ABORTO - O DIREITO DO NASCITURO À VIDA

A PRÁTICA DO ABORTO, NA ABORDAGEM DE GRANDES NOMES DA MEDICINA!

ABORTO

O DIREITO DO NASCITURO À VIDA

JOÃO EVANGELISTA DOS SANTOS
ALVES DERNIVAL DA SILVA BRANDÃO
CARLOS TORTELLY RODRIGUES COSTA
WALDENIR DE BRAGANÇA


Laureado pela Academia Nacional de Medicina com o Prêmio GENIVAL LONDRES, de Etica Médica

 

1982

Livraria AGIR Editora

RIO DE JANEIRO

 

Copyright  de João Evangelista dos Santos Alves, Dernival da Silva Brandão, Carlos Tortelly Rodrigues Costa e Waldenir de Bragança


Direitos para edição em língua portuguesa reservados a

ARTES GRÁFICAS INDÚSTRIAS REUNIDAS S.A. (AGIR)

 

No presente estudo os autores tecem considerações em torno do abortamento provocado, focalizando-o sob o ponto de vista científico, ético e legal.

Na parte I, após algumas definições preliminares (abortamento espontâneo, abortamento indireto, abortamento direto, etc.), detêm-se os autores no aspecto ético e legal do abortamento provocado direto, alinhando argumentos, sob vários aspectos, para demonstrarem a natureza criminosa desta intervenção. Após desfazerem as principais alegações com que se procura justificar morealmente o abortamento provocado, passam a analisá-lo sob o ponto de vista do Direito e da Justiça. Referem-se, em seguida, aos efeitos deletérios que a institucionalização deste crime pode acarretar sobre a pessoa humana, sobre a família, sobre a sociedade e, inclusive, sobre a Medicina, desvirtuando sua finalidade e contrariando seus princípios básicos.

A exposição é fartamente enriquecida com citações de autoridades do mais elevado gabarito.

Na parte II, os autores desenvolvem o tema encarando-o sob o aspecto estritamente científico e logo demonstram a inconsistência da chamada “indicação terapêutica”. Para isso, promoveram consultas em torno do problema da gravidez com intercorrência de enfermidade grave na gestante e obtiveram depoimentos inéditos de personalidades médicas de grande experiência e reconhecido saber profissional, nas respectivas especialidades: Prof. Euríclides de Jesus Zerbini, Prof. Alvaro Guimarães Filho, Prof. José Leme Lopes, Prof. Aloysio de Paula, Prof. Hélio Fraga, Prof. Henrique A. Paraventi, Prof. Emílio Mastroiani, Prof. Herbert Praxedes, Prof. José Ribeiro do Valle, Prof. Adolpho Barcellini e Prof. José Bocanegra Arroyo.

Compulsando a literatura médica brasileira, extraíram opiniões de médicos ilustres: Prof. Luiz V. Decourt, Prof. Alberto Raul Martinez, Prof. A Wolff Netto, Prof. Caetano Zamitti Mammana e outros insignes mestres da Medicina no Brasil.

Nas partes III e IV discutem os chamados abortamentos “sentimental” — (caso de estupro) e “eugênico”, demonstrando, na mesma linha de raciocínio, o mal intrínseco em que constituem tais práticas.

Finalmente, na parte V, os autores analisam o Código de Ética Médica em face da Lei Natural, e na parte VI consideram a proteção da Família e a Paternidade Responsável.

 

Senhores Doutores
A Diretoria da Academia Fluminense de Medicina, por resolução aprovada na última reunião ordinária, vem felicitar aos prezados doutores pelo prêmio conquistado na Academia Nacional de Medicina.

O Professor Genival Londres foi um nome consagrado na Medicina pátria não só pelo seu saber mas também pela preservação da ética médica - da qual foi um dos seus melhores cultores.
O trabalho “O Direito do Nascituro à Vida” representa, sem sombra de dúvida, uma excelente contribuição na defesa dos princípios ditados pelo código deontológico.

Atenciosamente

Antonio Jorge Abunahman
Presidente

 


JOÃO EVANGELISTA DOS SANTOS ALVES
Titular do Colégio Brasileiro de Cirurgiões

Ginecologista do Hospital de Ipanema — INAMPS — RJ

DERNIVAL DA SILVA BRANDÃO
Ex-Presidente da Sociedade Fluminense de Ginecologia e ObstetríciaVice-Presidente da SFGO

Ex-Conselheiro-Diretor do Conselho Regional de Medicina — RJ

CARLOS TORTELLY RODRIGUES COSTA

Ex-Presidente da Academia Fluminense de Medicina

Ex-Presidente do Conselho Regional de Medicina — RJ

Ex-Presidente da Associação Médica Fluminense

Ex-Presidente da Sociedade Fluminense de Ginecologia e Obstetrícia

Membro da Academia Fluminense de Medicina

WALDENIR DE BRAGANÇA

Ex-Vice-Presidente da Associação Médica Brasileira

Ex-Presidente do Conselho Regional de Medicina — RJ

Ex-Presidente da Associação Médica Fluminense

Professor de Ciências Sociais da Universidade Federal Fluminense
Deputado Estadual — Vice-Presidente das Comissões de Saúde, Trabalho e Legislação Social

Membro da Academia Fluminense de Medicina

 

DEDICATÓRIA

Dedicamos o presente trabalho a todos os colegas que encaram esse grave e delicado problema humano com seriedade e grandeza. Particularmente àqueles que, retamente intencionados, ainda admitem, em casos excepcionais, a prática dessa infeliz intervenção. Esperamos oferecer-lhes, nas páginas seguintes, alguns subsídios para renovada e fecunda reflexão sobre o tema.

