, está caçoando de mim.

- Não, meu amigo, não estou caçoando.

- Sr. cônego, estão agora caçoando de La Salette, mas é como a flor que no inverno cobrem de estrume e lama e que, na primavera ou no verão, surge da terra mais bela (110).

Em La Salette há outro responsável, Melânia. O P. Gérin, sem preveni-la vai interrogá-la: - "Então Melânia, disse-lhe à queima roupa, há quatro anos que nos enganais! Maximino acaba de confessar ao cura d e Ars que nada viram na montanha.

- Oh! que infeliz! Eu porém, sempre direi que vi alguma coisa.

- Que quer dizer com isso?

- Quero dizer que vi uma "Bela Senhora" que falou e desapareceu.

- E que vos disse tudo que há na vossa narrativa há quatro anos? - Sim, senhor."

Apesar da carta de Maximino, o Cura de Ars ficou na sua atitude, conforme se vê no seu escrito ao bispo de Grenoble. A sua descrença não durou muito, mas conservou dúvida ou sofreu tentação de dúvida, com surtos, de crença firme.

Um capuchinho, P. Bruno, pelos fins de 1850, in­terrogou o Cura de Ars a respeito de La Salette e do desmentido. Ele respondeu: "Por muito dinheiro eu não queria que esse menino tivesse vindo aqui". No dia seguinte, porém, a sós, o capuchinho voltou ao assunto e com surpresa ouve o Cura dizer: "Eu sempre acreditei em La Salette e ainda creio. Benzi medalhas e santinhos de N. Sra. de La Salette, distribuindo-as em profusão. Isso escrevi ao bispo de Grenoble. Vede se eu acredito". Dizendo isso, ele correu as cortinas do seu leito e mostrou ao Padre Bruno uma grande estampa de N. Sra. de La Salette pendurada na cabeceira" (111).

O certo é que o santo Cura andou torturado por dúvidas durante oito anos, cessando finalmente a provação. Em outubro de 1858, plenamente voltou ao seu primeiro sentir, isto é, a crer em La Salette. Eis aqui, diz o Pe. Toccanier (companheiro, em Ars, do Pe. Vianney), como ele contou a historia desse retorno: "Fazia uns quinze dias que padecia uma grande inquietação interior. Minha alma andava como que arrastada sobre areia. Fiz então um ato de fé na Aparição, em seguida restabeleceu-se a calma no meu espírito. Desejei então ver um sacerdote de Grenoble para manifestar-lhe o que eu tinha padecido. No dia seguinte chegou daquela cidade um distinto eclesiástico (112). Entrando na sacristia, perguntou-me que havia de pensar sobre La Salette. Eu. lhe respondi: "Pode crer".Faltava-me a quantia necessária, continua o Pe. Vianney, para completar a fundação duma missão. Encomendei-me à Virgem de La Salette, e encontrei numa gaveta, exatamente o dinheiro de que necessitava. Considero esse fato como milagroso". Desde então voltou a benzer medalhas e imagem de N. Sra. de La Salette, animando os seus penitentes a ir em romaria à Santa Montanha.

O Pe. Descostes, em 7 de Junho de 1864, num interrogatório por ocasião do processo de canonização, relatou: "O P. Vianney disse: Desde muito tempo andava atormentado a respeito de La Salette. Uma noite acabei exclamando: Meu Deus, eu creio. No entanto, quisera que me désseis algum sinal, alguma prova. Imediatamente gozei grande paz de alma; estava eu sofrendo muito interiormente, desde vários dias: roguei a Virgem Santíssima me livrasse desse sofrimento como prova da verdade da Aparição, prometendo nela crer, e logo cessou o meu sofrimento. Aconteceu também que, certo dia, chegou um sacerdote, alto como o senhor que sem me cumprimentar, perguntou: “Sr. Cura, que pensais de La Salette? Respondi: Eu acho que se pode e que se deve crer na Aparição. Virou-me as costas, e se foi sem nada mais dizer". (113).

O Cônego Oronte de Seignemartin, pároco da catedral de Belley, antigo cura de Saint-Friver (localidade perto de Ars) contava em 1878 o seguinte:

"Achava-me numa reunião de sacerdotes, quando chegou o Cura de Ars. Perguntei-lhe o que pensava sobre a Aparição e ele me respondeu em tom um tanto grave: "Creio firmemente''.

Nos fins de 1858, conta Madalena Mandy Seipiot, minha mãe estava enferma. Pedi licença ao Sr. Cura para fazer uma promessa à Virgem de La Salette. Respondeu-me que não era necessário, que fizesse mesmo a N. Sra. de Fourviére: "Mas quanto a La Salette, pode crer: eu creio de todo o coração". (114).Aqui há quem estabeleça o seguinte dilema: (115):
"Ou Maximino mentiu quando narrava o acontecimento de La Salette ou mentiu quando falava com o santo Cura d'Ars, sobre o mesmo acontecimento. Logo é mentiroso de qualquer maneira sobre o mesmo fato, portanto não era merecedor de crédito".

Ponderemos antes de tudo, que o santo Cura d'Ars tornou, é certíssimo. a crer "firmemente, de todo o coração" na Aparição de N. Sra. de La Salette. Ora se esse santo, de tão escrupulosa pureza de consciência, tivesse tido sempre completa certeza do desmentido de Maximino, nunca poderia, mesmo a custo da. própria vida acreditar na realidade da Aparição de N. Sra. de La Salette, e declarar a sua crença aos outros, pelo simples motivo de que cometeria pecado grave. Por, isso no processo de canonização muito se insistiu sobre essa questão.

Feita essa importante ponderação, entre as pontas do dilema acima, facilmente introduzimos: Ou Maximino quis experimentar o dom de intuição do Cura de Ars, ou também, foi um simples mal-entendido entre ele e o Santo Cura de Ars, ou ainda as duas coisas, sendo uma na primeira entrevista, outra na segunda entrevista de Maximino com o santo Cura. A própria carta de Maximino parece sugerir essas explicações, embora não de modo explicito.

Na chegada a Ars, como vimos, o Pe. Raymond, depois de tratar Maximino como um mentiroso, preveniu: "'mas aqui vais haver-te com um santo e aos santos não se engana.” Provocado por essa espécie de repto, já aborrecido, Maximino, talvez falasse de si para consigo: Vou ver se realmente o Cura d'Ars vai desmascarar a minha mentira. - Na primeira entrevista na sacristia com toda imprudência que os seus 15 anos e seu gênio irrefletido, explicam, teria declarado não ter visto absolutamente nada.

Por isso, na sua carta Maximino afirma: "Eu não quis dizer-vos e não disse seriamente a ninguém, não ter visto nada".

Ora, escreve o Cônego Trochu, pág. 347 e 348: "Cura d'Ars, a quem nem sempre assistia o dom da intuição, pensou que o menino se retratava de suas afirmações a respeito da Aparição".

O próprio Cura d'Ars· declarou a esse respeito: "Tenho remorsos... receio ter feito algo contra a Santíssima Virgem. Oxalá Deus me ilumine sobre esse ponto. Orei muito para conseguí-lo. Se o fato fosse verdadeiro então falaria nela e se não fosse estaria tudo acabado" (116). Deus ·porém nem sempre ilumina os próprios santos sobre todos os fatos.

O Santo Cura admitiu que talvez Maximino tivesse feito essa traquinada com ele. "Aliás, disse, o pequeno bem pode ter querido caçoar de mim, como já havia caçoado do Sr. Coadjutor" (117). Desse modo o incidente de Ars, não passaria duma lamentável travessura.Melhor será dizer que houve mal-entendido entre Maximino e o Cura d'Ars, como claramente afirma o vidente em sua carta: ''Não soube fazer-me compreender por vós… o que houve mal entendido de vossa parte”.

Notemos um pormenor que parece uma contradição. Lemos no livro do Cônego Trochu, pág. 347: "Pela manhã do dia 26 de setembro, o Pe. Raymond encontrou sobre a cômoda da sacristia um envelope com o endereço de D. Bruillard, escrito pelo P. Vianney: ''Que é isto?" - perguntou o Coadjutor com a sua habitual indelicadeza. "Queria dar uma carta a Maximino, respondeu o Santo, para que a entregasse ao Bispo de Grenoble. O menino negou-se a isso", e acrescentou amuado: "Eu fiquei descontente com ele e ele comigo".

Ora, na sua carta, Maximino· declara que o P. Rousselot lhe disse que o Cura d'Ars pediu-lhe autorização para escrever ao bispo de Belley. Haveria ali algo do mal-entendido?

Sabemos que Maximino sempre narrava: ''Eu Vi uma Bela Senhora", nunca "eu vi a Virgem Santíssima". No começo da própria carta do segredo, recordará o leitor, que o menino escreveu ao Papa: "Eu vi uma Senhora luminosa. como o sol, que acredito ser a Virgem Santíssima, mas eu nunca disse que foi a Virgem Santíssima". A carta do segredo é posterior ao "incidente d"Ars". Pois bem, na sua carta ao Cura d'Ars, Maximino frisou: "Eu vos disse Eu vos disse unicamente senhor Cura, saindo da sacristia e na porta, que eu vi alguma coisa e que não sabia se era a Virgem Santíssima ou uma outra Senhora. Nesse momento caminháveis pelo meio do povo e nossa conversa cessou".

Devido a se achar no meio do povo, talvez, o Cura d.'Ars só ouviu que não se tratava da SSma. Virgem cuidou compreender que Maximino se desmentia a respeito da Aparição, e por parte do menino era mais um esclarecimento do que tinha falado na sacristia, onde a entrevista, conforme o Pe. Monnin (118) teria come­çado assim: "Então foi você que viu a Virgem Ssma.?"

- "Eu não disse que vi a Virgem Santíssima, mas uma "Bela Senhora".O mal-entendido prosseguiria até o fim (119).

Finalmente Maximino, após ter iludido voluntariamente o Cura d'Ars, para lhe experimentar o dom da intuição, refletindo, quis, na hora da saída, explicar-lhe francamente: era tarde demais, pois, o santo. já longe, não ouviu tudo.

Assim, experimentação irrefletida por parte de Maximino e mal-entendido (120) entre ele e o Cura d'Ars. forneceriam a explicação do “Incidente d'Ars".

Todos esses acontecimentos, isto é, as entrevistas de Maximino e do Cura d'Ars, deram-se antes do julgamento doutrinal do bispo de Grenoble. Este remeteu todos os documentos ao bispo do Santo D. Devie, que tende-os recebido por ocasião da sagração episcopal do seu Coadjutor, consultou-se com os seus três colegas e comunicou ao bispo de Grenoble: Consideramos como certo, que as crianças não entraram em acordo para enganar o povo e, que de fato, viram uma pessoa que lhes falou.. Será a Virgem Santíssima? tudo inclina a crê-lo mas isso só pode ser verificado por milagres diversos da Aparição".

Encerramos este estudo, com um solene testemunho, do bispo Mons. Langalerie que pregando no próprio Santuário na santa Montanha, exclamou: "Amados romeiros, eu vim aqui para trazer o testemunho a favor da aparição da Virgem Santíssima, nesta montanha, o testemunho daquele que gostamos de chamar, aguardando o julgamento da Igreja, o santo Cura D’Ars.Fui o seu bispo e seu amigo, ele morreu nos meus braços; ele me disse que acreditava na Aparição de La Salette. Está me ouvindo do alto do céu, não há de me desmentir" (121). O "Incidente de Ars" confirma portanto a realidade da Aparição de Maria Santíssima no monte de La Salette.

São João Batista Maria Vianney, Cura d'Ars, vimos, tinha um quadro de N. Sra. de La Salette, na cabeceira da sua pobre cama; e, pela intercessão de N. Sra. de La Salette obteve graças e benefícios de Deus.

(105) Ao caso dá bastante importância um Articulista da revista "Razón y Fé” no numero de maio de 1949. pag. 462 e 463.

(106) A este estudo havemos de recorrer, quase que exclusivamente ao Cap. XIX, pag. 342 a 3SO do livro "O Cura de Ars” do ’Cônego Francis Trochu, traduzido no Seminário Central de São Leopoldo - Porto Alegre.

(107) Orfanato fundado pelo Santo Cura

(108) Notemos: 1o- quem são essas menínas? 2O- Quem é aquela que se desmentiu? Aonde se deu o fato? Que disse então a Virgem SSma.? - Nenhuma resposta a tão importantes perguntas. É ele só quem fala disse falo.

(109) O padre também exclamou: "Como é que Maximino veio consultar sobre sua vocação, si ele viu a Virgem SSma.?

(110) Rousselot - Un nouveau Santuaire. pág. 28. D. Dupanloup, bispo de Orleans, - declarou D. de Bruillard a 23 de Janeiro de 1852, - após ter interrogado a Maximino, escreveu-me que o pastorinho não se desmentiu. Esse interrogatório deu-se no Convento dos Cartuxos. a 10 de outubro de 1851. na presença do Superior do Convento, dum outro bispo, um padre e dois senhores. (Giray, I vol, pg. 130, Bibliografia 68).

(111) Carta do Pe, Bruno ao bispo de Grenoble, com data de 11 de agosto de 1861. Todos esses documentos encontram-se citados pelo P. Javen no seu livro: "'La Grace de La SaJette• ,Pág. 178-178 - Bibliografia 73.

(112) O Cônego Gérin cura da Catedral de Grenoble. Sua entrevista com o P. Vianney ocorreu a 11 de Outubro, Carta desse padre ao Bispo de Grenoble. D. Ginoullac de 13 de Outubro de1858.

(113) D. Giray - Les Miracles de La Salette. II vol. pg, 285. Bibliografia 88.

(114) No livro do Cônego Trochu. já assinalado, pág. 349, 350. Notamos que esse autor tira a sua documentação do processo oficial de canonização do santo Cura D'Ars.

(115) Articulista de "Razon y Fé''. número de Maio de 1949, pag. 462-463.

(116) Cap. Lant. do Processo Apostólico - pág. 123; em Tochu, pâg. 349.

(117) Gaetan Bernoville, La Salette, Paris, 1947 - pág. 145 - Bibliografia 75. Na mesma página lê-se: Maximino disse, em 8 de Novembro de 1850 ao Pe. Auvergne.. secretário do bispado: "Os santos bem mostram que são homens e que se enganam como os outros". Jauen, Pág. 179, dá a referência. Bibliografia 73.

(118) O Pe. Monnun escreveu a Vida do Cura d'Ars.

(119) A condessa de Gibeins declarou no Processo apostólico da canonização: '"Eu sei que depois da visita de Maximino ao Sr. Cura, este declarou que Maximino não tinha visto a Virgem SSma., mas uma "Bela Senhora". Girey - Les Miracles de La Salette, vol II, pág. 274; citado por Jauen, pág. 184, em "La Grace de La Salette".

(120) O Santo admitiu esse mal-entendido, escrevendo : '"Não nos compreendemos". Carta do Cura d'Ars ao Pe. Auvergne, 19 de setembro de 1857.

(121) Testemunho de Mélin, confirmado ao Pe. Millon, em1911, por Mons. Valansio, vigário geral que acompanhava Mons. E. Langalerie na romaria. Citado pelo Pe. Jauen p. 193 em "14 Grace de La Salette"', Bibliografia "13.

 

§ 2o - São João Bosco

Esse Santo muito popular foi verdadeiro devoto e propagador do culto de N. S. de La Salette. Para evitar delongas limitemo-nos a citar o seguinte:

"No ano de 1846, celebramos a festa de N. Sra. da Conceição. A alegria dessa festa foi aumentada pela notícia duma aparição da "Madona" na montanha de La Salette, na França. Essa Aparição tornou-se o tema preferido de Dom Bosco, que ele repetiu centenas de vezes, não somente para avivar no espírito dos seus jovens a ideia do sobrenatural, e a confiança em Maria Santíssima, mas sobretudo para lhes infundir o ódio aos três pecados que acendem. a cólera de Jesus Cristo e fazem recair sobre os homens terríveis castigos: a blasfêmia, a profanação dos dias santos e o esquecimento do jejum e da abstinência. Ele ligava tanta importância a esse fato, que contou o acontecimento milagroso em dois opúsculos impressos em anos diversos, alcançando a tiragem de 30.000 exemplares. É incalculável o bem espiritual que os jovens do Oratório experimentavam ouvindo narrativas desse padre, que lhes falava da "Madona'" como se a visse, tão grande era a vivacidade das suas palavras e dos seus sentimentos, nas descrições que dela fazia (122). A devoção a N. Sra. de La Salette, escreve um seu historiador, teve grande influência no espirito do santo e na fundação da sua sociedade'' (123).

(122) Nas memórias que o padre salesiano João Batista Lemoyne consagrou ano por ano, ao seu santo Fundador - citado por Hostachy - pag, 326-327 no livro "Histoire Seculaire de La Salette". Bibliografia 71.

(123) Lemoyne - Memorie bibliografiche di Don Giovanni Boseo, Vol IV, p. 5'76.

 

§ 3o - O Bem-aventurado Pe. Eymard

O Bem-aventurado Pe. Eymard (Pedro Julião Eymard) fundador da Congregação dos Padres do Ssmo. Sacramento e propagador da Adoração Perpétua, foi também um devoto de N. Sra. de La Salette.

Na época da Aparição, o P. Eymard residia em Lião. Foi o primeiro aí a saber do fato, por carta da sua irmã, que dava a narrativa pormenorizada da Aparição. A sua convicção foi rápida sobre a veracidade e natureza dessa manifestação celeste.

"Eu, respondeu à sua irmã, e nossos padres, acreditamos no fato, pois se o céu está irritado, não admira, porque o mal é grande! Os homens perdem a fé, as mulheres perdem a piedade, que constitui no entanto, toda a sua glória e toda a sua felicidade. A mocidade, envelhecida pelos seus vícios faz corar os anciãos".

O bem-aventurado ficou aguardando o julgamento da autoridade eclesiástica para subir ao lugar da Aparição. Quando o seu amigo, o Cônego Rousselot, lhe comunicou a carta pastoral do bispo de Grenoble, jubiloso respondeu em 21 de Julho de 1852: "É me impossível exprimir-lhe a alegria que me causou o recebimento da carta pastoral Venho testemunhar-lhe o meu profundo reconhecimento. A aprovação do fato sobrenatural de La Salette, provocou viva sensação aqui no sul. A carta pastoral tomou-se popular. La Salette será a grande peregrinação da França".

A 18 de Agasto de 1852, o Pe. Eymard galgava a Santa Montanha, onde encontrou os novos missionários, que o receberam no pobre casebre de madeira, aberto aos ventos e às chuvas, que constituía sua única habitação. Mas para o bem-aventurado tinha o valor de um palácio, e seu maior desejo era nele estabelecer sua residência. "Se eu não tivesse a felicidade de ser Marista, escreveu ele no livro do Tombo, viria pedir ao meu bispo, como o mais insigne favor, licença para me consagrar corpo e alma ao serviço de N. Sra. de La Salette. Fui o primeiro a proclamar em Lião o fato milagroso da Aparição e sinto-me feliz em beijar com amor e gratidão esta terra bendita, esta montanha da Salvação".

Antes do julgamento doutrinal, de modo privado, o fervoroso partidário da devoção a N. Sra. de La Salette, concitava as almas a recorrerem a Ela. E Maria Santíssima retribuía com graças peculiares a confiança do seu servidor. Assim foi que, dois anos depois da Aparição, já Ela se dignara ouvir a sua oração, conceden­do a uma das suas penitentes, então desenganada pelos médicos, em véspera de morrer, uma cura completa e repentina. (Trata-se da Senhorita Suillot, a esforçada colaboradora do Bem-aventurado).

"No dia 21 de Julho de 1868, o Bem-aventurado chegou em casa dos Missionários de N. Sra. de La Salette. em Grenoble, pelas 11 horas da manhã. Foi recebido pelo Pe. Archier, que, vendo-o tão fraco, tentou dissuadí-lo de celebrar a Missa. Ele fez questão". Eu quis, narrava o Pe. Archier, ajudar a missa que ele celebrou com muito custo, e quase que o recebi em meus braços, quando desceu do sagrado altar. "Dei-lhe um pouco de licor". Os missionários lhe ofereceram hospedagem que ele agradeceu. Seguiu penosamente para a sua vila natal, La Mure, onde poucos dias depois falecia santamente. Foi portanto na capela e com auxilio do superior dos Missionários de N. Sra. de La Salette que o Bem-aventurado celebrou a sua ultima missa (124).

(124) Le bienheureus Pierre-Julien Eymard, par un Religieux du Saint Sacrament. Vol. I, pag. 379 et vil, pag. 539.

 

§ 4o – Algumas santas

Santa Maria Emilia Rodat, foi canonizada pelo Santo Padre Pio XII, a 23 de Abril de 1950. Nasceu a 6 de Setembro de 1787 e faleceu a 19 de Setembro de 1852. Neste último dia, declara o Papa "será celebrada a sua festa". Era devotíssima de N. Sra. de La Salette, que ela invocava frequentemente nos últimos instantes da sua vida. O R. P. Silvano Giraud, M.S., no seu livro "O Espírito e a Vida de Sacrifício no Estado Religioso" (125) fala com piedoso entusiasmo dos exemplos de virtudes que essa grande santa deu, com heroísmo, aos religiosos e religiosas. E escreve: “Quando a grande noticia da Aparição de La Salette chegou-lhe aos ouvidos lá na solidão da casa Matriz do Instituto das Religiosas da Sagrada Família, de que era fundadora, ela logo compreendeu, com alma profundamente emocionada, quantas maravilhas se encerram nessa visita miraculosa de Maria SSma. aos homens, nessa mensagem tão prodigiosa. No jardim do convento havia uma estatua da SSma. Virgem com o título "N. Sra. do Socorro"; no ultimo ano da sua vida quis a Santa Superiora que esse título fosse mudado no de N. Sra. de La Salette. Diariamente ela ia fazer oração perante essa estatua, em união, dizia ela, com os numerosos romeiros que sobem a Montanha Santa". Frequentemente mandava as Irmãs rezar pela mesma intenção recomendando-lhes de não se cansarem em fazer, mentalmente, a santa romaria.

Finalmente, dois dias antes de morrer, dizia: "Fiquei muito consolada pensando nos pastores de La Salette. A Virgem SSma. chorava quando lhes apareceu.

Eu porém tenho confiança, quando for vê-la, que a encontrarei toda jubilosa". Notou-se que ela faleceu no mesmo dia e na mesma hora da Aparição, como que em recompensa da sua fé e piedade para com esse milagroso acontecimento" (126).

Santa Maria de Santa Eufrasia Pelletier, Fundado­ra do Bom Pastor de Angers - Devotadíssima ao culto da Virgem chorando, continuadamente difundia em torno dela essa sua devoção. Por ocasião das bodas de ouro da sua vida religiosa, em setembro de 1867, mandou erigir no seu convento um monumento a Nossa Senhora de La Salette.

Santa Sofia-Madalena Barat, pelo ano de 1800 teve por seu diretor espiritual em Paris, o Pe. Felisberto de Bruillard , que a Providência levaria, em 1826, ao trono episcopal de Grenoble e que seria o bispo da Aparição.

Em 1846 a :Madre Barat tinha 67 anos. Devia morrer em 1865. Ficou, sem demora, convencida firmemente da verdade da Aparição e facilmente comunicou a sua convicção às suas filhas. Em 13 de setembro de 1846 estabeleceu uma casa da sua Congregação perto de Grenoble. Nessa casa foi levantado o primeiro monumento em honra de N. Sra. de La Salette, após a capela da santa Montanha" - (A. Garnier, livro citado pag. 8 2, 82).

(125) 1o vol., pag. 0 e seguintes.

(126) Cônego A Garnier: L'expansion de La Salette dans le monde; 1946; pag. 87. Bibliografia '76-88, citando P. Barthe- Esprit de la mére Emilie de Rodat, pag. 375.

 

SEGUNDA PARTE

OS ADVERSÁRIOS DA SANTA APARIÇÃO

SUAS FALSAS ALEGAÇÕES

CAPÍTULO PRIMEIRO

GUERRA TOTALMENTE DESLEAL

Toda e qualquer obra divina encontrou, e sempre encontrará, adversários para combatê-la ou impedir, na medida ao seu alcance, que ela produza efeitos profícuos à glória de Deus e à salvação dos homens, que outra finalidade não tem a Providência divina.

A maravilhosa Aparição de Maria SSma. em La Salette, onde se manifestara na sua missão de Corredentora e Medianeira, não poderia fugir à violência de adversários, a cuja frente quis colocar-se a Autoridade pública civil. Certo prefeito “denunciou aos seus chefes hierárquicos uns boatos que perturbam os lavradores". O chefe do Departamento de Isére, baseado nessa denúncia, fez uma representação ao bispo de Grenoble.

A autoridade judiciária mandou secretamente um magistrado, interrogar os patrões das crianças, Pedro Selme e Batista Prá. Este, meses depois, em Corps, reconheceu nesse "inquisidor" o próprio Procurador do rei, Esse movimento parou com a declaração de Maximino e Melânia feita perante o Juiz de Direito, conforme relatamos.

Finalmente, interveio o próprio Ministro da Justiça e do Culto, através duma comunicação ao bispo de Grenoble, queixando-se "de perturbação, surgida no povo por causa de anúncio de fome, de doença mortal para as crianças, de advertência aos lavradores de não semear trigo... Por certo, Sr. Bispo, haveis de compreender, assim como eu, o perigo de semelhantes publicações, e não haveis de permitir, que os culpados se prevaleçam da vossa proteção; pelo contrário, importa reprimir o mal, etc."

O Bispo respondeu que "não tinha autorizado nenhuma publicação, mas enviado uma circular ao clero, recordando a proibição de publicar visões e milagres novos e que vigiava pelos acontecimentos". A autoridade civil, receosa, talvez de enfrentar-se com o sobrenatural, cessou suas inquirições e representações.

A imprensa ímpia e incrédula abriu violenta campanha contra a "superstição". Os jornais católicos responderam vitoriosamente. Um pasquim, ''Censeur de Lyon" excedeu-se acusando um padre dos Alpes de "ter inventado o acontecimento de La Salette para arranjar dinheiro".

O venerando Decano de Cabido de Grenoble, por carta escrita em tom digno e enérgico, intimou o articulista ousado a publicar o nome do padre. O tal não publicou o nome do padre, mas calou-se.

'Uns" pastores" protestantes, imitando o seu fundador Lutero que tão frequentemente falava do diabo, divulgaram brochuras nos quais declaravam, sem vacilar, que o próprio Satan tinha fanatisado Maximino e Melânia!

Assim chegamos ao campo católico, onde sacerdotes, especialmente dois, Pe. Cartellier, sorrateiramente, e Deleon, abertamente, moveram guerra realmente encarniçada e tenaz à santa Aparição. Foi mais uma triste prova de que o sacerdote, embora revestido de poderes espirituais extraordinários, conserva, infelizmente, a fraqueza humana.

O Pe. Cartellier, era membro da Comissão examinadora, composta de dezesseis sacerdotes, e fazia parte da minoria de quatro contraditores. Minoria essa que procurava prolongar inutilmente os debates, por meio de sutilezas como a seguinte: "Uma opinião muito provável, equivale ou não a uma opinião quase certa?”

Esse adversário, inteligente e sagaz, proporcionava continuamente os materiais da controvérsia aos outros, particularmente ao P. Deleon. O Pe. Cartellier, enviou em 1854 ao Papa Pio IX um manuscrito intitulado "Me moire au Pape'' (Memorial ao Papa); mas também mandou logo imprimir e distribuir largamente esse manuscrito, e remeteu um exemplar ao Papa, o que era uma falta de consideração, pois não deixava o tempo necessário para o exame do escrito. Pio IX remeteu-o ao bispo de Grenoble, com estes dizeres: “Quando notamos que o opúsculo impresso não era senão o manuscrito que nos fora enviado, não podemos deixar de ficar admirado com semelhante procedimento por parte de homens conhecidos que desprezando os principios da civilidade até a mais vulgar, para não dizer mais, pretenderam ocasionar-nos embaraços com a publicação anônima desse escrito".

O novo bispo de Grenoble, sucessor de D. Felisberto, era D. Ginoulliac, homem de talento, profundo teólogo. Em sua Carla pastoral de 4 de novembro de 1854, o Prelado ressaltando a ofensa feita ao Chefe da Igreja, demonstrou os erros, as insinuações maldosas, as injúrias dirigidas a D. Felisberto e a membros do clero e condenou a publicação por ser injuriosa à Santa Sé, ter sido publicada sem a devida autorização, violando assim as leis da Igreja, por conter alusões e acusações injuriosas, desrespeitando uma devoção legitimamente estabelecida, e proibiu aos membros do clero ler e conservar o livro incriminado, propagá-lo e emprestá-lo, sob pena de suspensão, ipso facto. A respeito do autor declarava: "Na esperança de que o autor desse livro dê o exemplo de louvável submissão, nós nos reservamos para resolver, a seu respeito, o que for de direito". O Pe. Cartellier, vendo o seu livro condenado, para fugir ao interdito e para não ser removido da paroquia de que era pároco, submeteu-se exteriormente, entregando nas mãos do bispo uma declaração escrita em que afirmava "ter combatido o fato e não a devoção à La Salette", comprometia-se "com plena submissão" à carta pastoral, a nunca propagar o Memorial; submetendo-se aos atos da administração episcopal, embora tivesse aduzido fatos de boa fé em seu Memorial, desaprovava e condenava tudo o que é erro e inexato; conservando o seu modo de pensar sobre La Salette, desaprovava e condenava as expressões que tinham magoado a D. Felisberto e aos sacerdotes apontados por S. Excia. na sua Carta Pastoral".

Desde então nunca mais publicamente atacou La Salette. Atacava-a secretamente, morrendo adversário da santa Aparição, em Vichy, a 13 de julho de 1865.

No livro condenado liam-se inventos como o seguinte: "Conforme relatam os Srs. Day e Guilland, nos primeiros tempos, Maximino não sabia fazer a sua narrativa. Essa alegação, fica confirmada pelo caso seguinte: Um funcionário da Universidade, altamente colocado, estando em Corps, quis ver os heróis de La Salette; chega pois ao convento onde eles se acham. Não entrou só. Lá encontrou um certo número de estranhos. Maximino, diante de toda a assembleia, faz o histórico da Aparição. Exprime-se com ligeireza, como um aluno que tivesse recitado uma lição bem decorada. “Meu menino, pergunta a pessoa de que falamos, o que você acaba de nos dizer, sabia no começo como sabe agora?" - "Não, Senhor" "Como foi que você fez para ter assim presentes essas recordações?" - "Foi o Senhor Vigário". - Isto tem mesmo jeito de anedota.

- Sabemos, como demonstramos, no primeiro capitulo, que o Sr. Mélin, o vigário ai apontado; portou-se com toda a prudência e cautela quando lhe anunciaram o acontecimentos porém a convicção que depois manifestou, não é dum impostor. No caso apresentado, muito cautelosamente, para evitar desmentidos, não Se encontra nem o nome do tal funcionário, nem de nenhum dos presentes. nem a data.

Aliás esse caso já se lia (com a diferença de que se fala apenas dum alto funcionário de Grenoble, não já da Universidade) no livro ''La Salette, Fallavaux", escrito dois anos antes pelo Pe. Deleon.

Esse infeliz sacerdote, que fora" coadjutor em Corps em 1822 e 1823, estava encarregado, na época da Aparição, duma paróquia perto de Lião, porém da diocese de Grenoble, cargo que ele teve de deixar, de ordem episcopal, por indigno procedimento. No começo declarou-se completamente a favor da Santa Aparição, tanto que publicou no seu jornal "Union Daupbinoise" os artigos do Pe. Chambon sobre o "incidente de Ars".

Em 1852, foi conforme acima se disse, afastado por D. Brouillard do sagrado mistério por mau comportamento. Então, por espírito de vingança, passou-se para as fileiras do oposição, tendo boa acolhida por parte do Pe. Cartellier.

Homem intelectualmente bem dotado, audacioso; nada escrupuloso, de estilo fluente, atirou-se à luta com triste furor, iniciando em Agosto de 1852 a luta com o livro, acima já mencionado "La Salette, Fallavaux, Vallée du Mensonge" (O Vale da Mentira) com o pseudônimo de Donnadieu.

A respeito desse panfleto, D. Bruillard escreveu, em 1 de setembro de 1852 no jornal "Univers": "Uma brochura infame, repleta de falsas alegações. de mentirosas asserções e de injúrias grosseiras contra pessoas do maior respeito acaba de sair em Grenoble; por todos esses motivos, a nossa única crítica é que ela encerra tantas mentiras quantas palavras". Contavam os contraditores que esse livro criaria confusão e teria muitos compradores por entre os padres reunidos para o retiro espiritual em Grenoble. Foi, mercê de Deus, um verdadeiro fracasso sobre todos os pontos de vista. Pelo contrário, os 212 sacerdotes presentes assinaram o protesto seguinte: "Excelência: Nós, membros do clero, reunidos para o retiro espiritual, submissos à autoridade do seu bispo, em seu julgamento doutrinai sobre o fato de La Salette, protestamos espontaneamente e com energia contra tudo o que um panfleto, que acaba de sair, contém de injurioso ao primeiro Pastor da diocese a quem amamos como Pai e a colegas, merecidamentehonrados pela vossa confiança e queremos como irmãos e amigos, Protestamos igualmente contra todo e qualquer escrito semelhante que vier a ser publicado". No fim de Dezembro de 1852, D. Felisberto de Bruillard, com mais de 80 anos de idade, solicitou demissão do seu alto cargo e tendo-lhe sido facultada a escolha do seu sucessor por gracioso favor do Papa, ele apontou o Pe. Ginoulliac, vigário geral de Aix. Nesses livros, os contraditores da santa Aparição, aproveitando-se dos relatórios mais ou menos resumidos e para uso privado, já assinalados, redigidos vários dias após terem sido ouvidos os videntes por alguns ótimos sacerdotes, conforme os dizeres" que lhes ocorriam à memória (127), os contraditores acusaram os delegados do bispo de terem no inquérito oficial, diminuído ou aumentado a narrativa de Maximino e de Milânia.

Se eles tivessem procedido com boa fé, facilmente iriam consultar o documento de Batista Prá, assinado por mais duas testemunhas, escrito logo no dia seguinte ao grande acontecimento, ditado por Melânia; e se teriam certificado de que o relatório oficial concordava com a primeira narrativa do fato, e também, salvo leves variantes de palavras, com os mais relatórios escritos na presença dos videntes, a medida que eles estavam falando. como os do Pe. Largier, do juiz Long, do Padre Lambert.

Preferiram acusar, injuriar. Na vacância episcopal, os adversários reergueram a cabeça na esperança de que o novo bispo mostrar-se-ia menos favorável à Santa Aparição, e o Pe. Deleon, ainda, com o falso nome de Donnadieu, publicou a segunda parte do seu livro "La Salette, Fallavaux".

Em 7 de maio de 1853, D. Ginoulliac tomou posse do bispado. Tratava-se dum homem de grande valor, erudito, teólogo de vasta ciência, professor de teologia, agindo com prudência e calma.

Espírito conciliador, quis apaziguar os ânimos. Acolheu bondosamente o Pe. Deleon que solicitava levantamento do seu interdito.. O prelado anuiu com a condição que ele, como provas da sua sinceridade, vestisse novamente o hábito talar , despedisse da sua residência a pessoa suspeita, causa de escândalo, retirasse do comércio o seu livro "La Salette, Fallavaux" entregando no bispado os exemplares existentes e escrevesse uma carta de desculpas a D. Bruillard.

Após tentar algumas escapatórias, o Pe. Deleon aceitou essas condições, foi reintegrado nas fileiras do clero, porém não demorou infelizmente em recair em seus erros.

Até então, isto é, durante sete anos, os encarniçados adversários tinham sustentado, por todos os meios e com toda a força, que Maximino e Melânia nada tinham vista e com ninguém tinham falado em La Salette; eis senão quando Deleon na segunda parte do livro "La Salette, Fallavaux", com audácia afirmava: “Eles viram e ouviram alguém: A senhorita de Lameliere".

(127) Um deles, P. Emery apresenta o discurso deste modo: A Senhora lhes falou mais ou menos nos termos seguintes: O mesmo escreve "o meu Filho vai vibrar o raio das suas vinganças". - P. Janaen, La Grac:e ele La Salette. Pg. 77, Bibl . 73.

 

CAPITULO SEGUNDO

O ENGRAÇADO ROMANCE "LAMELIÈRE"

Não daríamos nenhuma importância ao escrito, pois não passa de um bem excogitado romance o caso Lamerlière, se ainda poucos anos há um cientista, ou pretenso cientista, Salomão Reinach, lá em Paris em seu livro "Orpheus" não lhe desse todo o crédito. Escreveu pois (p. 564): "Uma beata, Senhorita de Lamerlière, lembrou-se - ao que dizem - em 1946, de vestir-se de amarelo, com chapéu, feitio de pão de açúcar e de "aparecer" na montanha de La Salette, a dois pastores, a eles revelando-se como sendo a Virgem SSma.

Muito embora um processo ulterior tenha desmascarado a impostura (128), contra qual protestara o cardeal arcebispo de Lião (129), o inquérito canônico concluiu em 1847 (130) com a proclamação do milagre, pelo bispo de Grenoble. Fundou-se uma Congregação para explorá-lo, fizeram e ainda fazem romarias a La Salette, onde a água duma fonte demonstrou-se fértil em curas".

Vamos ao romance, cuja heroína é a Senhorita Constança Luíza Margarida Saint-Férreol de Lamerlière, moradora em Saint-Marcellin, a 120 quilômetros· de La Salette. Piedosa, porém de corpo bastante volumoso, era tão prodiga em boas obras que seus parentes pleitearam em juízo a sua interdição, contra o que reagiu energicamente.

Deleon conta que Lamerlière, lá pelos primeiros dias da caça (131) de 1846, subia ao sobrado da diligência que vai a Grenoble, com uma caixa de papelão contendo vestidos. Durante a viagem diz ao condutor que um seu parente acaba de ser promovido à posto superior no exército da Africa, e que ela segue para os Alpes. Desembarcando, anuncia misteriosamente que algo sensacional vai suceder, e lá sumiu carregando a sua caixa.

Pouco depois dava-se a Aparição, na montanha da Salette, lugar por ela conhecido, pois ai mora, num palacete. Com a máxima facilidade, pois, ela pôde mostrar-se a Maximino e a Melânia com os trajes trazidos na caixa.

Falou primeiro em francês e vendo que não compreendiam, falou no dialeto de Corps. graças a algumas palavras que tivera ocasião de aprender durante a sua estada na região. Aproveitando uma nuvem que se aproximava, subiu com toda a solenidade a encosta dizendo: ''Pois bem, meus filhos, haveis de comunicar isso ao meu povo". Entrando então numa segunda nuvem que descia perpendicularmente, cobrindo-lhe a cabeça, o corpo, os pés, sumiu-se vertente abaixo. Está feita a Aparição!

Notemos desde já que as crianças sempre disseram que não havia nuvem nenhuma, que viram muito bem a "Bela Senhora" subir, acompanhando-a, que ela ia deslizando (132) por cima da relva e que até Maximino estendeu o braço para apanhar rosas do seu calçado.
Para impressionar o leitor, não vacila Deleon, imperturbável e impagável, em dizer que o condutor da carruagem chamava-se Fortin, que Maximino fez a narrativa dessa Aparição ao Sr. Filiole, negociante de Grenoble, que o tomou junto com o pai, em seu carro , indo de Corps a La Salette em Dezembro de 1848.

Prosseguindo no seu romance, o autor escreve: "Poucos dias depois a Srta. Lamerlière chegava a N. Sra. de Laus, a 70 quilômetros de La Salette, hospedando-se no convento das Religiosas, onde mostrou-se a uma empregada e às Irmãs vestida como lá em La Salette.

Fugiu pela janela do seu quarto e debalde a procuraram os Missionários e as Religiosas. Uns meses depois, o condutor Fortin, estando de serviço, na vila de Tullins, em casa do Sr. Mazet, vendo medalhas de N. Sra. de La Salette, caiu na gargalhada, dizendo que La Salette foi fabricada pela Srta. Lamerlière; e esta chegando precisamente neste instante, confirmou em parte o que ouviu. Aliás, as várias peças do referido vestido foram vistas pelo Sr. Gérard, negociante de paramentos sacros e a Sra. Carra, hoteleira perto da Porta da França, em Grenoble; finalmente a Srta. Lamerlière confessou todos os fatos à Sra. de Monière, que foi contá-los ao Vigário Geral, padre Berthier, em Dezembro de 1846; fatos esses do domínio público já em novembro desse ano. Da pena de Deleon aqui caiu o ponto final (133).
D. Ginoulliac, devido ao rumoroso escândalo, abr!u rigoroso inquérito, averiguando: "O condutor Fortin, não podia receber nos primeiros dias da caça" de 1846 na diligência a Srta. Lamerlière, por que, conforme declaração de 30 de julho de 1857, do empreiteiro das carruagens, Sr. Gruinard, esse condutor só entrou no serviço em 1849, A Srta. Lamerlière não podia falar da promoção do seu parente na Africa, em 1846, porque o sou cunhado, Sr. de Luzy, em 1846 e 1847, estava aquartelado em Lião e foi promovido a General, na Africa só sois anos depois.

A Srta. Lamerlière conheceu La Salette, só na sua romaria que fez em 1840, levada por um lavrador de São Miguel de Beaumont, que certificou que foram precisos bem dois dias para ela chegar ao lugar da Aparição (134).

Todos os prefeitos da circunvizinhança atestaram que no território dos seus municípios não existiu o tal palacete. Em 19 de setembro de 1846 Pedro Selme, como vimos, vigiava Maximino, nas montanhas descampadas de La Salette, e teria visto a tal criatura.

O negociante de Grenoble, não poderia tomar em seu carro a Maximino de Corps a La Salette pelo simples motivo que até 1851, não existiu ali nenhuma estrada de rodagem, mas só umas sendas estreitas.

O Superior e as Religiosas de N. Sra. de Laus atestaram que nunca lá viram Lamerlière ou qualquer outra pessoa vestida como a "Bela Senhora" de La Salette cuja Aparição bem conheciam. O Sr. Mazet de Tullins, em documento assinado, declarou que nunca falou com o condutor Fortin do acontecimento de La Salette.

A Srta. Lamerlière mostrou vestidos esquisitos, diversos dos de La Salette ao Sr. Génard, só em 1848; pois em 1846 ela estava de luto pela morte da própria mãe.

Finalmente o casal Carra declarou que só em 1847 tomaram conta do hotel Porta da França, e que só em 1850 a Srta. Lamerlière lá se hospedou pela primeira vez.

A Srta. Lamerlière, julgando-se merecidamente ofendida, processou Deleon; e, para comprovar que ela não podia estar em La Salette a 19 de setembro de 1846, apresentou ao tribunal uma intimação judiciária com data de 18 de setembro de 1846 a qual lhe foi entregue pessoalmente às 2 horas da tarde na vila de Saint Marcellin (135) pelo oficial de justiça que atestou esse fato.
D. Ginoulliae acrescentou: "Esse documento está bem nossas mãos". O advogado da Srta. Lamerlière foi Jules Tavre, notabilíssimo causídico que exuberantemente comprovou o que o Procurador admitiu que essa sua cliente estava em Saint Marcellin, nos d!as 19 e 20 de Setembro de 1846, porque no sábado 19 de setembro ela aguardava a chegada do seu cunhado, coronel de Luzy, que sofreu um desastre pelo caminho. Tendo porém a Srta. Lamerlière requerido 20.000 francos de indenizações, o Tribunal declarou que se limitava exclusivamente a julgar se ela se achava com o direito de exigir essa quantia, e sentenciou que o autor do livro, estando de boa fé, não tencionara prejudica-la na sua reputação, portanto não o condenava ao pagamento dessa quantia (136).

A esse processo aludiu Salomão Reinach, mostrando mais uma vez, a sua ignorância e sua estreiteza de espírito em admitir e divulgar novamente o ridículo, porém sacrílego, romance "Lamerlière".

(128) Precisamente o contrário como veremos.

(129) ele só quis comunicação dos segredos.

(130) O julgamento doutrinai foi a 19 de setembro de 1851.

(131) Nos meados de setembro: época em que na França o governo autoriza o começo da caça.

(132) Imaginem com a corpulência da Senhorita Lamerlière!

(133) P. Carbier. Historie de l'Apparition de La Salette, p. 176.

(134) Geralmente as pessoas não corpulentas levam um dia a pé. Quem escreve conhece as localidades.

(135) Essa vila fica pelo menos a 120 quilômetros distante de La Salette. A condução daquela época era vagarosa.

(136) A Ata por extenso desse processo acha-se no livro: "Affaire de La Salette", por J. Sabbatier. - Ver Bibliog. 46.