 

AGRADECIMENTO

Expressamos nossos agradecimentos e nossas homenagens aos ilustres colegas que colaboraram na parte científica deste trabalho, respondendo, nas respectivas especialidades, a consulta por nós formulada sobre o problema da gravidez com intercorrência de enfermidade grave na gestante: Prof. Euríclides de Jesus Zerbini (Cirurgia Cardiovascular); Prof. Adolpho Barcellini e Prof. José Bocanegra Arroyo (Cardiologia); Prof. Aloysio Veiga de Paula e Prof. Hélio Fraga (Pneumologia); Prof. José Leme Lopes (Psiquiatria); Prof. Herbert Praxedes (Hematologia); Prof. José Ribeiro do Valle (Bioquímica e Farmacologia); Prof. Álvaro Guimarães Filho, Prof. Henrique A. Paraventi e Prof. Emílio Mastroiani (Obstetrícia); e ao eminente Juiz de Direito Dr. Celso Felício Panza, por sua contribuição no setor jurídico, assim também ao ilustre advogado fluminense Dr. Antônio Francisco de Assis Alves.

Valemo-nos ainda, na presente exposição, de opiniões e estudos científicos expostos em revistas e congressos médicos brasileiros por eminentes colegas: Prof. Luiz V. Decourt, Prof. Alberto Raul, Martinez, Prof. Caetano Zamitti Mammana, Prof. A. Wolff Netto e outros ilustres autores citados no texto.  todos eles estendemos nossas homenagens.

 

I. CONSIDERAÇÕES GERAIS

“Desde o seio materno Javé me chamou,
desde o ventre de minha mãe, pronunciou o meu nome.”

Isaías 49,1
“Sim!
Pois tu formaste os meus rins,
tu me teceste no seio materno,
Eu te celebro por tanto prodígio,
eu me maravilho com tuas maravilhas!”

Salmo 189, 18-14

Na prática médica deparamo-nos, frequentemente, com vários problemas clínicos e cirúrgicos que envolvem aspectos de natureza ética, nem sempre fáceis de equacionar. Na época atual parece avolumarem-se tais problemas. Circunstâncias novas começam a trazer perplexidade ao médico, surpreendendo-o, muitas vezes desprevenido, em sua cada vez mais agitada atividade profissional. Porque muitos casos exigem solução imediata, nem sempre é possível ao médico reflexão mais acurada, ou o recurso de consultar os tratados de Ética, ou dirigir-se às autoridades no assunto, para encontrar solução justa e compatível com a dignidade humana.
Alguns graves problemas, por razões várias, são levados à crista dos acontecimentos e passam a exercer ou a sofrer influências diversas e a se apresentarem nos consultórios médicos em volume crescente e matizes os mais variados. Urge, portanto, reflexão mais profunda sobre tais problemas, e estudo mais detido e mais pormenorizado dos diferentes aspectos que os cercam.
Compete aos interessados, aos estudiosos, e às autoridades legítimas a busca de providências eficazes para evitar que prevaleçam soluções falsas, perigosas e injustas.
Assim, lembramos a título de exemplo, encontram-se os médicos das grandes cidades, sobretudo os especializados em Ginecologia, Obstetrícia e Medicina Social, perplexos em torno de problemas tais, como sejam: o anticoncepcionalismo, o recrudescimento das doenças venéreas, problemas sexuais em adolescentes e pré-adolescentes, abortamento provocado, etc.
Há algum tempo preocupa-nos seriamente o gravíssimo problema do abortamento provocado, sobretudo em face da influência negativa que começa a exercer entre nós o fato de em importantes países se haverem restringido, ao absurdo, as disposições legais que proíbem tal prática.
Deste tema nos ocuparemos no presente trabalho, sem outra intenção que a de contribuir para preservar a Medicina brasileira de macular-se em tão infausta prática, criminosa em sua natureza e sempre repudiada como contrária à consciência médica e ao espirito e à finalidade da Medicina.

Noções preliminares — Para facilidade de entendimento, resumiremos, a seguir, alguns conceitos geralmente admitidos e adotados.
Na essência, consiste o abortamento na morte ou na expulsão do concepto antes da sua viabilidade extra-uterina. Entende-se por concepto o ser humano no período da vida que vai desde o seu início, na concepção, até o nascimento. Usa-se o termo embrião para se designar o concepto durante as primeiras semanas de vida, reservando-se o termo feto para designá-lo no período subsequente. Neste trabalho, porém, para facilitar a exposição, usaremos as palavras embrião e feto com o mesmo significado atribuído ao termo concepto, isto é, como sinônimos deste. Assim também o termo nascituro — “aquele que há de nascer; gerado, mas ainda não nascido”.*

* LIMA, Hildebrando de & BARROSO, Gustavo — Pequeno Dicionário da Língua Portuguesa, 9.º ed., Editora Civilização Brasileira, São Paulo, 1957.

Abortamento espontâneo ou natural — É aquele que, como o nome indica, ocorre espontaneamente, naturalmente, em decorrência de fatores vários, que escapam aos nossos desígnios. É a morte natural do concepto.
A morte do concepto pode ocorrer também como consequência não visada, embora prevista, de ato médico realizado para curar gestante portadora de enfermidade, cuja natureza grave não permite adiar o tratamento até a viabilidade fetal.
Assim, por exemplo, em uma gestante cardiopata, no primeiro trimestre da gravidez, com indicação de tratamento cirúrgico cardiovascular inadiável, o risco de abortamento existe, mas não invalida a conduta cirúrgica, que é legítima, pois visa à salvação da mãe e não constitui agressão direta ao feto. Se ocorrer, o abortamento será indireto, acidental, não visado nem desejado pelo ato médico, embora previsto.
Do mesmo modo, várias outras enfermidades, como os tumores ovarianos, os miomas uterinos volumosos com conflito de espaço, etc. constituem casos em que a indicação cirúrgica é imperativa e legítima, no que pese encerrar grave risco para a vida fetal,
Até mesmo no carcinoma do colo uterino, o tratamento da mãe (histerectomia radical ou radioterapia intra-uterina) é lícito e pode ser efetuado, não obstante implicar em morte certa do concepto. Consequência esta indireta, não visada, mas inevitável. A consequente morte do concepto constitui aqui o que se chama, em Moral, ato indireto, isto é, o que não foi aceito, nem desejado, nem visado quer como fim quer como meio de obter um fim, mas foi previsto como consequência possível ou certa, porém inevitável, de um ato diretamente desejado (no caso, a destruição do câncer uterino pela retirada do órgão ou pela irradiação).
Nessas circunstâncias, a morte do feto ocorre “contra as intenções do médico, ainda que não contra as suas previsões”. Fundamenta-se a liceidade do ato no princípio do duplo efeito, assim compreendido:

a) à prática de um ato, moralmente bom ou indiferente, seguem-se dois efeitos paralelos, um bom e outro mau;
b) apenas o efeito bom é visado pelo ato praticado;
c) o efeito mau, embora inevitável, não é desejado nem visado pelo ato, sendo apenas previsto e tolerado;
d) o efeito mau não se constitui no meio de se obter o efeito bom;
e) o efeito bom é consequência direta do ato praticado, não sendo, portanto, secundário nem conseguente ao efeito mau;
f) o efeito bom visado é suficientemente importante para tolerar-se o efeito nocivo previsto.

Assim, na mulher portadora de câncer do colo uterino, a conduta terapêutica acima referida (ato bom) visa à cura da doente (fim bom). O fato de a paciente engravidar no decorrer da avaliação pré-operatória, ou mesmo já estar grávida antes, não lhe tira o direito ao tratamento adequado, ainda que, paralelamente à consequência boa (cura da mãe), preveja-se como inseparável uma, consequência má (morte do feto).
Como vemos, o direito ao tratamento não é postergado na mulher grávida, podendo esta ser sempre tratada, desde que não se atente diretamente contra a vida do concepto e se envidem esforços para preservá-la, quando possível.
A morte do feto assim ocorrida não infringe princípio deontológico, nem constitui objeto de atenção de nenhum Código de Ética Médica ou Código Penal, sendo pacífica e universal sua aceitação do ponto de vista moral e legal.

Abortamento provocado — Passamos agora ao abortamento provocado direto, que constitui o tema principal do presente trabalho. Entende-se por abortamento provocado e direto o que resulta de ato direta e deliberadamente destinado à morte do feto, ou sua expulsão da matriz quando ainda inviável, quer como fim quer como meio. A morte do feto é o objeto imediato da ação do operador, ainda que vise com este ato, em si mau, a um fim bom. É a morte provocada e premeditada do concepto.
É evidente que “os fins não justificam os meios”.
Intervir diretamente e deliberadamente para tirar a vida do feto (ato mau) como meio de obter-se a cura da mãe (fim bom) é procedimento condenável, posto que igual direito — no caso o direito à vida — de duas pessoas diferentes não se subordina. Ambas merecem o mesmo respeito aos seus direitos humanos inalienáveis, independentemente de maior fragilidade ou de maior força de uma sobre outra.
Uma mulher doente (por exemplo, portadora de câncer de mama ou de colo uterino, ou de cardiopatia grave, ou de nefropatia grave, etc.) tem o direito de tratar-se corretamente, mesmo estando grávida e ainda que o feto venha a sofrer as consequências deste tratamento.
Todavia, uma agressão direta contra a vida do concepto não se justifica, embora com o fim de melhorar as precárias condições de saúde da mãe; aceitar-se como justo tal procedimento implicará em legitimar-se a agressão a um ser humano indefeso em favor de outro mais forte ou mais influente.