 

CAPITULO TERCEIRO

LEVANTANDO FALSAS ACUSAÇÕES

Deleon e mais adversários levantaram falso testemunho contra os dois bispos D. Bruillard e D. Ginoulliac, pretendendo que o primeiro tinha designado o segundo para bispo de Grenoble com a condição expressa de que seria defensor da Aparição de N. Sra. de La Salette. Disseram mais que outros candidatos recusaram a aceitar a honra não se sujeitando à condição. É o que se lê no livro "La Conscience d"un prêtre et le pouvoir dun evêque", em 1856 (137).

Igualmente, afirmava Deleon que o Pe. Rousselot tinha mentido em seu relatório da audiência do Papa por ocasião da entrega dos segredos; Pois Pio IX dissera aos dois delegados do bispo de Grenoble: “O que trouxestes é um mundo de estupidezes". E na mesma tarde da audiência, na presença de cardeais e prelados romanos: "Eram ninharias, bobagens e monstruosidades", dizeres esses que Mons. de Segur ouvira e repetira em Paris a 21 de outubro de 1854, na presença de 25 padres.

D. Ginoulliac que tivera de lançar novamente o interdito sobre Deleon, indignado, respondeu com sua magistral Carta Circular de 19 de setembro de 1858, em que apresentava a carta que recebera de D. Bruillard, comunicando-lhe a sua escolha para bispo de Grenoble, na qual nenhuma vez se lê a palavra Salette, protestava com a máxima energia contra a injúria que o julgava capaz de vender a sua consciência. Aduzia estas palavras de Mons. Plantier, outro acusado: "As bondades de D. Bruillard para mim, têm sido inúmeras, porém nunca chegou a ponto de me oferecer o bispado de Grenoble com a condição de ser o defensor de La Salette" (138). "É erro que não tem desculpa, para não dizer calúnia, pois sempre e por toda a parte, manifestei a minha crença na aparição". O cardeal arcebispo de Lião escreveu a D. Ginoulliac: "Nunca disse e nunca escrevi que houve acordo entre D. Bruillard, e Vossa Excia., a respeito de La Salette. Quando ouvi falar nessa calúnia, sempre a combati" (139). Finalmente Mons. de Segur: "Tudo isso é tão mentiroso como ridículo, eu desminto formalmente. O Santo Padre nunca me falou de La Salette e eu não falei sobre tal assunto nem em Paris," nem em parte nenhuma, nem perante eclesiásticos'' (140).

Desta vez o Pe. Deleon sentiu-se tão esmagado que para sempre se calou, até que mais tarde foi absolvido e reabilitado por D. Fava e morreu em idade muito avançada, após ter declarado ao Pe. Marron, missionário de N. Sra. de La Salette, com quem temos convivido, "que sempre acreditara na Aparição de N. Sra. de La Salette e que tão somente a tinha combatido para se vingar da autoridade". Esse missionário, por sua vez, comunicou tal declaração ao Padre Carlier, missionário de N. Sra. de La Salette (141) de cujo livro extraímos os dados acima.

Deturpações de fatos, hipocrisia, mentiras e calúnias foram portanto as armas de que lançaram mão os adversários da santa Aparição. No entanto, continua-se, por ai, a despertar a desconfiança contra a misericordiosa intervenção de Maria SSma. dizendo: "La Salette foi combatida .desde o começo". É triste, imensamente triste!

(137) "A consciência dum padre e o poder dum bispo". Tanto este último panfleto como os outros de Deleon, o romance de Lamerlière, foram cabal e vigorosamente refutados pelo bispo D. Ginoulliac em sua carta Pastoral e várias suas Cartas Circulares. Ver Bibliografia 31.

(138) Carta a Amadeu Nicolas, 24 de maio 1857 em "La Salette devant la raison". Ver Bibliografia 40.

(139) Carta circular, 18 de setembro de 1858, de D. Ginoulliac. Bibliografia 31.

(140) carta de 11 de Setembro de 1858, de D. Ginoulliac. Bibliografia, 31.

(141) P. Carlier - Histoire de l'Apparition de Notre Dame de La Salette; pag. 170, nota. Blibliografia 66. P. Jauen “Da Grace de La Salette", pag. 68, Bibliografia 73.

 

CAPÍTULO QUARTO

UMA CARTA CAÍDA DO CÉU

Com o pretexto de que há muitos séculos andavam, e ainda andam, pelo mundo uns escritos com o titulo de Carta de N. S. Jesus Cristo, como andam hoje em dia orações correntes de Santo Antônio ou mais santos, o R. P. Delehaye, S. J., grande erudito não há dúvida, em hora rara por certo, em que ele cochilava - fraqueza essa do próprio Homero - afirmou (142) que o fato de La Salette não passava duma dessas cartas caídas do Céu.

O Reverendo, e digamos, saudoso padre, pois era homem de valor, aduz dois motivos para basear a sua afirmação.

1o - Como geralmente nas mencionadas cartas recomenda-se especialmente o repouso dominical, assim vê-se essa recomendação na Salette e em ambos os escritos, com ameaças do castigos rurais, como fomes e mortes. 2) Na cópia de Batista Pro, lê-se: "Carta ditada pela Virgem Santíssima ... "

Para ilustrar (143) o nosso caso transcreveremos aqui um exemplar típico duma dessas cartas. ''Carta milagrosa encontrada no lugar por nome Arrais, escrita em letras de ouro do próprio punho de Nosso Salvador e Redentor Jesus Cristo. Jesus, Maria - Nos domingos não fareis obra nem trabalho sob pena de serdes malditos por mim; ireis à igreja e rezareis a Deus que vos perdoe os vossos pecados. Dei-vos seis dias para trabalhardes e o sétimo para descansardes, depois de ouvido o serviço divino. Dareis vossos bens aos pobres, vossos campos serão férteis e vós sereis repletos de bençãos. Mas se, pelo contrário, não acreditardes na presente carta, a maldição cairá sobre vós e vossos filhos e vossos gados serão malditos. Hei de vos enviar guerra, peste e fome, dor e aflição do coração, como sinal da minha justiça e cólera e dura vingança; vereis sinais Prodigiosos nos astros, com grandes terremotos. Jejuareis cinco sextas feiras em honra das cinco chagas que sofri para vos salvar na árvore da cruz. Quem ler e divulgar esta, escrita do meu próprio punho sagrado editada pela minha boca sagrada, ainda que tenha cometido tantos pecados quantos dias há no ano, ser-lhes-ão perdoados, sendo realmente contrito e confessando-se ao próximo se o prejudicou. E se não acreditardes piamente nesta carta, eu vos enviarei bichos monstruosos e ferozes que devorarão a vós e aos vossos filhos. Felizes serão os que fizerem cópia desta carta e a levarem consigo; nunca espírito mau, nem fogo, nem raio o tocará. E guardai os meus mandamentos e os da minha Santa Igreja Católica fielmente e sereis salvos.

Assim seja.

Autorização de imprimir e distribuir.

Verdun, 19 de junho de 1824, o Sub-prefeito, Harmand.

Perguntamos: o que há de comum entre tal escrito e a mensagem de N. Sra. de La Salette, fora a recomendação de não trabalhar nos domingos? Note-se que a tal carta diz: “Dei-vos seis dias para trabalhardes e o sétimo para descansardes, de modo que o fim principal da lei é o descanso para os homens. Em La Salette, N. Sra. declara que o sétimo dia é para Deus reservei-me o sétimo... Nada na carta, a respeito da blasfêmia como Maria SSma. na Salette! Nenhum vestígio há na tal carta, da revolta do povo, do maior castigo, nada rural.

nada material: “Se quero que meu Filho não vos abandone..." o abandono de Deus! Nada de intercessão de Maria SSma. "Tenho de rezar sem cessar por vós'", dos seus penosos cuidados por nós, dos seus lamentos:

"Há muito tempo que eu sofro por vós”. Note-se também que os castigos piores e tão diversos dos anunciados em La Salette são para quem não acreditar na carta, não faz cópia da carta, como acontece nas orações-correntes.

Franqueza! o reverendo padre estava mesmo cochilando, ou não lera o discurso de N. Sra. de La Salette.

2o - No início da cópia de Batista Pra lê-se: "Carta da Virgem SSma. ditada ...". Ora, no documento acima, o próprio N. S. Jesus Cristo declara que Ele a escreveu de próprio punho.

Batista Pra escreveu "carta", simplesmente porque, pobre inculto lavrador, perdido em suas longínquas montanhas, não conhecia outro gênero literário a não ser o epistolar; as palavras mensagem, discurso, advertência, etc. não existiam na sua mente. Escreveu ''Virgem SSma.", porque - recordará o leitor - tendo notado a convicção do "Prefeito", homem culto, inteligente, após o interrogatório de Melânia, por isso ele também acreditou. Igualmente é necessário não esquecer, que Maximino e Melânia nunca disseram “encontramos" ou “Ela nos deu uma carta” mas "Ela nos falou chorando"; que na cópia de Batista Pra, não se trata de carta "encontrada", mas a narrativa da Aparição foi feita primeiro por palavra, não por escrito, a muitas pessoas, ao Vigário particularmente e ao "Prefeito"; foi por palavra que o grande acontecimento foi conhecido; o primeiro escrito surgiu bem 24 horas depois que Maximino e Melânia falaram. Negar isso é recusar qualquer valor ao testemunho humano.

Finalmente, o que resolve a questão de modo irrecusável, é o caso concreto, o fato contemporâneo do pedaço de pão dado a Maximino por seu pai, quando estavam a sós, completamente a sós, no caminho de Corps. O Sr. Giraud, não somente não desmentiu, mas por causa desse fato recordado voltou resolutamente à prática da Religião. De que modo o autor da pretensa carta chegaria a saber do caso? É claro, o R. P. Delahaye não refletiu.

O prezado leitor há de concordar conosco que as alegações dos adversários da santa Aparição não passam de erros, invencionices, má fé, e até calunias e irreflexão.

(142) Na revista "'Recherches de Sciences religieuses - fevereiro, abril 1928.

(143) Em "Grace de La Salette", pelo Pe. Jaum – pag. 13S e seguintes.

 

TERCEIRA PARTE

OS VIDENTES

CAPITULO PRIMEIRO

A GRAÇA CONCEDIDA A MAXIMINO E MELÂNIA

A justificativa deste capítulo encontramos na seguinte frase do R. P. Bliguet da Ordem Dominicana, professor do Escolasticado dessa Ordem na Bélgica: "A piedade popular é, particularmente quando ardorosa, um tanto simplória; ora muitos católicos cultos acompanham, não há dúvida, com relação à La Salette, a piedade simplória do povo fiel. Se alguém vos disser: Maximino e Melânia não foram nada santos; depois do maravilhoso acontecimento, não foram além de cristãos muito comuns, assim como eram antes, logo ficareis pensando, ou pelo menos tereis a tentação de assim pensar: Então não viram a Nossa Senhora! Pois, ver a Nossa Senhora e não se tornar santo, não é admissível. Aliás, uma das marcas da origem divina duma inspiração não será precisamente a sua eficácia santificante?"

Para esclarecimento e solução dessa dificuldade, pedimos vênia ao Pe. Bliguet - que por certo anuirá, uma vez que sua intenção era que o seu escrito fosse publicado pelos missionários de La Salette (144), - pedimos vênia para transcrever aqui a parte mais importante do seu estudo. Antes de mais nada o R. Padre afasta resolutamente o argumento acima: Maximino e Melânia não foram santos, pelo contrário; logo, não viram a Nossa Senhora. E apresenta a seguinte doutrina: "Que Maximino e Melânia não foram verdadeiramente santificados, é caso da alçada do historiador, e somos de parecer que muito modo de julgar a esse respeito deve ser modificado. Mas vamos ao pior, isto é supor que os pastores manifestaram na sua vida toda notável insignificância religiosa. A questão que temos para resolver é a seguinte: Na verdade, por causa dessa insignificância, o seu testemunho fica prejudicado e temos de conceder que o sinal mais autêntico da origem divina duma aparição ou duma revelação, seja o seu valor e sua eficácia santificante? - Sim e não. Sim, se falamos do seu valor e da sua eficácia santificantes para aqueles a quem é destinada, isto é, a Igreja, aos, fieis. Não, se falamos do seu valor e da sua eficácia santificantes para os instrumentos de que Deus há por bem usar para comunicar a sua mensagem ao povo.

 

Essas duas afirmações são apenas a aplicação ao caso de Melânia e de Maximino, das leis gerais que santo Tomás de Aquino descobre em toda a inspiração.

É conhecida a divisão clássica das graças e dons de Deus em graças “gratis datae” (145) ou carismas, e "gratum facientes"  (146) ou graças propriamente ditas. Eis aqui de que maneira explica e justifica essa divisão (1.a, II.a, quaest. III.a, 1). (147).
''Tudo o que vem de Deus vem Sendo feito de modo coordenado.'"

A criação de Deus é hierarquia; não só Deus governa pessoal e diretamente os seres, mas ainda Ele quis comunicar às suas criaturas essa perfeição, essa grandeza, para que elas fossem também ativas e providentes umas para com as outras. Isso é verdade na ordem da natureza e é verdade na ordem da graça; também a ordem sobrenatural é uma hierarquia.

É mister, portanto, dizer que a conversão e união a Deus - que são toda a razão de ser e toda a essência da graça - se realizam de dois modos: sem intermediário, quando Deus age só no íntimo da alma; e indiretamente, quando Deus usa dum instrumento que Ele escolheu para operar a salvação dos homens.

De modo que existe dupla graça; uma pela qual o homem fica unido individual e imediatamente a Deus, é a graça “Gratum faciens, e outra pela qual coopera com alguém para converter; é a graça “Gratis data"' (graça dada para bem dos outros).

Chama-se a primeira “Gratum faciens”, porque santificando aquele que a recebe e a conserva, torna-o agradável a Deus.

Não se chama a segunda “Gratum faciens”, porque, por meio dela, o homem que a recebe, não a recebe para sua própria justificação (volta ao estado da graça) e santificação, mas para a justificação e santificação dos outros.

Chama-se “gratis data” porque é gratuita inteiramente e por dois modos: pelo primeiro modo, porque ela está acima das forças da natureza, cujas leis ultrapassa; é a força que faz o profeta; pelo segundo modo, ela não tem relação com o mérito da pessoa a quem é concedida.

Como diz S. Paulo, é concedida para utilidade comum (148).

Essa doutrina, tão clara tão simples, é a luz que ilumina todo o tratado da Inspiração na Suma Teológica. Logo de início, santo Tomás coloca a profecia, isto é, a inspiração, na categoria das graças “Gratia datae” (concedida para o bem dos outros). Mais em baixo, ele faz apelo para essa doutrina, para resolver um caso difícil, aquele precisamente de que estamos falando: o caso dum profeta que não é santo: "A profecia é dada para o bem dos outros e da Igreja".

Ele já dissera no tratado "De· Veritate" (Da Verdade), questão 12, art. 5: "A profecia é concedida para bem da Igreja e não para bem do próprio profeta". Sustenta a mesma tese, em termos iguais, na Suma contra os Pagãos (livro III, pág. 154-155).

É portanto nele, idéia sólida, uma convicção firme e sempre mantida. Aliás, tradicional, sempre afirmada desde S. Paulo.

Ora, precisamente, esse caráter impessoal e social da revelação, ressalta com brilho em La Salette. Desde o começo da conversação que Ela se digna de ter com as duas crianças. É claro que Nossa Senhora, por ci­ma da sua cabeça - se é lícito assim falar - se dirige ao seu povo, a toda a Igreja. Bem sabe Ela que Maximino e Melânia compreendem mal o idioma francês, poderia falar no dialeto deles, e daí a pouco assim fará.Não parece cuidar disso, porque se dirige à França, cuja língua fala; e, além da França, à Igreja toda. As duas crianças que a ouvem, apenas são os seus mensa­geiros; e, se, dentro em pouco, Ela tem a Condescendência de falar o dialeto regional, é que o homem é instrumento de Deus, enquanto homem, isto é, sabendo, e não como um objeto.

O conteúdo do discurso se dirige claramente a todos os fiéis: "Há muito tempo que sofro por vós; se quero que meu Filho não vos abandone, tenho de implorá-lo sem cessar, e vós não fazeis caso", etc.. Tudo isso, é claro, excede a responsabilidade, a consciência e a própria compreensão dos dois pastores.

A consciência cristã é que é atingida. É a Igreja que deverá ouvir a lição e aproveitá-la. Por isso, a Virgem SSma. termina o seu discurso, dizendo: "Pois bem, meus filhos, comunicai isso a todo o meu povo".

Foi o que Maximino e Melânia fizeram, até mais do que eles queriam. Não era absolutamente necessário, para a sua missão, que eles fossem santos. Nenhum deles soube, é certo, ter vida fixa. Os dois sempre inconstantes, vão andando sem encontrar em parte alguma o seu lugar definitivo.

As aventuras, porém, da sua vida e o seu continuo movimentar-se, serviram à causa pela qual foram escolhidos; o fato de serem eles instáveis - fato que nos incomoda se não refletimos - tomou-os instrumentos mais apropriados à sua missão.

O próprio segredo, embora ignorado, atraiu mui­to a atenção e fez com que milhares de almas estudassem e recebessem a mensagem de Maria Santíssima em La Salette, a relembrar os deveres do cristão. Tantos pormenores explicam-se do modo ma!s simples, uma vez admitido o carater social católico da Aparição de La Salette.

As crianças não importam, são intermediários que, sem inconveniente, podem ser esquecidos. Trata-se dum dialogo entre o povo fiel e a Mãe de Deus. É mister procurar o resultado almejado e a eficácia comprobatória: não já nos dois pastores, mas sim nas almas cristãs a quem a mensagem foi dirigida. Aqui, nenhuma decepção, nenhuma dificuldade, pois as almas ouviram a voz querida a lhes recordar o seu dever, e a mensagem transmitida a todo o povo de Maria já renovou em muitos corações a devoção católica, e o bem vai prosseguindo.

Não há, pois, nenhuma necessidade, para que a mensagem divina tenha eficacia, de que Maximino e Melânia fossem santos, e nisso não existe nenhum motivo de admiração. Esta é a doutrina de santo Tomás:

"A bondade do homem consiste na caridade, pela qual ele fica unido a Deus; portanto, tudo o que pôde existir sem a caridade, pode também encontrar-se tanto nos maus como nos bons. É necessário, com efeito, dizer isso, em "louvor da divina bondade: é que ela recorre tanto aos maus como aos bons, para realizar os seus desígnios; por esse motivo, ela comunica tanto aos maus como aos bons esses carismas (dons) que não se acham necessariamente sob a dependência da caridade. Ora, precisamente, a revelação não se acha forçosamente vinculada à caridade. A profecia está na inteligência; a caridade está no coração; a profecia e outros dotes intelectuais não dependem da caridade; por isso a fé, a profecia e outros dons semelhantes podem encontrar-se nos maus e nos bons. O profeta recebe a revelação, não para uso pessoal, mas para utilidade da Igreja. Ora, por vezes acontece que alguém, mesmo não unido a Deus pela caridade, seja em qualquer coisa útil à Igreja.

Eis porque, a Revelação, o poder de fazer milagres, as funções eclesiásticas e mais dons em favor da Igreja podem existir sem a caridade; no entanto, só ela faz os homens realmente bons.

Na distribuição do dom da revelação, há prudência e escolha deliberada por parte de Deus. Ora, alguns há que não são bons ou muito bons para o seu próprio fim, mas são bons ou muito bons com relação à missão profética, capazes de cumpri-la bem, até muito bem. Dessa capacidade só a Providência é único juiz. O dom recebido fica sempre bom em si mesmo; o abuso provém da perversidade humana". Até aqui santo Tomás.

A respeito de La Salette, não devemos pois per­guntar se Maximino e Melânia eram santos, mas se estavam em condições de receber e de levar o testemunho conforme deles se esperava.

Pois bem, até o momento em que a Aparição, alcançando o seu fim real, tornou-se coisa pública, estudada e julgada pela autoridade eclesiástica, as duas crianças cumpriram de modo admirável a sua missão de testemunhas e de mensageiros. A sua candura, a sua sinceridade ingênua, por vezes com certa rudeza, o seu desinteresse, a sua ignorância, a sua imaginação, que parece incapaz de inventar, - tudo serve neles ou melhor tudo serve para o intento da Providência."

A respeito do que poderia ter acontecido após o julgamento episcopal, D. Ginoulliac , pregando a sete ou oito mil pessoas na santa montanha, por ocasião do 9o aniversário da Aparição declarou: "A missão dos pastores terminou, a da Igreja começa. Eles podem afastar-se, espalhar-se pelo mundo, tornar-se infiéis à grande graça recebida; a Aparição de Maria não ficará por isso abalada, pois é certa e nada no futuro poderá reagir contra ela" (149) .

D. Ginoulliac, o talentoso, piedoso e estrenuo defensor da santa Aparição. pronunciava essas palavras solenes quando Maximino estava com 20 anos de idade e Melânia com 24, no início portanto - após o grande milagroso acontecimento - de sua bastante movimentada carreira que vamos acompanhar com relativa brevidade.

(144) L'Apparition de La Salette. Vol I. p. 23 a 37. Bibliografia 70.

(145) Uma sraça gratuitamente dada. no sentido que Deus concede a alguém essa crença que não para ele, mas para outros.

(146) Uma graça que torna alguém agradável a Deus, portanto, uma graça que é para a santificação de quem a recebe, portanto uma graça que não é para os outros. Em nossa tradução escreveremos "dom" para designar as graças da primeira categoria.

(147) Quer dizer: a 1a parte da 2a Parte, questão III, artigo 1, da Suma Teológica de Santo Tomás de Aquino.

(148) I Cor. 12: “Datur manifestatio spiritus ad utilitatem." - isto é: a bem dos outros.

(149) Amédée Nicolas, livro citado pag. 418 - Bibliografia 40. O autor estava presente. Citado pelo P. Hostachy. Histoire seculaire de La Salette, pg. 218 - Bibliografia 71.

 

CAPÍTULO SEGUNDO

CARREIRA E CARÁTER DE MAXIMINO (1835-1875)

O Pe. Nortet, que viu a Maximino em Corps, pouco depois da Aparição, escreve: "O pai de Maximino deixa-o vadiar, brincar na rua, atirar pedras. O menino é irrequieto, volúvel. incapaz de parar, despreocupado com tudo; no entanto boa criança, sem amor próprio nem malícia" (150).

Essas palavras pintam Maximino com toda a exatidão; e sua vida - fora, naturalmente, a Aparição - nada é senão a mera ampliação desse quadro.

Apresentaremos um rápido esboço dessa vida cheia de surpresas, e depois demoraremos um pouco em lhe considerar os defeitos e as qualidades, cuidando em deixar a palavra, o mais possível, a ele próprio.

Nasceu Maximino Giraud na vila de Corps, na diocese de Grenoble, província do Delfinado, França, em 1835. Ficou órfão de mãe, infelizmente quando ainda pequeno, e seu pai não demorou em contrair segundas núpcias.

A madrasta não cuidou muito dele, e até frequentes vezes o maltratava. Já dissemos que vida levou até o dia 19 de setembro de 1846, em que foi escolhido por Maria SSma. para sua testemunha.

Logo depois do grande acontecimento, foi matriculado no colégio das Religiosas na sua vila natal, onde ficou até os 15 anos de idade, já órfão de pai.
De volta da sua rumorosa viagem a Axs e sua entrevista com o santo Cura, D. Bruillard o admitiu no Seminário menor de Rondeau, nos arredores de Grenoble. Durante as férias, passou um mês no convento dos R. Pe. Cartuxos, donde escreveu: “Sou bem alimentado, bem tratado, mas o tempo custa muito a correr. Os dias são meses"; no entanto ele fez retiro espiritual de oito dias

Para o novo ano letivo foi transferido para outro seminário menor, em Sto. André, porque nas proximidades de Grenoble as visitas se tornavam por demais frequentes. Nas férias o Pe. Rabillond o levou consigo, em meados de 1852. Em seguida, foi confiado ao Pe. Champon, aproveitando a ocasião de ir a Roma com o Sr. Similien, doador do alta-mor do Santuário, pois muito se interessava por ele.

Em 1856, afasta-se do Pe. Champon, para ingressar no seminário Maior de Dux, situado perto dos Pireneus e do Oceano Atlântico, e dirigido pelos Revmos. PP. Jesuítas. "Sendo, escreve ele, o melhor (?) aluno da casa, colocaram-me perto do P. Ralhador; tenho a vantagem de ter um bom quarto, uma vista esplêndida pela janela; porém, o meu querido vizinho, ao menor ruido corre a ralhar-me".

Dois anos depois, saiu do Seminário e dando rápida volta pelo subúrbio de Grenoble, foi a Paris, onde se ocupou em vários serviços e teve ocasião de entrar como empregado no Hospício Imperial, do verão de 1859 até janeiro de 1860. Ai surgiu-lhe a ideia de estudar medicina, o que fez durante 18 meses, completando os seus estudos no colégio Tonerre, sendo hóspede do ótimo casal Jourdain. Em 1864, despedindo-se da Faculdade de Medicina, senta praça para ser soldado zuavo, no exército do Papa, apenas durante seis meses.

Voltou no fim de 1864 para sua vila natal, Corps; sendo convocado em 1870 por causa da guerra deflagrada entre a França e a Prússia , com ordem de aquartelar-se numa fortaleza perto de Grenoble.

Em primeiro de março de 1875 faleceu piedosamente em Corps, em cujo cemitério foi sepultado. Seu coração, porém, foi levado à santa montanha onde repousa dentro do Santuário de N. Sra. de La Salette.

Lancemos um olhar sobre essa vida tão cheia de inconstâncias, para lhes descobrir uma explicação e conhecer algo das qualidades e dos defeitos desse vidente de Maria. SSma. Temos uma cena bem viva e sumamente expressiva no diálogo (151) seguinte travado entre o Pe. Bossan M. S. e o próprio Maximino.

- Que dizer a quem acusa a ti e a Melânia deterdes muitos defeitos?

- É preciso perguntar quais são esses defeitos.

- Dizem que sois levados, volúveis.

- Aí não há defeitos.

- Não são vícios, porém são defeitos.

- Sou como toda gente, não sou perfeito.

- Eu sempre disse que sois bons cristãos, por ser verdade. A aparição porém não teria produzido nenhum efeito dentro de vós, trazendo alguma graça particular, para vos corrigir e viverdes santamente?

- Não posso dizer isso, nada percebi; mas a Virgem Santa fez-me a graça duma educação cristã, nas boas Irmãs de Corps; cercou-me de padres exemplares; toda a minha infância passou--se num ambiente que me afastava do mal e me levava para o lado do bem.

Sem a Aparição, talvez esquecendo de Deus, eu como muitos outros, tornar-me-ia muito mau, quiçá membro da Internacional da Comuna. É portanto uma grande graça que Ela me fez, mantendo-me em bom ambiente, com fortes convicções religiosas.

-É verdade, porém muitos assim não entendem, e quereriam que fôsseis santos e não simplesmente bons cristãos.

- Pois bem! esses são uns bobos. Impossível de pensar como eles. A Aparição e eu são coisas diversas.

Fui apenas um instrumento. Ora, por mais que a água passe por muito tempo num cano de prata ou de ouro, nunca virará vinho. A graça passa pelo meu canal, mas não o transforma.

- Tendes certeza que não passastes de instrumentos nas mãos da Virgem Santa?

- Sim, perfeitamente. Fomos apenas canais, papagaios a repetirem o que tínhamos ouvido. Bestas éramos antes da Aparição, como bestas somos depois da Aparição e bestas ficaremos a vida toda."

Eis aí, a doutrina de Santo Tomás apresentada em linguagem pitorescamente popular.

Espírito infantil, volúvel, imprevidente, eis o que explica suficientemente que Maximino não tenha resolvido abraçar um estado firme na vida. Ele confessou, escrevendo do Seminário Maior, onde era vizinho do Pe. Ralhador. "Cuidava na minha boa fé que, aos vinte anos, eu não era mais criança, e todos os dias estou experimentando o contrário. Ainda há pouco um bom P. Jesuíta me dizia: "Senhor, aos 22 anos, não se faz mais criancices! olhai, não passais duma criança grande". É que eu tinha anunciado uma aula, de brincadeira, e todos se reuniram atoa.

Lembra-se o leitor de que, subindo à montanha de La Salette, na véspera da Aparição, já de manhã cedo, tinha comido o seu almoço. Respondendo a quem observou: Que vais comer pelo meio dia? Respondeu: Mas eu não estou com fome". Volúvel, imprevidente, despreocupado, eis o motivo de tantas mudanças de projetos. Por ex.: Quis estudar medicina, só porque tivera ocasião de ver os médicos no serviço hospitalar quando estava numa casa de saúde. Foi soldado no exército do Papa, porque tinha gostado muito das paradas militares em Paris. Foi negociante de vinho, por causa de bastantes dívidas feitas passando dum serviço para outro. Foi explorado, porque o seu sócio aproveitou-se da seu nome de pastor de La Salette porém nada lhe deu.

Por isso ele muito sofreu. De Paris escreveu à Madre Santa Tecla, de que sempre se recordou, a 28 de outubro de 1859: "Por certo estais aflita, porque vivo nesta Babilônia, com perigo de me perder. Após 6 meses venho lhe sossegar. Eu me comportei regularmente, porém, traguei pedaços de vaca danada. Bem que imaginais, pois me acho em Paris há quatro meses, sem amigos e sem gente conhecida. Tinha por único recurso uma moeda de 10 francos, uma insignificância na Capital. Muitas vezes tenho chorado, relembrando os meus oito dias em casa de Pedro Selme, e não minto, os meus olhos verteram rios de lágrimas ao pensar nas carícias da boa mãezinha Santa Tecla e de tia Valéria, e as pancadas de irmã Maria e minhas lágrimas redobravam, então ia fazer oração à Virgem atrás do altar mor de S. Sulpício, e retirava-me um pouco mais animado. Enfim, tudo passou, agora estou bem colocado."

Sofreu fome, frio, dormindo no chão ao relento (152).

Espírito infantil e bom, era muito reconhecido. Nunca deixou de escrever àquelas boas Irmãs, especialmente à que chamava de boa mãezinha, manifestando-se sempre devotado a quem o ajudava. Devido ao seu gênio, custava muito a aplicar-se ao estudo. Frequentemente reprovado nos exames, nunca se queixava dos seus professores, mas culpava sempre a si mesmo.

"Vou procurar estudar melhor... Quero trabalhar bastante neste trimestre para ter boas notas" - escrevia (153).

Acusaram-no de forte propensão para a bebida. A este respeito, ele dizia: "Não se preocupe, quando bebo sou piedoso". - Era verdade, atesta o P. Perrin :M. S. que fora seu colega no seminário.

Na carta seguinte, escrita pelo futuro Pe. Jesuíta, Henrique de Kerguenec, soldado junto com ele no exército do Papa, encontramos os defeitos e as qualidades de Maximino. Entre soldados, por experiência disso sabemos, não há segredos, existe completa expansão.

"Maximino contou-me toda a sua vida e me tem fornecido muitos pormenores acerca da Aparição. Que vida movimentada e afinal, nada feliz! Esse pobre rapaz já tem sofrido muito e tudo indica que ainda não acabou! Parece que a Virgem Santíssima o vai levando por um caminho nada semeado de rosas. É boa criatura, rude como os montes do Delfinado, porém reto e generoso. Maximino contou-me todas as suas travessuras em Paris e, alhures, que ele chama "as suas loucuras”; diríamos melhor, as suas extravagâncias, pois ele jurou que a respeito da moralidade, a Virgem Santa nunca permitiu que ele prevaricasse. Em Paris, enquanto estudava medicina, alguns estudantes armaram-lhe ciladas inconfessáveis; todas ele evitou e eu que jâ o conheço a fundo, acho que esse milagre é muito mais extraordinário, se é licito falar assim, do que o de La Salette.

Tem defeitos; estaria, por exemplo, propenso a querer gostosamente alcançar o fundo das garrafas; censuraram-no já a este respeito, e ainda hão de censurá-lo; pareceu-me duas ou três vezes um pouco quente depois que aqui chegou. Ontem eu mesmo quis experimentá-lo. a ver se realmente excedia os limites da temperança e notei que um só copo de vinho comum, soltava-lhe a língua e fazia que o sangue lhe subisse à cabeça.

É questão portanto de temperamento; talvez que nele o coração já não funcione regularmente. Aliás, o que nos outros passaria desapercebido, fica sendo muito notado em Maximino. Ele porém, tem horror às palavras levianas, de sentido duplo. Vê-se que o seu coração permaneceu digno da Virgem SSma. e não se manchou de modo nenhum.

Pois bem, o coração é tudo; e ao meu ver, todas as outras imperfeições de Maximino constituem evidente confirmação do milagre de La Salette" (154).

Esse camarada militar de Maximino teve ocasião providencial de destruir um falso levantado contra o vidente, acusado de ter sido expulso do exército do Papa, por embriaguez e violência contra um sargento.

Quando já Padre Jesuíta, esse camarada, encontrou--se com o cabo que presenciou o incidente e por escrito deu-lhe declaração atestando que o agressor fora o sargento, que Maximino não estava ébrio, mas tão somente com um movimento involuntário, jogou por terra a condecoração do sargento (155).

Outro caso: - Na época em que Maximino estava hospedado em casa do Pe. Champom, achando-se este na reunião do clero, uns fizeram-lhe observar cuidasse mais do seu hóspede, pois Maximino, na ausência dele, fora após uma noite de “farra” encontrado na rua completamente ébrio, proferindo palavras ofensivas.

- É certo? e quando foi isso? perguntou o Pe. Champom.

- Foi quarta feira de manhã, a semana passada na praça Grenette; e toda a cidade de Grenoble é testemunha.

- Pois bem! na semana passada, Maximino esteve sempre comigo! e quarta-feira de manhã, ele ajudou minha missa no santuário de N. Sra. de Fourvière, em Lião e fez a comunhão" (156).

Assim as más línguas ou pessoas irrefletidas prejudicaram a reputação de Maximino, embora ele, não há negar, tenha tido as suas fraquezas, sendo a maior, alguns exageros na bebida, por vezes involuntários, porque malvados, para conhecer o seu segredo, enchiam-lhe o copo com mistura; aliás ele sempre franco e leal confessou essas fraquezas.

Por certo, o leitor notou os dizeres do soldado a respeito da pureza de costumes de Maximino. O Pe. Perrin, seu colega no seminário e sempre seu amigo, a quem Maximino recorria nas horas de desamparo, atesta: “Nunca deixou de ser irrepreensível, no ponto de vista dos costumes". Igual testemunho deram os ami­gos deles em Roma, em Paris, em Corps. Miseráveis houve que lhe armaram ciladas, foi debalde. Não sendo nem padre, nem religioso, poderia casar-se mas dizia: "Quem viu a Virgem Santíssima, não pode apegar-se a criatura nenhuma" (157).

No entanto, a ideia dum casamento atravessou-lhe a mente, mas exclusivamente no intuito de ter um arrimo na vida, pois escreveu a quem estava ao par do projeto: “Eu muitíssimo preferia ficar assim como estou, com rendimentos fixos inalienáveis, como é o caso dum soldado ou dum funcionário aposentado" (158). O médico que lhe embalsamou o coração e o tinha conhecido em Paris, estudante, declarou: "Bebeu alguns copos de vinho, mas que ninguém ouse censurar-lhe outra coisa, pelo menos." O Dr. Peytard, médico em Corps,. a pessoa que o foi procurar para liquidar os honorários pelo tratamento do vidente, declarou de modo categórico: "Maximino morreu sem ter tido nada com mulher" (159).

(150) Nortet, N. D. de La Salette, Pag. 39 - Bibl. 58.

(151) Manuscritos do Pe. Bossam. Set.1871.

(152) P. Bossa:a a quem Ale confessou esses fatos. Bibliografia 3.

(153) Maximin peint par lui-même, Ver Bibliografia 59.

(154) Souvenirs des Zouaves Pontificaux, recueillis par Henri K.erguenec, Paris, 1981.

(155) Histoíre de La Salette - Carlier pág. 218, nota 1. Bibliografia 68.

(158) Manuscrito do P. Champom no arquivo dos Miss. de N. Sra. de La Salette. citado pelo Pe. Carlier, pag. 207, do livro acima.

(157) Carlier, pág. 217.

(158) Carta a Sa. Sorbets de 28 de Nov. 1873, em "La Grace de La Salette" , pelo P. Javeu M. S., p. 217, Bibliografia 73.

(159) Histoire de l'Apparition de N. D. de La Salette, pelo P. Carlier, p. 217 a 222.

 

CAPÍTULO TERCEIRO

MAXIMINO DEFENSOR DA SANTA APARIÇÃO

Sempre e por toda a parte, Maximino, a respeito da Aparição, não somente nunca vacilou, mas, pelo contrário, prontamente levantou-se em defesa do sobrenatural acontecimento, por palavra e por escrito, com a máxima energia e brilhantismo. Mencionemos uns casos.

Levado pelo Pe. Rabilland à romaria de S. Francisco Regis, lá se encontrou com 25 padres jesuítas e mais 20 outros padres. Pois bem! Eles todos juntos, como que em renhido torneio, se esforçaram por fazê-lo cair em contradição e tiveram de confessar-se vencidos, tão bem ele respondeu a todas as perguntas e apresentou os esclarecimentos necessários, ficando todos compenetrados de santo respeito pela Aparição.

Maximino foi mais valoroso defensor da "Bela Senhora" por escrito. pois ele publicou, em 1868, uma brochura de 72 páginas, in octavo, intitulada: "Minha Profissão de fé sobre a Aparição de N. Sra. de La Salette”.

Foi por ocasião dum breve artigo, na revista leviana: '"Vida parisiense" (160) em que um articulista inescrupuloso asseverava: "0 homenzinho de outrora, agora já adulto, não acredita mais que o milagre tenha acontecido.

Quiseram interná-lo no seminário, mas sendo pouco ortodoxo, tiveram que entregá-lo ao mundo leigo. Presentemente uma sociedade de piedosas damas adotou o filho do milagre e todas em família acalentam a pequena serpente. É gostoso ver como cai na gargalhada cada vez que, por acaso, vê o grupo de gesso onde ele está perante a Virgem vestida como uma roceira... "

-Imediatamente Maximino respondeu, estranhando antes de tudo a linguagem dum mal educado e prosseguia: ' "Sou um homenzinho. nunca tive pretensão de ser pessoa de importância. Porque não abracei a vida religiosa, alguns julgaram que eu desmentia meu primeiro testemunho e estão me atribuindo uma incredulidade que eu repilo com toda a energia da minha consciência. Para que de hoje em diante ninguém me acuse de incredulidade a respeito do fato de La Salette, por 1846, meio destes verbos: "contam, dizem, asseveram", eu, testemunha da Aparição de 19 de setembro de muito conhecida pelo nome de N. Sra. de La Salette, hoje, Já grande, com trinta anos de idade, no completo uso das minhas faculdades, livre e independente, afirmo que, bem longe de não acreditar no que vi e ouvi, na Santa Montanha, estou pronto a dar minha vida, para sustentar e defender a verdade desse grande acontecimento. Espero com a graça de Deus e auxílio da Virgem SSma., invocada com o título de N. Sra. de La Salette, que não serei covarde se a ocasião se apresentar.

Tive de rir-me por causa do invento duma sociedade de Senhoras que me acalentariam, pois o engano é mesmo engraçado: o articulista confundiu um batalhão de soldados pontifícios com uma sociedade de senhoras. Diante de um grupo de La Salette, que não é, por acaso ''que eu vejo", pois tenho esse grupo no meu quarto, trago comigo uma medalha de N. Sra. de La Salette e um relicário com um pedacinho da pedra onde Ela se sentou.

Perante esse grupo, em vez dum indecente rir de que falam, reverente me inclino com sentimento de humildade pela graça que Ela fez a mim, pobre pastor, e nos perigos e provações à minha relíquia eu recorro. O articulista demonstra completa ignorância dizendo que Melânia é minha irmã; em mais de vinte livros já se lê que entre nós não há nenhum parentesco e apenas nos conhecemos na véspera da Aparição". A vida Parisiense achou-se na obrigação de publicar a 6 de janeiro de 1866, o seguinte: “No nosso número de 11 de nov. publicamos um artigo a respeito do Pastor de La Salette. O Sr. Maximino Giraud julgou que nela havia imputações próprias para prejudicar a sua reputação de homem honesto e católico. Muito ele se sentiu ferido pelo ataque à sinceridade do seu testemunho que ele deu perante as autoridades administrativas. Judiciárias e religiosas e multidões de pessoas. Declaramos aqui, com a máxima boa vontade, que não tivemos intenção de ofendê-lo e reconhecemos que as informações apresentadas são exatas.." A resposta de Maximino constitui, um livrinho de 72 páginas que é um resumo esplêndido da argumentação com todas as provas e respostas às objeções dos relatos de milagres que tomam a Aparição de Maria SSma. em La Salette um fato indiscutível. Nem sequer fica esquecida uma suposta alucinação. “Ora, escreve ele, deixem de ofender essas crianças, tratando-as de impostores ou de idiotas, escrevendo: “Cuidaram ver o que não existia". Pois então! Melânia e eu fomos acometidos no mesmo instante da mesma alucinação e, coisa muito esquisita, nossos ouvidos e nossos olhos enganados nos fizeram ver coisas e escutar palavras idênticas!... Essa doença repentina, que nada tinha anunciado, seria tão extraordinária quanto o fato recusado".

Maximino dedicou o seu livro a N. Sra. de La Salette: "SANTÍSSIMA · VIRGEM MARIA IMACULADA DE LA SALETTE" - permiti que eu deposite aos vossos pés estas poucas páginas; fazei, hoje, que já sou homem, que a minha voz seja tão pura, tão verídica como no dia 19 de setembro de 1846, quando desci da vossa Santa Montanha para anunciar, a todo o vosso povo, a grande nova de que vos dignastes de me encarregar.

Eu vos suplico e vos imploro, ó Santíssima Virgem Maria, invocada com o título de N. Sra. de La Salette, concedei-me, até morrer, a graça de confessar vossa Aparição, como todas as testemunhas da Igreja fizeram para a divindade de N. S. Jesus Cristo."

(160) Vie Parisiense - 11 de novembro de 1865.

 

CAPITULO QUARTO

PIEDOSA MORTE E TESTAMENTO DE MAXIMINO

Vê-se claramente que Maximino era sincero devoto de N. Sra. de La Salette, a quem ele se dirigia como um filho à sua Mãe, com toda a candura e simplicidade.

Costumava dizer diariamente o terço. em sua honra, por vezes foi surpreendido prestando esse tributo de amor em horas adiantadas da noite, antes de seu repouso.

Maximino nunca se afastou da prática religiosa, recebendo os sacramentos. Quando era soldado na fortaleza perto de Grenoble, descia todos os meses para confessar-se com o Pe. João Berthier, missionário de N. Sra. de La Salette, fato que esse padre anotou no seu livro "As Maravilhas de La Salette" (161).

Ficou fiel a Deus e à Virgem de La Salette até sua piedosíssima morte, que passamos a narrar pelos: "Anaes de N. Sra. de La Salette", de Abril de 1875.

“Dum ano para cá, Maximino Giraud sofria uma doença que todos, ele mais do que outros, julgaram logo muito grave. "Vou; escreveu, (162) rezar bastante à Virgem SSma. para que me auxilie e me faça morrer conforme o seu coração. e possa vê-la de novo no céu; é tôda a felicidade na terra e todo o gozo no céu". Ia fazendo novenas à Virgem, comungando nos dias das suas festas; Pedia que o seu confessor viesse· frequentemente visitá-lo. Esse padre declara que a sua doença (reumatismo que lhe atingiu o coração), foi ocasião de ele manifestar a fé mais viva, renovando frequentemente atos de resignação e abandono à vontade de Deus.

No começo de Novembro de 1874, experimentando umas melhoras, pediu que o levassem à Santa Montanha onde ele fez a narrativa da Aparição pela última vez.

"Ficamos sob o encanto da sua palavra por mais duma hora, enquanto ia apresentando todas as circunstâncias nas suas minúcias "que eu vos confio, dizia, por ser o meu dever" (163).

Em primeiro de Março de 1875, a morte "conforme o coração da Virgem SSma" foi-lhe concedida. Após uma última oração a S. José, escreveu o seu Vigário, (164) pelas cinco horas, Maximino deu sua alma a Deus. Teve morte de piedoso cristão, cinco minutos após ter recebido, das minhas mãos todos os socorros da religião, com a maior fé e perfeita resignação. Assim como antes da sua confissão, tinha bebido com piedosa sofreguidão, vários goles da água de La Salette, bebeu também com a mesma pressa para poder engolir a Sagrada Hóstia, e foi sua derradeira bebida e suprema afirmação do fato da Aparição que tivera missão de anunciar ao mundo em nome da Mãe de Deus.