Vida humana — Não pretendemos entrar em considerações filosóficas em torno da conceituação ou definição de vida humana. Todavia, podemos dizer que a ciência nos informa onde e quando se inicia o ciclo de uma nova vida. É fato cientificamente comprovado e amplamente difundido que a fecundação do óvulo pelo espermatozoide, que normalmente ocorre na trompa, é o estágio em que começa o ciclo de uma nova vida humana. É o início de um processo que só termina com a morte. O óvulo fecundado evolui segundo um plano inexorável até a plenitude do desenvolvimento de todo o organismo, cujas características já estavam contidas nos cromossomos da célula única inicial. Desde o seu início o novo ser nada mais recebe do meio exterior, à exceção de alimentos sob diversas modalidades, segundo o estágio de seu desenvolvimento. Com a fusão dos gametas constitui-se uma unidade bem estruturada que, pela transmissão dos caracteres hereditários paternos e maternos, tem suas características futuras essenciais bem determinadas: sexo, grupo sanguíneo, fator Rh, cor dos olhos, da pele, dos cabelos, até mesmo o porte, traços psicológicos, de temperamento, etc. Ali está escondido também o que, de certa forma, se tornará a base da inteligência e até mesmo da personalidade. Tanto assim é que — sabem muito bem os psicólogos — profundos distúrbios da personalidade podem ter origem remota, no período pré-natal. Assim, o novo ser formado com o padrão cromossômico humano é um ser vivo. Agora perguntamos: é coelho? é gato? que espécie de ser vivo é?
Não há dúvida de que se trata de um ser vivo humano.
É o que continuará a ser sempre: a mesma pessoa com toda a sua individualidade própria. Há unidade e continuidade. No desenvolvimento do novo ser ocorrem profundas modificações, porém todas acidentais, alterando-lhe o formato, o volume, etc. mas sem que haja mudança substancial, específica, pois é sempre o mesmo ser que, desenvolvendo-se, passa por todas as fases geneticamente determinadas na célula inicial. Para que o homem chegue às fases de recém-nascido, infância, adolescência, maturidade, velhice, é necessário que também passe pelas fases de formação no ventre materno — que começa na trompa, com a fecundação do óvulo pelo espermatozoide, e evolui até o parto. São, todas, etapas da mesma vida. Em qual delas será lícito destruí-la? No caso do abortamento podemos dizer que, de certa forma, é a pior, pois se mata covardemente alguém que não tem qualquer possibilidade de defesa.

Evolução do Nascituro
1º dia — A concepção ocorre na ampola tubária. Um novo ser humano — fruto da união de gametas humamos — inicia sua vida. É um ser irrepetível. Nunca existiu outro igual, nem jamais existirá.
Aproximadamente 30 horas após a fecundação ocorre a primeira divisão celular. Segue-se uma série de outras divisões, aumentando o número de células: é o novo ser humano em pleno desenvolvimento. Após certo número de divisões celulares, o concepto atinge a fase denominada mórula. Enquanto isso, está sendo levado através da trompa em direção ao útero.

2º a 4º dias — O concepto, sob a forma de mórula, com 12 a 16 células, chega à cavidade uterina. Forma-se uma cavidade no interior da mórula, passando o concepto a denominar-se blastocisto. Já nas células da mórula existe certa especificidade, de modo que as mais internas ficam situadas em um polo do blastocisto (o embrioblasto, que dá origem aos tecidos do embrião) e as células externas achatam-se e formam a parede do blastocisto (o trofoblasto, que se converterá na placenta).

6º a 7º dias — Inicia-se a nidação, ou seja, a implantação do concepto, sob a forma de blastocisto, na mucosa uterina (endométrio), previamente preparada para recebê-lo.

12º dia — Inicia-se a diferenciação dos tecidos embrionários.

15º a 17º dias — Inicia-se a hematopoiese e a formação de vasos sanguíneos.

18º a 21º dias — O coração começa a pulsar.

1º mês e meio — É possível fazer um eletroencefalograma. A criança já é capaz de realizar movimentos rudimentares, embora a mãe ainda não os perceba.

2º mês — Todos os sistemas orgânicos estão praticamente formados. É possível fazer um eletrocardiograma e pode-se ouvir as batidas de seu coração, com instrumentos de precisão.

3º mês — Todos os sistemas orgânicos estão aptos a funcionar. A criança já é capaz de deglutir líquido amniótico, de realizar movimentos respiratórios e de urinar também. Possui até impressões digitais. Quando sua mãe dorme ela também dorme, e acorda quando ouve ruído forte do exterior ou quando sua mãe realiza movimentos bruscos. Daí por diante as únicas mudanças básicas serão o crescimento e o aperfeiçoamento do que já está formado.

A propósito da vida humana na fase intra-uterina, o Dr. William A. Liley, chamado o “Pai da Fetologia” e que aperfeiçoou a transfusão de sangue no feto, escreveu o seguinte (citado por WILLKES):

“O novo indivíduo comanda o seu ambiente e o seu destino com tenacidade de propósito, implanta-se na parede esponjosa do útero e numa demonstração de vigor fisiológico interrompe a menstruação da mãe. Aquele vai ser a sua casa durante os duzentos e setenta dias seguintes.
Para torná-la habitável, o embrião desenvolve uma placenta e um envoltório protetor com o líquido (amniótico). Ele resolve sozinho o problema de sua conformação e faz o arranjo extraordinário de sua convivência com a mãe, durante nove meses, embora sejam um e outro imunologicamente diferentes, de tal forma que não poderiam receber um enxerto de pele, nem transfusão de sangue um do outro. Apesar de tudo, toleram-se mutuamente em união de vidas por nove meses.
Sabemos que o feto está sempre se movimentando naquele líquido e sua posição depende de como ele se sente mais confortável. Sente dor, pressão externa, frio, e percebe o som e a luz. O feto também bebe o líquido amniótico, e mais ainda se for artificialmente adoçado, e menos, Se o gosto for desagradável. Ele soluça e chupa o dedo. O feto dorme e acorda. As vezes, também fica enfadado quando tudo está do mesmo jeito, mas pode ser ensinado a ficar atento a um sinal diferente. Enfim, ele mesmo é quem determina o dia em que vai nascer, porque, sem sombra de dúvida, o começo do narto é uma decisão unilateral do feto.
Tal é, pois, o feto que nós conhecemos e que nós próprios fomos um dia. É o feto de que cuidamos na Obstetrícia moderna, que vem a ser o mesmo bebê do qual cuidamos antes e depois do nascimento, o qual pode ficar doente antes de nascer, exigindo diagnóstico e tratamento como qualquer outro paciente.”

Infusão da alma — Também não pretendemos entrar em discussões teológicas sobre o momento em que ocorre a infusão da alma, visto tratar-se de problema ainda sem resposta definitiva. Todavia, em face dos modernos conhecimentos embriológicos e genéticos, é tendência geral, atualmente, admitir-se que a infusão da alma se verifica no momento da concepção.
Como já foi dito, é sabido que na concepção tem início o ciclo de uma nova vida. Se ainda não se pode afirmar que é já um ser humano autêntico, pela falta de certeza de que já possui alma espiritual, a certeza contrária também é impossível. Contudo é um ser que, certamente, está na esfera do humano, destinado a receber uma alma, se já não a possui desde a concepção. É infundado, pois, justificar-se o aborto com o argumento de que, no início, não se trata de um ser humano autêntico.
A esse respeito, assim se expressou D. ESTÊVÃO BETTENCOURT O.S.B, conhecido teólogo beneditino:

“Todavia, mesmo que se admita a tese da '“humanização adiada”, não resta dúvida de que o processo que decorre da fecundação do óvulo é o de uma vida humana em formação ou evolução; é um processo tipicamente humano ou pertencente à esfera do humano. Basta deixar que tal processo se desenvolva naturalmente para se perceber nitidamente uma vida humana. Por isto a eliminação de tal embrião fica sendo sempre um atentado contra a vida humana ou um homicídio.”

Portanto, ainda que se admita a tese da infusão retardada da alma, todo processo decorrente do óvulo fecundado pertence à esfera do humano. Uma vida que se origina da união entre um homem e uma mulher a que espécie poderá pertencer, senão à espécie humana? Assim, pois, mesmo em sua fase incipiente, não é humanamente lícito rejeitá-la, ainda que se considere o problema do ponto de vista materialista.
Sendo a teoria da infusão imediata da alma a mais provável — e mesmo que não o fosse, o simples fato de o desdobramento natural do processo já iniciado culminar com a infusão da alma, e, portanto, em vida autenticamente humana — não é sem fundamento que o aborto direto, voluntário, é equiparado ao homicídio, inclusive-em nosso Código Penal, como adiante mostraremos.
Sobre o problema da infusão da alma, a professora MARIA ALVES PINTO FRAGA fez o seguinte comentário:

“A Igreja, até hoje, não definiu em que fase da gestação Deus infunde a alma imortal dando forma à matéria. Talvez nunca possa fazê-lo, nunca possa afirmar em que estágio de desenvolvimento Ele a considera apta a receber tamanha dignidade. São Tomás de Aquino responde que realmente não podemos sabê-lo, mas que a vida criada é intocável em qualquer dos seus estágios, em vista do que lhe está reservado (grifo da autora). A discussão dos teólogos prende-se, portanto, a uma determinação de caráter religioso e não ao direito de suprimir uma vida humana em qualquer das suas fases de desenvolvimento.

Santo Agostinho, citado na encíclica “Casti Connubii”, diz, referindo-se aos esposos que praticam o aborto:

“Querem que a criança morra antes de viver, que seja morta antes de nascer. Não merecem o nome de esposos. Não se casaram, uniram-se para fornicar. Ela é a prostituta de seu marido e ele o adúltero de sua mulher."

Estas duras e santas palavras afirmam, sem rodeios, a responsabilidade da mulher casada quando se faz abortar, ela que é distinguida, com “privilégios”, por certos médicos abortistas.”

Objeções — Numerosos argumentos são constantemente evocados a fim de justificar a prática, pelo médico, da intervenção abortiva. A seguir comentaremos, sumariamente, algumas objeções, com frequência apresentadas, contra a proibição do abortamento.

Colisão de direitos — Valemo-nos de PEIRÓ:

“Afirma-se que no caso do aborto existe uma verdadeira colisão de direitos: os do filho e os da mãe. Desde que se não pode resolver senão subordinando uns aos outros, parece mais justo sacrificar os do filho, para salvar os da mãe.
Resposta: Se os direitos, que se supõem estarem em colisão, são de duas pessoas distintas e de valor separado, é natural que o direito que menos valha se subordine ao que vale mais; postos assim em colisão, o direito de propriedade e o direito à vida, aquele que é inferior subordina-se a este que lhe é superior. Por isso aquele que, obrigado por uma necessidade extrema, rouba para a satisfazer, não peca nem fica obrigado a restituir, porque merece mais respeito o direito à vida que ele possui do que o direito de propriedade da pessoa roubada.
Se os direitos que, por hipótese, se encontram em colisão, de valor igual, como, por exemplo, o direito à vida de duas pessoas diferentes, ou seja no caso que nos ocupa, o da criança e o da mãe, nenhum deles se deve subordinar ao outro, porque não são subordináveis, já que ambos merecem igual respeito e consideração (...). A mãe tem direito à sua vida e o feto tem-no à sua.”