Fizemos-lhe enterro com toda a solenidade possível, com a presença de seis padres e acompanhamento de quase todos os habitantes de Corps."

(161) Les Merveilles de La Salette, p. 13.

(162) Carta a Mime Sorbets, 28 Nov. 1873.

(183) Carta da Superiora das Religiosas, consignada nos Anais de La Salette. Abril de 1875.

(164) Carta do Padre Furzier à Sra. Sorbets, 12 Março de 1875, citada pelo P. Javen. Grace de La Salette, p. 225.

 

TESTAMENTO DE MAXIMINO

"Em nome do Padre e do Filho e do Espírito Santo. Assim seja. Eu creio em tudo quanto ensina a Santa Madre Igreja Católica, Apostólica, Romana, em todos os dogmas que definiu o Nosso Santo Padre o Papa, augusto e infalível Pio IX.

Creio firmemente, até com preço do meu próprio sangue, na célebre Aparição da Virgem Santíssima na Santa Montanha de La Salette, no dia 19 de Setembro de 1846. Aparição essa que eu tenho defendido por palavras, por escritos e por sofrimentos.

Depois da minha morte, ninguém ouse asseverar e dizer que me ouviu desmentir-me a respeito do grande acontecimento de La Salette, pois mentindo à face do universo, esse mentiria a si próprio. Com esses sentimentos, eu dou o meu coração à N. Sra. de La Salette" (165).

Como vimos, o coração de Maximino repousa no Santuário da Santa Montanha. Diante da beleza cristã duma tal morte e tão enérgica afirmação à beira da sepultura, que valor teriam ainda as poucas fraquezas em sua movimentada vida? Curvemo-nos reverentes perante a memória do escolhido de Maria Santíssima.

 

CAPITULO QUINTO

CARREIRA DE MELANIA CALVAT (1891· 1904)

Histórico panorâmico de sua vida

Nasceu Melânia, na vila e decanato de Corps, no Delfinado, França, no dia 7 de Novembro de 1831. Teve 5 irmãos e 2 irmãs. Sendo de família paupérrima, os seus pais tiveram de empregá-la como pastorinha, apenas com 8 anos de idade, em várias localidades da circunvizinhança, achando-se ela, 6 meses antes da Aparição, em casa de Batista Prá, na paróquia de La Salette.

A 19 de Setembro de 1846, recebeu junto com Maximino Giraud, a grande graça de ver e ouvir a Maria SSma. sendo ela mais favorecida que o menino na visão, pois só ea pôde contemplar completamente o rosto de N. Sra.: "Eu bem vi, dizia ela. que estava chorando e como corriam as suas lágrimas."

Depois da Aparição, a vovó Prá quis guardá-la consigo: “Fica conosco pequena, eu cuidarei bem de ti", contou Melânia. Mas só foi até Dezembro porque o pai da menina já não podia mais dispor dela, devido às inúmeras pessoas que se apresentavam para interrogá-la.

Pelos fins de Novembro de 1846, Maximino e Melânia achavam-se na Santa Montanha com certas pessoas desconhecidas, que diziam interessar-se por eles, propondo às crianças que as acompanhassem pois se encarregariam da sua educação. Na realidade, porém, tinham o intuito de explorá-las.

Melânia falou de noite com seus patrões, que, gente simples, acharam o projeto bom, uma fortuna! Desceu, pois, Melânia a Corps e com Maximino preparou-se para seguir viagem.

Mal os pais das crianças tiveram tempo, após breves reflexões, de correr para impedir a triste aventura. Ao par do caso, o vigário Pe. Melin escreveu ao bispo de Grenoble, D. Bruillard, que ''para evitar semelhantes perigos, resolveu matricular Maximino como externo, e internar Melânia no Colégio das Irmãs da Divina Providência, mesmo em Corps". Assim narra o P. Hostachy na sua História Secular de La Salette, página 114.

Nesse internato, onde permanecei até outubro de 1851, Melânia aproveitou bastante. "Notei nela grande transformação e progresso, a ponto de querer ser religiosa da Divina Providência", escrevia a Sta. Des Brulais no seu Eco da Santa Montanha, p. 18.

Por esse motivo, ela foi enviada à casa Matriz da Congregação situada em Corenc, nos subúrbios de Grenoble, onde ingressou primeiro como postulante e depois como noviça, recebendo o nome de soror 'Maria da Cruz.

Durante o noviciado, foi professora na escola primária gratuita anexa ao convento, desempenhando bem o seu cargo, mantendo a disciplina "conseguindo ensinar aos alunos o que ela não sabia", na espirituosa expressão do nosso conhecido Sr. Similien (166). Queria "ser missionária para ensinar às pequenas pagãs."

Apesar disso, o bispo D. Ginoulliac, por achar que ainda não adquirira suficientemente "a virtude da renúncia a si própria, por causa de certas singularidades, e para que se formasse melhor na humildade, não admitiu "Melânia à profissão religiosa" (167).

"Estando Melânia com a saúde um tanto abalada, por doença do estômago, escreve o sr. Similien, o bispo mandou-a tratar-se na casa das Irmãs de São Vicente de Paulo, na relativamente próxima cidade de Viena, onde mais facilmente poderia seguir as prescrições médicas. Demorou-se nessa casa, umas três semanas e, obtendo licença da sua Superiora, com quem se mostrou muito aborrecida, foi de romaria à N. Sra. de La Salette, a 10 de Maio de 1854 com ordem de ficar na residência de Corps. Aí devia esforçar-se por adquirir de fato a virtude de humildade. Em Corps teve caridosa acolhida por parte das suas antigas Mestras.

Nessa casa. esteve em contato com jovens camponesas irrefletidas e de educação e instrução inferiores à sua, que chegaram a ponto de fazer-lhe notar a sua condição incerta, por ter entrado sem dote na Congregação, e recordar-lhe que ela era de família muito pobre, como todos estavam vendo. Melânia sofria imenso" (168).

Inesperadamente, nessa época, um Prelado inglês, Mons. Newsham, vindo para festejar em La Salette o oitavo aniversário da Aparição, teve ocasião de conversar com Melânia e, compadecido, propôs-lhe levá-la por algum tempo à Inglaterra, com autorização de D. Ginoulliac, Autorização essa concedida por carta comunicado pelo Superior dos Missionários de N. Sra. de La Salette. Melânia consentiu com alegria (169).

Tratava-se duma simples viagem. Mons. Newsham colocou Melânia, como pensionista, em Darlington, num convento de Carmelitas. Ficando cativada pela vida austera das Filhas de Sta. Teresa, Melânia solicitou e obteve o favor de ingressar no convento, recebendo o hábito religioso a 25 de fevereiro de 1855 e, depois de mui satisfatório noviciado, fez a sua profissão religiosa em Fevereiro de 1856 (170).

O próprio capelão do convento, por ocasião duma romaria a N. Sra. de La Salette, na primavera de 1857, declarou aos Missionários de N. Sra. de La Salette que ela era uma boa religiosa.

Ou por saudade da Pátria, ou por motivo de saúde, Melânia quis absolutamente voltar para a França e foi para Marselha, onde morava sua Mãe, a 24 de Setembro de 1860 (171).

Nessa cidade ela se relacionou com a Congregação das Irmãs da Compaixão, recentemente fundada pelo P. Barthés S. J., que consentiu admiti-la, com a condição formal de que ela não revelasse a sua qualidade de vidente de La Salette, sendo apenas conhecida como ex--carmelita vinda da Inglaterra.

Solicitou Melânia do P. Barthés o favor de, pelo menos, escolher uma Irmã, a quem pudesse filialmente confiar-se, sendo determinada para essa missão a Madre Maria da Apresentação, que, de fato, durante anos, foi sua fiel companheira.

Sendo essa Madre nomeada superiora dum orfanato, numa ilha do Mediterrâneo, Melânia a acompanhou; tanto uma como outra, porém, não davam para semelhante obra e voltaram para Marselha.

Entrementes faleceu o R. P. Fundador, sendo Superior eclesiástico da Congregação, o P. Guid, vigário Geral. Este autorizou Melânia a entrar no noviciado, porém novamente com a condição expressa de ocultar a sua qualidade de vidente. Encarregada do catecismo na paróquia de Montalivet, Melânia, com a melhor das intenções, revelou ao Vigário, P. Forcade, o que ocultara até então por ordem superior. Logo esse Vigário tratou de estabelecer na sua paróquia recentemente instalada, no intuito de aumentar o movimento religioso, a devoção â N. Sra. de La Salette. Sabedores do fato os superiores decidiram que Melânia não poderia mais ficar na congregação, conforme fora entendido (172). A Madre da Apresentação, alegando que o venerando fundador lhe confiara Melânia, obteve de D. Place, bispo de Marselha, autorização de acompanhar a vidente, o que cumpriu fielmente até o ano de 1884.

Ambas foram em romaria a N. Sra. de La Salette de 15 a 18 de Abril de 1867, onde tiveram ótimo acolhimento por parte dos Missionários. No decorrer desses acontecimentos, vieram a Marselha, uns bispos expulsos do Reino de Nápoles pelos revolucionários de Garibaldi. Entre eles Mons. Petagna, bispo de Castellamare, perto de Nápoles, o qual se tornou diretor espiritual de Melânia. Precisamente, durante a romaria da sua dirigida, ele voltou para sua diocese, onde recebeu carta de Melânia expondo-lhe a sua aflitiva situação. Compadecido, D. Petagna, por intermédio de D. Ginoulliac, bispo de Grenoble, comunicou-lhe que as receberia com agrado em Castellamare, onde elas chegaram a 21 de Maio de 1867 (173).

Melânia, confiada à direção espiritual do cônego Zola, nomeado em 1876, bispo de Ugente, e transferido em 1880 para a diocese de Lecce, ensinava as pequenas italianas, só se ausentando rapidamente em 1871 para ir à La Salette e para uma estada em Roma no inverno de 1878-1879. Devido à doença da Madre da Apresentação, ambas a 22 de Agosto de 1884, estavam de volta à França. O santo Padre, escrevia Melânia em 16 de Junho, lastima que eu me afaste de Castellamare; mas atendendo aos motivos por mim apresentados, S. Santidade autorizou-me a ir para a França, recomendando-me grande prudência e discrição''.

A Madre da Apresentação após a sua romaria N.Sra. de La Salette, quis levar a sua companheira consigo a Marselha, mas a mãe de Melânia; já velhinha e doente; pediu que a sua filha ficasse com ela em Corps.

Levando, no começo de 1885, sua mãe para o sul da França, Melânia tratou dela, com todo o carinho, até primeiro de Dezembro de 1889, dia em que a morte lhe arrebatou a progenitora.

Achava-se, havia dois anos, em Marselha, quando em 1892, D. Zola, seu antigo diretor espiritual, convidou Melânia para ir morar em sua diocese. Anuiu a vidente e lá se hospedou em casa de Religiosas, até Junho de 1899, data em que voltou para a França. Ficou na terra pátria, indo várias vezes a La Salette, até pouco tempo; antes do seu falecimento.

Com efeito, pelos meados de 1904, ela se achava· em Altamura, no sul da Itália, hospedada uns meses em casa de religiosas. Depois transferiu-se para um pequeno quarto, sob a bondosa proteção do bispo D. Cecchini.

Todas as manhãs ela ia fielmente à catedral, ouvir missa, e depois recolhia-se à sua humilde moradia. Não a vendo no dia 15 de Dezembro, D. Cecchini, mandou saber dela. Sendo encontrada a porta trancada, as autoridades civis vieram e acharam Melânia morta (174).

Em carta circular de 8 de Dezembro de 1904. o Rvmo. Pe. José Perrin, Superior Geral, comunicou à Congregação dos Missionários de La Salette o seguinte: "Essa santa Moça, tinha se transferido, há 6 meses, para Altamura, na província de Bari, Itália, onde edificava o povo cristão daquele país pela sua profunda piedade e sua frequência à igreja e à Mesa Sagrada, eis quando foi encontrada morta no seu quarto, vitimada por uma sincope, no dizer dos médicos. A povoação fez-lhe magníficas exéquias, oficiando o bispo de Altamura, rodeado do Cabido da sua Catedral. É nosso dever, Missionários de N. Sra. de La Salette, não esquecer essa alma que compareceu perante o tribunal de Deus. Nesse intuito, pedimos a todos sejam feitas em suas residências exéquias solenes, ou pelo menos se celebre a santa missa onde o pessoal não for suficiente para atos mais solenes" (175).

(165) P. Carlier, Histoire de l'Apparition de La Salette, p. 225 Bibli. 66

(168) Pelerinage à La Salette. Bibliografia 25.

(167) Carlier, História, pás. 195, 196 e 191. D. Ginoullac, Carta Pastoral de 4 de Nov. 1854.

('168) Carlier, p. 197. Ver P. Javen, Grace "de Ia Salette, p. 232.

(169) Carlier, pág. 198, citando Des Brulais Suite de L'Echo de la Sainte Montagne.

(170) P. Hostachy, pág. 133 e Carlier, 198, 199.

(171) Acostumada à vida livre da Montanha "a vida de solidão do Carmelo não lhe agradava e a sua nostalgia aumentou particularmente depois da visita da sua irmã MARIA". Carta da M. Superiora.

(172) P. Carlier. Histoire de l'Apparition, p. 199.

(173) P. Jauen, La Grace de La Salette, p. 234. Bibliografia 75.

(174) No mesmo, p. 235.

(175) .P. Hestachy, Histoire Séculare de La Salette, p. 154.

 

CAPÍTULO S E X T O

UM PALADINO DESACERTADO DE MELÂNIA

LÉON BLOY

§ 1o - Sustentando erros

Estamos receosos de que o histórico apresentado acima, tenha deixado o leitor de fôlego perdido, tão rápida se realizou a nossa viagem de um convento para outro, andando por vários países. É necessário portanto que de novo percorramos com mais vagar, pelo menos algumas etapas, de modo a conhecer mais a fundo a vidente, e encontrar alguma razoável explicação dessa vida de tanto movimento e tantas inconstâncias.

Preliminarmente, julgamos oportuno nivelar o caminho e remover uns escombros, isto é, afastar os erros, embora sustentados com talento e persistência. Aludimos particularmente a Léon Bloy e por via de consequência, a quem dele intelectualmente depende.

Em parte anterior deste livro, temos aduzido fatos que comprovam claramente que Léon Bloy, desde o dia em que acolheu a Nossa Senhora de La Salette "em seu coração, como brasa ardente", tornou-se direta ou indiretamente, instrumento dessa Virgem Reconciliadora dos pecadores, para conduzir ou reconduzir ao Cristo e à Igreja, almas de altíssimo valor.

Homem realmente talentoso, escreveu frases admiráveis e candentes de fé e de amor sobre as lágrimas de Maria na sua Aparição, particularmente em "Symbolisme de l"Apparition", e em "Celle qui pleure" (176).

Aqui vai uma dessas frases: "Lágrimas de N. Sra. de La Salette, tão belas de desalentar a poesia e de fazer morrer a imaginação do homem. Assemelham-se às doze pérolas do Apocalipse, que são as doze portas da Jerusalém celestial, pelas quais é mister passar para alcançar a morada das eternas Bem-aventuranças. Talvez sejam as lágrimas de sua Mãe que antecipadamente Nosso Senhor tinha perante os olhos quando em seu Evangelho fala dessas pérolas preciosas que o homem de negócio adquire com tudo o que possui e que o divino Mestre compara com o reino dos Céus" (177).

É inegável que em "Aquela que chora", há belezas arrebatadoras, mas não deixa porém de ser um fato que Léon Bloy, devido à particularidade do seu espírito, nesse livro, erguendo-se qual desacertado paladino de Melânia, exaltando-a em demasia, acumulou muitos erros e levantou umas tantas falsas acusações.

Bem quiséramos lançar o véu do silêncio sobre essa memória de tanto brilho. Aos nossos ouvidos, porém, chegaram e ainda chegam numerosas vozes, até da longínqua Argentina, devido à tradução desse livro em idioma castelhano, vozes essas a clamarem que os escritos de Léon Bloy perturbam os espíritos, obscurecendo o grande Acontecimento, e abalam as almas em sua crença na santa Aparição, de modo que seria crime calar.

Vamos portanto, sem. acrimônia, com tôda calma, expor os fatos, tão eloquentes em sua simples realidade que não há talento que lhes supere a força. Antes de mais nada vai aqui esta anotação do R. P. Jauen, M. S., (178) no seu livro "La Grace de La Salette", pág. 231, nota: A autobiografia (de Melânia), que Léon Bloy se incumbiu de divulgar, exigiria infindas discussões críticas. Em que medida ela é obra de Melânia? Em que medida de Francia (179), lá em Messina, e de Combe aqui mais perto em Diou contribuíram nessa obra por meio de sugestões e retoques?A vidente escrevia: “0 Sr. Combe vai tratar de coordenar esses vários escritos numa só vida" (180).

Numa outra ocasião dirigindo-se ao mesmo: "Recordo que o sr. Vigário Combe disse: Quando. tiverdes terminado o vosso trabalho, será preciso destruir todas os outros escritos" (181). As reações de Léon Bloy a certos modos de proceder de Combe devem ser notadas. O informante recusa-lhe os documentos por· ele pedidos; no entanto não desconfia, admira-se, tão somente, da temeridade de Combe em substituir-se a ele como historiador de Melânia. "Esse infeliz. Combe, incumbe-se de- muita coisa, e seu erro me faz tremer. Não pode ignorar que eu fui muito particularmente designado e que ele está ocupando o meu lugar com injustiça. É portanto prevaricador sciens et prudens (com conhecimento de causa). Isso não é para espantai!? O historiador que pretende substituir-me, não sendo o escritor superior que fora necessário para que essa vida extraordinária seja aceita por cristãos dum nível intelectual mais elevado", será o fracasso supremo e completo, a exterminação definitiva de Melânia, que será acusadora, a acusadora diante de Deus, daquele que ela chamava. pelo nome de pai" (182).

E mais abaixo: "O P. Combe é um homem que não quer humilhar-se e que, por castigo, Deus priva de inteligência. Estou resolvido, hei de publicar o que possuo com uma introdução e nada mais" (183): Em "Celle qui pleure" (Aquela que chora) pág; 135, 136, Léon Bloy escreve: "Essa menina privilegiada, muito antes de 1846, foi visitada pelo Céu”, e que "A grande aparição de 1846 não passava dum episódio da sua infância". Foi, diz o seu futuro historiador que não ma compete nomear, cumulada, já com a Idade de três anos; dos dons sobrenaturais mais estupendos. Ensinada pelo menino Jesus, ela escondia essas graças…; os seus próprios diretores só lhes conheciam uma parte.

Em suas "montanhas" chamavam-na de santinha. Ela tinha os estigmas (sacros), não estranhava, parecendo acreditar que era assim para todos os cristãos... coisa dum sublime o mais aterrador. Melânia recebeu a comunhão frequentemente do próprio Nosso Senhor… Ela via tudo na Luz de Deus..."

Esses dizeres encerram em si a sua refutação; em todo o caso tão totalmente opostos às afirmações das testemunhas da época que viram e ouviram a Melânia .

Recorda o leitor, que o rapaz da família Prá exclamou "Ela que nem faz a sua oração”, - "Afirmaram-nos, que antes de 19 de Setembro de 1848, ela só foi duas vezes aos exercícios religiosos do paróquia" (184).

Ao seu guia, camponês da região, Des Brulais, perguntava: "Melânia conhecia um pouco o religião, quando viu a Santíssima Virgem! - Nada demais! rindo.

Dizem que nem sabe fazer direito o sinal da cruz. Então não tinha feito a primeira comunhão? - Impossível, não tinha inteligência suficiente para estudar uma página de catecismo" (185).

Esta dificuldade bem verificaram as· Irmãs que levaram 18 meses para prepará-la à primeira comunhão.

A própria vidente respondeu a Nossa Senhora que bem pouco fazia oração. "Fazeis bem a vossa oração, meus filhos? - Bem pouco , Senhora. dissemos. Os dois?

- Sim. Juntos? - Sim" (186).

Finalmente existe uma carta de Melânia onde lê-se: “Não sou mais tanto atormentada pelos senhores meus operários (os demônios), parece que estão descansando; porém eu não os imito - também não é justo que a última das criaturas, aquela que somente começou a rezar a Deus com a Idade de quinze anos (187), sofra mais que os outros".

Parece-nos que o caso é claro. Até o dia da Aparição não foi privilegiada sobrenaturalmente, portanto o grande acontecimento não foi um episódio nesses privilégios, mas fato completamente novo em sua vida.

(176) Aquela que chora.

(177) Symbolisme de l'Apparition (Simbolismo da Aparição), p. 169, 173.

(178) Esse Padre afirma no seu livro, p. 263, que ele leu um milheiro de cartas de Melânia e quase todos os escritos dos partidários dela referentes a questão do segredo etc.

( 179) São correspondentes de Melânia ou seus diretores espirituais.

(180) Carta ao Conêgo Brandt, 8 de novembro de 1.900, citada pelo Pe. Jauen no livro "La Grace de La Salette", p. 231, nota 2.

(181) Carta de Melânia ao mesmo, 1 de Janeiro de 1901. Essa ordem torna Combe muito suspeito, pois com isso não seria mais possível controlar o seu livro pelos originais.

(182) Pélerin de l'Absolu, p. 78 (0 Peregrino do Absotuto) que é o livro, por assim dizer das Memórias de Léon Bloy.

(183) Léon Bloy publicou o seu trabalho na revista ''Mercure de France".

(184) Cônego Bez - Pélerinage à La Salette, p. 20. (marla a La Salette, p. 20) - Bibliografia 18.

(185) Srta. Des Brulais em "Echo de la Sainte Montaigne", p. 20. Desse livro, Léon Bloy escreve: "Não existe livro mais recomendável sobre os inícios de La Salette" (em "Celle qui pleure". página 149, nota.

(186) Notas Lagier, em ''L'Apparition de La Salette", III p. 115- Bibliografia. 14.

(187} Corenc (convento onde estava Melânia) 16 de Março de 1854, em P. Jauen. livro citado, p. 231. - Debbreu e Girard publicaram essa carta. Ora Léon Bloy diz.: "As religiosas de Corenc puderam observar que essas graças não cessavam" . Em "Celle qui pleure", pag. 135.

 

§ 2o - Formulando falsas acusações

Comentando as palavras de Maria SSma., Léon Bloy escreve: "Os dois braços de meu Filho foram pregados (na cruz), mas um é suficiente para vos esmagar, esse eu já não posso mais suster, de tão pesado que é!

Ah! meus filhos, se vós vos convertêsseis! Homens então levantaram-se que tinham a mitra na cabeça e que tinham em suas mãos o bastão dos pastores do rebanho de Cristo. Esses homens disseram a Nossa Senhora: - Basta, não é? Taceat mulier in Ecclesia! (Cale-se a Mulher na Igreja). Nós somos os bispos, os doutores e não precisamos de ninguém, nem sequer das pessoas que estão em Deus. Aliás somos amigos de César e não queremos tumulto no povo. As vossas ameaças em nada nos perturbam e vossos pequenos pastores de nós só conseguirão, mesmo em sua velhice, desprezo, calúnia, escarnio, zombaria, miséria, exílio e finalmente o esquecimento.

A esperança da presente obra é fazer reparação de algum modo, se ainda estamos em tempo, pela sacrÍlega perfídia desses Caifás, desses judeus, que destruiram, há bem sessenta anos, o mais belo reino do mundo" (188).

Nada acrescentaremos, magoado por tão injusta e violenta linguagem. Limitamo-nos a relembrar o que em parte anterior deste livro aduzimos, para comprovar quanto foram e ainda são incansáveis, enérgicos e sábios os Exmos. Srs. bispos, pastores do rebanho de Cristo, na defesa, na explicação, na propagação da santa Aparição de N. Sra. de La Salette, que sem eles teria caí do no esquecimento, humanamente falando, apesar das ofensas recebidas no desempenho desse seu munus pastoral.

Volvendo-se particularmente contra D. Ginoulliac, numa nota da página 145, sem aduzir a mínima prova, ele, com palavras nada amenas, acusa esse Prelado de não ter admitido Melânia à profissão dos votos religiosos, porque ela negou revelar-lhe o seu segredo. Ora, D. Ginoulliac, como vimos, em carta Pastoral, apresentou publicamente os motivos. Na página 144, Léon Bloy, narra claramente que "aceitando o convite dum Monsenhor inglês, Melânia partiu com alegria para a Inglaterra, com autorização de D. Ginoulliac" (189).

Tratando os Exmos. Srs. bispos de tão desrespeitoso modo, Léon Bloy não deixaria de virar-se contra os simples sacerdotes. Foi especialmente contra os Missionários de N. Sra. de La Salette e depois da saída deles, tangidos pela perseguição religiosa, contra os Capelães diocesanos, seus substitutos na santa Montanha, que, sempre com termos ásperos, ele investiu no capítulo XXV do mesmo livro, por causa das hospedarias construídas para abrigar os romeiros, com as indispensáveis refeições por preços módicos que ele próprio aliás aproveitou.

Léon Bloy chegou em romaria à Salette, pela primeira vez, a 29 de Agosto de 1879. Por essa ocasião, Léon Bloy não apresentou queixa nenhuma contra os Missionários (190), pelo contrário, travou correspondência com dois deles, escrevendo uma carta ao P. Archier, superior, para lhe pedir documentos para um livro projetado sobre La Salette, e ao P. Brissault, para obter informações sôbre o falecimento dum seu amigo, Pe. Luiz Moidrey, morto e sepultado naquele mês na Santa Montanha. As investidas de Léon Bloy remontam à sua segunda romaria de 17 de Setembro a 14 de outubro de 1880. Nessa ocasião, surgiu um incidente entre ele e os Missionários de La Salette. O R. P. Perrin apresentou-lhe, sete dias depois de ter ele saldado as suas contas, novamente as suas despesas, dizendo que já tinha terminado a época das romarias, dando-lhe a entender claramente que ele devia retirar-se da santa Montanha.

Irritado, Léon Bloy escreveu logo com data , de 13 de Outubro de 1880, uma carta ao Pe. Barthiér, onde dizia: "… êsse modo de proceder ofende, tanto, mais que no mesmo instante foram dizer a minha parenta Mme. Roulé que também ela devia imediatamente saldar a sua conta... A presença dessa parenta que me acompanha e suas frequentes relações (rapports) comigo, circunstâncias essas que só podem escandalizar as pessoas que têm o pecado no coração, tem, provocado as mais imundas e injuriosas insinuações". Aqui, Gaetan Bernoville na página 214, do livro acima citado, nota: ·"Os entusiasmos de Léon Bloy e de Ana-Maria não se produzem sem algumas intimidades (privautés) que causam preocupações aos missionários de N. Sra. de La Salette; o P. Perrin, manda dizer-lhes que chegara o momento de partirem. Ele partiu ferido e trovejante".

Essa Ana-Maria Roulé, que ele chama de sua parenta na sua carta, era uma criatura com quem ele, solteiro, convivia (191). Na mesma carta, Léon Bloy, atribuindo a motivo de lucro, a ordem do Pe. Perrin, escrevia no final: "Eu desejara não me ver exposto às espantosas sugestões ·que o espírito do mal sopra no coração dos escritores que a injustiça fez sofrer e que podem usar do seu poder para se vingarem". Não admira que Gaetan Bernoville tenha escrito: "Os Missionários tornaram-se, aos seus olhos, vulgares “estalajadeiros", sobre os quais o panfletário descarregou largamente o azedume desse dia" (192). Com efeito, na págína 88 de "Celle qui pleure" escreveu: “Expulsos da santa Montanha os antigos missionários, levaram consigo a caixa, os vasos sagrados cobertos de joias, até o próprio diadema da Virgem SSma."

A verdade, nós bem sabemos, pois, lá estávamos, é a seguinte: Expulsos pela lei contra as Ordens Religiosas, que os despojava dos seus bens, os Missionários, para que tão preciosos dons não caíssem nas mãos do fisco, conseguiram, apesar dos perigos, confiá-los à grande abadia de São Maurício na Suíça, que os conservaria como um depósito sagrado. Houve quem :"levasse o caso à Santa Sé. Imediatamente, apesar dos mesmos perigos, trouxeram os Missionários de volta esses objetos. A Santa Sé examinou o caso e a Sagrada Congregação dos Religiosos enviou um prescrito ao superior Geral declarando: "Nada fizestes no passado senão o que é reto e profundamente de acordo com o espírito religioso: nihil nisi spiritu religioso funditus informatum”. - 29 de junho de 1912 - Pe. Hostachy, à pág. 426 do seu livro "Historia secular de La Salette", divulgou o texto completo.

Léon Bloy, no mesmo livro, pág. 146, 147, após ter contado que vira chegar em 1880 "um pobre e muito idoso mendigo, exausto pelas horas de subida, e pela neve terrível'' contando, conforme o regulamento (193) que eu não vi, com dois dias de hospedagem; mas o que eu bem vi, e vi até demais, foi o desespero, o humilde desespero do velhinho, dizendo um quarto de hora depois: ''Eles me deram uma sopa fria e me disseram que é preciso partir. Para não ser cúmplice dum assassinato, paguei-lhe embora muito pobre, três dias de hospedagem..." (194).

“A partir desse dia, continua, eu compreendi o que se passava nessa Montanha. Para ser franco, eu vi o espantoso espírito de avareza, desses pretendidos religiosos que deveriam ser mendigos, servos de mendigos, pois La Salette é, por essência e por excelência, uma romaria de pés no chão". Prossegue: "Desde a base à montanha não se pode subir suavemente a não ser com o diabo às costas. Os primeiros romeiros não se enganaram nem poderiam enganar-se. A estrada de agora não existia, e o serviço das mulas não estava organizado como hoje em dia. A Srta. des Brulais, que foi uma das primeiras testemunhas de La Salette..."

Ora, essa Senhorita, como consta dos seus livros, sempre subiu a lombo de mula e Léon Bloy igualmente; pois ele escreve, na página 18: "Após dez horas de estertores (na carruagem) a gente ficava entregue aos almocreves... Em certos lugares apeava-se para aliviar os animais".

Quisera ele (página 150) "que a hospedaria de La Salette fosse transformada em casa de Deus aprovisionada com abundância, onde o romeiro sadio seria servo dos pobres ou enfermeiro, se os cristãos dessem a centésima parte do que dão por força ao cobrador de impostos".

Quem não compreende que isso seria heroísmo contínuo, coisa impossível para a fraqueza humana? Léon Bloy em suas romarias, não ficou ao relento, pelas encostas da montanha; preferiu por três vezes aproveitar a hospedaria, como aproveitaram, quando lá chegaram Maximino e Melânia (195) de quem ele fala na mesma página. acrescentando: ''Maximino, que definhava na miséria, a poucos passos de sórdidos religiosos, que só existiam devido a ele". É falso. Pe. J. Perrin, frequentemente pagou os fornecedores de Maximino (196). Com os recursos da Hospedaria foram saldadas as contas do médico, do farmacêutico e do sepultamento de Maximino (197).

Com relação a Melânia ela escrevia de Nápoles ao R. P. Giraud, superior dos Missionários de La Salette:“Eu agradeço a vossa bondade, R. Padre. Espero que nossa divina Mãe se incumbirá de vos pagar a minha dívida (198). Ao mesmo “apresso-me em acusar o recebimento dos vossos dois bilhetes de 20 francos" (199).

- Assim por diante.

Em "Celle qui pleure'" Léon Bloy divulga um extenso documento em que Melânia narra prolongadíssimas audiências com o Papa Leão XIII que lhe teria dado ordem formal de ir à Santa Montanha, levando as Regras que Ele aprovava, para que tanto os Missionários como as Irmãs Religiosas, as adotassem e observassem imediatamente. Entretanto, a isso se opuseram o· bispo D. Fava e o Pe. Berthier, Missionário de N. Sra. de La Salette.

Quem conhece, mesmo de modo rudimentar, os tramites indispensáveis para a aprovação das Regras para religiosos pela Santa Sé e não ignora que nunca o Santo Padre dá sua aprovação a tais regras, antes que sejam estudadas por vários anos e aprovadas pela Congregração dos Religiosos, e que nunca o Santo Padre concede. audiências semelhantes: quem conhece esses trâmites concluirá que o narrado nessas páginas é simplesmente absurda invencionice. Com efeito esse documento (200) termina assim: “Por cópia conforme, 18 de Maio de 1904" - H. Rigaux - Vigário de Argouves.

Não se trata: pois. 'de documento original, mas duma cópia, com data em que Melânia estava recolhida em Altamura, poucos meses antes do seu falecimento.

Desse Rigaux a própria Melânia (201) a própria Melânia escreveu: ''Parece-me que o novo profeta se engana um pouco, mas deixemos.... Quem viver há de ver que não é como ele diz''.

E com isso, cai por terra também o que Léon Bloy afirma dos Apóstolos dos últimos tempos (202). Para eles eram as tais regras.

(188) Celle qui pleure, pág, 16, 17.

(189) Suite de l'Echo de la Sainte Montaigne, em P. Carlier, p. 188.

(190) No "Symbolisme de l'Apparition”, Léon Bloy externa-se com simpatia a respeito dos missionários de La Salette", escreve Gaetan Beruoville, em La Salette", Pág. 214 - Paris, 1946 - Bibliografia 75.

(191) A respeito dessa convivência fala por extenso Joseph Bollery. admirador de Léon Bloy no seu livro "Léon Bloy". Paris. 1947, I vol., páginas 309 e seguintes; e da romaria, páginas 445 a 452. A carta lê-se na pág. 451 – Bibliografia 64.

(192) No livro citado, págs. 214-215.

(193) Esse regulamento existe; nós, com centeas de colegas nossos, temos visto cumprir o preceito da hospitalidade; inúmeras vezes temos até ajudado a cumpri-lo.

(194) Toda a gente sabe que um mendigo errante, encontrando quem se interesse por ele, conta qualquer coisa para obter um dinheirinho. Afinal, Léon Bloy não viu nem ouviu ouviu os tais "eles", nem diz quem eram; baseia-se exclusivamente nas palavras do desconhecido.

(195) A respeito de Melânia, nós pessoalmente, em 1901 e 1902 presenciamos com que bondade e carinho ela foi acolhida. Acrescentamos que na hospedaria os preços são 40% mais em conta que alhures, nós ouvimos dizer por alguns romeiros, mesmo em 1949, por ocasião duma nossa viagem.

(196) Jauen, "La Grace de La Salette", pág. 219, bibliografia 73.

(197) Carlier, pág. 213, Histoire de l'Apparition de La Salette, bibliog. 66.

(188) Carta de 11 de junho de 1881 e carta de 14 de Setembro 1868 - em Carlier, pág . 202-203.

(199) Carlier, pág. 159 -198.

(200) Que Léon Bloy pretende ser do próprio punho de Melânia, pág. 159 de "Celle qui pleure".

(201) Carta. ao Cônego Brandt, 21 de Dezembro de 1898, em P. Jauen, pág. 240, Bibliografia 73.

 

§ 3o Léon Bloy e o “segredo de La Salette”

Chegamos finalmente ao assunto dum "Segredo de La Salette'' que Léon Bloy divulga em "Celle qui pleure'' incluindo na própria narrativa da Aparição, páginas 211 a 222. Ora, os últimos tempos já próximos, no entender dele, com terrificantes cataclismas e interpretações extravagantes da Bíblia, constituíam quase que a exclusiva preocupação de Léon Bloy, em 1879, ano esse da primeira publicação do tal segredo.

Na biografia (203) de Léon Bloy, lê-se: “Ana e Léon Bloy estiveram de volta a 16 de Outubro... (204). O que houve para os dois expectadores de acontecimentos sobrenaturais, no fim do ano de 1880 e todo 1881?

Parece que viveram isolados na contemplação dos gestos de Deus."

Com efeito o autor desde a página 309 até a página 434, salvo raros acontecimentos, narra largamente que ele e ela tinham visões, mergulhavam-se no estudo da Bíblia: isso pretendiam, com peculiar assistência do Espírito Santo, cujo próximo reino haveria de se implantar por meio de prodígios, e "conforme Ana Maria, escrevia Léon Bloy, o acontecimento de La Salette se refere de modo imediato à vinda do Espírito Santo (205)".

A última frase, demonstra que Léon Bloy devia forçosamente preocupar-se com o segredo de Melânia, admitindo qualquer texto sem o menor estudo crítico. Devido ao Decreto do Sto. Oficio que aduzimos quando tratamos dos segredos, limitamo-nos a notar que o Livro "Celle qui pleure" veio a lume em Setembro de 1907. Ora, o texto do segredo que aí se acha reeditado é precisamente aquele cuja divulgação, em 1879, fora reprovada, no dia 14 de Agosto de 1880 pela Congregação do Santo Ofício: “A Santa Sé viu com desagrado essa publicação e sua vontade é que os exemplares já espalhados sejam, na medida do possível, retirados das mãos dos fiéis (206); isso apesar da autorização (imprimatur) do bispo de Lecce. A Congregação do Index inscreveu como sendo proibidos dois livros sobre o 1o segredo de Melânia": O primeiro em 7 de Junho de 1901, o segundo em 12 de Abril de 1907, ambos da autoria do Pe. Combe.

Portanto Léon Bloy não acatou as ordens da Santa Sé, divulgando dentro de poucos meses o mesmo segredo.

Finalmente, ele (207) se queixa de que tanto os Missionários como os Capelães em suas narrativas da Aparição, querem que o anúncio dos castigos já se tenham realizado, dessa maneira "qualquer outra profecia referente ao futuro é frivolidade. Eu os ouvi apresentando estatísticas da Irlanda, França, Espanha, Polônia."

Ora, ele próprio transcreve as mesmas estatísticas, a título de comentário da mesma narrativa (208). No capitulo XII, pág. 71 e 72, Léon Bloy pretende que o clero não quer aceitar e divulgar o suposto segredo de Melânia, porque censura a impiedade e o procedimento vergonhoso dos padres, dos religiosos e das religiosas, frizando: "Eles não querem fazer o seu exame de consciência" dizia Melânia (209). Não conhecemos a fonte dessa informação, de que Léon Bloy não fala.

Pois bem! Melânia, numa carta autêntica, escrita no convento das Carmelitas na Inglaterra e dirigida ao Pe. Mélin com data de 21 de Março de 1855, que o Pe. Jauen, missionário de N. Sra. de La Salette publicou com fotocópia (210), escrevia: “As coisas que eu posso dizer não me foram ditas na Montanha de La Salette.

Delas não falei a ninguém, pois receava maior mal e que se desprezassem palavras do céu porque faladas por grande pecadora como eu. Parte dessas coisas se referem ao clero, mormente ao clero francês; outra parte se refere de modo geral "a todas as ordens religiosas tanto de homem como de mulheres.. (211).

É claro, pois, que escritor talentoso e verdade histórica nem sempre vivem de acordo; constatação essa que especialmente no caso presente quiséramos que os leitores do tão categórico Léon Bloy conservassem fundo na memória.

(202) Celle qui pleure, 13.

(203) Joseph Bollery - Léon Bloy, I vol., pág. 454.

(204) Da romaria que acima tratamos.

(205) Joseph Bollery, pág. 433. Esse autor, nas páginas 462 e 483, narra que o resultado foi que Ana Maria ficou demente e faleceu num hospício, em 1907.

(206) Léon Bloy que cita esse documento na pág. 124, sustenta que foi falsificado. Para concluir a questão, a revista “Annales de Notre Dame de La Salette”, publicaram a fotocópia em 1915.

(207) Celle qui pleure, pág. 151.

(208) Celle qui pleure, pág. 209.

(209) Celle qui pleure, pág. 72.

(210) W. Grace de La Salette, pág. 260.

(211) A titulo documentário, relatamos o seguinte: "A vidente Soror Maria de São Pedro ouviu estas palavras em 13 de Fevereiro de 1848: "A Igreja está sendo ameaçada por horrível tempestade, orai, orai". E a Confidente de Jesus recebe ordem de rezar especialmente pelo Santo Padre e a certeza de que, graças à Confraria reparadora, o sangue dos padres não será derramado como em 1793, porque Nosso Senhor não tem motivo de queixa por parte do clero como da época da grande Revolução" - Revista "Vie Spirituelle", 1 Nov. de 1943, -citada pelo P. Jauen. pág. 260 em ''La Grace de La Salette".

 

CAPITULO SÉTIMO

ELUCIDANDO A CARACTERÍSTICA

INCONSTÂNCIA DE MELÂNIA

Tencionamos agora apresentar algumas ponderações que, ao nosso ver, explicam talvez não por completo, porém de modo satisfatório, o caráter tão evidentemente inconstante de Melânia e também esclarecem tão variados acontecimentos da sua vida.

Existem pessoas singelas que a malvadez do mundo olha com sentimento de compaixão e algum desprezo que absolutamente não as atinge.

Criaturas simples, de fé religiosa ingênua, corações sinceramente amantes a Deus, com horror ao pecado, cumpridoras do dever do próprio estado, respeitosas da vida alheia, devotadas ao culto divino, que, na igreja ou em sua casa levam fazendo orações, o tempo que os seus censores empregam nos divertimentos ou coisas piores, mas que do Pai do céu, receberam ·na expressão do Evangelho, um só talento, pois "ipse fecit nos et non ipsi nos" foi ele quem nos fez a nós e não nós a nós mesmos'".

Pois bem, para valorizar esse talento, elas necessitam dum guia bondoso, esclarecido e também enérgico, do contrário, embora evitem faltas graves, andam sem rumo; até cuidam, por vezes, ter visto, mesmo ouvido, do Sagrado Coração ou de Nossa Senhora, supostas visões, logo esquecidas de ordem do pai espiritual. Sendo bem orientadas, a sua vida lhes decorre calma, pura, isenta de maldade e de malícia, por caminho, no dizer popular, que vai direto ao céu.

Esse seria por natureza, o gênero de vida de Melânia. Infelizmente ,a ela não tão somente faltou o indispensável guia, mas pelo contrário teve diretores espirituais pouco esclarecidos, erradamente enérgicos, uns até atormentados de iluminismo, com agravante de irrefletida veneração. Daí provém as suas frequentes mudanças de ideias e de estado e a convicção de que tinha recebido revelações de Nossa Senhora posteriores à Aparição e referentes ao clero (212).

Que por natureza Melânla fosse ingênua, simples, despreocupada, pouco dotada intelectualmente, necessitando de contínua vigilância e orientação - já foi comprovado por ocasião do exame da realidade da Aparição de Maria SSma. O patrão de Melânia, Batista Prá, declarava ao Pe. Rousselot: '”É muito retraida e tão despreocupada que chegando à noite, da montanha, toda molhada pela chuva, nem sequer pedia para trocar a roupa. Por vezes fechava-se no estábulo e até, se a gente não notasse, passaria a noite ao relento" (213).

"Bem muito pouca coisa pensava a coitadinha, dizia um camponês (214). Tão pouco dotada, que a superiora do Colégio em Corps declarava aos Delegados. episcopais “que por um ano inteiro não conseguira que Melânia soubesse de cor os atos de fé, esperança e caridade, embora lhos fizesse repetir duas vezes por dia" (215).

O Pe. Giraud, superior dos Missionários de N. Sra. de La Salette, depois duma entrevista com Melânia, exclamava "Pobre filha, pobre filha, quanto é para lastimar! ... Cuidava que ela fosse uma exaltada, porém dotada de certa inteligência! No entanto é de mentalidade comum e acanhada". Em outra ocasião: "Comigo nunca faz profecias" (216), dando assim a entender que Melânia bem dirigida, desistia das suas supostas visões. Melânia sempre tinha em muita conta ao Pe. Calage em Marselha, embora ele se opusesse às suas mais queridas ilusões e disso ela tivesse certeza. Dom Ginoulliac ordenou-lhe que acabasse com suas predições, visões e outras singularidades. Ela obedeceu até sua ida para a Inglaterra" (217).

Melânia, portanto, sendo bem orientada por natureza, nunca cogitaria dessas coisas extraordinárias. Para atirá-la a essas cogitações, muito contribuíram os irrefletidos atos de verdadeira veneração para com ela e os seus extravagantes diretores espirituais.

A respeito do primeiro caso limitamo-nos ao seguinte (218): "Eu vi padres, declarava o Pe. Gerente (219) ao Pe. Bossan, que escreviam tudo o que Melânia dizia, como se fossem oráculos. Eu disse a um vigário do sul da França, que já tinha escrito três páginas da sua conversação com Melânia: Mas, meu bom vigário, o que estais fazendo? Escrevo tudo o que ela falava isso na presença de Melânia. Eu vi padres, damas, generais, oficiais, homens de alta sociedade manterem-se perante Melânia como se se tratasse duma alta personalidade, falar-lhe com muita humildade, pedir a sua assinatura. Enfim uma porção de coisas idiotas".