Legítima defesa — Neste caso, para se justificar o abortamento, teria que se considerar o feto como injusto agressor, o que seria um absurdo, como nos demonstra o seguinte trecho do Dr. CAETANO ZAMITTI MAMMANA:

“Na gestação, em que a mulher apresenta perturbações graves e irremedidáveis, seria mister, para invocar-se a legitima defesa, que o êmbrio ou feto cometesse ato injusto. Mas é honesto considerar injusto agressor esse novo organismo, concebido e aninhado no ventre materno, e que, em postura passiva, se desenvolve e evoluciona de acordo com as leis estabelecidas pela natureza? Como injusto se esta é que lhe deu vida? É confundível com agressão a fase de desenvolvimento fetal ou sua saída do organismo materno?
Poderia o feto ser responsabilizado pelos processos mórbidos (insuficiência hepática, disfunções endócrinas, lesões renais, etc.) e anomalias constitucionais do sistema ósseo (má conformação da bacia óssea), ou ainda, dos genitais (atresia do colo uterino, atresia da vagina, etc.), que porventura se apresentem no organismo materno?
Não lhe cabe a culpa, se um desses processos mórbidos se agravar no percurso da gestação, ou se o perto for dificultado por uma causa qualquer que surja de última hora. (...)
Em vista disso, nenhum ato da gestante ou de terceiro, dirigido contra sua vida, pode ser averbado de legitima defesa. O autor do abortamento, ou melhor, da morte do fruto da concepção, obra nesses casos premeditadamente. Para se configurar a legitima defesa, seria necessário que a ocisão do suposto agressor não fosse premeditada, com fria preparação e total violentação das leis da natureza.
O feto não se porta como agressor, pois não gera perigo injusto, atual ou iminente. Provocando-se o aborto, pratica-se, em tal caso, o assassínio preventivo ou profilático, por zelos de um perigo supositício, porém jamais de legitima defesa.”

Estado de necessidade — Também este argumento não é de se admitir. O Código Penal vigente!º define “estado de necessidade” assim:

“Artigo 20 — Considera-se em estado de necessidade quem pratica o fato para salvar de perigo atual, que não provocou por sua vontade, nem podia de outro modo evitar, direito próprio ou alheio, cujo sacrifício, nas circunstâncias, não era razoável exigir-se.
Parágrafo 1º — Não pode alegar estado de necessidade quem tinha o dever legal de enfrentar o perigo.”
ARRUDA CÂMARAS assim se expressa:
“O estado de necessidade não é de aceitar-se no caso. Antes de tudo não pode invocar o estado de necessidade quem, por livre escolha ou dever de ofício, se acha exposto ao perigo: o soldado na guerra, o médico nas epidemias, o magistrado na judicatura, o comandante na direção de sua nau, a sentinela no seu posto, o padre no “munus” de salvar as almas e na guarda do segredo da confissão, o cristão na sustentação da fé, a mulher casada no seu nobre “munus” matrimonial — matrimônio significa “munus matris”. Por outro lado, o estado de necessidade não justifica ato intrinsecamente mau: a fome pode justificar o furto, mas nunca justificará o assassínio.”

As linhas seguintes são da pena de eminente Juiz de Direito do Estado do Rio de Janeiro, Dr. CELSO PANZA:

“O aborto sentimental, secundado pela violência — estupro — dispare sob todos os ângulos, não encontra resguardo na descriminante do estado de necessidade. Aberra do Direito como fruto féleo de pós-guerra. Não existe o perigo real e atual contrário ao direito de vida da violentada.
O quadro psicossomático futuro, em termos de previsibilidade, é chamado a intervir com galas de antijuridicidade.
A antijuridicidade, na minha convicção, está em ceifar vida latente, indefesa, inerme, inculpável no ato biológico violento. (...)
O aborto terapêutico, permitido sob o estado de necessidade, instituto pelo qual é legitimo preterir um bem jurídico para salvar outro, sendo esta a única opção, tem como pressupostos a imediatidade do perigo, sua atualidade bem como a realidade.
Como precisar tal certeza, se se toma como ponto de partida, para permitir a ausência de anti-juridicidade, a previsão, distante portanto do imediato, da iminência, da evidência real e atual do perigo, muito mais valorando-se o atual progresso da Medicina.
Admitir-se o estado de necessidade no aborto chamado de legal, terapêutico ou necessário, resulta em corruptela do instituto porque corrompido o critério da lógica.
Qual profissional médico tem a coragem de afirmar, em quadro nosológico apresentado, que o risco de vida da parturiente por sobrevir é de 100%?
Espancar-sei-ia de novo a lógica. Risco autoriza erro. Admite possibilidade ou impossibilidade. A subjetividade alastra-se na previsão, pura e simplesmente por ser previsão.
Previsão e risco são irmãos na Ciência do Direito.
Mas previsão e risco não se conciliam com o estado de necessidade. Ou existe perigo atual, iminente, real, ou não existe. É de aspecto formal o instituto.
Ou não há ou há bem jurídico em perigo atual.
Atualidade e realidade do perigo estariam no momento do parto.
Os tratados de Obstetrícia indicam casos graves que aconselham a intervenção.
Arrolam-se entre os casos: edema agudo de pulmão, mal de Basedow, diabetes, tuberculose, leucemia, eclâmpsia hipertensiva, anemia perniciosa, hemorragias rebeldes, polinevrite, obstrução da bacia por tumores, retroversão do útero gravídico.

Bom de dizer, ser o Código Penal de 1940, portanto data de mais de 30 anos.

A preocupação do momento era proporcional à ciência médica, com surto desenvolvimentista inopinado em nossos dias, improcedendo pois a ameaça à parturiente diabética, cardíaca, etc.
Conselhos não são imposições. Os tratados aconselham...
Não há como cometer tais crimes sob o estado de necessidade.