Lá na Inglaterra, nem Mons. Newsham, que a levou consigo, nem o Capelão das Carmelitas, demonstraram a menor prudência. Por ocasião da tomada de hábito de Melânia, o Jornal Tablet (220), assim descrevia a cerimônia: "Entre as pessoas mais apressadas, notavam-se Sir William e Lady Lawson com suas famílias, bem como Lady Dodsworth. Esta última e Lady Lawson estiveram bastante atarefadas em adornar com seus atavios, com suas esplêndidas joias, no valor, dizem, de 2.000 libras, a interessante Noiva que ia nesse dia consagrar-se ao Esposo Eterno".

Pobre pastorinha dos Alpes! Qual a imaginação capaz de resistir? Para completamente perturbar essa imaginação, uns três ou quatro sacerdotes que se empenharam. na direção de Melânia, eram verdadeiros desequilibrados, sonhando continuamente com anjos e demônios a se combaterem como tantos visionários.

Numa carta (221) esquisita do Pe. Braudt que orientou Melânia durante 26 anos, ao Cônego Pe. Di Francia, outro orientador da vidente, lê-se: "Apresso-me em informá-lo de que a veneranda Melânia está projetando acompanhar três dos meus parentes à Santa Montanha de La Salette, a 19 do corrente, aniversário da Aparição da divina Maria. Tudo se está preparando para que dentro de seis ou sete anos, quando o grande São Miguel tiver sucedido a São Gabriel no governo do mundo criado que este último terá ocupado durante cerca de 254 anos. A Irmã da Natividade, religiosa Bretã, escreveu cinco volumes sobre esse importantes assunto. Em 1908 deve começar a grande obra... Já preveni há bem três anos atrás, vários cardeais, arcebispos e bispos da França que o cataclisma vinha sendo causado pelos bispos..." (222).

Esses infelizes desvairados tinham muita influência sobre o espírito e a vontade de Melânia, como pessoalmente tivemos ocasião de verificar, precisamente por ocasião da romaria anunciada nessa carta, pois naquela época estávamos na Santa Montanha. Tivemos a grande satisfação de conversar com a vidente. Lembramo-nos até de que ela nos perguntou qual era a tradução da palavra italiana: "stampa" (imprensa) em francês, portanto conservamos bem presentes na memória os acontecimentos.

Eram uns três padres, de fisionomia nada serena, que simplesmente, com o movimento dum dos seus dedos, impediam ou permitiam que Melânia falasse ou atendesse a quem a ela se dirigia. Dominavam-na por completo. Quando porém Melânia, porventura, acabava-se só, amavelmente respondia às perguntas acerca da santa Aparição. Era então uma velhinha de 71 anos de idade, modesta, piedosa. Quando recebia a santa comunhão diária estava toda recolhida. Faltava-lhe um bom guia espiritual.

Após o que acabamos de expôr, admira que ela não tenha falado e escrito coisas piores. No que falou e escreveu, aliás, dado as condições acima apresentadas, torna-se impossível discriminar, em muitíssimos escritos com seu nome, o que é da sua verdadeira autoria.

Resumindo os numerosos fatos que vimos expondo, eis aqui o nosso modo de pensar.

Tão numerosas manifestações de respeito, de consideração, de como que veneração, durante anos, por parte, como ficou demonstrado, elas pessoas mais conceituadas, produziram do íntimo de Melânia, não já o sentimento orgulhoso do seu valor pessoal, nem a convicção de ser bem dotada e portanto merecedora desses preitos, mas apenas o hábito de querer ter voltada para si a quase contínua atenção de todos.

Tendo, porém, recebido do Criador sô um talento, ela, por si mesma, não percebeu o perigo dum tal hábito. Não houve um diretor "(223) de almas, bastante esclarecido e firme, que falando-lhe como ministro de Deus, lhe apontasse o estado de vida que ela deveria abraçar e que dirigindo--se à sua consciência, alheia ao caso, a levasse a reprimir esse hábito funesto.

Pelo contrário a sua Mestra de noviciado no convento, cuja obrigação era dar, mesmo com severidade a Melânia, então na idade propícia da adolescência, verdadeira formação religiosa, foi coadjuvando a essa tendência (224), mesmo contra a vontade da superiora, que isso ignorava (225).
- A senhora é a postulante enviada de Lourdes?

- Sim. Madre Superiora.

- O seu nome?

- Bernadete Soubirous.

- O que sabe fazer?

- Pouca coisa, minha madre.

- Então o que quer que façamos consigo?

A santa calou.

- Quem lhe recomendou a nossa congregação?

- O bispo de Nevers.

- Santo homem, faz sempre das suas! E mandou-a para a copa lavar os pratos, (Em "La Beata Bemadetta", do P. Blasy, tradução italiana - pág. 130.

Por esses motivos, quando Melânia se julgava esquecida, por fraqueza humana e movida pela exigência do seu hábito, para novamente atrair a atenção para a sua pessoa, lançava mão dos meios às vezes mais imprevistos, por exemplo, mudez e cegueira (226), rapidamente curadas sem o menor remédio. Sobreveio também grande tentação do demônio (227) que em certa ocasião (Janeiro de 1855), estava atormentando-a e perturbando-a por meio de violentos vexames, o que influiu no seu moral" escreve Similien, e até mesmo supostas visões, pois fazia muitas leituras.

Mais tarde, especialmente desde 1878 (228) alguns sacerdotes de imaginação como que saturada de visões apocalípticas, na expectativa de próximos e espantosos cataclismas, aproveitando-se do fato do segredo e por meio de lisonjas, influíram de modo desastroso no espírito de Melânia, porém sem provocar mórbidas consequências em suas faculdades psíquicas (229).
O Sr. Artus provou facilmente que que se tratava da demente Maria Bertault que estava com 62 anos de idade, quando, a 9 de março de 1869, ela saiu daquele hospital, portanto dois anos antes das preleções do Dr. Voisin. Nessa época Melânia. tinha 37 anos." - Da revista “Ami du Clergé", 18 de Maio de 1950, pág. 313, 314, n. 20.

Uma especialista em morto-psicologia e grafologia fez breve estudo sobre os traços fisionômicos e a grafia de Melânia. Concluiu: "Esse rosto de mulher de aspecto chato, de maçãs salientes e nariz delgado, indica muito ardor e sensibilidade aguda. O olho muito fundo, em alto plano cerebral leva a pensar que suas impressões foram profundamente interiorizadas, podendo facilmente se tornar sistemáticas. - A grafia, unida, dinâmica com traços esguios, manifesta natureza interiça, muito "tensa" , também imaginativa. Não se pode, por esses documentos, desvendar um temperamento de visionária". Assim: Suzanne Bresard, - ''Trouble et Lumière" (Inquietação e Luz) - Études Calmélitaines - (Vo Congresso de Psicologia Religiosa), 1948, - p. 191.

E nós também dizemos com o padre Carlier: "A morte de Melânia foi repentina. porém não foi imprevista; pois a ela se preparava por uma vida inteira afastada do mundo, de união com Deus, de virtudes cristãs, tornada mais meritória pelos vexames do demônio".

Com efeito, apesar dos seus defeitos que não negamos, pelo contrário (230) Melânia foi cumpridora das suas obrigações de professora, de catequística, carinhosamente dedicada: durante a prolongada enfermidade da sua mãe, como vimos no rápido esboço da sua biografia. Ela praticou a virtude da pureza de costumes, não tão somente de maneira irrepreensível, mas de modo notável e notado.

O capelão do convento onde ela estava testemunhou “Era obediente, muito obediente, bastante tentada pelo demônio; mas sempre pura, muito pura, perfeitamente casta" (231).

Apesar de sua vida tão movimentada e por regiões tão diversas, nunca se levantou a menor dúvida a respeito da sua pureza de costumes.

Soror Dorotéa, cujo testemunho Lê-se em nota anterior, respondeu, do seguinte modo às perguntas do Pe. Bossan, M. S.: ''Quais as virtudes principais que notou em Melânia? Uma piedade afetuosa e forte. Gostava de singular modo fazer a Santa Comunhão, de que falava com efusão do coração. Quando estava na Igreja; ficava sempre de joelhos sem se encostar, imóvel, como que em êxtase" (232).

Lançando pois um olhar sereno sobre o largo painel dessa existência - notando, como é de justiça, as poucas. sombras. existentes aqui ou acolá, que não existiriam se Melânia, fosse paternal e sabiamente orientada - o grande conjunto se nos depara de uma brilhante formosura.

Por esse motivo, estranhamos, e bastante, esta frase escrita há relativamente pouco tempo: "Sem embargo, apesar do desastre das suas vidas, Melânia e Maximino encontraram sempre gente crédula que lhes dão fama de virtude" (233). Frisemos com insistência; que os casos de Melânia, que alguns julgam complicados só tiveram, é certo, início em 1851, portanto não podem atingir de nenhum modo o fato da Aparição, que se deu cinco anos antes, em 1846.

Melânia, como Maximino, sustentou sempre, por toda a parte, até morrer, o que viu e ouviu na Salette, em 19 de Setembro de 1848. D. Fava, bispo de Grenoble, a um jornal que ousara publicar que Melânia se tinha retratado, pode opor vitoriosamente este desmentido: “Melânia, que eu fui interrogar há dois meses em Castellamare, assinaria com o próprio sangue a narrativa que fez e sempre sustentou" (234).

Nós que aqui escrevemos, desculpando-nos junto ao leitor, tornamos a declarar que, pessoalmente, ouvimos da própria boca de Melânia o que ela sempre disse, e isso foi só dois anos antes do seu falecimento.

Ainda sobre o mesmo assunto transcreveremos aqui o texto de Sto. Tomás, aduzido pelo R. Pe. Bliguet, de ordem Dominicana: "No entanto, é mister recordar que entre os pecados que fazem perder a caridade, uns há que impedem o uso da profecia e outros não. Por exemplo, as faltas carnais desviam completamente os espíritos das preocupações espirituais, por isso mesmo, tornam-nos impróprio para receberem a revelação que exige alta qualidade espiritual.

As faltas espirituais não desviam da mesma maneira de toda a espiritualidade; por isso pode haver profetas sujeitos ao pecado do espírito; porém não se encontram profetas escravos dos vícios carnais.

O que é também verdade quanto às grandes preocupações temporais que absorvem o espírito e o desviam da vida espiritual" (De Veritate, questio XII, art. 5) (235).

Ora vimos que Maximino e Melânia, praticaram sempre a virtude da castidade e que eles nasceram, viveram e morreram na maior pobreza. O R. P. Bliguet pondera: "Melânia e Maximino receberam esta ordem: "Pois bem, meu filhos, comunicai isso a todo o meu povo". Foi o que fizeram e até o fizeram mais do que quiseram. Não era necessário à sua missão especial que fossem santos. Nenhum deles conseguiu, duma só vez, fixar-se na vida. Ambos, a esse respeito, foram uns errantes, que não encontram lugar definitivo em parte alguma. Mas os "acasos" da sua vida e o seu contínuo movimento reverteram em beneficio da causa para a qual foram escolhidos, e esta instabilidade que algo nos incomoda quando não estamos vendo a sua razão de ser, afinal, os torna mais completamente instrumentos e melhor os adapta ao seu papel.

O próprio segredo, tão falado, encontra sua justificativa no caráter social da mensagem de La Salette.

Não falo do conteúdo, porém nada poderia melhor excitar a curiosidade da massa fiel e nada poderia melhor contribuir para que as almas prestassem mais atenção.

Para instruir um espírito nada melhor do que deixar-lhe algo para adivinhar.

Assim foi para a mensagem de La Salette. Com efeito, foi ouvido por milhares de almas, apaixonou a curiosidade cristã.

Bem sei que houve comentadores desacertados que perturbaram e desorientaram essa curiosidade, falando tão somente do segredo. O seu erro é significativo, enganaram-se tomando por fim e intento aquilo que não passava dum meio. Uma vez atraída a atenção do povo, que é que N. Senhora quer? Ela disse claramente.

Que é que ela pede que seja comunicado ao seu povo?

A sua queixa e os seus conselhos. Observai o repouso dominical; não blasfemeis; numa palavra: "Guardai os mandamentos - convertei-vos e vivei de conformidade com a lei e a fé católica".

Com essas magníficas palavras fica fechada com chave de ouro o nosso estudo sobre a carreira de Maximino e Melânia, videntes de Maria SSma. na montanha santa e querida de La Salette.

(212) Em 16 de Maio de 1858, o Cardeal Villecourt escrevia a D. Ginoulliac: "'Talvez as crianças tenham ido, além da sua missão. O mesmo teria acontecido a Joana de Arc e a outros”... - Giray - Les Milacres de La Salette, I Vol. XXVIII. Bibliografia 68.

(213) Rousselot - La Verité, pág. 79, citado por Hostachy - Histoire Sêculaire, pág. 114.

(214) Mlle. des Brulais, Ech., em Hostachy, pág. 115 - Também Pe. Carlier. pág, 197, citando o Sr. Similien “Por entre tantos pareceres diferentes, Melânia não sabia qual aceitar e qual recusar! a sua cabeça não teve força suficiente para examiná-los todos a um só tempo." Isso deu-se logo depois de não ser admitida a professar os votos e pouco antes de ir para a Inglaterra.

(215) Rousselot. Vérité sur l'Apparition, pág. 43, citado por Hostachy pág. 123.

(216) Jauen, La Grace de La Salette, pág. 234, 244. O Pe. Giraud, foi um dos maiores mestres da vida espiritual do século XIX. Melânia, tinha a maior veneração para com ele.

(217) J. Jauen, La Grace de La Salette, pág. 253.

(218) Pe. Jauen, La Grace de La Salette, pág. 253.

(219) O Padre Gerente de quem se trata, é o Capelão do primeiro Convento perto de Grenoble, onde Melânia fez o noviciado e não foi admitida à profissão religiosa. Culpada foi a Irmã Sta. Tecla, mestra das Noviças, que admitiu todos os caprichos de Melânia, em vez de lhe reprimir esses surtos de vaidade e pretensões de ser pessoa fora do comum disse, porque é muito edificante. Vou ler Domingo próximo aos meus paroquianos o que acabo de escrever.

(220) Número de 3 de Março de 1855, citado pelo P. Jauen no livro acima, pág. 258.

(221) Com data de 2 de setembro de 1902, escrita na cidade de Amiens, França.

(222) Cópia dessa carta foi tirada do original em Messina onde residia o Cônego Di Francis, pelo Pe. Forest, a 25 de Agosto de 1808 - citada por Jauen, pág. 243, do livro "La Grace de La Salette", bibliografia 73.

(223) O capelão que narrou o fato das homenagens deveria ter exigido, ou pelo menos, pedido à autoridade, cessassem essas manifestações.

(224.) Jauen pág. 240.

(225) O Padre Doullier escreveu. a D. Ginoulliac: "Creio que inocentemente, sem dúvida, deram a essa menina orientação que a desviou bastante do caminho certo da humildade e da obediência" - Jauen declara Da pág. 242: "os escritos de Melânia dessa época (1852) dão a entender que menos lisongeada e melhor orientada, a jovem noviça, enveredaria por outro caminho". Assim não foi com Sta. Bernadete, a vidente de Lourdes. Talvez recordaram o caso de Melânia. Eis aqui a notável acolhida que a santa teve por parte da superiora geral.

(226) Pe. Jauen, pig. 237.

(227) Pe. Carlier, 193.

(228) Jauen, pág. 243 a 252.

(229) A esse respeito talvez seja oportuno aqui o relato seguinte: "Em suas preleções, divulgadas na revista "Union Mèdicale”, de 27 de junho de 1872, o Dr. Voisin, alienista conceituado e médico em La Salpetriére (hospital de Paris) dizia: 1o Bernadeta alucinada... 2o Ainda tenho numa das minhas salas urna mulher que desde sua adolescência está vendo à Virgem SSma. no céu e que desempenhou o papel principal no milagre de La Salette. O Sr. E. Artus, numa brochura escreveu-lhe: Senhor, não venho propor-lhe uma aposta, mas desde já, assino aqui o compromisso de lhe pagar a quantia de 10.000 francos, se depois de um inquérito feito por três dos seus colegas, em cujos nomes caíram na sortes lançadas, não ficar demonstrado que a pastora de La Salette nunca pisou nas suas salas." O Dr. Voisin nada respondeu, confessando assim que o que ele dissera, era materialmente um falso.

(230) Soror Dorotéia declarou: "Melânia era por vezes resmungona, terrível, ameaçadora. Dizia: "Não quero, não farei". Logo depois, refletindo, voltava e fazia o que se lhe ordenava. Quando saiu do convento, dirigiu palavras ofensivas à Madre Geral De repente, quando ia descendo, advertida pela Irmã que a acompanhava. voltou para despedir-se com toda delicadeza". Dos manuscritos do Pe. Bossan, M. S., citados pelo Pe. Carlier, pág. 194).

(231) Manuscritos Bossan - Pe. Carlier, pág. 193.

(232) Manuscritos Bossan, Pe. Carlier, pág. 193. Nessa mesma atitude nós pessoalmente a vimos no santuário da Santa Montanha em 1901 e 1902.

(233) Pertencendo à "gente crédula", pedimos vênia para umas ponderações. Trata-se dum artigo da revista "Razon y Fê", Março de 1949 - pág. 482, 463 em que sem a menor alusão às virtudes cristãs, à fé viva, à prática religiosa, à pureza admirável, apesar de tantos perigos, de Maximino e de Melânia, sem mesmo dar a entender que haja justificativa para essas sombras, os olhos fitos unicamente - o que é uma injustiça - nos seus defeitos que não temos escondido, o articulista remata com a esquisita conclusão acima. me escreve também: "Fazia parte do acontecimento uma mensagem secreta “unicamente comunicável ao Papa", o que não corresponde à verdade. Maximino e Melânia nunca disseram que tinham recebido uma mensagem Unicamente Comunicável ao Papa, mas um segredo que estavam proibidos de contar. Eles o comunicaram ao Papa, quando compreenderam que o Chefe da Igreja tem direito de saber tudo o que se refere à Religião; o que comprova que na Aparição nada há, nem aberta, nem secretamente que contrarie a doutrina da Igreja. Particularmente julgamos que era dever do articulista, homem ilustrado, declarar que o procedimento "mesmo desastrado" dos videntes não é argumento de valor para por em dúvida a realidade da Aparição.

(234) P. Carlier. Histoire de l'Apparition de La Satette, pág. 204.

(235) Na revista "La Salette”.

 

QUARTA PARTE

MANIFESTAÇÕES E MONUMENTOS DE FÉ NO MONTE DA SANTA APARIÇÃO

CAPITULO PRIMEIRO

OS PRIMEIROS ANIVERSÁRIOS DO EXTRAORDINÁRIO ACONTECIMENTO

Embora fosse época de muito reduzidos meios de difusão, a notícia do grande acontecimento espalhou-se com fulgurante rapidez, alcançando em pouco tempo os limites do mundo e teve a mais funda repercussão nas almas no universo inteiro.

"A sua difusão foi pronta, rápida, pela França, pela Europa, o seu vôo pelas quatro partes do mundo. A notícia finalmente chegou providencialmente à capital do mundo cristão. A Deus seja honra e glória!" constatava D. Felisberto de Bruillard, na sua carta pastoral de 1 de Maio de 1852.

Em 1853, o Pe. Rousselot, escrevia (236): "Por toda parte, em Roma, em Paris, em Londres, em Constantinopla, na Europa, na América, na Algéria, na Oceania, por toda a parte, a oração junto ao uso piedoso da água da Montanha santa, obteve graças assinaladas, operou prodígios. De fato, sem tais maravilhas, de que modo explicar esse concurso contínuo, numeroso, edificante de romeiros de toda idade e toda condição, vindos de todos os países?

"Apesar do silêncio sabiamente imposto ao clero, as multidões; movidas por força invisível, movimentam-se por toda a parte, cobrindo as estradas, sobem a montanha, rezando, chorando, cantando; e depois dumas horas passadas nesses cumes selvagens, descem cheias de alegria, confiança e gratidão. O primeiro romeiro a 21 de Setembro de 1846, foi o Prefeito de La Salette; o segundo, com mais cinco pessoas, foi o vigário de Corps.

A 17 de Novembro a Confraria, em peso, dos Penitentes de Corps. A 27 de Novembro, compareceram 1.500 pessoas, apesar do frio e da neve a cair muito densa (237).

No dia do aniversário da Aparição, 50 a 60 mil pessoas vindas das regiões mais afastadas, lá estavam. Infenso a toda exageração em assunto de tanta importância, apenas apresentamos esse número, embora muitos padres e leigos ilustrados, testemunhas oculares, elevem esse número até 60 mil e mais ainda.

Nessa multidão imensa, havia engenheiros acostumados a prudentemente avaliar massas ocupando certa superfície de terreno. Baseados em suas avaliações, admitiram esse número por certo prodigioso (238).

Já de véspera, perto de 1.500 pessoas tinham subido à Santa Montanha, apesar da chuva, do frio, da neblina, passando a noite ao relento, castigadas pela inclemência do tempo, enfrentando-a com sentimento de piedade.

Que linda foi, no dia seguinte, essa procissão! Iniciada a uma hora de luminosa madrugada, durante o dia, continuadamente ocupava os 16 quilômetros de Corps à Santa Montanha, e de hora em hora, despejava 4 a 5 mil romeiros novos dentro desse templo cujo teto era o firmamento e cujo recinto abrangia três montanhas (239). Entre os romeiros, encontravam-se 250 sacerdotes.

Transcorrendo esse primeiro aniversário num domingo, atendendo aos pedidos repetidos e respeitosos do vigário de La Salette com a condição que se cuidasse em evitar nas cerimônias todo e qualquer caráter oficial, no único intuito que os romeiros cumprissem o seu dever religioso, o Sr. Bispo autorizou a construção duma pequena capela de madeira a ser destruída oito dias depois da celebração da santa missa até meia hora depois do meio dia. Graças a esse favor as duas primeiras missas no lugar da aparição foram celebradas simultaneamente pelo vigário, Pe. Pérrin e seu irmão, às 2:30 hs. da madrugada, prosseguindo. essa celebração simultânea até às 12,30 hs, com distribuição da sagrada comunhão durante nove horas ininterruptas, aos fiéis que se apresentavam por grupos de vinte e cinco.

Mesmo nos meses em que a neve e o gelo envolvem as montanhas, contínuos grupos, até de 800 romeiros, lá chegavam. No segundo ano, devido à Revolução de 1848 que derrubou a monarquia, o movimento diminuiu; porém já no terceiro Aniversário, o número duplicou.

O Pe. Louis Pérrin, vigário de La Salette declarou que até o fim de 1849, mais de 300.000 romeiros tinham vindo aos lugares da Aparição (240).

O Sr. Bispo de Algéria, D. Dupuch, avaliava, em 1855, em quinhentos mil o número dos romeiros que desde o dia da Aparição até essa época subiram à Santa Montanha. Os padres Berthier e Perrin, missionários de N. Sra. de La Salette declararam que até 1870, mais dum milhão de pessoas tinham chegado à bendita montanha, embora os meios de transportes fossem rudimentares; de carro até Corps, em seguida a lombo de mula, ou a pé. Em 1867, num só mês, setecentos sacerdotes, foram piedosamente rezar missa na santa montanha, vindos de 80 dioceses diferentes (241).

Nota..se que até 1853, só havia uns barracões e uma capelinha de madeira. Por esse motivo, muitos exclamavam "esse formidável e espontâneo movimento manifesta a intervenção divina. Voz do povo, voz de Deus!"

Outra prova cabal de rápida difusão e da intensa repercussão da maravilhosa Aparição, encontra-se no muito avultado número de cartas dirigidas tanto ao ,vigário decano de Corps, como ao vigário e aos missionários de La Salette, umas quatro mil por ano. Em dez anos, quarenta e tantas mil cartas já tinham sido recebidas (242).

"Cartas essas, escrevia o vigário de La Salette ao bispo de Grenoble, oriundas das mais variadas regiões e de todas as classes sociais, cônegos, arciprestes, capelães, muitos vigários, coadjutores, superiores de casas religiosas, presidentes de tribunais, advogados, doutores, condes, condessas, marqueses, marquesas, negociantes, pais, mães de famílias, etc. para obter pela intercessão da Virgem Santa, alívio, curas de moléstias, pedindo orações, novenas, missas" (243).

Igualmente inúmeros foram os escritos sobre a Aparição, não só na França, mas em outras nações. Por enquanto limitemo-nos aos seguintes (244) por tratar-se de obras publicadas "fora da França.

O arcebispo de Milão, F. Ramilli, mandou traduzir em italiano e imprimir o livro "A Verdade sobre o Acontecimento de La Salette", com prefácio e a carta pastoral doutrinária do bispo de Grenoble.

O arcebispo de Urbino (Estados Pontifícios) publicou a carta pastoral da Quaresma sobre o acontecimento de La Salette, desenvolvendo-lhe os ensinamentos.

Como vimos anteriormente, D. Ulthorne, bispo de Birmingham, (Inglaterra) além de publicar o seu livro sobre La Salette, em 1860 rebateu ataques contra o grande acontecimento, no artigo saído num jornal de Londres, confirmando a sua crença na Aparição, contestada por alguns, e responde à objeção recente".

Ainda fora da França, os bispos de Gand, (245) Burges, Tournai, Liége, Namur, Buremonde, Liverpool, Stratford, Veneza, Parma, Módena, Milão, Trento, Toronto, Bradstown, etc. autorizam o culto público de N. Sra. de La Salette. Em 1861, celebrou-se em Barcelona a festa de N. Sra. de La Salette, com novena preparatória, em todas as igrejas. Nessa cidade foi traduzido em castelhano o manual do Romeiro de La Salette, do Pe. Rousselot. Dos 10.000 exemplares, 8.000 foram vendidos em poucos dias. Aliás, no fim de 1846, um tipógrafo de Grenoble vendeu cem mil narrativas da Aparição.

(238) Un Nouveau Sanctuaire à Marie, p. 4, citado pelo P. Hostachy, livro acima, p. 305.

(237) Pe. J. Berthier “Les Merveilles de La Salette" (As Maravilhas de La Salette, pág. 264).

(238) J. Berthier, ''Les Merveilles de La Salette" (As Maravilhas de La Salette), p. 246-265.

(239) P. Hostachy, livro citado, p. 311.

(240) P. J. Berthier. Ibid., p. 265.

(241) P. Hostachy. Livro citado, p. 309 e 313.

(242) M. Doyen, vigário em Nemur. '"La Salette vengée", p. 281. Bibliografia 37.

(243) Pe. Rousselot. La Verité, p. 235. Ver Hostaclly, p. 313.

(244) No livro "Auguste Marceau", já citado, II vol, p. 431.

(245) Nessa cidade, o P. Jerônimo, da Ordem dos Recoletas publicou o livro “Nova narrativa da Aparição de N. Sra. de La Salette'', em 1855.

 

CAPITULO SEGUNDO

SANTUÁRIO, MAIS TARDE BASÍLICA DE NOSSA SENHORA DE LA SALETTE

§ 1o O terreno

Na Santa Montanha - Em sua carta pastoral de 1 de Maio de 1852, D. Felisberto de Bruillard, escreveu:

"Irmãos muito amados., trata-se agora da construção dum santuário em honra da nossa augusta Mãe, na Montanha privilegiada que ela se dignou de honrar com sua presença, onde ressoou sua voz celestial Deve esse santuário ser condigno da Rainha do Céu, e testemunho da nossa gratidão, pois queremos construir para o próprio universo".

Antes de mais nada ele cuidou de adquirir o terreno onde se dera a Santa Aparição e com superfície suficiente para levantar esse monumento religioso e também as hospedarias indispensáveis para abrigar os romeiros. Sendo esse terreno de propriedade do município de La Salette, S. Excia. já dera os primeiros passos junto da Câmara Municipal por intermédio do vigário e decano de Corps, por carta de 18 de Abril de 1849.

Não foi nada fácil realizar o negócio, pois os vereadores exigiam uma quantia por demais exagerada ou participação nas ofertas para o santuário em benefício da própria igreja paroquial, duma escola, etc. Queriam aproveitar a ocasião tanto que o Prelado teve de lhes escrever: "Lembrai-vos que eu não sou o dono das ofertas dos fiéis, sou apenas administrador e nessa qualidade só posso aceitar propostas razoáveis e conscienciosas.”

As negociações foram delongando-se através de consultas, conferências, debates, comissões mistas nomeadas pelas duas partes. Finalmente o bispo nomeou seu bastante procurador junto da Câmara Municipal, o Sr. Bergeret, antigo tabelião de Grenoble, homem ponderado, entendido, desinteressado, de espírito conciliador que após três viagens, conseguiu levar as negociações a feliz êxito.

A escritura de compra e venda foi lavrada no escritório do tabelião de Corps. O município de La Salette vendia um terreno de 50 . 000 metros quadrados pelo preço de dois mil e quinhentos francos, a D. Felisberto de Bruillard, bispo de Grenoble, isto foi em 26 de Outubro de 1851.

No intuito de testemunhar a sua paternal solicitude aos habitantes do município de La Salette, cuja pobreza e necessidades não ignorava, o bispo prometia entrar, a título suplementar, com a quantia de 7.500 francos, sendo: 3.000 para consertos na igreja paroquial, 2.500 para a construção duma escola e 2.000 para obras de beneficência. No dia 23 de Março de 1852, D. Fe!isberto de Bruillard assinou um ato de doação irrevogável pelo qual cedia aos bispos de Grenoble seus sucessores o imóvel, a fonte e os direitos respectivos por força da escritura lavrada em 28 de Outubro de 1851. Por decreto de 30 de Junho de 1852, o ministro da Instrução pública e dos Cultos aprovou essa doação (246).

(246) Annales de N. D. de La Salette, mars et abril de 1914, bibliografia 52, citados por Hostachy, pág. 262-263

 

§ 2o – Benção e lançamento da pedra fundamental do santuário

Em sua carta pastoral de 1852, o bispo de Grenoble escrevia: "Já estamos no lindo mês de Maio, especialmente consagrado ao culto de Maria, mês em que tantas homenagens lhe são prestadas por toda parte da terra.

Pois bem, amados Irmãos, é precisamente esse mês que temos escolhido para bênção e lançamento da pedra fundamental do santuário de N. Sra. de La Salette. Queremos que essa cerimônia se realize com toda a pompa condigna do seu fim. Convidamos um dos nossos mais caros colegas do episcopado para fazer o que nos seria de tanto agrado fazermos" por nós mesmo pessoalmente, se, mais do que a idade adiantada, contínuos sofrimentos no-lo permitissem. Nisso temos que nos submeter à vontade de Deus e fazer o sacrifício dos nossos gostos.

Nós vos convidamos também, amados Irmãos, a subir à Santa Montanha, para aumentar com vossa presença, a magnificência desse dia de tão celestial alegria. Efetuará a bênção solene e lançamento da pedra fundamental o Exmo. Sr. bispo de Valença, com assistência duma delegação do nosso cabido e numeroso clero, na terça-feira, 25 de Maio".

Assim falava, no começo do mês, esse ancião venerando, a vergar ao peso de oitenta e sete anos de idade, e torturado por dores nevrálgicas agudas. Na véspera da festa, porém, experimentando melhoras, partiu de carro público, chegando a Corps em 24 de Maio, seguindo a cavalo até à paróquia de La Salette, tendo deixado na casa paroquial de Corps, D. Chatrousse, bispo de Valença, chegado na mesma hora. No dia seguinte, pelas 6 horas da manhã, D. Felisberto de Bruillard, de novo a cavalo, subiu à montanha onde na capela de madeira, celebrou a santa Missa perante as multidões comovidas. Meia hora depois chegava o bispo de Valença.

Damos aqui a palavra a um médico testemunha ocular:

"Que espetáculo maravilhoso, esses inúmeros romeiros espalhados, alguns pelos pendores do monte Gargas, outros pelas margens do riacho Sézia, onde flui a fonte milagrosa; outros apinhados em torno dessa fonte, o maior número no planalto, formando um só bloco, ocupando uma superfície que não media menos de oitenta metros de largura por trezentos e cinquenta metros de comprimento. A nossa estupefação e a nossa admiração ia crescendo, ao contemplarmos, do ponto elevado onde estávamos colocados, além, no fundo dos despenhadeiros, pelas encostas e pelos cumes das montanhas circunvizinhas, miríades de romeiros, uns produzindo na vista efeito de verdadeiros formigueiros, outros, a visão nunca imaginada, de milhares de pontinhos pretos a movimentarem-se apressados, em direção ao alto. A medida que essas compridas fileiras de romeiros vinham se aproximando do planalto, formavam procissão levando na frente uma campainha, as suas cruzes, os seus estandartes flutuando ao vento, as jovens vestidas de branco, a maior parte dos homens com seu traje de penitentes. O pastor de cada paróquia entoava um hino Aquela que as gerações chamam de Bem-aventurada e logo centenas de vozes ecoavam pelos ares. As nove horas deveriam começar as cerimônias.

O tempo repentinamente mudou e chuva miudinha e penetrante, entristecendo a todos, perturbou todas as organizações. No entanto, às dez horas, uma procissão composta de numeroso clero, conduzindo os dois venerandos prelados, movimentou-se rumo ao lugar onde será construído o novo santuário. Um altar de madeira, muito singelo, ali se levantava, adornado com seis ramos verdes e festões de variados matizes. Iniciou-se a cerimônia que se prolongou até o meio dia. Apesar da chuva persistente, o povo se manteve firme, atento e piedoso. O bispo de Valença celebrou em seguida a santa Missa, terminando com a bênção do SSmo. Sacramento.

Dentro da pedra fundamental, alicerce da pilastra principal do novo santuário, encerrou-se uma caixa de chumbo, contendo relíquias de S. Francisco de Sales e Santa Joana de Chantal, umas moedas e medalhas com a data de 1852, umas cartas de Comunidades religiosas e um pergaminho com os seguintes dizeres em idioma latino: ''Felisberto de Bruillard , pela misericórdia divina e mercê da Santa Sé Apostólica, Bispo de Grenoble. Fazemos saber e atestamos que, no ano do Senhor de 1852, a 25 de Maio, Nós, estando presente, a nosso rogo, S. Excia. D. Pedro Chatrousse, Bispo de Valença, benzemos e lançamos esta pedra fundamental. Assistiram essa cerimônia perto de cem sacerdotes, bem como uma grande multidão, dumas quinze mil almas. Esse santuário é levantado em honra da Bem-aventurada Virgem Maria, que em 19 de Setembro de 1846, apareceu a dois pastores, Maximino e Melânia, ainda bem jovens. Reluzente como o sol, porém cheia de tristeza, Ela lhes ordenou anunciassem ao seu povo os castigos que o ameaçava, se não se convertesse, e os bens para ele reservados se voltasse a Deus. Feito na Montanha de La Salette, em dia e ano acima, no VIo ano do glorioso pontificado do SS. Pio IX e do nosso episcopado o XXVIo.

Felisberto, bispo de Grenoble”.

Estando tudo terminado, os romeiros foram saindo pesarosos, novamente em procissão, com seus estandartes, e cantando hinos à N. Sra. de La Salette, rumo duma pousada para a noite. Mas, por entre essas piedosas multidões, o que mais chamou a atenção de todos, foi nosso venerando pontífice, que tudo enfrentara para dar à Mãe de Deus claro testemunho da sua fé e da sua devoção. Sua Excia. não poderia voltar a cavalo, para La Salette e Corps, sem correr os maiores perigos. Fizeram-lhe notar que os caminhos eram muito escarpados quase a prumo, e que a chuva os tomara por demais escorregadios.

Homens de La Salette, de ombros robustos e pés firmes, encarregaram-se de levar, revezando-se, o seu bispo numa apropriada liteira. Os romeiros, que já se tinham ido, espalhados pelas veredas, contemplavam o inaudito e comovedor espetáculo. O ritinir duma campainha pedia licença para passar. Cantos religiosos vibravam, e todos viam,· maravilhados, ondular pelos pendores da montanha, o seu primeiro pastor levado, sob um docel que o protegia contra as inclemências do tempo, à frente de imensa procissão cujos hinos uniam-se às vozes dos sinos dos campanários circunvizinhos" (247).

(247) Citado P. João Berthier, M. S. em "'La Merveilles de La Salette", p. 283 a 288; Bibliografia, 60.

 

§ 3o - Construção do Santuário e dependência

Logo após a compra do terreno, o vigário de La Salette mandou um mestre de obras explorar a montanha, e tendo ele encontrado ótima pedreira, tratou-se logo de abrir um caminho suficiente para o carregamento das pedras já no início da primavera de 1852.

Entrementes, D. Felisberto de Bruillard, solicitou demissão do seu alto cargo, a 29 de Dezembro de 1852; e a 7 de Março de 1853, D. Ginoulliac, apresentado à Santa Sé pelo venerando resignatário, já era bispo de Grenoble.

O novo Prelado nomeou uma Comissão construtora, que escolheu, para fazer as plantas e acompanhar o trabalho, um jovem (248) arquiteto, por nome Alfredo Berruyer. Tomadas que foram as necessárias informações, a Comissão reuniu-se no bispado de Grenoble. Os membros leigos, mormente o arquiteto, prevendo enormes dificuldades, limitavam-se em seu parecer a uma obra solidamente construída, porém de proporções modestas. Os eclesiásticos, como os padres Auvergne, Rousselot, Mélin queriam um monumento mais amplo e mais lindo. Prevalecendo esta última opinião, o arquiteto apresentou a planta dum santuário para umas três mil pessoas, dizendo espirituosamente "que não poderia opor-se a construções gigantescas, por serem sempre do agrado dos arquitetos" (249).

Tratava-se efetivamente duma obra gigantesca; e muito árdua foi a tarefa, pois os trabalhos realizavam-se numa altitude de 1.800 metros, em monte escarpado, sem estrada, apenas umas estreitas veredas.

O R. Pe. Archier, nomeado em 1o de Janeiro de 1854, por D. Ginoulliac, administrador das obras, com encargo de fornecer o material assim falava, mais tarde - época em que tivemos a honra de conhecê-lo sobre o andamento da construção: "Quem acompanhou, como eu, todo esse trabalho, quem se recorda. que, fora as pedras encontradas no lugar, todos os outros materiais, até a areia que foi preciso ir buscar lá em baixo a 12 quilômetros, deviam aqui subir em reduzidas cargas, a lombo de mulas, não já pelos caminhos abertos depois, mas pelas íngremes veredas do planalto, por onde andavam com dificuldade os próprios pastores; quem se lembra das provações, dos obstáculos de toda espécie frequentemente superados contra toda esperança, oh! muito espontaneamente faz ato de fé na Aparição da Virgem SSma. Quem viveu nesta Montanha desde o princípio, não pode furtar-se ao júbilo de proclamar: "Digitus Dei hlc est", "é mesmo obra de Deus" (250).

Continuava fazendo notar, que "mercê de Deus, não se deu nenhum desastre importante durante todo o tempo da sua prolongada administração, tanto nos trabalhos, como nos transportes". - "Considero, dizia ele, qual verdadeiro milagre, que, por tantos anos de empreendimentos dificultosos e perigosos, nunca ninguém tenha fraturado um membro, apesar de inúmeros desastres que só ocasionaram prejuízos materiais e tendo nós a trabalhar até 120 operários". Eu mesmo, acrescentava rindo, por mais de vinte vezes, corri perigo de ser esmagado ou mesmo atirado aos despenhadeiros. Foi de 1854 a 1864 que as obras se efetuaram com a maior regularidade. Pelos fins de Setembro de 1853, o SSmo. Sacramento foi trasladado, piedosamente com a presença dos missionários e de todos os operários, feitos coroinhas, cantando hinos, da mísera capela de madeira para um novo pavilhão, e logo depois para o próprio santuário que, já coberto em outubro de 1860, abertas as naves em 1863, foi franqueado ao culto em 1885.

Trata-se dum edifício de estilo romano-bizantino, com três naves, de quarenta e quatro metros e cinquenta de comprimento, de quinze metros de largura, de dezoito metros e cinquenta de altura, podendo conter 2.500 romeiros. Colunas esbeltas, feitas de blocos de mármore cinzento da montanha, medindo um metro de circunferência e pesando quatro miil quilos, sustentam a notável abóbada. De cada lado da fachada ergue-se uma torre quadrada encimada por uma cruz. O telhado de cobre está em condições de resistir aos mais tremendos temporais. Em 1849 o R. Pe. Pérrin mandou acrescentar dez capelas laterais e outras tantas dentro da cripta".

Ergue-se o santuário entre as duas asas da hospedaria bastante ampla para dar pousada a mais ele oitocentos romeiros (251) e abrigo a inteiras multidões, com restaurantes, água encanada e luz elétrica.

Todas essas enormes construções foram efetuadas, exclusivamente por meio de ofertas espontâneas, em agradecimento de graças alcançadas, não se recebeu nenhum subsídio da autoridade pública, não se abriu nenhuma subscrição, salvo a que os próprios missionários fizeram entre si, cujo resultado, setenta mil francos, serviu para se enfrentarem as primeiras despesas (252).

Numa paróquia ficou resolvida uma coleta entre as crianças em beneficio de N. Sra. de La Salette. O vigário, comunicando o resultado, escreveu comovido ao Chanceller do bispado: "Há perto da casa canônica uma família muitíssimo pobre, pai, mãe, sete filhos. O filho mais velho tem doze anos e o mais novo, quatorze dias de idade. De volta do catecismo os mais velhos disseram à mãe: “Mamãe, as crianças vão fazer uma coleta para N. Sra. de La Salette; nós não vamos dar nada? - ”0nde é que eu vou arranjar dinheiro?, por certo seremos os únicos que não daremos nada", respondeu, com os olhos marejados de lágrimas, a pobre mãe. - "Então, com sua licença, mamãe, vamos pescar camarões que levaremos ao Sr. Vigário; ele nos dará uma gorjeta, que será para a coleta". Trouxeram-me um prato regular de camarões. No domingo seguinte, os cinco mais velhos, aconchegados uns aos outros, perto do altar mor, das suas mãozinhas deixaram cair a sua oferta na bandeja. O pai, logo na entrada da igreja, envolvia com o braço o sexto filhinho e me apresentou o seu dinheirinho; e a mãe, ajoelhada na capela de Nossa Senhora, deu uns centésimos por ela e pelo sétimo filho que nasceria doze dias depois. Bem-aventurados pobres!"

O bispo, ao saber desse fato mandou vinte francos de esmola à essa família (253). As ofertas, provindas, na expressão do Pe. Melin, dos quatro cantos da terra e do centro, foram suficientes para custear todas as despesas que importaram pelo menos em dois milhões de francos, quantia essa enorme para a época (254).

(248) Estava apenas com 30 anos de idade, recém formado na Escola das Belas Artes. Morreu com 82 anos assistido em seus últimos momentos por um missionário de N. Sra. de La Salette, que ele tinha em grande estima. - Baffert - Vida de Alfredo Berruyer - Grenoble 1893, pág. 44 - Hostachy, 266.

(249) Pe. Hostachy, M. S. - Livro citado, pág. 267, que se baseia em Annales de N. D. de La Salette, Abril, Maio de 1914.

(250) Hostachy. p. 255. Esse historiador se refere aos manuscritos do P. Deschaux. M. S. (aluno do P. Archier), p. 179, onde leêm-se os dizeres desse venerando Padre.

(251) P. J. Berthier - Merveilles de La Salette, pig. 29§.

(252) "Histoire Centenaire de La Salette", Hostachy, pág. 269. Não houve subscrição promovida pelos Missionários. Mas o P. Rousselot, conforme narra esse mesmo autor, foi por iniciativa própria. percorrendo o Norte da França, a Bélgica, a própria Holanda, em Agosto e Setembro de 1857, deixando, em várias cidades listas para angariar recursos em benefício da construção do Santuário. Em “La Galerie de La Salet - Les Curés", pág. 318 e seguinte, pelo P. Hostachy.

(253) P. L. Carlier - ''Histoire de l'Apparition de N. D. de La Salette". pág. 528, 529.

(254) Hostachy, pág. 268-269 - "Histoire Centenaire de La Salette”.

 

CAPITULO TERCEIRO

O SANTUÁRIO E SUAS MARAVILHAS

§ 1o No Interior do Santuário

"O altar·mor, inaugurado em 1866, graças ao zelo do Sr. Similien que conseguiu obter os necessários cinquenta mil francos, é obra prima. Encimado por linda estátua, de mármore de Carrara, o altar foi esculpido pelo artista romano Carimini, de conformidade com as instruções da Sagrada Congregação dos Ritos. É todo de mármore e apresenta em suas várias faces, em baixos relevos, imagens de vários profetas, de anjos nos quatro ângulos, uma série de colunas com arcos que sustentam castiçais e cruzes de bronze e uma esplêndida cornija. Todo ele assenta em base de mármore tirado da pedreira do monte Gargas. Foi construído na Bretanha.