Noronha, acatado tratadista, sendo sua opinião unânime entre os juristas, ensina as justificativas do estado de necessidade:

a) atualidade do perigo;
b) inevitabilidade dele;
c) involuntariedade em sua causação;
d) inexigibilidade do sacrifício do bem ameaçado.

Acentua em suas considerações, vol. I, pág. 213, Direito Penal:

“Assim como um verigo futuro não autoriza a justificativa, não a permitirá o passado.

Continua, mesma página da obra citada:

“Deve ele, pois, ser efetivo, quer pela atualidade quer pela iminência."

Desnecessário dizer que atualidade e iminência são fatores que se processam no momento do perigo.

Não há como chancelar tal prática sob a descriminante do estado de necessidade, que, como instituto científico, tem suas linhas determinadas e precisas na atualidade do perigo.

Nossos juristas encaram o problema com evasivas; problema que tem de sofrer a expiação da política criminal, que interpreta e sugere o direito em realização, para transformações, visando banir o art. 128, I e II, do Código Penal, postergador de bem tutelado, o mais excelente, e de direitos civis do nascituro,

Um dos maiores tratadistas do mundo em matéria penal assim se expressa:

“Una cosa es el aborto terapéutico preventivamente practicado, y a largo plazo, y otra muy distinta es la situación de necesidad.

Esta supone siempre una situación de urgencia, esvresada vor las palabras “mal inminente' (Derecho Penal Argentino, pág. 127, Tomo III, SOLER).

Alguns desavisados chamam tal estado de necessidade de especial.

O legislador não o previu. Inexiste.

É irrazoável. Nega o direito, avilta e desgasta institutos; contraria, enfim, o direito. Não pode realizar-se.

O aborto terapêutico e o sentimental violentam as instituições. Sob o estado de necessidade, alvará legal para matar, inúmeros crimes se tem cometido; incontáveis.”

Escolha do mal menor — Sendo a vida do filho de menor valor que a da mãe, dizem, seria lícito sacrificar aquele para salvar esta.

Ora, o valor de uma vida humana é imponderável e a ninguém, honestamente, ocorreria a ideia de matar um mendigo, ou um assassino, ou um homem em estado de coma irreversível, etc. para tirar-lhe um órgão vital com o fim de, em operação de transplante, salvar a vida de um sábio, de um grande cientista ou de conceituado político.

A julgar tão-somente por critérios palpáveis, a vida do feto, com todo o futuro à frente, em muitos casos poderia valer mais que a vida da mãe, gravemente enferma, com prognóstico de curta sobrevida, faça-lhe ou não o chamado abortamento terapêutico.

Em tal circunstância, como já se disse, tem a mãe direito ao correto tratamento — como teria se não estivesse grávida — mesmo que este coloque em risco a vida do concepto, desde que não constitua atentado direto contra ele. Não se trata aqui de se sobrepor direitos equivalentes mas, sim, de respeitá-los, não fazendo prevalecer uma pessoa sobre a outra, a mais forte sobre a mais fraca, a mais “útil” sobre a mais “inútil”.
Em tão difícil situação, embora a justiça não o exija, a generosidade e, no caso específico de mãe e filho, o próprio amor materno pedem ceda o mais forte à necessidade do mais fraco.
Assim nos lembra PEIRÓ:“

“Recordemos o incêndio do Bazar de Caridade em Paris no qual uma das senhoras da comissão organizadora, a duquesa de Vendôme, recusou sair antes que os demais tivessem abandonado o local, o que foi causa de ter perecido carbonizada. No naufrágio do “Titanic”, em pleno Atlântico, os mais fortes, os milionários, deixraram as canoas de salvação aos mais fracos: crianças e mulheres. Recordem-se os casos de epidemias, em que médicos e sacerdotes oferecem a vida para salvar os doentes; as leprosarias em que uns e outros contraem a horrível doença para atender e aliviar os infectados. Todos estes exemplos demonstram que, longe de merecer a preferência, o direito do mais forte, um simples sentimento de humanidade impele espíritos, mesmo não movidos por motivos sobrenaturais, a cederem o seu direito e a sacrificarem-se no altar da franqueza, aos direitos dos mais débeis.”

Vemos nesses exemplos, e em numerosos outros, arriscar-se a vida por uma causa nobre, em favor de pessoas amadas, etc. (e até mesmo — ai de nós! — em defesa de interesses escusos, de vantagens materiais ou para satisfazer vaidades): e por que não no ato de gerar a vida?
É inegável a extrema delicadeza dessas situações, bem raras, aliás. Contudo, não podemos esquecer o princípio de que os fins não justificam os meios e que as virtudes devem ser sempre preservadas, mesmo diante de circunstâncias tão difíceis. A atitude sabiamente intuitiva da mãe que protege o filho até o sacrifício da própria vida deve ser defendida contra as dificuldades que, sobrepujando sua resistência espiritual, fazem-na ceder, levando-a a desejar, para fugir a um risco, O sacrifício do filho que gerou. Nessas circunstâncias, necessita a mãe de apoio e de ajuda do médico e da sociedade, bem como de leis que protejam seu filho contra sua fraqueza e contra a indecisão do médico, oferecendo, inclusive, um esteio à conduta moral de ambos, nessas situações aflitivas e angustiantes.