O altar de mármore do ábside, cujo baixo-relevo representa a proclamação do dogma da Imaculada Conceição, foi doado pelo Conde de Chambord, pretendente ao trono da França; e a estatua é presente do Conde Boyne de Chambery, Savoia. Os vitrais da fachada representam a Transfiguração, os da ábside, no centro, a Anunciação e os da nave central, os outros mistérios do Rosário. Os quadros da Via Sacra são lindas pinturas a óleo, oferecidas por Senhoras de Dijon. A Bélgica ofereceu (255) o magnifico púlpito, construído por dois escultores de Bruxelas. É todo de carvalho da Rússia e tem dez metros de altura, assenta numa só pilastra, com seis faces e dois contrafortes encimadas pelas imagens de São Ramberto, padroeiro de Bruges e Sta. Gúdula padroeira de Bruxelas. Há em lindos baixos relevos, os quadros da Virgem falando aos pastorinhos, da Anunciação, da Visitação. No alto das escadas, vêm-se as imagens, à direita, de São Geraldo e à esquerda de Santa Juliana promotora da festa do SSmo. Sacramento. .

Mui graciosos são os pendentes - do sobre-céu, adornados com várias estátuas.. Dentro do nicho, ao alto, a estátua de S. José padroeiro da Bélgica. Finalmente, a flecha e a cruz.

Inaugurado em 1880, o órgão monumental, de carvalho, com dois teclados; vinte e dois registros, pedais independentes, som mavioso, adornado com as estátuas de N. Sra. das Dores, de Anjos tocando trombetas, do rei Davi, de Santa Cecília. É também obra dum artista belga, Sr. J. B. Ghys.

O ostensório, de ouro maciço, cuja mão de obra custou 12. 000 francos, representa a adoração dos Reis Magos, prostrados perante o Menino Jesus que Maria SSma. e São José lhes apresentam no presépio. Vêem-se também o jumento e o boi. Por cima a estrela do oriente, em cujo centro rutila magnífica esmeralda. O lugar onde se coloca a Hóstia sagrada, é circundado de brilhantes e adornado com finos trabalhos de esmalte.

Há também uma pequena cruz de prata, presente dum chefe selvagem, lembrança do seu batismo, trazida pelo missionário que o batizou. O cálice, também de ouro maciço, de dois quilos, é cravejado pelo menos de 300 diamantes. O cibório de ouro, cinzelado por um artista parisiense, constitui verdadeiro poema em honra do SSmo. Sacramento e de Maria SSma., no rutilar dos seus numerosos brilhantes.

As galhetas, com a bandeja apropriada, refulgem igualmente em simbolismo, brilhantes e esmaltes. O pálio, de seda e ouro, fabricado em Lião constitui esplêndida interpretação do grande acontecimento de La Salette. Nos seus quatro painéis,, bordados a ouro fino, com suas vestes históricas, contemplam-se Maria Ssma., tendo em seus joelhos o Cristo descido da cruz, o Papa Pio IX. sentado no trono pontifício, e mais duma centena de santos e santas da França, desde os primeiros mártires da Gália até os da grande Revolução francesa.

O missal, oferta do conde de Pennalver, é um primor de arte, basta dizer que o encadernador levou três anos para executar o trabalho. Emoldurando as páginas, lindas pinturas reproduzem a história do antigo e novo testamentos.

Finalmente dentro de um relicário, em forma de chalé, doado em 1862 por uma mlraculada de N. Sra. de La Salette, um grande pedaço de pedra na qual se sentou Maria SSma., a 19 de Setembro de 1846. Todos esses objetos constituem O que vem sendo designado com o nome de "Tesouro do Santuário".

Nas paredes e nas colunas do Santuário encontramos a comovedora origem de tantas e tão lindas riquezas, pois as paredes se acham completamente revestidas com placas comemorativas, de mármore e letras de ouro, e de todas as colunas pendem estandartes, corações, quadros, medalhões, muletas, espadas, cruzes de honra, etc. no avultado número de 6.000, objetos esses a redizerem as graças e milagres alcançados pela intercessão de N. Sra. de La Salette.

Mencionaremos ainda o grande quadro que representa Santa Ana ensinando a ler a Nossa Senhora, doado pelo imperador Napoleão III; as duas lâmpadas de prata colocadas de cada lado do Altar mor, oferecidas em 27 de Setembro de 1873 e Maio de 1874 pela duquesa de Aosta, que foi rainha da Espanha, com estas inscrições: “Reconhecimento e lembrança de novo benefício".

Logo depois da guerra de 1870, um jovem oficial de 19 anos que se portara valorosamente, foi oferecer à N. Sra. de La Salette a sua espada que ainda lá está.

Esse oficial morreu em 1943, com 93 anos, refulgente de glória militar e religiosa. Trata-se do general de Castelnau, vencedor em 1914, da batalha de Nancy, o católico fervoroso que ergueu bem alto a bandeira da pátria e da fé e foi durante muitos anos o chefe da Ação católica na França. "O adversário francês que instintivamente atraiu as nossas simpatias, por causa do seu grande valor militar e do seu cavalheirismo, foi o general de Castelnau'", dizia o general alemão Von Klück. Por certo que tão brilhante carreira provem da especial proteção de N. Sra. de La Salette em retribuição da sua oferta (256).

Uma piroga, (257) original oferta, chama logo atenção de todos. Está pendurada, á modo de lustre, no fundo da igreja, e foi enviada pelo R. P. Janin, marista, missionário dos Canacos. Esse religioso guardara funda recordação das duas romarias à N. Sra. de La Salette, feitas em Agosto de 1868 e Outubro de 1871.

Quando se tornou fundador da missão da ilha dos Pinheiros, perto da Nova Caledônia, mandou construir por seus catecúmenos, essa pequena embarcação, que é uma exatíssima redução das que os selvagens usam na ilha, para oferecê-la quanto antes à N. Sra. de La Salette. Nada falta à piroga, nem a barraquinha de bambus para defender o pescador contra os ardores do sol tropical, nem Os largos ramos, nem o cordame de emergência. O pequeno rei da Ilha foi o arquiteto da obra e sua esposa, Hortência, teceu a vela com fios de palmeira. O padre Janin benzeu a piroga antes de remetê-la para o Santuário em 1876.

(255) Para custear as despesas a condessa Francisca de Robiano abriu uma subscrição; entre os primeiros suscritores, vem o cardeal Deschamps, arcebispo de Malines – Hostachy, pág. 286.

(256) P. Garnier. L'expansion de La Salette, p. 106 - Bibliografia 78.

(257) P. Hostacby. Histoire Séculaire de La Salette, p. 286-290.

 

§ 2o - Fora do Santuário

Os Sinos

Até o ano de 1868, só (258) humilde sineta chamava os romeiros espalhados pelos pendores do monte Gargas. Em 1866 chegaram os primeiros quatro sinos que D. Ginoulliac a 6 de Agosto disse mesmo ano, benzeu, sendo ele o padrinho do maior, de 1.200 quilos, por nome “Maria da Assunção”, a madrinha foi a condessa Francisca de Robiano. O segundo, "Maria da Compaixão" teve por padrinho o P. Orcei, vigário Geral, e por madrinha a doadora, Srta. Legrand, de Marselha. O terceiro “Maria da Visitação” doado pela Espanha, teve por padrinhos o conde e a condessa de Penalver. O quarto “Maria da Imaculada Conceição" teve por padrinhos o Sr. e a Sra. S. Lejay, insignes benfeitores.

Antes da bênção D. Ginoulliac pronunciou eloquente alocução, concluindo com estas palavras: “0 sino, como o sacerdote, recebe a unção da Santa Igreja e, como ele, fica elevado entre o céu e a terra. Como o sacerdote, o sino é a voz da Igreja e de Deus. Nesta montanha de La Salette, os sinos serão também o eco da voz de Maria SSma., redizendo a todos seus conhecimentos maternais que Ela aqui deu a seu povo na pessoa dos dois pastorinhos". Nesta altura tanto o auditório como o orador não conseguiram dominar a sua comoção" (259).

Em 1891, dois outros sinos, “Maria da Sagrada Família” e “Maria do Sagrado Coração"', foram colocados junto aos outros na torre, à esquerda do Santuário . A bênção mais solene ficou reservada para o "Sino Grande", de três mil quilos, puxado com a máxima dificuldade até à santa Montanha e depois guindado à sua torre, à direita do Santuário.

A cerimônia efetuada por D. Fava, bispo de Grenoble, com assistência de D. Berthet e numeroso clero, realizou-se a 17 de Julho de 1897, por ocasião das solenidades das bodas de ouro da Aparição. Por esse motivo o "Sino Grande", recebeu o nome de “Maria do Jubileu".

(258) Hostachy, ibid., pág. 286, 290.

(259) Annales de N. D. de La Salette, Agosto de 1867, Hostachy, ibid., Pág. 290.

 

§ 3o Lugar da Aparição e Capela da Cemitério

O lugar da Aparição conservou-se no seu estado primitivo. Em 24 de Maio, em 8 de Julho, em 9 de Julho de 1864 foram colocadas, na sua respectiva ordem e lugar as estátuas grandes e magníficas, representando as várias fases da Aparição. Maria SSma. chorando, falando e voltando ao céu. Foram doadas pelo conde e condessa de Penalver, de Barcelona, Espanha, e fundidas na célebre fundição de Creusot, França.

Nesse mesmo ano, a Já gasta via-sacra de madeira foi substituída por quatorze cruzes de ferro fundido com expressivos medalhões, que moços da paróquia de La Salette carregaram às costas desde a sua aldeia. Finalmente em 1868, no lugar da cerca de madeira, foi colocada uma grade de ferro lavrado que ainda lá existe.

Para executar t6das essas obras tomou-se necessário remover a pequena capela construída no lugar da Aparição. Foi transferida para bem mais alto, no pendor da montanha, dentro do recinto do cemitério. Encostado na parede da capela, à direita, ergue-se um monumento fúnebre, para sepulturas dos Missionários de N. Sra. de La Salette. No alto da fachada como que flutua nos ares uma linda estátua de mármore, esculpida por Fabisch, professor da Escola das Belas Artes em Lião.

A estátua conduzida nas procissões é uma oferta motivada pelo seguinte milagre. Em Julho de 1849, o Sr. Bey de Garidel, de Marselha, ia subindo a Romaria pelo antigo caminho que margeava os despenhadeiros, pelas encostas do monte Chamoux. Eis senão quando a sela de sua cavalgadura virou e ele caiu no abismo.

Humanamente falando deveria ficar triturado, mas pela proteção de Maria SSma., só padeceu leves contusões. Em 19 de Setembro seguinte ele remeteu essa imagem para o Santuário (260).

(260) Colhemos todos os dados deste capitulo nos livros: P. J. Berthier, “Les Merveilles de La Salette", pág. 280-317; P. L. Carlier, "Histoire de l'Apparition de N. D. de La Salette", pág. 524, 536; P. V. Hostachy, “Histoire Séculaire de La Salette", pág. 255, 274 e 283-291.

 

CAPÍTULO QUARTO

TRIUNFOS DE MARIA SSMA. EM LA SALETTE

§ 1o - Soleníssima coroação de N. Sra. de La Salette

O Papa Pio IX, manifestou sua intenção de coroar N. Sra. de La Salette pouco antes de morrer: "Dizei ao bispo de Grenoble que eu quero coroar N. Sra. de “La Salette" (261).

Esse desejo seria realizado pelo sucessor o imortal Leão VIII. Assim que se espalhou a notícia da Coroação, levantou-se raivosa celeuma no campo da imprensa incrédula que no ano de 1878 festejara ruidosamente o centenário do ímpio Voltaire. Através de calúnias os inimigos da Religião esforçaram-se por desacreditar o culto da Santa Aparição, dizendo que Roma não tencionava aprovar o culto de N. Sra. de La Salette, pois S. Santidade acabara de declarar por decreto de 25 de Janeiro, ao Bispo de Grenoble, que “esse culto não tinha base séria, nem razão de ser'' e que ''Melânia mentira e tinha confessado a sua mentira" (262).

D. Fava, novo Bispo de Grenoble, numa circular ao clero e aos fiéis da sua diocese, de 2 de Fevereiro de 1879, disse um tanto irônico: "Efetivamente recebemos o decreto em apreço. Em lugar porém de declarar que o culto de N. Sra. de La Salette não tem base nem razão de ser, diz que dois grandes benefícios acabam de ser concedidos, por S. Santidade Leão XIII, ao Santuário de N. Sra. de La Salette. esses benefícios são: o título insigne de Basílica menor e a solene coroação de N. Sra. de La Salette, representada pela estátua que a Sagrada Congregação dos Ritos aprovou. O Mensageiro de Tolosa e Cia, estão portanto confundindo e baralhando as coisas. A respeito de Melânia, que não é aliás a única testemunha da Aparição, o mesmo Mensageiro está levantando um falso, pois a vidente, que nós fomos interrogar em Castellamare, Itália, hã uns dois meses, declarou-se pronta para assinar com o próprio sangue a narrativa que fez e sempre sustentou. A pobre pastora, sendo nossa diocesana, compete-nos defendê-la o que aqui estamos fazendo com agrado, deixando-lhe o cuidado de exigir justiça pela calúnia" (263).

A respeito dessa vigorosa defesa do bispo de Grenoble, o Papa Leão XIII mostrou sua satisfação em audiência de 3 de Fevereiro de 1879, a D. Paulinier, antecessor imediato de D. Fava, na Sé episcopal de Grenoble: "Enquanto estávamos ajoelhados aos seus pés, escreveu D. Paulinier (264), pouco depois que a imprensa mal intencionada espalhara rumores em desabono do culto de ,N. Sra. de La Salette: "Muito mal entenderam as minhas intenções", disse-nos o Pontífice. Bem longe de diminuir o culto prestado a Maria SSma. nos altos cumes dos Alpes, quero conferir-lhe nova consagração, pelo duplo privilégio da ereção do seu santuário em Basílica menor e da solene coroação da sua imagem devidamente esculpida sob a orientação da Sagrada Congregação dos Ritos, de acordo com as antigas tradições." Depois de ter, em carta pastoral de Fevereiro de 1879, por ocasião da Quaresma, recordado e reforçado as provas da santa Aparição, os escritos e as sentenças doutrinárias dos seus antecessores, a respeito do grande acontecimento, ressaltando novamente os ensinamentos de N. Sra. de La Salette, tão apropriados à época presente D. Fava anunciava oficialmente o Decreto da Santa Sé.

Logo se movimentou o governo da República Francesa que, através do Ministro do Interior e dos Cultos, quis exigir que o bispo de Grenoble lhe prestasse esclarecimentos sobre suas diligências junto à Santa Sé, cujo decreto deveria ser submetido ao Conselho de Estado.

Por carta. em linguagem digna e firme, o Prelado demonstrou claramente ao Ministro que de modo algum tinha violado as leis da República, carta essa corroborada pelo cardeal Desprez, bispo de Tolosa. que recordou que o ministro Bachard a ele próprio formalmente declarara que "os breves e os rescritos referentes à liturgia poderiam ser publicados, sem autorização do governo, acrescentando que os atos do Episcopado eram inúmeros de acordo com essa declaração".

Sendo, apesar desses esclarecimentos, censurado oficialmente, D. Fava, por carta de 19 de Dezembro de 1879, protestou com veemência, terminando com o seguinte brado de fé: "Rogo à V. Excia. considere que a Igreja Católica, mormente para um bispo, é Mãe, Esposa mística do Cristo, divinamente constituída para todos os séculos e que a mim portanto, por ser meu dever sagrado, compete defender seus direitos inalienáveis, sua independência como sociedade perfeita e divina, sua liberdade" (265).

Pelo Breve anunciado e assinado a 8 de Abril de 1879, confirmando o decreto de 19 de Janeiro, Leão XIII, delegou o Cardeal Guibert, Arcebispo de Paris ''para efetuar, de autoridade apostólica, a solene coroação, com todas as faculdades necessárias e oportunas". Concedia, observando as condições ordinárias, uma indulgência plenária aos fiéis que, no dia da coroação, ou num dos dias da semana seguinte visitassem o Santuário e venerassem a estátua coroada.

Perante 15 a 20 mil romeiros, vindos de todas as regiões, e 800 Sacerdotes, quatro dos quais chegados da longínqua ilha da Martinica, antiga diocese de D. Fava, com assistência dum Cardeal, dois Arcebispos, sete Bispos e Abade, estando os cantos a cargo do coral do Seminário Maior, a dupla cerimônia da sagração da Basílica (266) e da coroação da imagem foi magnífico e glorioso triunfo para N. Sra. de La Salette.

No dia 19 de Agosto de 1879, a nova Basílica, toda engalanada, com suas abóbadas recamadas de estrelas, adornada com suas insígnias foi solenemente sagrada por D. Paulinier, Arcebispo de Besançon e antigo Bispo de Grenoble, assistido por quatro Bispos que sagraram quatro altares laterais.

Na tardinha desse dia, o Exmo. Cardeal Arcebispo de Paris assim respondeu à saudação de D. Fava: "É de V. Excia., todo o mérito do que se dá neste momento. É grande o ato que está-se efetuando. Vivemos tem­pos difíceis, a Igreja está sofrendo muitas contradições nestas mesmas horas, para não ousar palavras mais fortes. É mister redobremos nossas orações e nossas boas obras. Esta imponente romaria que V. Excia. Convocou é um fato que, assim espero, há de atrair a proteção de Maria SSma. sobre a França e sobre a Igreja" (267).

No dia seguinte, 20 de Agosto de 1879, após muitas, muitas missas com inúmeras comunhões, pelas oito horas, organizou-se infinda procissão, conduzindo triunfalmente o real diadema (268) que seria colocado na fronte de N. Sra. de La Salette. Agrupou-se o imenso cortejo em torno do estrado monumental onde erguia-se a estátua a ser coroada, coberta por um véu. Celebrou-se a santa missa, ouviu-se o sermão de D. Fava e removeu-se o véu, debaixo das vibrantes aclamações do povo.

Então o cardeal Guibert, após benzer a estátua e a coroa, segurando com suas mãos venerandas o diadema e levantou-o até a altura da Virgem a quem ofereceu-o e o colocou na sua fronte de rainha e de Mãe.

Nesse mesmo instante, nas torres alegremente bimbalharam os sinos, estrondosas detonações reboaram, brados de triunfo e de alegria irromperam dos inúmeros peitos e com vibrante entusiasmo cantou-se o hino "Te Deum". Com eloquência pregaram por essa ocasião o R. P. Giraud, missionário de N. Sra. de La Salette, o celebérrimo orador sacro D. Mermillod, Bispo de Gebra. A multidão porém prorrompeu fremente em aplausos, quando D. Fava na peroração do seu discurso proferiu estas palavras candentes: "Servidores, filhos do Cristo e da sua Augusta Mãe, unamos nossos corações, unamos nossas vozes, e debaixo deste céu imaculado, nas margens desta torrente, no meio destas montanhas que estremeceram ao contato da Mãe de Deus, ao vibrar destes hinos do imo das nossas almas, gratas e fiéis, clamemos todos juntos, com voz unânime: "Glória a Jesus Cristo! Glória a N. Sra. de La Salette!" (269).

(261) Annales de N. D. de La Salette, Março de 1878 e Nortet, N. Da. de La Salette, pág. 248, citados por D. Giray, '"Miracles de La Salette", II vol. pág. 433, nota.

(262) Essa inépcia foi divulgada primeiro pelo "Messager de Toulose" e reproduzida imediatamente pelos jornais às ordens da Maçonaria. Hostachy, ibid., pág. 344 e seguintes.

(263) Annales de N. D. de La Salette, Março 1878, P. Hostachy, 345, 347.

(264) Carta publicada nas Annales de N. Da. de La Salette. Março de 1879, P. V. Hostachy, ibid., p6g. 347.

(265) Pastoral, Souvenirs d'un Jubilé épiscopal pág. 101, 110 citado, pelo P. Hostachy, pág. 350. Histoire Séculaire de La Salette.

(266) Basílica, em sentido litúrgico, é um título de honra duma igreja com certas prerrogativas, distinguindo-se basílicas maiores e basílicas menores. A primeira categoria pertencem Latrão, São Pedro, São Paulo e Santa Maria maior em Roma e todas tem uma porta santa; à segunda, outras nove igrejas em Roma e fora de Roma, as igrejas que receberam Esse título. Cada uma em Roma tem privilégios próprios; fora de Roma gozam do privilégio de levar nas procissões a Umbela, encimada por uma cruz, e campainha, e o clero, quando não é regular, veste capa magna. No Dicionário litúrgico pelo Frei Basílio Rower, O.F.M.. Ora o Santuário de N. S. de La Salette já fôra erigido pelo decreto de Leão XIII à dignidade de Basílica Menor. Ver página 297 do livro “Les merveilles de La Salette"; pelo P. João Berthier M.S.

(267) Rastoul - pãg. 103 - em Hostachy - pág. 352. Histoire Séculaire de La Salette.

(268) Esse diadema, oferecido por uma Senhora que por modéstia, negou-se a dar o nome, é composto das joias de ilustre família. caprichosamente engastadas por artistas parisiense, em rosas de ouro. No centro de cada rosa rutila um brilhante e cada pétala é uma água-marinha. Por entre as rosas e suas folhagens de ouro surgem elegantes caules de prata dourada, crivados de diamantes culminando em feixes de estrelas de ouro e pedras preciosas. O artista, pelo que se vê, esforçou-se por reproduzir o diadema que a Virgem trazia no dia da sua aparição. Conseguiu o seu intento, e sua obra foi honrosamente classificada na grande exposição de Paris em 1857. A doadora fez oferta em reconhecimento da cura do seu filho único. - J. Berthier - ibid. - Pág. 316.

(289) Annales de Notre Dame de La Salette. Set. de 1879. P. Hostachy, 363.

 

§ 2o - Cinquentenário da Aparição de N. S. de La Salette

No ano de 1896, transcorria o décimo quarto aniversário do batismo do rei Clodoveu, primeiro monarca cristão dos Francos, portanto da França. Por esse motivo, as festividades do áureo jubileu da Aparição realizaram-se particularmente de 19 de Setembro de 1886 a 19 de Setembro de 1897. O Bispo da coroação, D. Fava. que precisamente celebrava nesse mesmo ano as bodas de prata da sua sagração episcopal, anunciou durante a quaresma de 1896 a áurea data com vibrante entusiasmo, numa carta pastoral repassada de fé e devoção. Posteriormente numa brochura "Na Santa Montanha de La Salette", Julho de 1896, D. Fava em linguagem simples, apropriada, estudou o tema que Maria SSma. em La Salette viera para nos recordar que "Jesus no seu Testamento, tinha deixado aos homens, a sua própria Pessoa, a sua própria Mãe, a sua própria esposa mística, a santa Igreja ".

A pedido desse Prelado, o Papa Leão XIII tinha concedido uma indulgência plenária aos fiéis, que durante o referido ano fizessem a romarias de N, Sra. de La Salette. Movimentaram-se, com efeito as multidões e durante os mencionados treze meses, magnificas foram as festas e numerosas as romarias. Só no mês de Agosto de 1897, contaram-se de doze a quinze mil pessoas sobressaindo, no dia 21, a romaria exclusivamente de homens da Diocese de Grenoble.

No dia do Cinquentenário, 19 de Setembro do 1896, apesar da sua idade adiantada, 70 anos, D. Fava encontrava-se na santa Montanha, para glorificar a Virgem de La Salette.

No mesmo lugar da Aparição, perante pelo menos uns cinco mil romeiros, após ter lido a resposta do Papa Leão XII concedendo-lhe, por Rescrito, todos os favores pedidos, o Prelado foi discursando sobre a santa Aparição, com grande elevação de pensamento e suave ternura do seu grato coração, pelas graças recebidas durante os vinte e cinco anos do seu episcopado tão operoso, mormente em defesa e glorificação da Virgem dos Alpes. "Ao terminar o seu discurso, escreveu (270) um dos presentes, D. Fava, movido por zelo apostólico, concitou, com veemente entusiasmo, a imensa multidão a repetir com ele, num vibrante clamor: “Viva Nosso Senhor Jesus Cristo! Viva N. Sra. de La Salette!"

A 17 de Outubro de 1899, esse grande e sábio devoto de Maria em prantos, ia receber junto dela, a recompensa "do bom e fiel servidor". Foi portanto sob o Episcopado do seu sucessor, D. Henry, que com todo o brilhantismo, estando o Bispo presente, foram celebradas as solenidades das bodas de Diamante da maravilhosa Aparição (271).

(270) Annales de N. D. de La Salette. Outubro de 1898.

(271) Pe. Hostachy e Pe. Carlier, livros citados. respectivamente p. 357-522.

 

§ 3o Centenário da Aparição da N. Sa. de La Salette

Sua Santidade o Papa Pio XII, gloriosamente reinante, escreveu já em 31 de Dezembro de 1943, à S. Excia. Revma. D. Harsconet, presidente da Junta Nacional dos Congressos Marianos: "A França, Reino de Maria. tão flagelada pelos atuais acontecimentos, há de se unir para festejar o Centenário da Aparição de La Salette e avivar sua piedade filial para com sua augusta Protetora. Não há dúvida nenhuma que numerosas ficam-lhe reservadas por esta ocasião”. E ao Revmo. Pe. Cruveiller, superior geral dos Missionários de N. Sra. de La Salette: "Nossa devoção para com a SSma. Virgem não pode deixar de se dilatar perante as suaves perspectivas do Centenário da Aparição de N. Sra. de La Salette".

Durante o Congresso, o Papa mandou sua bênção apostólica dizendo: "Em espírito Nós estamos presentes a vossas sessões em que o vosso nobre país rende solene homenagem ao Coração Imaculado de Maria e lhe promete fidelidade filial, especialmente pela santificação dos Domingos e festas consagradas ao Senhor, fidelidade essa que há de torná-lo mais firme na sua vocação cristã. Que a celeste Reconciliadora dos pecadores obtenha do S. Coração tal efusão de graças, que possa haver digna e verdadeira paz!"

Para dar maior brilhantismo às solenidades religiosas comemorativas do Centenário da Aparição de N. Sra. de La Salette, ficou resolvido que se realizaria o Vo Congresso Marial Nacional tanto em Grenoble como em La Salette, de 2 a 8 de Setembro de 1946. Não foi marcado o dia 19 de Setembro, pois naquelas montanhas o frio é já intenso nessa época.

Dessa grande manifestação de fé e dessas esplêndidas solenidades, apresentaremos aqui os acontecimentos mais notáveis. As lágrimas, os lamentos. as advertências de Maria SSma., em La Salette para a conversão do seu povo, proporcionaram aos Congressistas ótima oportunidade para estudos, desenvolvimento do tema principal “Maria SSma., Corredentora do Gênero Humano'". A caraterística do Congresso, omitindo os grandes cortejos, as imponentes procissões, foi um ambiente de oração, de penitência, de reparação. Nesse intuito, meses antes do Congresso, promoveu-se intenso movimento de orações e de sacrifícios; mormente entre os enfermos, a cuja frente estava Myriam de G... notável escritora, acamada, havia 30 anos e as crianças que no dia da sua Missa e Comunhão geral depositaram no altar um lindo pergaminho com as listas das suas 74.000 comunhões, 330.000 sacrifícios 2.000 .000 de Ave Marias.

De modo dramático, num empolgante quadro vivo, 1.600 crianças, reproduziram a descida de Maria SSma. do céu até o monte de La Salette, precedida por um cortejo de 120 crianças, já anjinhos celestes, enquanto que as outras crianças aqui na terra, para lhe enxugar as lágrimas, iam rode-á-la, num expressivo desenvolver se de virtudes; caridade, auxílio mútuo, amor fraterno, agrado aos outros, sacrifícios".

O Tesouro espiritual dos enfermos foi depositado no próprio altar do Santuário no monte de La Salette, no mesmo dia do centenário, 19 de Setembro de 1946, sobressaindo: 17.696 dias de sofrimentos, 221.178 sacrifícios, 41.820 comunhões e 1.611.511.116 Ave Marias. Para as intenções do Congresso rezaram-se mais de cinco bilhões de Ave-Marias.

As principais cerimônias religiosas do Congresso em Grenoble realizaram--se na igreja do S. Coração, cuja pedra fundamental veio da Montanha de La Salette, havendo sermão todas as noites, por vários Bispos, sobre a santa Aparição.

Sua Excia. Revma. D. Roncalli, Núncio Apostólico do Papa na França, quis, renunciando às recepções oficiais, apresentar--se como simples romeiro, presidindo as festas da Assunção de Maria SSma., no próprio lugar da Aparição, onde celebrou Missa e falou sobre a atualidade dos ensinamentos de N. Sra. de La Salette.

Fazendo humilde e discretamente apelo à sua qualidade de Decano do Corpo diplomático, fez votos ardorosos para que os diplomatas então reunidos em Paris, esquecendo as suas discórdias secundárias, estabelecessem a paz no verdadeiro ambiente de ordem espiritual que só poderá garanti-la. Mostrou--se o Exmo. Sr. Núncio, bondoso e paternal, avivando nos corações o amor ao Papa.

Para homenagear à N. Sra. de La Salette, compareceram o Exmo. cardeal Gerlier, uns vinte Arcebispos, Bispos e Abades, 400 Sacerdotes e uns 30.000 congressistas, e numerosos representantes das autoridades civis e militares. D. Martin, bispo de Ruy, subiu a montanha a pé de mochila às costas. Perante essa imponente assembleia, por ocasião do encerramento do Congresso, participando todos nos cantos e hinos apropriados, desenrolaram-se dois magníficos e originais espetáculos, nos quais tomaram parte umas 600 personagens.

Primeiro: comovedora e instrutiva cena do drama do Calvário. Num imenso coreto, Maria SSma. e São João, estão de cada lado duma grande Cruz, para a qual converge toda história do mundo, para a qual tudo se orienta, desde Adão e Eva até João Batista; a Cruz donde tudo sai, Igreja, Sacramentos, santos e santas, a vida eterna; a Cruz, centro da vida do Cristo, da Virgem, da Igreja e da vida de cada um de nós. Eis que dessa Cruz se aproxima Longino, o centurião, para traspassar o Coração do Cristo; e depois a Igreja, para receber numa taça, o sangue e a água que então jorram.

Segundo: o aparecimento de bem quatorze Virgens mais veneradas em torno de Nossa Senhora de La Salette, visão admirável e significativa. Alta estátua de N. Sra. de La Salette conduzida por uma escolta de honra, foi atravessando a relva do Estádio, subindo ao coreto onde recebeu a homenagem das Virgens da França. Essas, vindas triunfalmente das várias províncias, trazidas por cortejos pitorescos de cristãos bem vivos do XXo século , vestindo os seus trajes regionais, estiveram rodeando a Virgem de La Salette durante a missa solene campal, cantada pela massa popular, alternando com os vários coros de cantores.

O ato religioso porém mais imponente, mais significativo e de maior sacrifício, foi a subida penitencial e a solene ereção das quatorze cruzes da via-sacra pelas encostas da montanha de La Salette. De pesada madeira de carvalho, cada uma de 3 metros e 50 centímetros de altura, essas cruzes foram oferecidas pelas quatorze províncias eclesiásticas da França, incluindo as dioceses das Antilhas e do norte da Africa; e receberam a bênção de D. Lhosa, bispo de Ajáccio, Córsega.

Levadas, em carros apropriados até a igreja paroquial de La Salette, juntamente com a décima quinta, oferecida por Grenoble sob cujos braços se realizaram as cerimônias do Congresso. Carregadas aos ombros de padres e leigos que tiveram frequentemente de se revezar, formando infindo cortejo, iam elas subindo a íngreme encosta, por caminho pedregoso, por entre hinos e orações, até alcançarem o lugar da primeira estação.

Ali tudo para, implanta-se uma das cruzes. D. Richaud, bispo de Lavai com palavras candentes foi comentando a Via dolorosa. Renova-se esse gesto de 300 em 300 metros, enquanto muitos assistentes caminhavam penosamente, ofegantes, de pés nus, em reparação da revolta do povo contra o Cristo e sua lei, durante as três horas da rude jornada, rumo da Rainha da Misericórdia.

Ao chegarem diante dela, no lugar da Aparição, com a décima quinta cruz, uns tantos ainda em jejum para comungar, sentiram-se tão cansados que já não podendo mais rezar, limitaram-se a contemplá-la de olhos marejados de lágrimas.

As quatorze horas, em carro pomposamente adornado, chegava também a imagem de Maria SSma., em prantos, seguida de quarenta automóveis trazendo o Cardeal, 03 Bispos, as autoridades civis, entre as quais deputados do Congresso Nacional. Organizou-se então o cortejo imenso, a cuja frente ainda sob lindo sol, a imagem de Maria em pranto, conduzida por 400 padres. Estes carregavam sucessivamente a imagem e a décima quinta cruz, toda branca, a mais pesada, para erguê-la, no alto duma encosta, em frente ao Santuário.

Aí chegando, recebe a bênção de D. Caillot, bispo de Grenoble, que fizera questão apesar dos seus 86 anos de idade, de tomar parte nas piedosas manifestações.

Lá campeiam as quinze enormes cruzes. de braços acolhedores, dos justos e particularmente dos míseros pecadores, redizendo-lhes: "Penitência, oração, amor", qual imorredouro memorial do Centenário da Aparição de N. Sra. de La Salette.

A 19 de Setembro, o próprio dia do Centenário, esplêndidas foram as solenidades. com a presença de D. Futy, da Congregação de N. Sra. de La Salette, Bispo missionário na ilha de Madagáscar e de D. Vittoz, Bispo Auxiliar de Grenoble e mais de 5.000 romeiros. Ao Evangelho da Missa pontifical, celebrada por D. Vittoz, pregou D. Futy com apostólica eloquência, tomando por sua vez a palavra, Mons. Vigário Geral, conforme cartas recebidas de lá, renovou a consagração. feita em 1870 por D. Popow, Bispo de Sofia, da Bulgária e do mundo Eslavo, a N. Sra. de La Salette.

Durante as solenidades do Centenário houve romeiros de quase todas as nações. Em Roma, na basílica de Santa Maria dos Anjos 30.000 pessoas tomaram parte nas cerimônias presididas por S. Eminência o Cardeal Tisserant.

Não reproduziremos aqui as narrativas divulgadas no "Mensageiro" das solenidades realizadas no Brasil.

Recordemos apenas a inolvidável procissão luminosa do Rio de Janeiro, o alvo cortejo de 800 filhas de Maria que na Capital de S. Paulo subiram ao santuário do alto de Sant'Ana para lucrar a indulgência plenária e, na mesma cidade, as duas imponentes procissões das paróquias de Sant'Ana e de N. Sra. de La Salette. Encontrando-se em seu percurso uniram-se para formar infindas fileiras a glorificar Maria SSma. em pranto.

Com muito pesar não mencionamos tantas festas em numerosas localidades do interior. Citaremos apenas Marcelino Ramos onde uns 30.000 romeiros, conduzidos por sete bispos, orando e cantando naquela indescritível peregrinação de penitência realizaram uma das mais empolgantes manifestações de fé em honra de N. Sra. de La Salette.

O remate de tantas solenidades foi simplesmente o Retiro espiritual que na sua casa Matriz, na Santa Montanha, fizeram de 22 a 30 de Setembro, cento e vinte quatro padres e irmãos de La Salette. Em todos os peitos ostentava-se o crucifixo caraterístico da Congregação, isto é, com a torquês e o martelo, instrumentos da paixão, assim como viram os pastorinhos no peito de Maria SSma. na Aparição; e nos corações, a intensa alegria dos encontros fraternais, encerrando-se os piedosos exercícios com a profissão religiosa de 14 estudantes e a renovação dos votos de 110 religiosos, perante aquile altar ao qual estão vinculadas tantas almas espalhadas pelo vasto mundo, lá recordadas pelos seis expressivos e simbólicos brasões cujos dizeres em seis línguas diferentes correspondendo às seis províncias da Congregação, proclamam que está sendo cumprida filialmente a ordem da Mãe chorando: “Comunicai isso a todo o meu povo" (272).

(272) Colhemos quase todos os dados acima na magnifica brochura, tão bem ilustrada, publicada em Grenoble: "Centenaire de Notre Dame de La Salette", por P. Y. Estienne. Bibliografia 81.

 

QUINTA PARTE

OBRAS RELIGIOSAS ORIUNDAS DA APARIÇÃO DE N. SRA. DE LA SALETTE

CAPITULO PRIMEIRO

A CONGREGAÇÃO DOS MISSIONÁRIOS DE N. SRA. DE LA SALETTE

§ 1o Preliminares

Proclamada que foi a realidade indubitável da Aparição de Maria SSma., D. Felisberto de Bruillard lembrado, por certo, da repetida ordem de Nossa Senhora "Pois bem, meus filhos, transmitireis isso a todo o meu povo'", ordenava em sua carta pastoral de 1o de Maio de 1852 a construção de um Santuário na Montanha privilegiada, e, na segunda parte da mesma carta, determinava o seguinte:

"Mas, irmãos muito amados, por mais importante que seja a construção deste Santuário, algo que o é ainda mais, a instituição dos ministros de religião, destinados ao seu serviço, para serem a todos os fiéis, dispenseiros dos. Mistérios de Deus e dos tesouros espirituais da Igreja, estes sacerdotes serão intituladas MISSIONÁRIOS DE LA SALETTE. A sua instituição será assim como o Santuário, um monumento perene, uma recordação perpétua da misericordiosa Aparição de Maria...

O venerando Bispo nomeou dentre os sacerdotes mais exemplares de sua diocese os primeiros missionários, a saber:

Os PP. Sibillat, Denu e Burnoud. sendo este último o Superior. Constituíam eles uma tríade admirável, unidos por laços de estreita amizade e possuidores de um conjunto de dotes que os tomavam aptos para o fim a que eram destinados. Pois, o Pe. Burnoud era excelente organizador e ótimo administrador, o Pe. Sibillat. eloquente orador sacro, o Pe. Denaz, asceta piedoso e zeloso confessor. Esses pioneiros destemidos acharam-se reunidos sob o mesmo teto na asa paroquial de La Salette a 20 de Maio de 1852.

Ora, por ordem do Exmo. Sr. Bispo, devia realizar-se na Montanha santa a cerimônia de· bênção e do lançamento da pedra angular do futuro Santuário. Oportuna ocasião ofere­cia-se logo de inicio aos novos Missionários de revelarem suas excelentes qualidades. Graças à primorosa organização planejada pelo Pe. Burnoud, devido ao brilhante sermão do Pe. Sibillat e às prolongadas horas no confessionário do Pe. Denez, aquela missa campal transformou-se numa apoteose à Mãe em Pranto, apesar da inclemência do tempo. A presença do Prelado diocesano e do Bispo de Valença, contribuiu para tomar ainda mais imponente e piedosa aquela manifestação de fé.

A 1o de Setembro reuniu-se ao pequeno grupo mais um Missionário o Pe. Bonvallet e em 1o de Novembro mais o Pe. Archier, que seria a coluna mestra do novel Instituto. Em sua carta pastoral o Sr. Bispo anunciara "aos Missionários de Nossa Senhora que a vida do apóstolo é vida pobre, dura e laboriosa". Naquelas montanhas, a pequena comunidade habitava um casebre de madeira com telhado de palhas; constava de um único compartimento que era ao mesmo tempo sala de jantar, sala de visitas, gabinete de trabalho, quarto de dormir e cozinha.

A 27 de Maio de 1852 escrevia uma romeira, Srta. Des Brulais: "Ó minha amiga, se você visse a pobre e pequena cabana onde moram esses piedosos missionários! É mesmo o estábulo de Belém. Esta semelhança enche-lhes o coração de santa alegria. Um deles, o Pe. Sibillat, dizia-me ainda à pouco: "Quando vejo pelas frestas do teto de tábuas luzir no firmamento uma estrela. ponho-me a pensar: é o olhar de minha Mãe que vigia sobre mim", e acrescentava: "Não trocaria minha tosca cela por um palácio" (273).

O bem-aventurado viera agradecer a milagrosa cura de Mile Gufllot, sua penitente e futura coadjutora entre as senhoras do Ssmo. Sacramento.

Após dez anos de terríveis sofrimentos, desenganada pelos médicos, pediu por ordem do bem-aventurado, sua cura a N. S. de La Salette que lha concedeu completa no dia 8 de setembro de 1849, conforme carta do Bem-aventurado de 8 de dezembro do mesmo ano ao Vigário de Corps: “Antes examinei, vi e acreditei”, escreveu a respeito da Aparição.

Assim foi até Setembro de 1853,. quando se mudaram para a nova habitação de pedra contígua do Santuário. Era no dizer do seu Superior: '"uma família de irmãos. Cor unum". Devido aos cuidados da Cúria episcopal, foi-lhes preparado também uma residência em Grenoble, sede do bispado. O Prelado diocesano aprovou o Regulamento provisório, apresentado pelo Superior, Pe. Bumoud.

(273) À esse “Rancho” chegava a 18 de agosto de 1852, o Bem-aventurado Pedro Julião Eymard, fundador da Adoração Perpétua do Ssmo. Sacramento. Escreveu ele no livro do Tombo: “Se eu não fosse religioso marista… ligar-me-ia de corpo e alma ao serviço de N. S. de La Salette. Tive a dita de proclamar, por primeiro em Lião, o milagroso feito da Aparição e hoje me sinto feliz em beijar com amor e gratidão esta terra bendita”.

 

§ 2o Rumo à Congregação dos Votos Religiosos

Estava portanto semeado o grão de mostarda, destinado como aquele do Evangelho, a tornar-se uma grande árvore, sobre a qual se desencadeariam as rajadas furiosas das provações, sorte de todas as obras de Deus. No caso vertente, porém, o mal devastador encerrava-se na própria semente.

Por não ter sido aceita pelo novo Bispo Dom Ginoullac a Regra definitiva apresentada como sendo inspirada por Deus a uma penitente do Pe. Burnoud., este, embora fosse o Superior, afastou-se definitivamente da Sociedade. Por determinação do mesmo Prelado. a 1o de Maio do ano de 1858, sucedeu-lhe no alto cargo o Pe. Archier que procedendo com a maior Prudência, mas ao mesmo tempo com firmeza ''suaviter a fort ter" exigia fosse observada a Regra provisória do Pe. Orcel, Superior do Seminário Maior e por outro lado ia incutindo nos espiritos a conveniência de que a Regra definitiva fosse fruto da experiência e do estudo de todos os Missionários.

Apôs a leitura de uma carta de orientação do Prelado diocesano, bondosa, clara e firme em que se lia "fazemos questão que se chegue finalmente a professar os votos temporários, pois, a emissão dos votos, embora por um ano, estabelece definitivamente qualquer comunidade religiosa. Quem julgar não poder assumir tal compromisso, queira prevenir-nos e, de comum acordo, tomaremos as devidas providências". Serenaram-se os ânimos e, feito o retiro espiritual, seis Missionários, com o Pe. Archier à testa, emitiram, nas mãos do Bispo, por um ano, os três votos simples de religião a 2 de Fevereiro de 1858.

Apresentava-se ao mesmo ano, como postulante o Pe. Silvano Maria Giraud. sacerdote talentoso e alma de escol, durante cujo noviciado se manifestou o maior perigo jamais havido para o Instituto sob forma de profundas divergências a respeito do próprio fim da Congregação. Não havia mais acordo sobre o teor de vida religiosa e da Regra que se devia adotar. Na Mensagem de Maria Ssma., em sua Aparição, há duas caraterísticas. O espírito de reparação e penitência, nas palavras: “Por mais que façais, por mais que rezeis, nunca podereis retribuir-me os cuidados..” e de obras de zelo apostólico: "'Transmitireis isto a todo o meu povo".

Tendo o Mestre de Noviças forte propensão para o espírito de sacrifício, esforçava-se por formar nele os noviços impondo-lhes prolongadas meditações. duras austeridades, jejuns rigorosos. Outros Confrades, dando preferência às obras de apostolado, julgavam incompatíveis com as obras de zelo tantas meditações e austeridades.

Durante anos, nas discussões, nos debates capitulares, renhida foi a luta, que se prolongou durante os três períodos do superiorado geral do Pe. Giraud, que por índole própria pendia para a contemplação e vida de imolação. Debalde tentou ele harmonizar as duas tendências. Finalmente, no Capitulo geral de 1878. sendo Bispo D. Fava, predominou o caráter apostólico por maioria absoluta de votos e portanto foi aprovada a regra correspondente e ficou sendo Superior Geral o R. Pe. Ardder. Germinara providencialmente viçoso e robusto o grão de mostarda em meio às borrascas, para estar apto a desenvolver-se em grande árvore.

 

§ 3o O Recrutamento, Congregação de Direito Pontifício

O recrutamento dos Membros efetuara-se até essa data pela admissão na Congregação de sacerdotes do clero secular. Esse modo de recrutar logo se mostrou ineficaz e inseguro. Por esse motivo o Superior Geral, Pe. Archier deu bom acolhimento a proposta de alguns pedres que preconizavam a fundação duma Escola Apostólica ou Seminário Menor. Por ocasião da primeira romaria de D. Fava a N. Sra. de La Salette, o Pe. Archier humildemente, de viva voz, solicitou de Sua Excelência a necessária autorização. O Sr. Bispo, que labutara nas missões longínquas, compreendendo a importância de tal fundação, respondeu bondoso: “Pois sim! Padre, autorizo-o de todo o coração e abençoo o seu projeto". Era o dia 13 de maio de 1876.

O Pe. Arcbier Confiou imediatamente a realização dessa obra ao Pe. João Berthier, tão bem aquinhoado para empreendimentos desta natureza a ponto de mais tarde se tomar o fundador duma Congregação religiosa. Anunciando o Pe. Berthier a criação da Escola Apostólica, fiz, na revista "Annales de Notre Dame de La Salette'", editada pela primeira vez em 1o de Maio de 1885, caloroso apelo, declarando abertas as matriculas para jovens que se sentissem chamados à vida religiosa e sacerdotal.

Pedidos de admissão vieram sem demora de modo que aos 5 de Agosto de 1878, no Seminário S. José, ao pé da Montanha" da Santa Aparição, 15 apostólicos, oriundos de várias regiões da França, iniciavam o tirocínio de futuros Missionários de Maria SSma. em Pranto. Risonho descortinava-se o porvir. Esperançosos os missionários alargavam as vistas pelo vasto mundo. Fazia-se mister, porém, que a Congregação, transpondo os estreitos limites diocesanos. conseguisse a indispensável aprovação de Roma.

Entrementes, Mons. Bernard, Prefeito Apostólico da Suécia veio com pedido de auxiliares ao Superior Geral, prometendo intervir junto ao Bispo de Grenoble e à Santa Sé.

As atividades dos missionários como primeiros da fé daquelas terras. arrancadas ao seio da Igreja pelo protestantismo, desbravaram o caminho que conduz ao redil da Igreja Católica Aquelas almas transviadas, até que a maternal providência de Maria lhes destinasse outro campo de apostolado na tórrida e agreste ilha de Madagáscar.

Em Novembro de 1878, D. Fava resolveu viajar a Roma, levando consigo como secretário particular o Pe. Henrique Berthier. Durante a audiência com o Sto. Padre, D. Fava apresentou ao Papa o Pe. Henrique, salientando que se tratava de um Missionário de N. Sra. de La Salette.

"Oh!, exclamou Leão XIII, um Missionário da '"Bela Madona" de La Salette" e dignou-se interrogar a respeito da Congregação e das Regras. se já foram aprovadas. Sendo negativa a resposta o Papa frisou: "Mas é preciso fazê-las aprovar, e virando-se para D. Fava, concluiu com fino sorriso nos lábios: "Não é assim, Excia.?" O Bispo gentilmente anuiu. "'Pois bem, prosseguiu Leão XIII, dirigindo-se ao Pe. Berthier, que lhe apresentava um exemplar da Regra de que vinha munido, entregai-o a S. Congregação. O Sr. Bispo dará o seu apoio".

Segundo os tramites legais a súplica mereceu plena aprovação da S. Congregação que publicou sucessivamente, a 27 de Maio de 1879, o decreto laudatório, a 2 de Maio de 1890 o decreto "ad experimentum" e finalmente a 4 de junho, decreto sancionado a 7 de junho seguinte por Pio XI a Regra teve aprovação definitiva, Por todo esse rosário de favores, vibrantes foram os hinos de ação de graças entoados pelos Missionários de N. Sra. de La Salette, pois, nessa honrosa e querida circunstância recebiam perpétua acolhida no grêmio da Santa Igreja.

 

§ 4o - Expansão Salettina

Na alma dos Missionários de N, Sra. de La Salette ressoava sem cessar e com insistência a ordem da Celeste Rainha:

“Pois bem, meus filho!', transmitireis isto a todo o meu povo".

Daí os constantes esforços para levarem ao mundo inteiro a Mensagem da Mãe em Pranto.

Para não abusar da benevolência do prezado leitor, vamos esboçar apenas em largos traços o painel da expansão Salettina, dizendo algo de cada uma das suas províncias pela ordem cronológica da criação, reservando, como é de justiça, lugar de maior relevo para a nossa província do Brasil.

A Cúria Geral da Congregação devia ter sua sede no próprio lugar da Aparição, mas devido à perseguição religiosa movida contra as Congregações e Ordens religiosas teve diversas sedes provisórias na França e na Itália. por fim, atendendo filialmente aos desejos da Santa Sé, transferiu-se para Roma, onde possui um prédio recentemente construído, sentido Superior Geral, o Revmo. Pe. José Imhof, de nacionalidade suíça.

Acha-se sob imediata dependência da Cúria Geral, a Casa Mãe da Congregação na Montanha de La Salette, onde se publica e revista: “Annales de Notre Dame de La Salette". O Escolasticado Internacional, que se acha estabelecido em Roma desde o ano de 1896, conta atualmente com 42 Escolásticos, sendo 6 brasileiros. As duas casas italianas não constituem Província; uma no centro e outra no norte com ao todo, 23 Padres, 13 Escolásticos, 39 Irmãos leigos, 9 Noviços e 14 Apostólicos. Publicam a revista: "Il Messaggero" de N. S. de La Salette.

 

Província de N. Sra. de La Salette na França

Conta 132 Padres, 28 Escolásticos, 39 Irmãos leigos. 13 Noviços, 100 Apostólicos, 32 casas; destas, na Bélgica uma e catorze na ilha de Mandagascar, Africa. Essa missão africana foi iniciada em Agosto de 1899. Compõe-se agora do Vicariato Apostólico de Antsirabé e da Prefeitura Apostólica de Morondava. Muito sofreu essa provincia durante as duas guerras medievais, vendo-se obrigada a fechar suas Escolas Apostólicas. Tem a seu cargo duas paróquias. um patronato de rapazes em Paris, um orfanato em Lião. Publica a revista: "Bulletin des Missioneires de N. Dame de La Salette".

 

Província, de N. Sa. das Sete Dores, dos Estados Unidos

Aos 9 de Agosto de 1896 desembarcaram os dois primeiros Missionários em Quebec do Canadá; após terem percorrido várias regiões deste país e dos EU.UU, tiveram paternal acolhimento junto do Bispo de Hartford, cujo Vigário Geral fizera promessa de envidar todos os esforços para estabelecer na diocese uma Congregação religiosa e de preferência uma que se devotasse ao culto de N. Sra. das Dores. Fo­ram, pois, acolhidos os Missionários com grande júbilo e abriram um estabelecimento na própria cidade episcopal.

Há nessa província, criada em 1934, 158 Padres, 84 Escolásticos, 23 Irmãos leigos, 3 Noviços, 109 Apostólicos, 41 Casas, das quais relevamos uma na Luisiana, que é paróquia de Índios, duas nos subúrbios de Londres, pois, a Inglaterra constitui um distrito, e seis na Prefeitura Apostólica de Akyab, na Birmânia. Nos EE.UU. há 26 paróquias a seu cargo: publica as revistas salettinas "The Salette Missionary'", e “Our Ladys Missionary''.

Foi no ano de 1902 que cinco Missionários foram enviados à Polônia à pedido insistente do Bispo de Springfield, dos EE.UU., no intuito de lá formarem sacerdotes de nacionalidade e língua polonesa que seriam em seguida enviados para atenderem os numerosos imigrantes poloneses existentes na sua diocese, para onde, com efeito, foram mandados alguns Missionários, ficando outros nesta nobre nação tão martirizada. Criada em província em 1934 tem como órgão de propaganda salettina o: “posaniec M. B. Saletynskiej”.

Há nessa província 52 Padres, 38 Escolásticos, 21 irmãos leigos, 11 Noviços, 40 Apostólicos, 19 Casas, das quais 3 na Argentina (Córdoba, Santa Fé e Vila Senta Rosa); seu órgão de publicidade é: "El Mensajero de N. Sra. de La Salette”. Possui mais um distrito com 3 casas no Canadá e duas nos EE.UU.

Apesar do jugo cruel dos comunistas, há intensa vitalidade religiosa nas casas da Polônia. Sabemos de modo certo que ainda no dia 19 de Setembro de 1950. aniversário da Aparição, umas 50 mil pessoas foram em romaria a Dembowiec, distribuindo-se naquele dia 40.000 comunhões. O governo comunista apoderou-se de quase todas as casas dessa Província. A Polônia chora em companhia da Virgem de La Salette em Pranto.

 

Província de N. Sra. Reconciliadora dos Pecadores da Suíça

Criada em 1948. Nessa nação refugiou-se grande parte dos Apostólicos da França em 1880 e ai fizeram noviciado e emitiram votos religiosos. O Escolasticado permaneceu aí até 1902.

Em 1924, fundou-se a primeira Escola Apostólica de língua alemã. Atualmente existem nessa província 60 Padres, 20 Escolásticos, 10 Irmãos leigos, 60 Apostólicos, 7 Casas; destas 3 na Colônia portuguesa de Angola, na Africa, Missão iniciada em 1946. Publica a revista: "Botschaft von La Salette".

 

Província do Imaculado Coração de Maria dos Estados Unidos

Criada em 1945 pelos franco americanos, a pedido reiterado dos Padres e Escolásticos oriundos do Canadá. cujos emigrantes são em grande parte de língua francesa e de tradições profundamente católicas.

Consta essa província de 63 Padres. 21 Escolásticos, 29 Irmãos leigos, 9 Noviços, 83 Apostólicos, distribuídos em 6 Casas, das quais, duas nas Ilhas Filipinas.

Seu órgão de propaganda é: "Celle qui pleure", revista farta e artisticamente ilustrada.

 

§ 1a - Província da Imaculada Conceição do Brasil (criada em 1934)

EM SÃO PAULO

Há muitos anos que na Terra de Santa Cruz se honra a N. Sra. de La Salette, pois, encontramos seu culto estabelecido na Bahia, no convento das Religiosas Visitandinas em cuja capela piedosamente se venera a Maria SSma. em pranto. O autor destas linhas estando em viagem, teve a dita, em Junho de 1938, de lá encontrar reunidas e de animar numerosas pessoas devotadas ao culto de N. Sra. de La Salette.

Em S. Paulo, no antigo Seminário Maior, os Revmos. PP. Capuchinhos, seus Diretores então, querendo atrair sobre os futuros Sacerdotes as bênçãos da Virgem em Pranto e infundir-lhes no coração fortes sentimentos de zelo, colocaram na capela uma estátua representando Maria SSma. falando aos pastorinhos, grupo que ficou na memória de várias gerações de sacerdotes. Não é, pois, de estranhar se a devoção a N. Sra. de La Salette e as diversas obras religiosas estabelecidas celeste Aparição tenham encontrado e continuem a encontrar carinhoso acolhimento junto do operoso Episco­pado e zeloso Clero e bom povo brasileiro.

Quiséramos a todos exarar aqui a viva expressão do nosso agradecimento. O impulso, porém, do culto de N. Sra. de La Salette no Brasil deve-se à vinda providencial dos seus Missionários para esta amada terra de Sta. Cruz, que hospitaleira os acolheu quando acossados pelas rajadas impiedosas da perseguição na França.

O primeiro foi um Missionário de acrisolada virtude, Pe. Clemente Moussier, natural de Ablandins, uma das aldeolas de Le Salette, na França (274). Com a bênção e licença do Superior Geral da Congregação, (Revmo. Pe. José Perrin), partiu no vapor "La Plata", a 28 de Novembro de 1902 e desembarcou, após feliz viagem no porto de Santos, no dia 18 de Dezembro, sendo acolhido e conduzido à capital bandeirante pelo Rvmo. Pe. José Masset. capelão da Casa Provincial das Irmãs de S. José de Chambery, na cidade de Itú, Estado de São Paulo, para onde levou o recém-chegado.

Lá durante uns meses o Pe. Clemente ficou aprendendo o idioma pátrio e dando assistência religiosa à Santa Casa.

Em 1o de Julho de 1903 encaminhou-o para Jaú, no mesmo Estado para ser o capelão do internato dessas Religiosas durante um ano.

Entrementes o Pe. Clemente cogitava numa instalação definitiva da sua Congregação. Aqui passamos a transcrever um autógrafo do próprio Missionário, escrito que é propriamente o Termo de nascimento dos Missionários de N. .Sra. de La Salette em terras do Brasil "'No começo de Abril de 1903, alguns meses após a minha chegada ao Brasil. saindo de ltú, fui a S. Paulo para falar com S. Excia. Revmo. D. Antônio de Alvarenga, no dia depois de suas Bodas de prata episcopal: cheguei, porém, para assistir aos funerais do santo Bispo, falecido :na noite anterior, depois de prolongada enfermidade. No dia seguinte, estando no Alto de Sant'Ana, para fazer uma visita ao magnífico Internato que as irmãs de S. José ai levantaram e, ouvindo falar das necessidades espirituais desse bairro abandonado, quase sempre sem pastor (pois de Julho de 1985 a 1903 já tivera 6 vigários) por causa da sua pobreza, senti o meu coração confranger-se à vista das misérias de toda espécia dessa paróquia. Pareceu- me que N. Sra. de La Salette lançava olhares misericordiosos sobre esta povoação, cujos doentes quase na sua totalidade morriam sem o conforto da Religião e a terça parte das crianças ficavam sem serem batizadas. Voltei para Itú, onde me demorei cerca de 3 meses, indo em seguida a Jaú sem manifestar a ninguém esse meu propósito.

No ano seguinte, em Março de 1904, a Revma. Madre Superiora do Colégio de Sant’Ana mandava perguntar-me se eu queria vir para iniciar em S. Paulo a primeira Casa da Congregação no Brasil. Encontrando nela uma pessoa de ideais idênticos aos meus e disposta a me auxiliar na execução do meu projeto de fundação, após refletir e rezar, respondi que breve iria a Sant'Ana, pois, tencionava fazer uma visita a D. José de Camargo Barros, novo Bispo de S. Paulo, isto é, assim que S. Excia. tivesse tomado posse da Diocese.

Em 27 de Abril cheguei em S. Paulo e no dia seguinte apresentei-me ao Sr. Bispo; ia acompanhado par Mons. Benedito Alves de Souza, vigário da paróquia de Sta. Cecilia, a quem a Superiora da Colégio Sant'Ana me havia recomendado. Asseverou-me Sua Excia. Revma. que eu podia contar a sua benevolência, que se ocuparia do negócio. Compreendi que o caso estava favoravelmente resolvido".

Com efeito, nomeado vigário por provisão de 24 de Agosto de 1904, o Pe. Clemente Henrique Moussier, no Domingo seguinte, dia 28, lendo pessoalmente a provisão na Missa, tomou posse da paróquia de Sant'Ana, na qualidade de 1o vigário.

Não tendo essa paróquia nem igreja matriz nem casa paroquial, o Padre teve de hospedar-se numa casa perto do Colégio e da capela. Santa Cruz, matriz provisória.

Foi nessa mesma c:asa que os Padres e os Irmãos fitaram morando até o ano de 1910, sendo portanto essa casa a primeira residência regular dos Missionários de N. Sra. de La Salette no Brasil. Tendo adquirido terreno e casa com andar térreo em frente à nova Matriz, na rua Voluntários da Pátria, os Padres vieram ali morar a 2 de Março de 1910. Transferiram-se em 1o de Novembro de 1913 para a nova e espaçosa residência construída na sua Salette, aberta pela Prefeitura Municipal. Residiram ali até Julho de 1947, quando foram vendidos o terreno e o prédio, no intuito de amparar o Seminário Apostólico.

Se excetuarmos os anos de sagrado ministério na Santa Cruz das Palmeiras deixado por motivo da convocação dos Padres para a guerra de 1914, os Missionários continuaram quase a exclusivamente a desenvolver suas atividades na paróquia de Sant'Ana, que incluía as capelas do Colégio das Irmãs de S. José, dos Lázaros do Guapira, atualmente Jaçanã. Foram promovendo sem descanso a construção da Matriz e da Casa Paroquial contígua. Nas dependências da igreja prosperam 12 associações religiosas e importante dispensário e laboratório. Tão grande vulto alcançou a Paróquia que dela se criaram nada menos que 7 outras freguesias e parte de mais duas entre as quais merece especial menção a de N. Sra. de La Salette.

Cuidaram filialmente os Missionários de estabelecer e fomentar sempre o culto de sua Boa Mãe do Céu em Pranto.

Efetivamente todos os anoa de 1904 a 1918, realizava-se em Setembro uma romaria organizada e chefiada pelo futuro Bispo de Vitória, Mons. Benedito Alves de Souza que sempre com eloquência pregava os ensinamentos de N. Sra. de La Salette.

Mereceu peculiar relevo a de 1917, preparada pelo futuro cardeal Leme, e presidida pelo Bispo D. Duarte Leopoldo e Silva e a de 1915, preparada por Santas Missões, pregadas pelo famigerado brasileiro Mons. Miguel Martins. havendo sido distribuídas 1500 comunhões.

Na Matriz de Sant'Ana o culto de N. Sra. de La Salette fica especialmente aos cuidados da Confraria, canonicamente estabelecida em 1909. A capela de N. Sra. de La Salette, magnificamente adornada, com altar de mármore, com amplo painel à fresco a reproduzir em largas proporções e cores vivas, as três fases da Aparição. Mercê de Deus e de Maria SSma. em Sant'Ana o movimento religioso é considerável. Foi desmembrada de Sant'Ana a paróquia de N. Sra. de La Salette em 24 de Março de 1949. Os missionários estão promovendo ai a construção dum imponente Santuário, para que N. Sra. de La Salette domine dai a grande Metrópole paulista. Por ora o seu culto se realiza numa exígua capela provisória, em cujo recinto venera-se um fac-simile da Aparição em La Salette. Serve de igreja paroquial e sede da Confraria de N. Sra. de La Salette e mais associações religiosas.

No terreno da Residência surgiu vasto prédio para servir de escola primária, onde mais de 100 alunos recebem sólida formação cristã, sob a direção das Irmãs de S. Vicente de Paula.

(274) Achava-se o Pe. Clemente Moussier nos EE.UU., onde numa entrevista, tida com uma irmã da congregação de S. José de Chambery, soube da falta dolorosa do clero no Brasil. Daí o seu pedido de vir ao Brasil.

 

NO RIO DE JANEIRO

Desde algum tempo o Cardeal Arcoverde manifestara o desejo de confiar aos Missionários de N. Sra. de Salette uma paróquia na sua Arquidiocese do Rio de Janeiro. Com a chegada de mais Padres pôde o Pe. Clemente Moussier atender a tão honroso convite, chegando à Capital Federal em Abril de 1912. Foi nomeado vigário da populosa e mui necessitada paróquia de Santo Cristo dos Milagres, cujos ofícios religiosos, devido a tal incompreensão da irmandade, passaram a efetuar-se na capela do Hospital de N. Sra. da Saúde. Foi dessa capela que, num Domingo de Setembro de 1913, saiu a imagem de Maria SSma. em Pranto, conduzida triunfalmente por uma imponente procissão, percorrendo por entre flores e hinos, pela primeira vez. várias ruas da Capital do Pais.

Entretanto, por mais que os Mission6rios se esforçassem por encontrar no território a eles confiado um lugar apropriado para erguer sua residência e o santuário, nada conseguiram, neste particular. Volveram então as vistas para o bairro de Catumbi, onde finalmente, no última dia duma novena a N. Sra. de La Salette, puderam adquirir, com o consentimento do Exmo. Cardeal Arcebispo e do Exmo. Núncio Apostólico, terreno e prédio suficiente para seus intentos, no dia 18 de Julho de 1913.

Nesse bairro cuja população era, como ainda é agora, composta de humildes trabalhadores manuais e modestos comerciários, na parte do prédio, transformada em capela, simples e estreita, iniciaram os trabalhos apostólicos os obreiros de Maria em Pranto.

Tendo sido criada a paróquia de N. Sra. de La Salette. por decreto de 14 de Abril de 1914, o Exmo. Cardeal Arcoverde, a 19 desse mês. pessoalmente se dignou vir, ao bimbalhar de minúsculos porém sonoros sinos bentos na véspera por Mons. André Arcoverde para a um só tempo inaugurar a nova paróquia, a nova matriz, pequenina, mas altiva por ostentar as três imagens representando as fases da celestial visão de La Salette, vindas havia poucos dias de França e enfim empossar ao novo vigário Pe. Clemente Moussier.

Apesar da convocação de alguns Padres para a guerra de 1914. as obras salettinas iam se desenvolvendo promissoramente na recém-nascida paróquia tanto que, a 20 de Janeiro de 1918, com grande pompa se realizava a tão almejada inauguração da pedra fundamental do Santuário, oficiando o próprio Cardeal Arcebispo D. Arcoverde.

De reduzida tipografia paróquia a lume a revista: "'Mensageiro de N. Sra. de La Salette", cujo primeiro número apareceu em janeiro de 1917. Despretensioso, mas de ambições nobres, ostentava assim seu programa: "Divulgar o acontecimento da Aparição; apregoar a ação corredentora da Bendita Mãe de Jesus e nossa Mãe, fazer chegar, ao conhecimento dos brasileiros suas suaves mas severas advertências; clamar ao povo a necessidade de retomar à prática dos Mandamentos; fomentar todas as obras que condigam com os fins da Aparição". Atualmente a Redação de "'Mensageiro de N. Sra. de La Salette" acha-se em Marcelino Ramos, Rio Grande do Sul.

 

EM MARCELINO RAMOS, RIO GRANDE DO SUL

(Seminário e Paróquia)

Ventilada já em 1911 a ideia duma fundação de Seminário Apostólico salettino, devido à guerra e crescentes dificuldades, só chegou a realizar-se 17 anos mais tarde e 26 anos depois da chegada dos Missionários. Após algumas viagens pelos Estados sulinos ao Paraná, Sta. Catarina e Rio Grande do Sul, para colher informações e entrar em entendimentos com os Srs. Bispos. encontraram boa acolhida por parte de D. Atico Eusébio da Rocha, então Bispo de Sta. Maria, que se dignou atender ao pedido dos Missionários de N. S. de La Salette, criando para eles a paróquia de S. João Batista em Marcelino Ramos. Autorizando-os a levantar o Seminário no território da mesma, aos 12 de Março de 1928. O primeiro Vigário foi o Pe. Agostinho Poncet.

Enviado como Visitador pelo Revmo. Pe. Superior Geral o R. Pe. SOrrel apresentou-se em Marcelino Ramos em 1o de Junho de 1928, acompanhado pelo Pe. Fidells Willi e Pe. André Duguet, então provincial do Brasil. Sob a direção do Visitador foram tomadas as decisões, mormente a compra dum terreno esplendidamente situado na fralda dum morro, e ultimados os preparativos ficou determinado para a abertura do Seminário Apostólico o dia 2 de Julho de 1928, festa de Purificação de Maria SSma., chegando neste mesmo dia os primeiros candidatos recrutados anteriormente.

Mercê de Deus e proteção de N. S. de La Salette, apesar das continuas e torrenciais chuvas Desta festa, chegava a cavalo o primeiro aluno, o futuro Pe. José Junior Vicente, atual vigário de Marcelino Ramos. Outros se lhe juntaram de mo­do que o despretensioso autor diste escrito, novo Superior e Vigário. encontrou em fins de Julho um pequeno rebanho de oito ovelhinhas medrosas e tímidas, pois, viveram até aí nos seus recônditos rincões, porém resolutas e briosas no estudo e na piedade, cristalizando o fundamento e firmando um esperançoso futuro da Congregação em terras de Santa Cruz.

Em casa bastante incômoda de madeira a recordar a cabana dos primeiros Missionários, regelada no inverno e abrasada no verão, sob a esforçada direção do Pe. André Duguet, que os dirigia nos exercícios religiosos na igreje contígua também de madeira, e nos estudos e aulas realizadas numa única estreita sala de estudos onde se iniciou a formação sacerdotal e religiosa dos escolhidos do Senhor e da Virgem de La Salette.

Em 28 de Novembro seguinte, entrava no Seminário Apostólico, aquele que seria seu firme, devotado e esclarecido amparo por anos a fio, o Pe. Francisco Allard, atualmente de novo Superior e diretor da Escola. Assinalemos também a chegada, aos 11 de Maio de 1929 do esforçado Ir. João Creef, tão bem conhecido pelos nossos amigos e benfeitores, lncansável propagandista de N. S. de La Salette e realizador de importantes empreendimentos entre os quais avulta a construção do Santuário de M. Ramos.

Com a bênção divina, o número dos Apostólicos ia crescendo e com isto a premente necessidade dum prédio mais amplo e apropriado. Decidir isto foi obra do Pe. Picard. Ecônomo Geral da Congregação, chegado a 23 de Abril de 1930.

Com sua colaboração, estudou-se a planta e a 29 de Junho do mesmo ano foi solenemente lançada a pedra angular, efetuando-se a construção com grande rapidez. Aos 23 de Março de 1931 os Seminaristas ocupavam o novo edifício, embora só coberto em parte e possuindo apenas divisões de tijolo bruto, sem portas nem janelas. Felizmente, com a primavera veio o calor e então se acabou a vida campestre. As obras prosseguiram lentamente, sendo a última demão dada epenas recentemente, resultando o magnifico prédio atual.

Entrementes o Ir. João, percorria com a missão de recrutador o Rio Grande do Sul. trazendo novas levas de novatos.

Devidamente autorizado pela autoridade diocesana dava início às romarias que modestamente se celebravam na capela do Seminário. Maria SSma. largamente abençoou o seu humilde pregoeiro, pois, por ocasião do 91o aniversário da Aparição, no último Domingo de Setembro de 1937 chegavam uns 1.000 romeiros, iniciando a procissão penitencial que desde então todos os anos escala as pedregosas rampas entre orações e hinos de súplica e ação de graças à Virgem Reconcilladora doi Pecadores.

E sempre num crescendo incoercível, no último domingo de Setembro a romaria penitencial ao Santuário da Mãe em Pranto atrai dezenas de milhares de romeiros entre os quais D. Antônio Reis mereceu pela sua assiduidade e fervor marial o título de “Romeiro no 1 de N. Sra. de La Salette.

A grande afluência de fiéis reclamava forçosamente um templo mais vasto. Em Abril de 1946, D. Antônio Reis lançava esse arrojado projeto, benzendo a pedra fundamental do Santuário, cujo surgimento prodigioso se deve em grande parte aos incansáveis esforços do Ir. João, que soube acertar e fazer vibrar o coração de muitos benfeitores para que com suas esmolas fizessem erguer-se majestoso em suas linhas modernas o Santuário da Mãe que Chora. Inaugurado em fins de Setembro de 1949 foi bento por D. Antônio, com toda a pompa litúrgica, em presença de milhares de romeiros. A sua arrojada cúpola domina os verdejantes morros de Marcelino Ramos, coando através de seus vitrais multicores suave luz. Vibram em sua torre em melodiosos acordes os 4 sonoros sinos vindos da França e bentos solenemente por D. Cláudio por ocasião da romaria de 1951. Aninhados em sua alta mansão cantam as glórias de N. Sra. de La Salette, graças particularmente à generosidade dos franceses radicados no Brasil

Em frente ao Santuário veneram os romeiros um expressivo fac-simile da Aparição reproduzindo em lindas estátuas de cimento branco es três atitudes de Maria em La Salette.

Não descuidaram, entretanto os Missionários a paróquia a eles confiada. Quatro novas capelas surgiram na zona colonial. Em Marcelino Ramos, em lugar da paupérrima igreja matriz levantou-se suntuoso templo de sóbrias linhas retas, de imponente fachada, de alterosa torre e de vitrais piamente coloridos.

Existem atualmente na Província da Imaculada Conceição do Brasil 27 Padres, sendo 4 franceses, 2 estadunidenses, 4 suíços e os restantes formados no Brasil, no seminário salettino, havendo ainda 34 Escolásticos, dos quais 7 em Roma, 8 lrs. Leigos, 14 Noviços e 95 Apostólicos. Administram 4 paróquias.

 

OS QUE TOMBARAM

Nos campos do labor apostólico os Missionários sempre tiveram trabalho acima das forças de modo que não há de que admirar-se se nove deles tombaram na luta. repousando 7 em terra paulista, um na Capital federal à sombra do Santuário e outro em M. Ramos.

sobre cada um deles aqui vão brevíssimos dados bibliográficos, na ordem em que a Providência foi servida chamá-los à eterna recompensa.

Pe. Afonso Bovier, natural da Suíça, chegou ao Brasil a 18 de Dezembro de 1902; exerceu o s. ministério sacerdotal sucessivamente em Sant'Ana, Jaú, Santa Cruz das Palmeiras, novamente em Sant'Ana, na cidade de S. Paulo, onde faleceu em 26 de Março de 1941. Foi bom, singelo, inocente como uma criança como o aclamou a voz do povo.

Pe. Clemente Henrique Moussier, francês, fundador no Brasil, como vimos; faleceu completamente exausto, pelas ingentes atividades desenvolvidas por ocasião da chamada '"gripe espanhola", na paróquia de N. S. de La Salette, no Rio de Janeiro a 27 de Junho de 1919. Para dizer que sua popularidade basta o fato de mais de 5.000 pessoas estarem presentes aos seus funerais.

Pe. Leão Peroche. natural da Franca, chegou ao Brasil a 8 de Setembro de 1905, exerceu seu :zêlo apostólico quase exclusivamente na paróquia de Sant'Ana, em S. Paulo, “uma. das mais bem organizadas da Arquidiocese, graças aos seus esforços". Foi verdadeiro "Homo Dei", lia-se no jornal "Correio Paulista", em 22 de Agosto de 1919, dia dos funerais desse Padre, cuja saudosa memória ainda perdura nessa paróquia.

Pe. Eugenio Beaup, francês, chegou ao Brasil a 8 de Setembro de 1905, ocupou durante muitos anos o cargo de capelão do hospital de leprosos, e do Colégio de Sant'Ana , onde faleceu a 15 de Julho de 1924. Religioso fiel à regra e sacerdote esforçado no sagrado ministério.

Pe. Francisc:o Burdin, natural de França, chegou ao Brasil a 29 de Agosto de 1903. Alma vibrante e coração de fogo, como estão lembrados os paroquianos de Jaú, e Sant'Ana, N. Sra. de La Salette e particularmente os de Viadutos, no Rio Grande do Sul Foi vitima do seu ardoroso zelo e faleceu em S. Paulo a 10 ele Novembro de 1929.

Pe. Paulo Charton, natural de França, chegou ao Brasil em 1922. Dotado de viva inteligência, exerceu o s. ministério nas paróquias de N. Sra. de La Salette, do Rio, na de Sant'Ana, em São Paulo, onde faleceu, pode-se dizer, ceifado inesperadamente na flor da idade a 5 de Julho de 1932.

Pe. Paulo Ravier, francês. chegou ao Brasil a 22 de Maio de 190S, vigário cooperador das paróquias de Sto. Cristo dos Milagres e de N. Sra. de La Salette do Rio de Janeiro, de Marcelino Ramos e de Sant'Ana em S. Paulo onde veio a falecer a 26 de Abril de 1933, acometido por ataque cerebral, durante as festividades de suas bodas de prata sacerdotais. A Congregação mariana lhe venera a memória como seu fundador e zeloso Diretor.

Pe. Agostinho Poncet natural de França, chegou ao Brasil aos 9 de Setembro de 1909, para ocupar importantes cargos. Foi vigário nas paróquias de Sant'Ana; de Marcelino Ramos. Mestre de Noviços e de novo Vigário cooperador em Sant'Ana, S. Paulo, onde faleceu a 18 de Abril de 1943. Missionário esforçado, geralmente era conhecido pela alcunha de "Padre meu bom filho", pois. era com essas carinhosas palavras que acolhia a todos.

Rvmo. Pe. Celeslino Crorel, francês, venerando ancião, que após muitas labutas nos Estados Unidos e depois de ter ocupado altos cargos de Procurador Geral junto da Santa Sé Assistente Geral e Superior Geral da Congregação, aceitou, apesar dos seus 70 anos, o Provincialato do Brasil, onde aportou em Novembro de 1938, dedicando-se especialmente com sua múltipla experiência e sua paternal bondade, ao bom andamento do Seminário Apostólico de Marcelino Ramos. Forçado, por motivo de sua precária saúde a ir ao Rio de Janeiro para aí se submeter a dolorosíssima operação, faleceu a 23 de Novembro de 1943.

O seu último ato de vontade, manifestado por um sinal, foi de abençoar todas as obras salettinas do Brasil. Enterrado ao lado do Pe. Clemente Moussier, seus restos mortais foram ao depois, transladados e honrosamente tumulados no Santuário, junto ao Seminário pelo qual quis dispender suas derradeiras energias.

O Pe. Celestino é o fundador das Irmãs Missionárias de N. Sra. de La Salette.

Em toda a Congregação já faleceram 126 Padres.

Vós todos, valorosos obreiros da Virgem de La Salette, cuja saudosa memória reverentemente saudamos: Descansai na paz do Senhor!

Voltando à Congregação em geral, respeitando a modéstia dos que ainda vivem, parece-nos oportuno acrescentar algumas palavras sobre dois Missionários de N. Sra. de La Salette, de fama reconhecida mundialmente, a saber os PP. Silvano Maria Giraud e João Berthier.

De acrisolada virtude foi o R. Pe. Giraud (1830-la85), incansável e sobremodo apreciado pregador de retiros para o clero, religiosos e religiosas. Viveu possuído de intenso espírito de sacrifício, que embalsama todos os seus numerosos escritos, principalmente o livro "Espirito e Vida de Sacrifício no Estado Religioso", traduzido do francês pelo Pe. Antonio de Cruz C. M. e impresso pela Editora Vozes. Este livro foi adotado, é lido e meditado por numerosas casas religiosas no Brasil. Mas a sua obra em dois volumes é: “Pêtre et Hostie” (“Sacerdote e Hóstia”), de elevado estilo e de profunda mistica espiritual.

O Cardeal Manning, autor do livro "'Sacerdócio Eterno" escreveu de Londres, 2 de Junho de 1885, ao Pe. Giraud: "'Procurei por toda a parte colher todos os livros que tratam do Sacerdócio, nada encontrei tão completo, tão exato, como o seu "Prêtre et hostie”. Nele o acervo de citações e autoridades excede o de qualquer outro livro conhecido".

Competente historiador da vida religiosa na época moderna, Henri Brernond declara: "O Pe. Giraud fica sendo um dos autores espirituais mais autênticos do século passado". O Pe. Giraud é o fundador das Irmãs da Ordem Terceira Regular de N. S. de La Salette.

O Pe. João Berthier, primeiro Reitor do Seminário Menor e Maior da Congregação; pregador de linguagem singela, mas empolgante, que tivemos a dita de ouvir. É também escritor fecundo em livros e sabemos por termos averiguado pessoalmente. que seus livros ''Theologie Dogmatique et Morale" e "'Le Prêtre dans le Ministère de la Predication" se encontram em numerosas bibliotecas de vigários do Brasil. Permanecendo embora Missionário de N. Sra. de La Salette foi o fundador da Congregação da Sagrada Família, cujos Missionários são merecidamente conhecidos pelo seu zêlo eficiente e operoso em nossa terra.

 

Centenário da Congregação dos Missionários de N. Sra. de La Salette

Por ocasião do seu primeiro Centenário, os Missionários Salettenses realizaram, em todas as suas casas, apropriadas solenidades comemorativas, esforçando--se por lhes dar o máximo esplendor. Limitamo-nos a relatar alguns dessas festividades religiosas. notando que no Brasil celebrou-se também o Cinquentenário da chegada do primeiro Missionário em terra de Santa Cruz.

No Santuário do Rio de Janeiro, com grande afluência de fiéis no próprio dia do Centenário, 1o de Maio de 1952, o Exmo. Sr. Cardeal D. Jaime de Barros Câmara celebrou missa festiva distribuindo avultado número de comunhões e sendo assistido por vários clérigos do seu Seminário Maior, consagrou um artístico altar de mármore dedicado ao Sagrado Coração de Jesus.

Houve tríduo com eloquentes sermões de Mons. Henrique Magalhães que também com linguagem elevada e comovedora falou em suas palestras no Rádio, por D. Jorge Marcos de Oliveira, Bispo Auxiliar, missa com ministros sacrados, sendo Diácono o R. P. Carlos Ambrozzi, Provincial dos PP. Servos da Caridade, sermão ao Evangelho por Moms. Antônio Gonçalves de Rezende, encerrando-se as comemorações com solene ''Te Deum" oficiando Sua Excia. Revma. D. Rosalvo Costa Rqo, Vigário Geral da Arquidiocese. Os pobres foram contemplados com fartas distribuições de gêneros alimentícios.

Em São Paulo, na igreja Matriz de Sant'Ana, celebrou-se piedosa e muito concorrida novena, de 13 a 21 de Setembro, .ficando a organização e o brilhantismo dos exercícios religiosos, cada dia, a cargo duma das associações paroquiais. O remate" foi imponente procissão conduzindo a imagem de Maria em prantos, profusa e ricamente adornada em carro triunfal até o provisório Santuário de N. Sra. de La Salette no alto de Sant'Ana.

Neste último Santuário desenrolaram-se também fervorosas cerimônias. O ato mais solene foi no Dmningo 21 de Setembro, a bênção e o lançamento da pedra fundamental por um Bispo auxiliar, delegado do Exmo. Sr. Cardeal Arcebispo.

D. Carlos Motta, do futuro Santuário, cuja maquete ostenta um monumento de amplas dimensões.

No Rio Grande do Sul, em Marcelino Ramos, no Domingo 28 de Setembro, além da procissão luminosa, no dia do 106o aniversário da Aparição, efetuou-se a já tradicional Romaria de Penitência, que neste ano, precedida por um tríduo pregado pelo R. Pe. Cura da Catedral de Passo Fundo, revestiu-se de excepcional brilho.

Após ainda uma procissão luminosa, seguida às 23 horas de concorridíssima e fervorosa Hora Santa de reparação perante o SSmo. Sacramento, a distribuição de mais de 3.000 comunhões, desenrolou-se a empolgante Procissão de Penitência, ondeando rumo acima pela íngreme encosta, espargindo pelos vales adentro, hinos, orações e brados de misericórdia e perdão ao Cristo e à Virgem das lágrimas, até formar um verdadeiro mar humano duns 20.000 romeiros que, na missa fesüva campal, ouviram a palavra eloquentemente mariana do amado Bispo celebrante, o próprio Pastar da Diocese, D. Cláudio Colling.

Em Roma, a notícia das solenidades comemorativas foram espontaneamente irradiadas pela Rádio Vaticano, sendo explicada, numa ulterior irradiação a oportunidade de celebrar-se o Centenário da Congregação (275).

Consistiram essas solenidades na inauguração particularmente da nova sede da Cura Generalícia, perto do Janículo, na bênção da sua elegante capela, com toda a pompa litúrgica por D. Luizi Traglia, Bispo Auxiliar de S. Ema. o Cardeal Vigário do Papa em Roma, numa brilhante e convincente conferência sobre a santa Aparição pelo R. P. Laurent, Reitor do Santuário no monte de La Salette, a numerosa assistência de altas personalidades, na tomada de posse do cargo de Protetor da Congregação dos Missionários de La Salette, por Sua Exma. o Sr. Cardeal Tisserant, Prefeito da Sagrada Congregação para os Orientais.

Oferecendo ao Eminente Patrono, numa bandeja, uma chave, como que ao dono das nossas casas, uma sineta, que ele tocou levemente, a indicar que ele comunicará os chamados de Deus, o livro da Regra, como ao guarda dos valores religiosos da Congregação, o Revmo. Pe. Superior Geral declarou: “Somos uma Congregação mariana, somos uma Congregação apostólica, somos pequenos, eis ai os títulos que possuímos para contar com vossa proteção que imploramos".

Tomaram parte nessas cerimônias e nos ágapes fraternais, S. Excia. Revma. D. Caillot, Bispo de Grenoble, ali presente, apesar de seus 82 anos de idade, como que a representar o Bispo Fundador, vários Bispos Prelados, Superiores Gerais de Ordens e Congregações religiosas, sendo a Providência do Brasil representada pelo seu Provincial, Revmo. Pe. André Duguet.

Finalmente, mais duas provas da paternal bondade do Santo Padre para com os Missionários de N. Sra. de La Salette. Em 22 de Abril de 1952, Pio XII, por intermédio da Secretaria do Estado do Vaticano, se dignou escrever-lhes as suas felicitações, fazendo os melhores votos por ocasião do seu centenário, acrescentava: “Do Santuário Mariano, berço da Congregação, os religiosos difundiram-se por numerosos países, e hoje em dia, levam até longínquas terras o espírito missionário mariano que caracteriza o instituto”. Em 28 de maio seguinte, o Papa recebeu 70 religiosos saletinos numa audiência tão carinhosa que até consentiu ser fotografado no meio deles, jubilosos por tão grande honra. Concedeu 1000 dias de indulgência “toties quoties”, a quem os seus crucifixos de missionários falando lhes com nímia benevolência "da vossa eminente Congregação".

Perdurando ainda o ano do Centenário fazemos aqui um caloroso apelo aos prezados leitores, para que bondosamente se unam aos humildes e desde já desvanecidos 510 Padres Missionários, 212 Escolásticos, 140 Irmãos, 100 Noviços e 640 Apostólicos da Congregação de N. Sra. de La Salette, coadjuvando-os a cantar o hino de ação de graças a Cristo Rei e à Sua Celeste Rainha neste Centenário de sua existência e neste jubileu áureo de sua vinda a este hospitaleiro e grande Brasil.

Estas comemorações jubilares enaltecem o começo das proféticas realizações, vaticinadas pelo Santo Cura d'Ars em 1856 ao Pe. Archier, que nola deixou consignada nestes termos: "Sois Missionário de La Salette! Oh! La Salette faz um bem enorme, mas ainda mais há de fazer. Grande bem fará sempre e por toda a parte, mais e mais. A Virgem Santa vos fará a graça de realizar uma bela obra; trabalhai em favor dela sempre com coragem, pois, há de crescer e um dia os vossos sucessores terão súditos em todas as regiões do mundo".

Os Capelães seculares. - Durante a forçada ausência dos Missionários de N. Sra. de La Salette, expulsos do Santuário pela perseguição de 1901, contra os religiosos, especialmente cruel para com êles, os lugares da Aparição e as romarias ficaram a cargo de Capelães do clero secular: nomeados pelo Bispo de Grenoble. Durante quase meio século foram eles também obreiros zelosos, esforçados e talentosos do culto de Maria SSma. em prantos.

Entre os Reitores desses beneméritos capelães, mencionemos particularmente o Sr. Cônego Giray, mais tarde Bispo de Cahors, autor do livro "Les Miracles de La Salette", obra notável por nós frequentemente citada; e o Sr. Cônego Garnier, que muito nos honrou com a sua visita ao Santuário do Rio de Janeiro, autor do livro "L'expansion de La Salette dans le monde", estudo apurado que bastante aproveitamos neste nosso trabalho. Queiram eles aqui encontrar o nosso preito de gratidão!

A primeiro de Janeiro de 1943, os missionários de N. Sra. de La Salette, de coração jubiloso, de alma palpitante, a transbordar de reconhecimento, voltavam à casa materna da Santa Montanha. Da expressão do Provincial dos Missionários de N. Sra. de

La Salette na França: "A casa da nossa Boa, nossa Tenra. nossa Misericordiosa Mãe" (278).

(275) A narrativa dessas solenidades, em linguagem fluente e comovedora, foi divulgada no número de maio de maio e junho de 1952 das “Annales de Notre Dame de La Salette”.

(278) P. Hostachy, Histoire séculaire de La Salette, p. 477.

 

CAPÍTULO SEGUNDO

§ 1o Mais instituições religiosas oriundas da Aparição de N. Sra. de La Salette

Para não alongar demasiadamente este Capitulo limitaremos a mera e rápida enumeração. (276A).

As Religiosas Reparadoras, fundadas em 30 de Novembro de 1849, apesar das maiores dificuldades, pelo P. Marche na cidade de Saint-Dizier, diocese de Langres. Tem por fim através de imolação e sacrifício, fazer reparação pelos crimes profilados por N. Sra. de La Salette.

A Congregação das Missionários da Sagrada Família fundada pelo Pe. J. Berthier, Missionário de N. Sra. de La Salette, da qual já falamos.

As Religiosas Reparadoras de N. Sra. de La Salette. - A iniciativa dessa fundação, provém da Senhorita Delvi Fabry, que em 1868 dela falou com o Papa Pio IX. Bondoso o Papa a animou em seu intento, dirigindo-a ao Bispo de Grenoble, Dom Paulinier; deu hábito religioso à Srta. Delvy Fabry e mais cinco irmãs em 17 de Setembro de 1871. Tem por fim fazer penitência pelos pobres pecadores. Essas Religiosas coadjuvam os Missionários de N. Sra. de La Salette na Montanha Santa.

As Religiosas de N. Sra. de La Salette. em Lião e as irmãs da Montanha", fundadas direta e indiretamente pelo R. P. Giraud, M. S. Tem duplo fim, atividades em obras caritativas e vida contemplativa e de sacrifícios para certo número delas.

As Religiosas Missionárias de Sra. de La Salette - fundadas pelos Missionários de N. Sra. de La Salette em 1928 quando era superior o R. Pe. Celestino Crozet, de quem anteriormente tratamos.

Essas Religiosas, receberam Instituição canônica e Regra do Bispo de Soissons, respectivamente em 2 de Fevereiro e 5 de Outubro de 1930.

Tem por fim principal colaborar no Apostolado com os Missionários de N. Sra. de La Salette, tuto em teras pagãs, como nos paises católicos.

Se os resultados não corresponderam aos intentos do fundador, é certo que essa obra preparou os espíritos para as leis sociais referentes ao Domingo.

Para simples memória aqui assinalarem os que durante as sessões do Concílio do Vaticano, o R. Pe. Giraud, M.S. organizou uma Associação cujos membros faziam orações e sacrifícios pelo Concílio.

(276A) Os dados que seguem, aurimos particularmente do livro - “L’Expansion de La Salette dans le Monde” - Cônego A. Garnier – 1948. Bibliografia 76.

 

ADORACÃO PERPÉTUA

Fundada por D. Felisberto de Bruillard, para sua diocese em reparação dos ultrajes. No tempo do nosso seminário menor, pudemos ver com que regularidade e fervor, os membros dessa Associação faziam sua oração ao SSmo. Sacramento na capela dos missionários de N. Sra. de La Salette, em Grenoble. Cessou nessa capela por ocasião da ida dos Missionários para o exílio devido às leis de 1901, de perseguição contra todas as ordens e congregações religiosas.

Altos funcionários do Governo deram a entender que para os missionários de N. Sra. de La Salette não haveria contemplação alguma, devido ao seu apostolado através das romarias e particularmente junto dos homens.

 

§ 3o - As grandes peregrinações

Em 23 de Setembro de 1849, a Senhorita des Brulais, já tantas vezes citada, escrevia: "Três anos decorreram desde que a Rainha do Céu desceu sobre a montanha de La Salette para nos trazer as advertências do seu Filho e já milhares de romeiros aqui vieram para receber da boca destas fracas crianças as palavras da Mãe de Deus. Na Santa Montanha comparecerem representantes do povo todo e enviados do Universo inteiro; missionários vindos das ilhas mais afastadas do grande Oceano, sacerdotes chegando da África ou para lá voltando, romeiros da Inglaterra, da Espanha, da Saboia, da Suíça, da ilha da Córsega, etc., das cidades principais da França" (218).

Tratava-se porém de romeiros que lá subiam por iniciativa individual. A casos particulares não se limitariam estes movimentos, pois da Santa Aparição em La Salette, surgiram essas admiráveis manifestações religiosas que foram e ainda são as grandes Peregrinações anunciadas, organizadas e metodicamente realizadas.

 

Primeira peregrinação nacional em 1872 na França

Foi ao Pe. Thedenat enquanto estava rezando, em Outubro de 1871, na sepultura do venerando Cura de Ars e perante a imagem de Santa Filomena, que ocorreu a feliz ideia de organizar uma Peregrinação nacional de penitência a N. Sra. de La Salette. De volta a Paris, dirigiu uma circular aos Católicos da França para lhes expor o seu projeto e fundou a revista "Eco de Sta. Filomena" para propaganda. Pois bem, dos Missionários de N. Sra. de La Salette veio-lhe a primeira palavra calorosamente animadora e completamente adesiva.

Intento admirável porém tão vultoso que o Pe. Thedenat, simples coadjutor de paróquia sozinho não poderia realizar.

Os Padres da Assunção, aceitaram a incumbência de organizar a peregrinação. Formou-se uma Junta, e o programa elaborado definitivamente duma Romaria Nacional a Ars e à La Salette, entrou em execução. Aos 18 de Agosto de 1872, trezentos e oitenta romeiros de Paris e de mais oito cidades importantes. estavam ajoelhados na igreja dos Santos Gervásio e Protásio, paróquia do Pe. Thedenat, perante a Imagem de Santa Filomena, e pouco depois partiam de trem especial.

Em Dijom e eles se uniram mais duzentos romeiros da Borgonha, outros incorporaram-se pelo caminho, e no dia seguinte faziam oração em Ars. Pelo percurso novos grupos entravam nos trens rumo a Grenoble.

Nessa última cidade foram grosseiramente insultados por um bando de fanáticos malcriados. ralé da sociedade. Não reagiram os piedosos romeiros, pelo contrário, tendo o Bispo D. Faulinier, mesmo na santa Montanha, recebido comunicação que o Procurador Geral fazia questão de processar os culpados, respondeu agradecendo a gentileza, desistindo de qualquer processo, escrevendo: "Os verdadeiros cristãos aprenderam no Calvário a maneira de responder ao insulto e à violência. Não é nem pela repressão, nem pelo desprezo, mas é pelo perdão e pela oração".

Chegando na Santa Montanha, todos os romeiros, sorrindo narraram-me o triste acontecimento e um deles, levantando a voz pediu orações para os culpados, e para eles entoamos três vezes o "Parce Domine" (279) e o salmo "Miserere".

Os romeiros de Marselha chegaram a 18 de Agasto de 1872, cantando, pela vez primeira, o hino "Deus de Clemência" (280). No dia 20, às 16 horas vieram umas cem pessoas de Paris. Marselheses e Parisienses organizaram entusiástica recepção ao Bispo D. Paulinier.

Na manhã seguinte pelas 7 horas, aparece o grupo mais importante chefiado pelo R. P. Picard superior principal dos Assuncionistas. O Exmo. Sr. Bispo e todos vão ao seu encontro e a procissão de mais de mil e quatrocentos romeiros, e uns trezentos padres, serpeando pelas encostas da Montanha, sobe até os lugares da Aparição, onde todos prorrompem, comovidos. em choros e orações. Após a Santa Missa, com eloquente sermão do R. P. Picard, ao Evangelho, ficou resolvido se mandasse ao santo Padre um telegrama de filial devotamento e anúncio de intensas orações. Pio IX respondeu o seguinte: "'O Santo Padre, agradecendo os Romeiros da França reunidos em La Salette esse testemunho de devotamento, envia-lhes, de todo coração, sua bênção paternal. Cardeal Antonelli, secretário do Estado Pontifício."

"Pelas quatorze horas chegaram a pé vinte e quatro meninos do patronato de Dijon, trazendo uma cruz com o Cristo de madeira, e os apetrechos necessários aos viajantes. Passando pela vila de Vizille, sendo injuriados, o mais novinho virando-se para os malvados, gritou com voz infantil: "Rezaremos bastante para vós lá na Salette". É que eles todos iam comungar.

Na Peregrinação havia homens da Inglaterra, Bélgica, Espanha, ltália, Holanda, Hungria", Polônia, Portugal, Rússia, Suíça, Egito, América, Ilhas da Reunião; e todos imploraram N. Sra. de La Salette pelos seus países.

De volta, na estação de Grenoble, os romeiros encontraram uma delegação da cidade cujo orador declarou: "'Piedosos romeiros. Por ocasião da vossa chegada a nossa cidade ocorreu um fato odioso. Homens desclassificados, que Grenoble não aceita para seus filhos, gente cosmopolita promotora de distúrbios vos acolheram com insultos. Ficamos envergonhados por eles, e a população toda está indignada. Não queremos que leveis mau conceito da nossa cidade. Perdoai, piedosos Romeiros”.

O R P. Picard respondeu com toda amabilidade, e todas bradaram: '"Viva a França! Viva o Papa!"

Antes de descer da Santa Montanha, ficou constituído o "'Conselho Geral das Peregrinações que continuou e ainda prossegue na realização de Romarias porém mais tarde foram e vão a N. Sra. de Lurdes por ser mais fácil a viagem. Desde 1984, uma romaria quase exclusivamente de padres, durante as férias, chegava fielmente à Santa Montanha. Nós tivemos a dita, anos a fio, de contemplar, comovido esses trezentos para quatrocentos venerandos sacerdotes, orando pelas suas ovelhas, chefiados pelo R. P. Petit, seu organizador, que tivera inspiração de promover essa Romaria no Santuário de N. Sra. de La Salette.. no bairro de Vaugirard, ern Paris.

Devido a tão magnifico impulso, acelerou-se a marcha e desde então organizaram-se e hoje em dia vêm sendo ainda realizadas romarias da Bélgica, Itália, Polônia, Suíça e por ocasião do centenario da Aparição, chegava um grupo importante, dos Estados Unidos da América do Norte. Debalde portanto não se dirigiu Maria SSma. ao seu povo em La Salette, pois das suas lágrimas, dos seus lamentos, das suas advertências, com agrado repetimos e frisamos pois o fato anda um tanto esquecido, surgiram no século XIX e prosseguem no século XX essas empolgantes manifestações de fé que são as grandes Peregrinações (281) desmentindo, em alto e bom som. isto é, por esplêndida realidade a declaração do primeiro ex-ministro Thiers, na Tribuna da Câmara dos Deputados francesa: "As romarias já não cabem mais em nossos costumes".

(279) “Tende piedade Senhor" - "Tende misericórdia".

(280) Trata-se da melodia do nosso cântico: "Seja louvado com devoção... Por todos seja amado Jesus teu coração...”

 

§ 4o - De La Salette nasceu a boa impressão na França

O R. P. Emllio Gobel, dos Assuncionistas, Redator chefe do Jornal La Croix, de Paris, escreveu não há muito: “As Peregrinações iam, cada vez aumentando mais, sob o impulso do Conselho Geral. Houve necessidade de um emissário para comunicar as orientações, estimular as boas vontades, anunciar as romarias. Dai provém a pequena revista, muito modesta, despretenciosa, por nome "Le Pélerin" (0 Romeiro) cuja redação foi entregue a um Assuncionista. o P. Germer Durané. Pouco tempo depois o talentoso P. Vicente de Paulo Bailly, resolveu encarregar-se da pequena publicação de fraca aparência e reduzida difusão. Cada manhã ele acordava sempre com uma idéia nova. Um belo dia meteu-se-lhe na cabeça de levar os seus leitores pelo mundo afora, fazendo-lhes visitar, não somente os santuários, mas também as cortes, os parlamentos, as cidades e os campos. ''Le Pélerin", primeiro apenas revista piedosa tomou-se a revista do lar cristão. Teve ràpidamente suplementos: ''La Vie des Saints" (A Vida dos Santos), ''Les Contemporains" (282), saiu também "L'Almanach du Pélerin" (O Almanaque do Romeiro), finalmente veio a lume, em 1882, “La Croix” (283) (A Cruz). Assim é que um humilde boletim com a finalidade de apenas divulgar as atividades do Conselho Geral das Romarias, fundado em 22 de Agosto de 1872, em La Salette, abriu caminho à "La Maisom de La Bonne. Presse” (A Casa da Boa Imprensa) e a "La Croix”. Não se repudiam, por certo, as próprias origens, especialmente quando tão largamente abençoadas por Nossa Senhora (284). De modo mais autorizado não se poderia proclamar que a santa A,parição de La Salette é causa do bem imenso produzido no mundo por essa obr:a tão pujante que é O jomal "La Croix" e "La. Maison de La Bonne P.resse", de Paris, de cujas oficinas saem, tantos livros, tantas revistas, tantos artigos religiosos e tantos objetos de propaganda católica, meio ótimo para Nossa Senhora alcançar todo o seu povo.

(281) P. Carlier - Histoire de l'Aparition de La Salette, Pág. 491. e seguintes e Hostachy - Histoire S'eculaire de La Salette, pag. 292 e seguintes.

(282) (Os Contemporâneos) era e biografia dos homem mais célebres da época moderna.

 

SEXTA PARTE

DIFUSÃO DO CULTO DA N. SRA. DE LA SALETTE PELO MUNDO INTEIRO

CAPITULO PRIMEIRO

NA FRANÇA

Repercussão imediata, considerável teve por certo, no país onde se deu o grande acontecimento da Aparicão de Maria Ssma. Na montanha de La Salette e por toda a parte surgiram centros de peculiar devoção à Virgem chorando, pois o Pe. Rousselot, já em 1865 enumerava duzentos e cinquenta santuários em honra de N. Sra. de La Salette (285).

Atualmente em todas as 84 dioceses da França existem igrejas, capelas, altares erigidos a M. Santíssima aparecida em La Salette, em número aproximativo a 300, sendo uns 50 na Diocese de Grenoble (200), com também 55 centros da Arquiconfraria de N. Sra. de La Salette. Realizam-se sempre em todas essas igrejas, capelas e centros da Arquiconfraria, exercícios piedosos em honra da Virgem Maria em Pranto, cuja festa vem sendo celebrada, por meio de novena, cerimônias brilhantes, com avultado concurso de fiéis e mesmo importantes romarias.

Merecem lugar de relevo as seguintes cidades, deixando à parte a cidade e a Diocese de Grenoble, onde como é natural, acha-se consideravelmente desenvolvido o culto de N. Sra. de La Salette.

Morlaix, na Bretanha, onde foi erigido o primeiro santuário à Maria SSma. Em prantos, em 1848, numa colina que domina o porto no terreno do hospital e dum educandário dirigido por religiosas agostinianas. “Sobe-se – notava o redator de "Lac" por íngreme acosta que bem recorda o próprio lugar onde se deu a miraculosa aparição" (287). É que duas alunas, desenganadas pelos médicos, foram curadas pela intercessão de N. Sra. de La Salette.

O Pe. Perrin. vigário de La Salette, remeteu à promotora da obra. Srta. de la Fraglay, um fragmento da pedra onde se sentou a Virgem Maria. Intensa é a devoção ainda hoje em dia, nesse santuário, onde, em alguns aniversários da Aparição distribuíram-se 2.000 comunhões e celebraram-se 40 missas.

Em 19 de Setembro de 1920, duas ilustríssimas personagens lá foram piedosamente agradecer a N. Sra. de La Salette as bênçãos recebidas, o General Weygand e o Marechal. Foch, vencedor da primeira guerra mundial (288) .

Malétable, diocese de Seez. Em 1866, o Bispo diocesano sagrou a igreja de N. Sra. de La Salette num cume em cuja torre ergue-se a estátua de N. Sra. de La Salette, que se vê em toda a região, com inscrição das mais notáveis palavras de Maria SSma. Por Rescrito do Papa, lucra indulgência plenária quem vai fazer oração nessa igreja (289).

Nantes, terra natal da Senhorita des Brulais. curada em 1847 de duas enfermidades no lugar da Aparição e cujos livros constituem uma das mais importantes fontes de informação a respeito da Aparição. Ela faleceu em 1898. Por sua iniciativa, construiu-se um santuário à N. Sra. de La Salette no seminário. As pedras dos alicerces foram carregadas às Costas especialmente por operárias depois do seu trabalho.

Quando eram muito pesadas. iam se animando com estas pa­lavras: É para a boa Mãe de La Salette". Na sagração desse santuário compareceram dez bispos, dois prelados romanos, dois abades (290).

Paris – Vaugirard, no orfanato dos Irmãos de S. Vicente de Paulo, deram-se três milagres pela intercessão de N. Sra. de La Sa1ette, em 1855. Um orfãozinho sofria de hemorragia renitente, que remédio nenhum conseguia estancar e o menino perdeu tão grande quantidade de sangue que em poucos dias estava às portas da morte, desenganado pelo médico.

Invocando a N. Sra. de La Salette e fazendo uso da água da fonte milagrosa, depois de violentos sofrimentos, a cura foi completa.

Sendo necessária, para urgente desenvolvimento do orfanato, a indispensável aquisição dum terreno e não havendo recurso nenhum, fizeram promessa de construir no almejado terreno uma capela à N. Sra. de La Salette, cuja intervenção foi implorada através duma procissão ao redor do terreno, conduzindo a imagem de Maria em Prantos. E a quantia necessária foi oferecida.

Em 21 de Novembro de 1854 houve, com toda a solenidade, a bênção e lançamento da pedra fundamental dessa capela, que desde a sua inauguração foi e ainda é um centro centro muito movimentado de devoção à N. Sra. de La Salette (291).

Em Lião. - Foram particularmente os Padres das missões Africanas que desde 1871, promoveram e desenvolveram nessa grande cidade o culto de N. Sra. de La Salette.

Em seu grande educandário do Prado. o venerável Pe. Chevrier que tanto fêz para regenerar os menores abandonados (292), estabeleceu e aumentou a devoção à N. Sra. de La Salette. É que ele, quando ainda seminarista, fora romeiro no primeiro aniversário da Aparição, em 19 de Setembro de 1847 e uma vez sacerdote fazia retiro espiritual anualmente na santa Montanha. Trata-se portanto dum ardoroso devoto de Maria SSma. em Prantos.

Ainda em Lião a piamente célebre Paulina Jaricot, fundadora da Obra da Propagação da Fé e do Rosário perpétuo, promotora das primeiras obras de caridade em benefício das classes operárias, foi fervorosa devota de N. Sra. de La Sa1ette.

Muito se esforçou para propagar o seu culto, igualmente os primeiros missionários de N. Sra. de La Salette colaboraram na sua obra da Propagação da Fé.

Já em 1847, mandara vir a Lião água milagrosa de La Salette, em quantidade suficiente para poder distribuir em outras cidades.

Parte dessa água, por ela fornecida, jogada nas bombas acionadas para apagar tremendo incêndio do hospital de Carpentras, fez parar imediatamente o fogo, como escreveu um padre que lá estava: "Eu gritei: - é água de N. Sra. de La Salette, jogai dentro da bomba! Parou o fogo e salvou-se o resto do edifício"(293). Isto foi em 31 de Julho de 1847.

Em Luçon, na Vandéa - Nessa diocese o culto de N. Sra. de La Salette acha-se de modo mui generalizado, desde 1866.

- Em 1898, o vigário da Paróquia de La Rabasteliêre, recomendando à generosidade dos devotos de N. Sra. de La Salette, o aumento da igreja paroquial; assim escrevia: Esse aumento tornou-se necessário devido à própria Virgem chorando, pois de 1893 para cá, uns 80 a 100.000 romeiros vem, cada ano, implorá-la, na pequena montanha, que lhe foi como que consagrada, durante mais de seis meses por ano, de modo que em nossa igreja não cabem, aos domingos, os romeiros. Nossa Senhora de La Salette não pode portanto, deixar de nos auxiliar (294).

Na diocese de Arras, note da França, honra-se La Salette da Beira-Mar. Eis aqui a origem desse culto. Perto da cidade de Calais existe uma aldeia por nome Barracas. Nome esse, dado no século XVII a certos abrigos ou barracas provisórias para receber soldados acometidos da peste. Aos poucos ali se construíram umas casas, nascera uma aldeia.

Até 1857, os moradores de “Barracas" levavam vida pagã, sem igreja, sem culto, sem oração, na mais completa ignorância religiosa e péssimos costumes. As quatro salas de danças, sempre superlotadas, eram frequentadas pela depravada mocidade da circunvizinhança. Nesse ano, com a bênção do seu Bispo D. Parisis, devoto de La Salette, um missionário, "Pe. Simoisin, resolveu evangelizar e converter essa infeliz povoação, com a invocação de N. Sra. de La Salette, cuja imagem benzida pelo Prelado, ele trazia.

Debalde esse padre zelozo procurou abrigo para o divino "Mestre e para si próprio. Finalmente conseguiu encontrar um quarto de operário ainda inacabado para moradia, e uma antiga sala de dança para capela.

Foi uma mulher, por nome Genoveva, que resolveu ceder esse local, porém com muito custo. Ela mesma explicou, mais tarde, o motivo. Ótima pessoa, neta duma verdadeira santa que já com 75 anos de idade ainda andava 6 quilômetros a pé, todos os domingos, para ouvir missa. Ora um pastor protestante, narrava ela, se estabelecera na localidade e durante dois anos, dava um franco e meio a todas as pessoas que vinham ouvi-lo. Eu resisti sempre e tanto fiz que afinal ele se retirou. As ''Barracas" não são um lugar como os outros. Vimos aqui gente de todo o quilate; por isso, Pe. Simoisin, eu desconfiei do Sr., pois ignorava se o Sr. não era algum protestante.

Se finalmente resolvi ceder-lhe o quarto foi porque o vi certa vez acompanhado por um padre coadjutor da cidade, de Calais, que aliás eu tinha encontrado uma só vez".

Pois bem, na tardinha do domingo do advento. em que foi celebrada a Missa naquela praia esquecida, iniciou-se uma novena à futura Padroeira, N. Sra. de La Salette. Coisa notável, durante os quarenta e cinco minutos do piedoso exercício nenhum homem frequentava o botequim. Foi impossível dar a bênção do SSmo. Sacramento, por falta de sacrário, até que duas generosas e piedosas pessoas de Calais compadecidas de tanta penúria, ofereceram um lindo tabernáculo.

As instruções religiosas prosseguiram diariamente até o fim do tempo pascal, perante numerosa assistência. Tão bem impressionados e convictos ficaram todos que o dia em que o Padre anunciou que era precisa ir a Calais para tomar parte numa cerimônia religiosa em beneficio da construção da igreja, os moradores em peso lá foram incorporados, tendo à sua frente o Pe. Limoisin.

"Essa manifestação de fé por parte dos habitantes das "Barracas", lia-se no jornal de Calais constituiu, a 10 de Março de 1858, espetáculo comovedor tanto mais que se trata duma povoação operária, sem nenhuma religião até a presente data." O fato provocou intenso movimento de simpatia e as ofertas foram largamente generosas.

Assim é que, graças à constante e valiosa proteção de de N. Sra. de La Salette, a quem essa pobre gente estava totalmente devotada a 16 de setembro de 1860, D. Rappe, bispo de Cleveland, E.U., benzia e lançava a pedra fundamental do seu santuário que, a 26 de Julho de 1863, D. Parisis, Bispo diocesano benzeu solenemente com assistência de cinquenta padres, nove cônegos e sete decanos, pregando com entusiástica eloquência o Pe. Sibilat, missionário de N. Sra. de La Salette.

Desde então esse novo santuário de Maria SSma. em Pranto ficou sendo um centro de romarias cada vez mais numerosas e piedosas. No Santuário de "'Barracas", o aniversário da santa Aparição celebra-se com várias solenidades, pelo menos durante dez dias, com assistência de fervorosa multidões. Já em 1865, jubiloso o Pe. Limoisin escrevia à Santa Montanha: "O número dos romeiros triplicou neste ano. Fui censurado por ter feito a igreja grande demais; pois bem, é quase sempre pequena demais. Houve vários sermões por dia, com auditório, para cada sermão, muito numeroso e muito piedoso.

Embora fosse a pregação da noite particularmente em benefício desta povoação operária, viam-se muitas pessoas estranhas voltarem alegres para suas casas, apesar da escuridão, da areia movediça, até da água que era preciso atravessar várias vezes devido à enchente da maré. Durante esta novena N. Sra. de La Salette concedeu-nos várias graças extraordinárias, notadamente três curas que vamos cuidadosamente examinando". Compareceram sete mil romeiros durante a novena de 1870, dezessete mil em 1873, vinte e cinco mil em 1875. O Santuário fica repleto sete e oito vezes por dia; da parte da manhã para as missas e da parte da tarde para as bênçãos do SSmo. Sacramento, com pregação nos vários exercícios, sendo pregadores frequentemente missionários de N. Sra. de La Salette.

Perdura hoje em dia esse piedoso movimento de romeiros vindos a pé das paróquias vizinhas e de trem, as mais afastadas. Quase toda cidade de Calais vai em romaria, cada ano, ao santuário das "'Barracas" que é realmente La “Salette da Beira Mar.” (295)

Pedimos vênia para assinalar que na diocese da Córsega, nosso torrão natal, o culto de N. Sra. de La Salette acha-se profundamente estabelecido.

Sabemos que o mês de Setembro particularmente é sempre celebrado com muita devoção numa Igreja, perto do porto, da cidade Bastia; e que um missionário de N. Sra. de La Salette foi o pregador durante todo o mês de Maria na principal paróquia de Acácio, sede episcopal, cujo pároco foi o sacerdote assistente em nossa primeira missa.

(285) Carlier ibid., pág. 537.

286) carlier. ibid.. pq, 538 e Garnier: L'expansion de La Salette dans le monde, pág. 109 a 165.

(287) No jornal “Univers” , n. de 26 de janeiro de 1852, era o maior jornal católico da época. Hostachy, pág. 315.

(288) Garnier, livro citado. p. 150.

(289) Garnier, Ibid., pág. 159.

(290) Garnier, Ibid., pág. 143.

(291) Carlier, ibid., pag. 537 a 539.

(292) “Para ser admitido no Prado, dizia ele, o menino “não deve nada ter, nada saber, nada valer”. Villefranche. Vida do Pe. Chevrier em 1918.

(293) Annales de Notre Dame de La Salette, janeiro de 1872, citado por Hostachy, ibid., pág. 319.

(294) Garnier, lbid, pag. 1.

 

CAPITULO SEGUNDO

NA EUROPA, FALANDO-SE DAS NAÇÕES PELA ORDEM ALFABÉTICA

A revista ”Annales de N. D. de La Salette'", informa, já no terceiro número em Julho de 1865, que a devoção à Maria SSma. em Pranto, existia ”na América do Norte, na Africa do Sul, em New Bedfort e em Port-Louis" no Oceano Índico, e que pedidos de água da fonte milagrosa chegavam, naquela época, da Asia, da África, da América, da Oceania (296).

Numa crônica provinda do estrangeiro, lê-se: "A simples e comovedora narrativa dos dois pastorinhos alcançou os limites do mundo, encontrando por toda a parte intenso eco nas almas devotadas à Virgem de La Salette que possui em todos os lugares servidores cuidadosos em piedosamente invocá-la com o novel título de "Reconciliadora dos pecadores".

(295) Pe. Carlier, pág. 571 a 576. Histoire de I'Apparttion de La Salette.

(296) Conforme repetimos, quase todos os dados aqui apresentados no ótimo livreo: “L’Expansion de La Salette dans le monde” (Expansão de La Salette no mundo). Pelo Cônego Garnier.

Vamos nas páginas seguintes ilustrar esses dizeres do ao esclarecido cronista, percorrendo, em viagem rápida, as cinco partes do mundo.

EUROPA - Do velho continente venham simplesmente pela ordem alfabética as várias nações, menos a França. já suficientemente considerada.

 

ALEMANHA

Em 1866, encontram-se capelas em honra de N. Sra. de La Salette, em Wartemberg, Ebgerazhofen, Hindelang, Sauabia, Aulendorf. De Karpsham, Baviera, um capelão escrevia em 1871: "Em nossa paróquia levantava-se um lindo santuário de N. Sra. de La Salette, onde muitos homens vem em romaria". Em outra carta, um correspondente dum recanto do Wutemberg, escreve: "na aldeiazinha de Schwarzembach, paróquia de Boms. à capela de N. Sra de La Salette, vão muitas romarias. Ela ouve as súplicas feitas perante a sua imagem, conforme comprovam inúmeras placas comemorativas. Em alta e bela montanha, no centro do Luxemburgo, ergue-se lindo grupo da maravilhosa Aparição. Os “Annales" divulgam em 1873: "A devoção de N. Sra. de La Salette difunde-se na Alemanha com extraordinária rapidez, devido às importantes graças alcançadas, por meio de devoção e uso da água de La Salette.

Atualmente essa devoção continua e por certo progride, pois a congregação dos Padres da Sagrada Família fundada, como vimos, pelo virtuoso Pe. João Berthier missionário de N. Sra. de La Salette, possui na Alemanha duas províncias.

 

BÉLGICA

Após a França, foi a Bélgica, que primeira e mais pressurosa admitiu e prestou culto à gloriosa Aparição de La Salette. Já em 1847, belgas galgavam a montanha Santa. Numa brochura lá editada em 1854 lemos: “A devoção à N. Sra. de La Salette é fato geral em nossa querida pátria. Em todos os recantos da católica Bélgica erguem-se Santuários A N. Sra. de La Salette "Reconciliadora dos pecadores" dos quais muitos já inaugurados em 1852 e foram sempre aumentando mais, sendo frequentados por inúmeros devotos de N. Sra. de La Salette.

Limitemo-nos a distinguir os fatos seguintes. Em Bruxelas, precisamente nesse ano de 1852, um P. Redentorista, pregou vários sermões sobre a santa Aparição e verdadeiras multidões apinhavam-se em torno do púlpito. Ampla capela foi construída em 1856 em Latour que se tomou ardoroso centro de sincera devoção, tanto que no aniversário da Aparição há romarias de três a quatro mil pessoas com inúmeras comunhões. Por ocasião das nefandas guerras de 1870, 1914, 1939 aos milhares lá foram os fiéis para implorar "Aquela que está sustendo o braço de Jesus irado...

Em Lovaina, entronizaram lindíssima imagem de N. Sra. de La Salette em memória dos mortos na guerra de 1914.

Em Boussoit, cujo pároco foi milagrosamente curado por N. Sra. de La Salette de grave enfermidade, a devoção viceja desde 1863 e centenas de placas comemorativas demonstram quão valiosa seja a intercessão de Maria SSma. em Pranto.

Em 1885, o Prior doa Recoletos de Saint-Trond, relatava a extraordinária afluência de fiéis, durante a novena Na Igreja, com capacidade para 5.000 · pessoas, não podia caber a massa dos homens, aos quais atendiam o dia todo, nada menos de onze confessores.

Existem na Bélgica uns sessenta centros da Arquiconfraria de N. Sra. de La Salette, com mais de cem mil sócios cuidadosos em celebrar com brilho e devoção, em 19 de Setembro, a festa da sua excelsa Padroeira. Aliás em Tournai, os missionários de N. Sra. de La Salette, transformaram a pequena capela da escola apostólica e escolasticado que aí mantém, num verdadeiro santuário onde frequentes e numerosas romarias vão pressurosas invocar e cantar à Virgem chorando, em torno do impressionante ''fac·simile" da Aparição. Vimos que a Bélgica através de subscrição pública e popular encabeçada pelo episcopado todo, ofertou essa maravilhosa obra de arte sacra que é o púlpito do santuário na Montanha santa. Poderosa e carinhosa Mãe para com os belgas se dignou ser N. Sra. de La Salette. A cidade de Bruges foi por duas vezes em 1854 e 1866, preservada do cólera pela sua maternal proteção. Um grande milagre cujo relato pormenorizado o Bispo de Liége remeteu em 1867 a D. Ginoullac, constitui uma das provas da realidade sobrenatural da Aparição. Encerremos esses dados com estas linhas escritas em 1893, por uma religiosa das Clarissas em Antuérpia: ''O bendito culto vai cada vez aumentando mais, isso explica-se, pois não há mais possibilidades de se enumerarem as curas, conversões, graças de toda espécie que a Mãe chorando derrame em nossa terra.”

 

ESPANHA

Logo em 1847 ficou nessa nação, conhecida a santa Aparição; mas foram mormente dois leigos que desde 1862 em Pamplona propagaram com zelo incansável o maravilhoso acontecimento, cuja narrativa muito os comovera. Assim é que precedida por uma novena, com sermões dados por sete pregadores, foi solenemente celebrado o dia 19 de Setembro de 1863, na igreja mais central, São Nicolau, com assistência de inúmeros fiéis.

No ano de 1861 a festa de N. Sra. de La Salette, com novena preparatória, foi celebrada em todas as igrejas de Barcelona (297).

O "Manuel du Pélerin à La Salette”, do Pe. Rousselot foi traduzido em castelhano por pessoa de distinção de Barcelona e dos 10.000 exemplares, 8000 foram vendidos em poucos dias (298).

Alastrando-se rápida e piedosamente por muitas importantes localidades o culto de N. Sra. de La Salette atravessou também os mares até as ilhas Canárias onde, só na Paróquia de Bojo, em certos dias da novena em 1885, compareceram mais de 30.000 romeiros. Aliás o aniversário da Aparição celebrava se poucos anos depois na Espanha, em mais de duzentas dioceses e aldeias. Nos "Annales" de 1817 lê-se: '"Há na Espanha hoje em dia 58 altares de N. Sra. de La Salette, três em igrejas catedrais, 40 em igrejas paroquiais e 15 em conventos. Acha-se a Confraria estabelecida em 38 cidades, com uns 80.000 associados. A esses centros seis Arcebispos e vinte e sete Bispos concederam indulgências. Em todas essas igrejas soleniza-se com muito brilho, o aniversário da Aparição". Ainda em 1898 houve ereção da Confraria em Niveiro, perto de Compostela. Relembremos que o doador das magníficas estátuas do lugar da Aparição foi um fidalgo espanhol o conde Narcísio de Penalver.

 

HOLANDA

O culto de N. Sra. de La Salette nesse país teve início em 1848 com a inauguração e bênção duma grande estátua de pedra, no castelo de Babberich, em Gueldre, paróquia de Oud·Levenaur.

Essa estátua foi coroada em 1879, no mesmo ano da coroação na Montanha santa. Em 1865, as irmãs de São Vicente de Paulo comunicaram ao redator dos "Annales" que '"Graças à devoção de N, Sra. de La Salette, deram-se várias curas milagrosas na Holanda".

As religiosas da Visitação da importante cidade de Tilbourg, eram muito devotas de N. Sra. de La Salette. Perante a bela imagem que elas possuem foi celebrado com particular solenidade o cinquentenário da Aparição.

(297) Vie d. Aguste Marceau, II Vol.., p. 432.

(298) lbid. P. 436 - Ver Giray. l.es Miracles de La Salette, I Vol. p. 157.

 

HUNGRIA

Há também nessa nação, almas devotas de N. Sra. de La Salette. Em 1890, na Montanha Santa, recebeu-se de Budapeste a seguinte carta: ''Rogo vos o favor de rezar e mandar rezar pela alma do meu filho porém , acima de tudo ajudai-nos a muito agradecer à N. Sra. de La Salette a cuja intercessão deve-se a sua conversão extraordinária. Sua morte piedosa foi consolo para nós e notável edificação para nossa cidade".

 

INGLATERRA

Nesse país. veio a lume em 1854. um dos primeiros livros sobre a Aparição, pelo V. Bispo de Birmingham, D. Ullatherne, piedoso romeiro, sábio historiador, estrênuo defensor de N. Sra. de La Salette.

Carta com data de Julho de 1886, fala duma capela em Londres em honra de N. Sra. de La Salette, erigida no ano anterior. O autor acrescentava: "O capelão dessa igreja. visitou a vossa Montanha e tem grande devoção à N. Sra. de La Salette. o Bispo de Newport. em 1888, autorizou um convento de religiosas a ter N. Sra. de La Salette para sua Padroeira e titular da sua capela.

Nos suburbios de Londres há duas casas dos Missionárias de N. Sra. de La Salette cuja festa em suas paróquias, vem sendo celebrada com toda solenidade. Há imponente procissão, cerimônia religiosa jamais realizada em Londres desde a instalação do protestantismo inglês, isto é, há quatrocentos anos.

 

IRLANDA

Em 1866 vieram cartas comunicando maravilhosas graças alcançadas pela invocação de N. Sra. de La Salette.

 

ITALIA

Depois da Bélgica é por certo na Itália que N. Sra. de La Salette tem sido mais honrada e invocada, de norte a sul. Em 1852· o Arcebispo ele Urbino perto de Roma publicava a sua carta pastoral da quaresma sobre a Aparição de La Salette, comentando os seus ensinamentos. Em 1854, em Macerata, também perto de Roma, com autorização do Bispo, foi publicada em italiano uma novena à N. Sra. de La Salette e os Barnabitas celebravam na sua igreja solenemente essa novena (289).

O culto de Maria SSma. em Pranto despontou em Nápoles, donde em 1866 um pároco escrevia: "'A concorrência dos fiéis é realmente enorme na minha igreja, para honrar à N. Sra. "de La Salette”, pois continuas e inúmeras são as gracas alcançadas. Na Confraria, de Abril de 1865 Junho de 1866, alistaram-se 13.523 pessoas, notando-se Bispos, Padres e Religiosos. Da minha igreja a devoção difundiu-se pelas regiões circunvizinhas, até a Calábria."

No outono de 1865 grassava em Nápoles o cólera. Cessando o flagelo devido a esses piedosos exercícios, no inicio do ano seguinte, houve tríduo de ação de graças com missa cantada por 150 músicos, iluminação dum milheiros de velas e procissão de 8 .000 pessoas.

Na Sicília, lá pelas encostas do vulcânico monte Etna, em Catânia, foi construída em 1875 uma igreja paroquial dedicada à Nossa Senhora de La Salette. Em Palerma, capital da Província, e mormente em Messina onde habitou Melânia, o culto da Virgem chorando foi cada vez mais se espalhando. Na própria ilha da Sardenha, durante a guerra de 1914-1918, celebrava-se com solenidade o aniversário da Aparição.

Em 1870 em Milão, em dez igrejas solenizou-se a festa de N. Sra. de La Salette. Em Veneza nesse mesmo ano, foi o Cardeal Arcebispo que celebrou missa e distribuiu a comunhão do dia 19 de Setembro. Grandiosas cerimônias realizaram-se nos anos seguintes, em honra de La Salette na Lombardia, em Sena, na Veneza, onde na paróquia de Brulis a Confraria possui mais de 9.000 associados.

No centro da Itália, em Salmata, Umbria, na casa de férias para estudantes em Roma dos Missionários de N. Sra. de La Salette, grande afluência de pessoas devotas imploram continuamente a Virgem Reconciliadora, no ''fac-simile" da sua Aparição.

Ao traçarmos estas linhas, surgem saudosas recordações em nossa mente, pois lá estivemos e até falamos quando se reproduziram os lugares onde Maria SSma. chorou. A capela foi inaugurada por D. Anselmini, Bispo de Nocera – Umbria, e a reprodução foi benta em Setembro de 1907.

(299) Vie d'Auguste Marceau, II vol. p . 431.

Em 1938 o Cardeal Canali presidiu em Salmata as solenidades sempre empolgantes do dia 19 de Setembro.

No norte, especialmente em Turim já em 1881, devido a uma subscrição aberta pelo jornal "Unitá Católica", foi construida uma capela à N. Sra. de La Salette. Aliás, os Missionários salettinos, estabelecidos nessa cidade, mantêm e difundem pela redondeza a devoção à sua Mãe em Pranto.

Finalmente, na lindíssima igreja dos mesmos missionários em Roma o culto de N. Sra. de La Salette desenvolve-se mais e mais, e todos os anos um Cardeal da Santa Igreja lá preside as cerimônias da festa da Santa Aparição.

 

NORUEGA

Nessa nação quase totalmente protestante implantou-se em 1879 o culto de N. Sra. de La Salette, pois nessa época Mons. Bernard, vigário apostólico, após ter ingressado na Congregação levou consigo vários missionários de Maria SSma, em Pranto. Eles durante vários anos trabalharam para aumentar o número dos católicos.

 

POLÔNIA

Desde 1862 existe nesse país a devoção de N. Sra. de La Salette, produzindo, confirmam os “Annales" de 1866, abundantes frutos espirituais, acrescentando a narrativa da cura espontânea em Cracóvia, dum padre Recoleto gravemente enfermo.

Quando o P. Semenenko resolveu fundar a Congregação da Ressurreição, foi de romaria a N. Sra. de La Salette , para recomendar o seu projeto à Virgem Reconciliadora e até pronunciou notável sermão a 19 de setembro de 1869. “Que é que não se pode obter, exclamou, de uma Mãe quando ela está chorando? É por esse motivo que a Polônia que Pio IX chamou de infeliz Polônia, aqui vem. Está aqui presente em espírito. Pois bem, eu, filho da Polônia, venho suplicar-vos que abrindo os braços da vossa caridade, recebais carinhosamente os poloneses".

Lá se desenvolveu de modo extraordinário o culto de N. Sra. de La Salette com a chegada em 1905 dos seus missionários, sob cujo impulso movimentaram-se até multidões de 30.000 romeiros. Atualmente por motivos bem conhecidos, ignoramos a sorte dos amados coirmãos que lá temos.

 

PORTUGAL

Iniciou-se a devoção de N. Sra. de La Salette, na mesma Lisboa, graças, dizem as “Annales" às Carmelitas que estabeleceram "com a maior solenidade" a Confraria em sua capela no ano de 1858. Na mesma época, Salette já era conhecida em Vila-Cova, em cuja igreja, três moças mandaram colocar um grupo da Aparição. Lá iam orar muitos muitos fiéis alcançando valiosas graças.

Em 1865, em Santa Quitéria, foi inaugurada uma capela com um lindo grupo, tomando-se um centro ativo de devoção. Igualmente no Porto, em torno das imagens de N. Sra. de Lurdes e de N. Sra. de La Salette, colocadas uma perto da outra, havia frequência de fiéis a orar. Na arquidiocese de Braga celebravam-se as festas das duas Senhoras, aconselhando o Sr. Arcebispo fossem considerados dias santos de guarda.

No ano de 1877, em Lisboa, em reconhecimento duma graça alcançada, uma pessoa doava à igreja de São Francisco, uma estátua de N. Sra. das Lágrimas, fazendo-se a festa do dia de N. Sra. das Sete Dores.

Uma das mais importantes cerimônias realizadas em Portugal, em honra de N. Sra. de La Salette, foi, por certo, a solene trasladação, no domingo 19 de Setembro de 1880, da estátua de N. Sra. de La Salette para a capela erigida em sua honra em Oliveira de Azemeis, perto de Aronca. A bênção dessa capela, a 19 de Setembro de 1875, tinham assistido várias irmandades, um destacamento do regimento de infantaria e milhares de fiéis.

Por largos anos nessa paróquia, o culto de N. Sra. de La Salette desenrolou-se magnificamente sendo as festas celebradas em Agosto e Setembro com o maior brilho e profunda piedade.

Em seu número de 28 de Setembro de 1908 “A Palavra”, jornal católico do Porto, divulgava o seguinte: "Está sendo construído atualmente um santuário de N. Sra. de La Salette numa colina perto de Vila Cova de Campea. Devem todos ajudar essa obra, na medida do possível, cooperar mormente publicando graças alcançadas pela intercessão da Virgem de La Salette. Hoje em dia, como não podia deixar de ser, em Portugal, empalideceu a devoção de N. Sra. de La Salette, ao fulgor rutilante do culto de N. Sra. de Fátima. Não importam os nomes, é sempre a Virgem Maria cada vez mais conhecida e querida.

 

CAPÍTULO TERCEIRO

BALKANS E ORIENTE MÉDIO

BULGÁRIA

Em 1870, S. Excia. D. Rafael Popoff bispo dos Búlgaros católicos achava-se na montanha de La Salette, para consagrar à Virgem Reconciliadora, tanto sua pessoa como sua diocese. A 21 de Agosto dentro da Basílica, pronunciou o seguinte ato de consagração: “ó Mãe divina, concedeste-me a graça de vir à vossa Montanha santa, já célebre em todo Universo, para que pudesse venerar estes lugares. Quero por minha vez, consagrar-vos minha pátria e minha Igreja. Sois soberana do Oriente o socorro dos cristãos e toda nossa esperança. Tomai, ó Maria, sob vossa peculiar proteção, minha pátria; eu vo-la consagro vo-la entrego, sede de hoje em diante sua advogada, sua Rainha, sua mãe. Em minha pessoa e na dos amigos do meu povo e do Oriente, todos aqui prostrados em vossa presença, vede a minha pátria gemendo aos vossos pés, levantai-a, ó Maria, para colocá-la em vosso coração maternal."

Essa oração é de empolgante atualidade neste ano de 1953!

 

ILHAS JONICAS

Em 1872, com autorização do Arcebispo, o padre Boulin, único francês naquelas terras. estabeleceu a Confraria de N. Sra. de La Salette, cuja festa foi celebrada na Catedral.

 

TCHECOSLOVAQUIA

Os "'Annales" de 1928 iniciavam um artigo com estas palavras: "Quem acreditaria que um dos mais antigos Santuários de N. Sra. de La Salette tenha sido levantado na Tchecoslováquia, construido em 1848, dois anos depois da Aparição? Assim, no entanto, afirma uma carta que acabamos de receber de Viena."

Esse santuário situa-se perto de Krautenwald. Vários romeiros tchecos foram à La Salette. Em 1931 lá chegou uma caravana de 14 padres, um seminarista e 16 leigos, sendo mais numerosos nos anos seguintes. Em 1933, romeiros tchecos achavam-se em La Salette rodeando o Bispo de Preschow, D. Goitich. No santuário, pela vez primeira houve missa pontificial no rito tcheco-slávico.

No seminário maior de Praga os seminaristas diariamente faziam orações perante a imagem de N. Sra. de La Salette. Falamos no passado, pois atualmente nuvens sombrias lá baixaram.

 

TURQUIA

A 19 de Setembro de 1865. narram os "Annales" e R. P. Beré, superior dos Padres Lazaristas em Constantinopla, numa interessantíssima conferência, falou das várias seitas do Oriente, acrescentando que todos esses hereges, até os turcos conhecem e amam a Virgem Maria e tem particular devoção a N. Sra. de La Salette”.

Em primeiro de Maio de 1870. D. Jossef patriarca de Alexandria escrevia estas notáveis palavras: "Vários dos nossos Bispos e padres tiveram a dita de fazer essa piedosa romaria e de consagrar o nosso infeliz Oriente à Virgem da Reparação… Não é possível deixar sem eco os ensinamentos de Maria e sem fruto as lágrimas da Mãe de Deus, não obedecendo à sua ordem de transmitir as suas advertências a todo o seu povo".

 

SIRIA

Em Outubro de 1871, o R. P. Sabugí, vigário geral do patriarcado de Antioquia, de rito Sírio fez no Santuário este ato de consagração: "Vossa Aparição, ó Maria, nesta Montanha, repercutiu em todo o Universo. Por isso, todos os povos aqui vêm consagrar-se a Vós, reconciliar-se com vosso Filho, alcançar misericórdia. Nesse piedoso dever, o Levante rivalizou com o Poente: Armênios, Gregos. caldeos, Melquitas, búlgaros, maronitas poloneses, vieram de bem longe suplicar-vos novamente acolher em vosso amor sua nação que a primeira, depois dos judeus fiéis, recebeu a boa nova da Redenção e correspondeu ao chamamento do Salvador."

 

ARMÊNIA

O Patriarca da Cilífia, D. Hassoun achava-se em Grenoble em 1867. Impossibilitado de subir à Montanha santa, após ter celebrado missa e renovado a consagração da sua nação feia a N. Sra. de La Salette, em 1961 pelo Arcebispo de Jerusalém na Igreja dos Padres de La Salette, delegou dois sacerdotes para em 19 de setembro pronunciar no Santuário o ato da consagração todo repassado de fé e poesia:

"Ao voardes novamente para o Céu, vosso olhar volveu-se para o Oriente, para essas longínquas regiões donde Veio a luz da fé. Foi olhar de amor e ternura, a nos dizer que sois a Mãe homens; a eles todos tendes amor, pois aos vossos olhos não há nem gregos, nem romanos, somente filhos vossos objeto da vossa maternal ternura. Eis que o Oriente vos ouviu e vos compreendeu. Eis que, vossos filhos das longínquas regiões vos imploram. Para vós estendem mãos suplicantes. Abri vossos braços para os acolher, ouvi suas preces, desfazei as nuvens da ignorância e do erro que cobrem essas regiões. Restabelecei nelas o reino de Deus, restabelecendo a unidade católica. É a súplica que vos dirige o patriarca da Armênia. Sede a Rainha dessa preciosa e interessante Parte da família católica. Abençoai a Igreja da Armênia."

 

CALDEIA

No ano seguinte, igualmente no Santuário da Montanha santa, D. Elias João Millos, Arcebispo de Akra e Vigário do patriarcado da Caldeia, consagrou sua nação e sua Igreja a N. Sra. de La Salette. Enquanto D. Millos, ajoelhado no altar pronunciava o ato da consagração em língua caldaica, o superior dos missionários ia lendo no idioma francês a mesma consagração do. púlpito: "'Ó Virgem imaculada e reconciliadora, vede a vossos pés, um filho da pátria de Abraão de quem sois filha e descendente, vede um Bispo da Igreja caldaica, o vigário do seu venerando patriarca. Movido por esses títulos, venho consagrar-vos minha pátria e minha Igreja. Bem conheceis todas as aflições e todas as necessidades que angustiam nossa Igreja da Caldeia; bem sabeis quanto estamos gemendo sob os golpes dos males que nos acabrunham; somos o pequeno rebanho ainda fiel ao amor de Deus e à verdade, como também à fé em vossas divinas prerrogativas. Dignai-vos, Virgem bendita entre todas as mulheres, dignai-vos iluminar, fortalecer e santificar vosso Clero da Caldeia."

 

CAPITULO QUARTO

OS OUTROS CONTINENTES

§ 1o - África

ILHA DA REUNIÃ0

Dessa ilha, em 1866 um missionário escrevia: - "Todos os nossos Padres da missão proclamam que devemos à N. Sra. de La Salette a decadência completa do Cisma, a prosperidade da Missão e um movimento intenso de conversões por parte dos pagãos." Foi particularmente na vila de Saint-Leu que se estabeleceu e desenvolveu a devoção de N. Sra. de La. La Salette.

O vigário, ordenado sacerdote no dia 19 de Setembro de 1846, fizera promessa, por ocasião de uma epidemia de cólera, de construir uma Igreja a N. Sra. de La Salette, se o país não fosse atingido pelo terrível flagelo. Fôra ouvido e no dia 19 de Setembro de 1859, já concluído o santuário, os fiéis das paróquias circunvizinhas uniram-se aos de Saint-Leu, para agradecer à N. Sra. de La Salette. Nesse mesmo dia foi estabelecida a Confraria com numerosos associados. Desde então celebra-se com fervor o aniversário da Santa Aparição, bendito Santuário, onde ainda em 1899, deu-se uma cura milagrosa, conforme carta do vigário desta época, o qual acrescenta: ''O Santuário tornou-se, há bem quarenta anos, centro de romarias para toda a ilha da Reunião. Aliás o fato que reunião há mais assinantes do "Bulletin" francês do que em qualquer diocese da França, comprova claramente quão viva e difundida é a devoção a N. Sra. de La Salette.

 

ILHA MAURÍCIA

Situada perto da Reunião, possui três centros de culto a N. Sra. de La Salette. Os "Annales" relatam que em 1865 numerosos fiéis frequentavam o Santuário construído no jardim das Irmãs de S. Vicente de Paulo, onde se alcançaram muitas graças, especialmente por ocasião de grande epidemia em 1867. Nessa mesma localidade foi construída uma igreja paroquial dedicada a N. Sra. de La Salette.

 

NA BAHIA GRANDE

Em 1862, D. Collier, Bispo de Porto Luiz lançava a pedra angular dum Santuário que é a reprodução exata da Basílica do lugar da Aparição.

Finalmente o Pe. Bardet, antigo romeiro de La Salette, fundou, na sua paróquia em 1868. uma biblioteca exclusivamente de livros sobre N. Sra. de La Salette.

 

MAHÉ

É uma pequena ilha do grupo Seychelles, que possui um pequeno Santuário de N. Sra. de r. Salette, em montanhas que dominam o mar, onde, segundo os "Annales" de 1893, encontram-se por vezes até 2.000 romeiros.

 

DAHOMÉ

Nessa região africana, relatam os "Annales" de 1869, um missionário, P. Courdinoux, levantou uma capela a N. Sra. de La Salette e acaba de pedir um quadro representando a celeste Aparição".

Uns poucos anos atrás, foram remetidas três lindas estátuas para a ·Guiné Francesa, sendo inauguradas na capela de N. Sra. de La Salette na missão de Palé e mais outras para a missão de Gueké.

 

ÁFRICA CENTRAL

Em 1868, narram os "Annales" D. Camboni, superior das missões do centro da África, veio em romaria à N. Sra. de La Salette, para consagrar-lhe os países que evangelizava. Único vivo, dos 36 missionários partidos com ele, quis que N. Sra. abençoasse o seu novo projeto de evangelização e os resultados foram admiráveis. Protegido pela celeste Reconciliadora, voltou para sua missão onde mui frutuoso foi seu apostolado."

 

ANTILHAS

HAITI

Em 1874, um devoto fervoroso de N. Sra. de La Salette, o Pe. Mevel, chegando na minúscula ilha de las Cahobas, não encontrou nem igreja, nem casa paroquial, nem escola. recomendando-se a Maria SSma. em pranto, lançava, em 19 de Setembro a pedra angular da sua igreja. No ano seguinte recebia uma imagem de N. Sra. de La Salette, e todos os anos, conforme os parcos recursos daquela pobre gente, foi celebrando o aniversário da Aparição.

Na próxima ilha Domingos, há também uma pequena capela de madeira com três estátuas da Aparição. Nesse humilde oratório, escreviam de lá em 1873, muitas graças foram alcançadas, especialmente a cura duma leprosa de 17 anos de idade.

Nesse mesmo ano, ereção de capela e confraria em S. Lucas, diocese de Eoseau, cujo Bispo D. Poirier, estava em La Salette em 1874.

 

MARTINICA

Na paróquia de Sto. Estêvão do Centro da cidade de São Pedro, há foco ardoroso do culto à N. Sra. de La Salette, onde, no mês de Setembro, escrevia o vigário em 1866, vem sendo solenizado qual "segundo mês de Maria". Os sucessivos vigários ficaram, por correspondência, sempre relacionados com a Montanha santa, pedindo medalhas e santinhos de Maria SSma. em pranto, de que nunca "temos quantidade suficiente".

Em lugar ameno e pitoresco no alto dum morro, Da aldeiazinha de Sant'Ana dentro dum pequeno Santuário contemplam-se em lindos quadros, as três fases da Aparição, e na fachada lê-se uma inscrição a lembrar que o Bispo D. Fava. benzeu "esta capela em 1873 e pouco depois tornou-se Bispo de La Salette".

Em 1934, o vigário dessa paróquia, escrevia: "'Sem exagero, podemos dizer que se outrora, contavam-se às centenas os romeiros, agora é aos milhares que eles vêm implorar à boa boa Mãe do Céu, a cujos pés encontram o que procuram, a paz da alma”.

 

§ 2o - Oceania

Até nesse tão longínquo continente há muitos devotos de N. Sra. de La Salette. A 19 de Setembro de 1868, D. Elloy, vigário apostólico da Oceania central. em romaria a La Salette, expandiu-se em pormenores sobre a fé dos habitantes de lá, e sua confiança em N. sra. de La Salette.

Quando falamos da Basílica de N. Sra. de La Salette, narramos que ao P. Janin. denominado por seus fiéis: '"Pedro de La Salette"', pela sua fervorosa devoção à Maria SSma. em pranto, deve-se a piroga tão notada pelos romeiros.

Esse ardoroso missionário, muito desenvolveu o culto de N. Sra. de La Salette levantando-lhe na ilha dos Pinheiros, um santuário inaugurado no dia da Páscoa; outro em São José de Ouvéa, onde há um 'fac-simile" do lugar da Aparição, e ainda outro na Ilha Nou.

 

JAVA

Por carta de 27 de Agosto de 1865, um vigário da ilha de Banka, pedia "o recomendassem à N. Sra. de La Salette a si e aos seus queridos chineses.

 

ÁSIA

CHINA

Nesse imenso pais os "Annales" assinalam duas regiões nas quais se conheceu e honrou a N. Sra. de La Salette. Koug-Tcheou e, Tsin-Gay, onde labutava. pelo ano de 1880, o Pe. Vray, missionário muito devoto da Virgem chorando. Ele escrevia em 1886: -"Dentro de pouco tempo, vou ainda apresentar o quadro de N. Sra. de La Salette· à veneração dos meus neófitos de Tsin-Gay. Prometo propagar, com todas minhas forças a devoção à Maria SSma. em pranto.

 

COCHINCHINA

No jardim do convento das Carmelitas em Saigon, inaugurou-se um grupo da celeste Aparição. Essas religiosas muito devotas de N. Sra. de La Salette difundiram o seu culto nas vizinhanças. Uma delas por carta de 1868, comunicava numerosas curas milagrosas obtidas pelo uso da água de La Salette.

 

ÍNDIA

Bastante numerosos santuários de N. Sra. de La Salette erguem-se na índia, pois cedo lá foi conhecida a Santa Aparição, cujo culto estabeleceu-se em Sad·Koh em 1868, e em Vizigapatam em 1873. O zeloso propagador desse culto foi o Pe. Gandy, oriundo da diocese de Grenoble e que celebrara sua primeira missa no altar-mor do Santuário da Santa Montanha.

Ao chegar em Pondichery, encontrou estabelecida a devoção de N. Sra. de La Salette, pois de lá escrevia em 1869:

“N. Sra. de La Salette está sendo aqui muito venerada." Em carta de 1878 comunicava que "A Virgem Reconciliadora é causa de muitas conversões por entre os pagãos" e pedia orações para seus cristãos a N. Sra. de La Salette. Voltou a escrever em 1881: “Desde que eu consagrei a N. Sra. de La Salette a minha vida de missionário na minha última visita ao seu bendito santuário, na hora de partir para o seminário das Missões em terras pagãs, essa boa Mãe tem me protegido por mil modos. Nada melhor para lhe testemunhar o meu reconhecimento, do que dedicar-lhe a Igreja que tenciono construir e de constituí-la Protetora, Rainha e Mãe de meu distrito e de todos meus cristãos."

Pouco depois, ele era Arcebispo. de Pondichery.

De Carvor, vicariato apostólico de Coimbatore, no Indostão, escrevia o Pe. Lefeuvre em 1877 aos padres na Montanha Santa: "Os vossos presentes adornam a capelinha de Suma-Daraboaram. Não é possível dizer-vos o número de pagãos que já fizeram a sua prece e mesmo a sua oferta aos pés de N. Sra. de La Salette.

Em Coimbatore, numa pequena povoação duns 250 cristãos, construiu-se modesto santuário à N. Sra. de La Salette, a cuja proteção recorreram quando ameaçados pelo cólera, fazendo promessa de oferecerem um santuário, se fossem poupados pelo flagelo. Assim aconteceu e feita uma coleta, fizeram questão que o sacrário viesse da "Grande Salette" da França.

Lá foi o sacrário, evidentemente sem despesa para aquela pobre gente.

As Religiosas de Jesus e Maria de Agra, levantaram uma capela a N. Sra. de La Salette. Em 1866 uma delas escreveu: '"No corrente ano, por meio de vossos preciosos '"Annales" temos tornado mais conhecida N. Sra. de La Salette, aumentando-lhe o amor: pelas várias regiões da India, desde Bombay, até as fronteiras do Tibet. As nossas numerosas alunas das doze escolas levarão por toda parte a boa nova. O mês de Setembro, há quatorze anos. vem sendo celebrado com o mesmo fervor que o mês de Maio".

Um missionário acrescentava: "Podereis acreditar que ultimamente a Virgem de La Salette se dignou de exercer sua benigna influência nos montes do Hymalaia, nesta missão de Agra?"

Um padre Jesuíta, missionário no Maduré, Índias Orientais, comunicando que em 1866 dera-se a inauguração dum santuário a N. Sra. de La Salette cujo primeiro subscritor fora D. de Bruillard, dizia: - "Mesmo os nossos ingleses protestantes dão muito valor a esse santuário, provavelmente o primeiro com o titulo de N. Sra. de La Salette das Índias. acontecimento realmente faustoso, no vasto continente da Asia.

Queira Maria converter os protestantes e os pagãos!"

Em 1873, o Pe. Saint-Cyr escrevia: "É um santuário "aéreo" pois ergue-se a 2.200 metros de altitude. Pare alcançá-lo há dois cantinhos respectivamente de 35 e 24 quilômetros.

Apesar de tudo. avultado é o número dos romeiros que pela confiança de obter graças. sobem movidos pela fé. Vêm, não se queixam, voltam, entusiasmados. Glória, pois, a Maria!"

Dez anos mais tarde o mesmo religioso fazia caloroso apelo à caridade “porque sendo o santuário insuficiente para o número de fiéis, torna-se necessário aumentá.-lo. Dessa missão do Maduré um outro padre também jesuíta, em 1908, solicitava fosse publicada uma grande graça obtida pela intercessão de N. Sra. de La Salette.

Nestes últimos anos os padres americanos de N. Sra. de La Salette fundaram na Birmânia, em Arakan, uma missão se apresenta muito dificultosa. Cinco padres embarcaram no porto de Veneza, em 1937 tendo antes ido a La Salette para colocar o seu apostolado sob a proteção da Virgem Reconciliadora. Um deles faleceu logo ao chegar, outro exausto de excessivo labor, teve de ausentar-se da missão. Graças a jovens substitutos, conseguiram estabelecer-se em três postos, mas a guerra com o Japão foi-lhes muito prejudicial. Um dos padres foi morto e cortado em pedaços pelos indígenas; outro faleceu; os outros ficaram completamente exaustos pela fome e pelo cativeiro, de modo que a missão voltando a estaca zero, teve de ser iniciada novamente. Mais uma vez, por certo, o sangue dos mártires será semente de cristãos.

 

§ 3o - América do Norte

De caso pensado temos deitado para o fim o glorioso continente por dois motivos; primeiro para que seja o remate deste nosso estudo; segundo porque, após a Europa é na América, tanto do Norte como do Sul que, mais se espalhou e presentemente ainda é mais celebrado - e com que brilho! - o culto de N. Sra. de La Salette.

Nessa obra porém tendo os missionários de N. Sra.. de La Salette, parte bastante ativa, passamos gratissímos a palavra ao Sr. Cônego Garnier, antigo Reitor do Santuário na Montanha Santa traduzindo literalmente o seu bondoso escrito (300) .

(300) L’Expansion de La Salette dans le Monde, p. 205 a 212.

 

ESTADOS UNIDOS

Os "Annales" cujo primeiro número saiu em 1865, atestam que antes dessa época, a devoção à N. Sra. de La Salette não era absolutamente ignorada na América.

Aludindo às cartas provindas numerosas de toda parte, lia-se: '"Hoje é uma carta de Baltimore que fala da alegria e do entusiasmo com que foram lá recebidos alguns artigos religiosos".

Em 1861 efetuou-se a bênção dum altar de N. Sra. de La Salette em Caron-Dolet onde, em 1881, as religiosas de S. José mandaram construir-lhe uma capela. Foi sobretudo em San Francisco que mais se espalhou essa devoção. Florescia no hospital dessa cidade, na capela das religiosas das Mercês, que pouco depois consagravam um hospício a N. Sra. de La Salette, cujo nome estava esculpido, por extenso, na porta.

Dali a devoção se irradiou pela cidade toda, havendo várias curas extraordinárias, tomando incremento na casa dos Jesuítas, das Religiosas de Notre Dame e da Apresentação.

Em 1812, o Arcebispo de San Francisco recomendando-se às orações dos romeiros de N. Sra. de La Salette, manda se organizem coletas cujo produto foi remetido a Paris para que seis pobres se incorporassem na primeira peregrinação nacional à qual se uniram pela oração os fiéis de San Francisco.

No Texas erigiram um grupo da Aparição em 1889, no convento das Ursulinas Da vila San Antonio, a cuja cerimônia, muito concorrida, faltava o Bispo de Galveston, D. Bubuis, só por estar de viagem para a França.

Pelas margens do lago Michigan, em Charlotte, no ano de 1869, construíram e dedicaram uma igreja a N. Sra. de La Salette.

Igualmente em Duluth, em Minnesota, criou-se um centro da Confraria em 1877.

Em Nova Orleans, na cidade Les Remparts, foi construída uma igreja paroquial dedicada à N. Sra. de La Salette, a primeira provavelmente das Américas, com centro da Confraria. Outro centro foi criado em 1873 na igreja Santo Agostinho, Da própria cidade de Nova Orleans, com 1.500 sócios.

No estado de Missouri, as religiosas irmãs de São José de Carondolet, mandaram construir, em 1885, uma capela à N. Sra. de La Salette fazendo questão que a pedra do altar fosse de mármore vindo do Santuário da Montanha.

Em Davenport, no Lowa, o culto de N. Sra. de La Salette difundiu-se com a denominação de N. Sra. das Lágrimas.

Igualmente, em Hailly-Idaho na Califórnia, no Arcebispado de Oregon, um santuário de N. Sra. de La Salette, possui um lindo grupo da Aparição. Em 1893, um missionário dessa região escreveu externando a sua gratidão à Virgem das Lágrimas, por tê-lo livrado de inúmeros perigos durante o inverno passado pelos montes.

Em época mais recente, devido aos padres de La Salette chegados da França e aos recrutas americanos que a eles se uniram, o culto de N. Sra. de La Salette desenvolveu-se nos Estados Unidos rápida e consideravelmente. A revista americana que os padres publicam, "The La Salette Missionary", forneceria dados completos. Limitemo-nos a uma simples lista das suas casas nesse pais, árida, mas muito eloquente.

Estabelecendo-se em Hartford em 1892, tomaram a seu cargo a paróquia de N. Sra. das Dores e já em 1898 ali criaram uma Escola Apostólica. Desde então, o aniversário da Aparição foi sempre celebrado com a maior solenidade. Atualmente multidões de três a quatro mil romeiros vão rezar em La Salette de Hartford, no Domingo mais próximo do dia 19 de Setembro. Iguais atividades notam-se no centro salettinos estabelecido na importante paróquia de S. José, criada para os padres em 1894, em Fitchburg em cuja matriz inauguraram uma estátua de N. Sra. de La Salette; em 1897 fundaram uma associação reparadora de homens, a "Liga de N. S. S.", que tomou compromisso de cumprir os ensinamentos da Virgem da Montanha. Logo de início os aderentes inscreveram-se às centenas.

De menor importância são as residências de Proenecia, Estado de Nova York e Danielson, na Connecticut, fundadas respectivamente em 1902 e 1905. Nesta última localidade os padres têm a seu cargo a paróquia de São Tiago em cuja matriz os vitrais da capela-mór representam as três fases da Aparição.

A residência de Ware (Mass), fundada em 1904, apresenta esta particularidade que os padres são poloneses que a um só tempo cuidam da paróquia Santa Maria e publicam um "Buletin de La Salette" em idioma polonês.

Os padres da residência de Westfield, fundada em 1901 têm a seu cargo a paróquia polonesa da SSma. Trindade, e os da residência de Holyoke (Mass.), fundada em 1911, cuidam da Paróquia da Imaculada Conceição.

Muito mais importante é a casa de Bloomfield, fundada no ano de 1911 no Connecticut, residência do R. P. Provincial e casa do Noviciado. Duas casas que são apenas duas paróquias, foram fundadas na Luisiana; em Sulphur (La,) no ano de 1921, que é a paróquia de N. S. do Pronto Socorro e em Loreanville (LA) onde os padres têm a seu cargo a paróquia de S. José e mais distritos.

Um centro salettino da maior importância, é o de Alta-mont, Estado de Nova York, onde há, ao mesmo tempo o escolasticado, a redação do "Buletin" Americano e uma romaria muito frequentada pelos circunvizinhos, mormente durante a novena antecedente a 19 de Setembro.

Mencionemos as três pequenas residências: a de Fairmont; (W. Wa.) fundada em 1923 no west Virginia, onde os padres cuidam da paróquia italiana de S. José; a de Bondsville (Mass.) fundada em 1925 que é paróquia polonesa de Santo Adalberto; e a de Nashua, em new Hampshire, fundada em 1928, é também paróquia polonesa de Santo Estanislau.

Não há centro salettino mais ativo nos Estados Unidos que a Escola Apostólica canadense de Enfield, na Estado de New Hampshire, especialmente desde a publicação da revista em francês "Celle qui pleure" (Aquela que chora). Seus professores, vão, num raio de 100 a 150 quilômetros ajudar os vigários das paróquias, o que para eles constitui excelente ocasião de transmitir a grande nova de La Salette.

A casa de Attleboro, fundada recentemente, é uma autêntica romaria, onde foi inaugurado a 19 de Setembro de 1945, um “fac-simile” dos lugares da Aparição.

No sul dos Estados Unidos, no Texas, existem duas paróquias, com o culto de N. Sra. de La Salette; Em Bufkin, que é a paróquia de São Patrício; e Winton, na Luisiana, que é a paróquia de São José.

Mencionemos a pequena residência de São Casimira, em Nashua, fundada em 1929, que é uma paróquia lituana, e as recentes paróquias, Sioux-City, no Iowa, de 1930, e de Berkley na Michigan, que é a paróquia de N. S. do Refúgio.

A Província do Canadá, estabeleceu o seu escolasticado em Attleboro em 1942, onde se efetuou em 1945 a bênção do "'fac-simile" dos lugares da Aparição.

Terminemos assinalando o tato que o R. P. Kolbuch, provincial da Polônia, salvou a sua província, na época da invasão alemã em 1939 fundando a Escala Apostólica polonesa em Olivet, no Ilinois, escola essa a irradiar bem ao longe a devoção à Virgem chorando, pois os seus devotados professores evangelizam as povoações polonesas da circunvizinhança.

Como se está vendo, é realmente esplêndido o trabalho desenvolvido pelos padres de La Salette nos Estados Unidos, deixando antever um futuro de mais amplas realizações.

A Província dos Estados Unidos é a mais desenvolvida, grande é portanto o porvir do culto de N. Sra. de La Salette nessa parte da América.

 

CANADA

Chamados em 1895 para fundar as missões Ovest Canadense, os padres de La Salette muito labutaram e de um dos sobreviventes, o P. Morard, o Arcebispo de São Bonifácio, D. Langevin, dizia: "R. P. Morard, missionário de La Salette, é o herói da América do Norte".

 

§ 3o – América do Sul

Não há que duvidar, é no Brasil que as festas em honra de N. Sra. de La Salette se realizaram de modo mais “espetacular". Verdade é que, fora Santa Cruz das Palmeiras por alguns anos confiada aos padres de La Salette, as paróquias entregues aos seus cuidados são importantes paróquias urbanas e que a romaria de Marcelino Ramos é muito concorrida.

Tivemos o prazer de visitar as residências de São Paulo e do Rio de Janeiro. No Santuário do Rio de Janeiro, de puro estila gótico, sendo vigários desde a sua criação de 1914, os padres de La Salette, vimos piedosas multidões apinhadas a cantar os mesmos hinos que os de La na Salette e também como na Santa Montanha, com acompanhamento do carrilhão. Fomos rezar na sepultura do fundador da missão, o P. Moussier que deixou reputação de santo.

Não foram no entanto esses padres que nesta cidade tornaram conhecida N. Sra. de La Salette, pois, em 1887 os “Annales” afirmaram que a devoção a devoção a N. Sra. de La Salette era muito popular no Rio de Janeiro, assinalando que três Brasileiros vieram em romaria de ação de graças a N. Sra. de La Salette. Um deles seguia, nessa ocasião, os passos dum seu sobrinho romeiro de La Salette, uns anos antes, onde passara 40 dias orando e jejuando. Em 1859 achava-se em La Salette uma família do Brasil, mas o presente seria singularmente mais lindo que o passado.

Podemos pessoalmente avaliar qual seja o esplendor das festas saletinas no santuário, pelo que vimos e ouvimos indo ao Congresso de Buenos Aires, quando nessa casa recebemos mais fraternal acolhimento.

A primeira residência fundada pelos padres foi a de São Paulo, que deu seu nome a Rua Salette, rua essa onde se estabeleceram. Eles têm a seu cargo a paróquia de Sant'Ana. O mês de Setembro e mormente o dia 19 desse mês, sempre se celebram com a maior solenidade e frequência de milhares de pessoas.

Desde aquela época foi criada em São Paulo no alto de Sant'Ana a paróquia de N. Sra. de La Salette, sendo também residência do R. P. Provincial.

A verdadeira romaria salettina fica no entanto em Marcelino Ramos, Estado do Rio Grande do Sul, onde os romeiros vão aos milhares.

Fundada em 1928, nessa casa existem o escolasticado, o noviciado, a Escola apostólica; e os padres têm a seu cargo a paróquia de S. João Batista. Para o restante da América do Sul, os '"Annales" de 1873 dizem que havia em Buenos Aires um altar de N. Sra. de La Salette inaugurado em 1869 e outro em Montevidéu no Uruguai, este último, acrescentava o correspondente, existe faz muito tempo e ai a Aparição é mais honrada e mais conhecida".

No mês de Julho de 1902, quatro padres da Venezuela achavam-se em La Salette para consagrar a sua pátria à Virgem que eles vieram implorar pelos seus patrícios e pedir-lhe o bem inestimável da paz.

Pouco antes da última guerra, os padres poloneses se estabeleceram na Argentina para se ocupar dos imigrantes da Polônia, fundando as residências de Buenos Aires, Cordoba, Rosário e Santa Fé." Até aqui o competente e muito ilustrado Sr. Cônego Garnier.

Após essa rápida viagem pelo mundo afora, onde por toda a parte até nos mais ignorados recantos, encontramos, comovidos; inúmeros devotos da Virgem das Lágrimas, chegou finalmente o momento de encerrarmos estas por demais prolongadas páginas.

Ao escrevermos, guiou nossa mão tão somente o intuito de tomar mais completamente conhecida, sobretudo na terra de Santa Cruz, e mais fielmente ouvida, mais piedosamente implorada, mais gloriosamente honrada, a querida Mãe, Maria SSma. em Pranto, na sua comovedora Aparição do Monte de La Salette.

 

DEVOCIONÁRIO

ORIGEM, FIM E PRIVILÉGIOS DA ARQUICONFRARIA

ORIGEM - Pouco depois da Aparição de Maria SS. no monte da Salette, em 19 de setembro de 1846, formou-se uma associação religiosa com o nome de N. Sra. Reconciliadora que o Bispo da diocese erigiu canonicamente e que o Papa Pio IX elevou à categoria de Arquiconfraria por Breve de 21 de Setembro de 1852.

FIM - A Confraria tem por fim:

1o Aplacar, por intermédio de Maria SS. a cólera de Deus. irritado pela violação dos seus mandamentos;

2o Rezar pela conversão dos pecadores;

3o Proporcionar aos seus membros os meios para se santificarem.

 

REGULAMENTO

I - Devem os associados: rezar diariamente um Pai Nosso, uma Ave Maria e mais a invocação:

Nossa Senhora da Salette, reconciliadora dos pecadores, rogai sem cessar por nós que recorremos a vós; fazer o possível para confessar-se e comungar no dia 19 de cada mês; fazer observar, pelas pessoas que deles dependem, os mandamentos de Deus e os 1o e 4o da Igreja; propagar a devoção de N. S. da Salette, fazendo conhecer seus lamentos, suas ameaças e recomendações em sua Aparição.

II - Todos os católicos, homens, senhoras· e crianças podem ser membros da Confraria; para isso é só dar o seu nome ao Diretor para serem inscritos no respectivo Livro.

II - Nos Centros da Confraria haverá um grupo de associados composto duma diretoria e zeladores especialmente encarregados, nos termos do seu regulamento interno, de promover: 1o) o desenvolvimento da Confraria; 2o) as cerimônias religiosas em honra de N. Sra. da Salette, especialmente no dia 19 de Setembro ou no domingo seguinte.

PRIVILÉGIOS - Por Breve de 28 de Agosto de 1852, o Papa Pio IX concedeu aos membros da Confraria: 1o uma indulgência plenária no dia de sua admissão; 2o uma indulgência .plenária cada ano no dia 19 de Setembro ou no Domingo seguinte, festa da Padroeira da Confraria, se, depois de confessar e comungar, visitarem a igreja ou capela do Centro da Confraria, fazendo orações pelas intenções do Papa; 3o uma indulgência de sete anos e sete quarentenas nos dias seguintes: 2 de Fevereiro, festa da Purificação de Maria SS.; na sexta feira depois do Domingo da Paixão, festa de N. S. da Compaixão: 21 de Novembro, festa da Apresentação de Maria SS. com as condições marcadas para o aniversário da Aparição; 4o uma indulgência de sessenta dias para cada obra de caridade, por exemplo, tratar de enfermos, pobres, etc., ou obra de devoção, por exemplo, ouvir missa, etc. 5o uma indulgência plenária na hora da morte, depois de se confessarem e comungarem ; não podendo, só de coração, e podendo, invocarem de boca, o SS. Nome de Jesus. Essas indulgências podem ser aplicadas às almas do Purgatório.

 

NOVENA A NOSSA SENHORA DE LA SALETTE

PRIMEIRO DIA

- Ó minha terna Mãe, prostrando-me a Vossos pés, afim de pedir-vos… (designar aqui a graça desejada) não posso esquecer que descestes do Céu sobre a montanha da Salette; para me recordardes primeiro que tudo, os meus deveres de cristão, e que não alcançarei o favor que tanto desejo com esta novena, senão depois de, por uma boa confissão, por-me em estado de graça com vosso divino Filho e de todo o coração procurar corrigir-me de meus defeitos. Portanto, Virgem Reconciliadora dos pecadores, obtende-me esta graça das graças, pois com ela tudo conseguirei em superabundância. Animado por tantos prodígios que obtém aqueles que vos invocam sob o titulo de Nossa Senhora da Salette, eu recorro também a Vós; gravai cada dia em meu coração alguns dos ensinamentos da vossa Aparição misteriosa.

Resolução - Recitar a Ladainha de Nossa Senhora da Salette.

 

SEGUNDO DIA

- Ó minha Mãe, porque chorais tristemente sentada no rochedo em tão profunda solidão? - Meu filho, é para te ensinar a refletir e a chorar teus pecados. O campo da tua alma estão na desolação, porque não meditas nas grandes verdades da Fé, nos novíssimos do homem e nas deploráveis consequências da tua leviandade, nesta vida e na outra. Retira-te pois, frequentemente, à solidão e lá meu divino Filho falará ao teu coração e te inspirará algumas resoluções que te assegurem a salvação eterna. - Ó minha Mãe, quantos motivos tenho de unir minhas lágrimas às Vossas! Tenho, com efeito, resistido até hoje ao chamamento de Jesus; auxiliai-me, pois, de hoje em diante, a não pensar, a não falar, a não fazer cousa alguma, senão de conformidade com os desejos do seu divino Coração.

Resolução - Preparar-se para fazer o mais breve possível uma boa confissão.

 

TERCEIRO DIA

- Ó minha terna Mãe, que quer dizer essa grande cruz luminosa sobre vosso peito? Porque a torrente de lágrimas que caem de Vossos olhos sobre o divino Crucificado! - Meu filho, não terás, pelo pecado mortal, ultrajado, crucificado teu Salvador e teu Deus? Não vês que a Cruz, o sinal adorável da salvação, é cada vez mais desprezada por toda parte? E não terás, pois, motivo de verter lágrimas de sangue diante de tais iniquidades? Apressa-te, pois, a desarmar o braço justiceiro de meu Filho, para que Ele não o deixe cair sobre ti e sobre os teus Receia que Ele te abandone. Atende, estude, adora, agradece a Jesus crucificado; Ele é remédio para todos os males, é modelo de todas as virtudes.

Traze-O sobre teu peito e, sobretudo, em teu coração. Em compensação, Ele te há de levar ao Céu.

Resolução - Trazer ostensivamente uma cruz ao peito.

 

QUARTO DIA

- Ó minha boa Mãe, os intuitos da vossa Aparição revelam-se perfeitamente no vosso vestuário; a modéstia do vosso olhar, um vestido todo simples, um simples lenço ao pescoço, um humilde avental, uma touca ocultando-vos os cabelos e os ouvidos bem como o cuidado em esconder vosso rosto angélico ao humilde menino, condena fortemente o orgulho, o luxo e a sensualidade, que tantas vitimas fazem nesta e na outra vida. Auxiliai-me, pois. ó minha Mãe, a ter uma vida toda interior, a ocultar-me aos olhos do mundo e só nele mostrar-me para difundir a santa fragrância de Jesus Cristo. Fazei-me compreender bem que não posso ser puro de coração senão praticando a modéstia, a humildade, a mortificação e o afastamento do mundo.

Resolução - A maior simplicidade no vestuário e nos costumes.

 

QUINTO DIA

Vós chorastes, ó terna Mãe, todo o tempo que estivestes falando na Salette, disse a Pastorinha, e Vossas lágrimas tornavam-se mais abundantes conforme os crimes que viestes censurar-nos: a revolta contra Deus e sua Igreja, a blasfêmia, a profanação dos dias do Senhor, o desprezo das leis da penitência e dos avisos sobrenaturais, a ingratidão para com Vosso amor e Vossos benefícios!... Continuai, pois, ó Mãe Santíssima, a verter essas lágrimas benéficas, para corrigir nossos costumes e obter de nós lágrimas de verdadeira penitência. Para vos provar o sinceridade das minhas, quero de hoje em diante, combater em torno de mim todos esses grandes crimes que Vós nos censurastes.

Resolução - Associar-se à Arquiconfraria de N. Sra. da Salette.

 

SEXTO DIA

- Ó minha Mãe, Vós dissestes na Salette: - "Fazei bem vossa oração, meninos. E' muito necessário fazê-la de manhã e à noite. Bem sabeis o que meu divino Filho disse da oração em seu Evangelho: é preciso orar sempre. incessantemente, porque, sem Mim, isto é, sem a sua graça, nada podeis fazer que seja meritório. Ora, esta graça não é concedida senão na oração. Pedi, pois, em Meu nome (com o coração reto e puro, confiança, submissão e perseverança), e recebereis (mesmo os milagres, mais estupendos). A oração é a chave dos tesouros do Céu; o clamor das vossas fraquezas sobe até Deus e a misericórdia divina desce logo. Se quereis, pois, ser um santo, (ou uma santa), sê uma alma generosa. Eu mesma rogo incessantemente por vós no Céu".

- Ó minha santa Mãe, quanto sois bondosa; jamais esquecerei a necessidade da oração, que é a felicidade da vida.

Resolução - Fazer ao menos à noite, a oração em família.

 

SÉTIMO DIA

- Ó minha Mãe santíssima será possível que a maldade dos homens possa chegar a transformar em seu detrimento o que o amor infinito de Deus estabeleceu para sua salvação e sua maior felicidade? E, entretanto, é isto o que Vós nos censurais em vossa Aparição, dizendo: - "Eles não vão à Missa senão para zombar da Religião! Ai! quantos cristãos que, à semelhança dos Judeus, no dia da Paixão do Salvador, não se dignam sequer entrar na igreja e ali procurar a salvação nas fontes dos Sacramentos! Ou, se ali vão, é só para escarnecer de tudo, pelas suas más disposições!" - Longe de mim, ó Mãe, a horrorosa desgraça de um sacrilégio! Será com toda a sinceridade de minha alma que confessarei sempre, e sera com filial respeito e santa edificação que assistirei muitas vezes a Missa e comungarei.

Resolução - Aproximar-se frequentemente dos Sacramentos e participar da Santa Missa.

 

OITAVO DIA

- Ó Maria Santíssima, como a vossa Aparição me revela os segredos do vosso coração materno!... Como ela aumenta e fortalece minha confiança em Vós! Misericordiosa Mãe, nada Vos desanima para ganhar o coração de vossos filhos e reconduzi-los a Deus! E aqueles que não se deixaram atrair pela vossa encantadora bondade, Vós os moveis a render-se, por meio de vossas lágrimas, ameaças e até castigos! Mas ainda então, com que suavidade, se uma Vossa mão castiga, com a outra susteis o braço do vosso Filho irado! Vosso olhar materno e solícito nos persegue até em nossos extravios e nas mínimas circunstâncias da nossa vida, para nelas descobrir e recompensar algum bom sentimento e boa obra... Quem não amará pois uma tal Mãe? Quem não terá nela plena confiiança? Quem não procurará ter-lhe amor e glorificá-la?

Resolução - Confiar na proteção de Maria Santíssima, mesmo contra toda a esperança.

 

NONO DIA

- Ó minha boa Mãe, eis-me no último dia desta novena e nela tenho apenas esboçado os ensinamentos da vossa Aparição. É tão suave contemplar-Vos e expandir o coração a Vossos pés! São tão rápidos os instantes que se passam junto de Vós! Parece-me que Vos ouço dizer-me com aos pastorinhos extasiados em Vossa presença: "Pois bem, meu filho, comunicarás isto a todo o meu povo". O amor ama o sacrifício e a dedicação; faze pois, compreender aqueles que te rodeiam, a necessidade, as práticas e as consolações do serviço de Deus, resumidas na minha Aparição. Como Eu, inflama-te do santo zelo pela glória de Deus, pela edificação e pela salvação de teus irmãos. O Céu será o primeiro dos teus esforços".

Resolução - Fazer o exercício da Via Sacra em sufrágio das Almas do Purgatório.

 

ORAÇÃO A N. SRA. DE LA SALETTE

Lembrai-vos, ó Nossa Senhora de La Salette, verdadeira Mãe das dores, das lágrimas que derramastes por mim no Calvário; lembrai-vos também dos angustiosos cuidados a que sempre vos dais por mim, afim de me subtrair à justiça de Deus; e vede se depois de tanto terdes feito por vosso filho, animado por este pensamento consolador, venho lançar-me a vossos pés, apesar de minhas infidelidades e ingratidões.

Não rejeiteis a minha oração, ó Virgem Reconciliadora, mas convertei-me; alcançai-me a graça de amar a Jesus sobre todas as coisas e de Vos consolar por uma vida santa, para que vos possa ver um dia no Céu. Assim seja.

(300 dias de indulgência- Pio XI, 27-11-37).

 

Invocação a N. Sra. de La Salette

Nossa Senhora de La Salette reconciliadora dos pecadores, rogai sem cessar por nós que recorremos a Vós.

(100 dias de indulgência - Pio XI, 27-11-37).

 

Para mais certamente alcançar a graça desejada, aconselhamos:

1. - Não omitir a confissão e a comunhão.

2. - Propagar a devoção a N. S. da Salette e seus ensinamentos.

3. - Publicar a graça alcançada para maior glória de Maria SS.

Para publicação dos favores obtidos como para pedidos da presente novena ou associar-se à Arquiconfraria de N. S. da Salette, obter, estampas, medalhas, água da fonte milagrosa e mandar rezar missas em louvor a N. S. da Salette, dirigir-se ao

R. P. SUPERIOR DOS MISSIONÁRIOS DA SALETTE

78, Rua Catumbi - Bio de Janeiro, ou Sant'Ana – São Paulo, ou Marcelino Ramos - Rio Grande do Sul.

 

INVOCAÇÕES A N. Sra. DA SALETTE

N. S. da Salette, Mãe de Deus, Rogai por nós,

N. S. da Salette, Rainha e Mãe dos homens,

N. S. da Salette, Mensageira da Misericórdia Divina,

N. S. da Salette, toda poderosa por Vossas súplicas,

Vós que reteis o braço do Senhor irritado contra nós,

Vós que derramais tantas lágrimas sobre nossas revoltas e infidelidades.

Vós que tanto sofreis por nós, apesar de nossas ingratidões,

Vós que nos excitais tão maternalmente a sempre recorrermos a Vós,

Vós que nos exprobais particularmente a violação do Domingo e a blasfêmia,

Vós que Vos queixais tão dolorosamente da profanação das coisas santas,

Vós que nos recomendais tanto a oração da manhã e da noite,

Vós que tão amargamente condenais as sensualidades e os vergonhosos prazeres do mundo,

Vós que nos recordais de um modo tão tocante a paixão de Jesus Cristo,

Vós cuja Aparição é uma fonte de salvação para os pobres pecadores,

Vós que insistis tão fortemente com os justos a redobrarem de fervor.

Vós cujas ameaças proféticas, tão justamente aterrorizam o mundo inteiro,

Vós que nos prometeis tantos bens, se nos convertermos,

Vós que fizestes jorrar a Vossos pés a fonte milagrosa,

Vós que a exemplo de Jesus. curais toda a enfermidade,

Vós que quisestes sor honrada e invocada no Universo inteiro,

Vós que fazeis nascer e prosperar tantas obras reparadoras,

N. Sra. da La Salette, regra viva de caridade,

Vítima de penitência e expiação,

Modelo de modéstia e simplicidade,

Estandarte de obediência e submissão,

Foco de zelo e apostolado,

Providência dos pobres e das crianças,

Luz dos cegos e ignorantes,

Consolo dos enfermos e aflitos,

Esperança dos desesperados,

Advogada da Igreja padecente,

Apoio da Igreja militante,

Glória da Igreja triunfante,

Por Vossas amargas queixas, tornai-nos dóceis à voz de Vosso divino Filho,

Por Vossas abundantes lágrimas, alcançai-nos a graça de chorar nossos pecados,

Por Vossos maternais sofrimentos, alcançai-nos resignação em todos nossos males,

Por todas Vossas aparições, ressuscitai a fé de Vosso povo,

Por Vossos olhares voltados para Roma, afeiçoai-nos mais e mais a Santa Sé,

Por vossa incomparável ternura fazei que Vos amemos cada vez mais,

Por Vossa arrebatadora beleza, fazei-nos suspirar pelo céu,

Por Vossa nova Assunção , atrai-nos junto a Vós.

N. S. da Salette Reconciliadora dos Pecadores,

Rogai sem cessar por nós que recorremos a Vós.

 

OREMOS

Senhor Jesus, que em vossa infinita misericórdia, nos enviastes sobre a Montanha da Salette, vossa gloriosíssima Mãe, para nos lembrar os deveres de cristão; fazei que sensíveis às suas lágrimas e dóceis aos seus avisos, apaziguemos nesta vida vossa cólera, por sincera penitência e mereçamos pelas boas obras, a graça de vos possuir eternamente no Céu. Vós que viveis e reinais por todos os séculos dos séculos.

Assim seja.

50 dias de indulgência por D. Duarte Arcebispo de S. Paulo.