Dever do médico — Antecipar deliberadamente a morte nunca foi alternativa válida para o médico, mesmo nas situações mais dramáticas, pois é seu dever prolongar a vida em busca de cura, tantas vezes impossível, é verdade, mas sempre procurada.
Houve, nesse sentido, um juramento.
Trecho do juramento de Hipócrates:

“... Aplicarei os regimes para o bem dos doentes, segundo o meu saber e a minha razão, e nunca para prejudicar ou fazer mal a quem quer que seja. A ninguém darei, para agradar, remédio mortal nem conselho que o induza à destruição. Também não fornecerei a uma senhora pessário abortivo. (...)”

Em CAETANO ZAMITTI MAMMANAS encontramos a seguinte referência à declaração de Genebra:

“Aliás, a Organização Mundial de Saúde, em declaração de Genebra, no ano de 1948, adotou um dos mais belos e comovedores princípios que deve ser o foro íntimo dos médicos:

“Manterei o máximo respeito à vida humana, desde o momento da concepção e, ainda  que sob ameaça, não usarei de meus conhecimentos médicos contrariamente às leis da humanidade. ”

Estado de inconsciência — Alguns dizem que o concepto não tem consciência da própria existência e por isso não é um ser humano autêntico. O que dizer então do recém-nato, que também ainda não atingiu o estado de consciência? E o que dizer de pessoas adultas que sofreram qualquer tipo de acidente e como consequência entraram em estado de coma profundo, permanecendo assim inconscientes durante semanas, meses, ou até mesmo durante anos? Perderam, por isso, nesse período, a condição de seres humanos autênticos?
É certo que o concepto, o recém-nato, as pessoas em estado de coma profundo não têm consciência da própria existência; nós, porém, temos plena consciência de que eles são seres humanos, possuidores de todos os direitos inerentes à pessoa humana, e, por isso, não podemos negar-lhes a existência.

Falsas justificativas — Vários são os motivos com os quais se quer justificar o aborto: motivos terapêuticos, econômicos, sociais, sentimentais, de honra, etc.
Mas o respeito à vida de um indefeso, inocente e frágil ser humano não seria motivo mais que suficiente para se proibir e condenar o abortamento?
É incontestável que o abortamento é uma ação contra a vida, é atentado contra uma existência humana.
Afirmar contrariamente é falsear a verdade para justificar atos “convenientes” as difíceis circunstâncias do momento.
Por mais dramáticas que sejam as circunstâncias arroladas — como o perigo de práticas clandestinas, doenças da mãe, família numerosa, promiscuidade, pobreza, miséria, desonra, violência, incesto, estupro, malformações fetais, explosão demográfica, etc. — não se justifica a legalização do abortamento voluntário.
A legalização dessa prática, em qualquer das circunstâncias referidas, representa gravíssimo afrouxamento, quase equivalendo, na prática, a verdadeira liberação, com todas as suas consequências deletérias sobre a pessoa humana como tal, sobre a família como instituição, sobre a sociedade em geral.
O abortamento voluntário legalizado constitui falsa e contraditória solução de problemas sérios que ferem a dignidade da pessoa, pois consiste em ato, por sua natureza, contrário à ordem moral e que atinge ainda mais a dignidade humana, desvalorizando a vida que se quer promover. É uma tentativa de resolver problemas humanos com desprezo da própria vida humana.
Permitindo-se, sob qualquer pretexto, a supressão voluntária de uma vida humana inocente em sua fase intra-uterina, como impedir-se a supressão de uma vida humana em qualquer fase de sua existência, quando constitui pesada carga: aleijões, inválidos irrecuperáveis, loucos agressivos, velhinhos arterioscleróticos, comatosos irreversíveis, etc. Só com o respeito aos direitos de cada um, inclusive dos mais fracos e indefesos, é possível salvaguardar o direito de todos.
Por rebaixar o valor da vida humana ao nível dos animais irracionais, constitui o abortamento sério atentado aos alicerces naturais da família, desagregando-os pelo triunfo do egoísmo que rejeita riscos e repele sacrifícios.
Os que matam o fruto da união humana sepultam também o amor, e assim enfraquecem e desfiguram a instituição familiar, cujos valores e grandeza, que em si mesma encerra, têm origem divina e são os fundamentos da sociedade.
Sendo a instituição familiar a célula viva da sociedade e a fonte de novos membros, é óbvio que só constitui a base e o sustentáculo da ordem social a família bem constituída e corretamente estruturada segundo as leis naturais que regem o comportamento humano.
Práticas anti-humanas — como o abortamento, o anticoncepcionalismo, etc. — que diminuem o valor da vida humana e desfiguram a família, constituem-se em fatores de corrupção e degradação da sociedade que as institucionaliza.

Anticoncepcionalismo e abortamento — Acenam, argumentando superficialmente, com o anticoncepcionalismo na perspectiva de reduzir o número de abortamentos. Não comporta o presente trabalho uma análise de tal matéria, mas podemos afirmar que os argumentos nesse sentido são incorretos e falsos. A experiência mostra que o desrespeito à lei moral natural leva sempre a desregramentos cada vez maiores. A formação de uma mentalidade anticoncepcional, má em si mesma, também o é como estágio intermediário e necessário para se chegar à tolerância e depois à plena aceitação do abortamento como coisa “normal”.
O anticoncepcionalismo, quebrando o primeiro elo da lei moral de respeito à vida humana, favorece a aceitação de métodos cripto-abortivos e depois do abortamento livremente praticado.
Causa espécie a licenciosidade com que se começa a defender, entre nós, o “direito de abortar”, inclusive através de revistas leigas em artigos pseudocientíficos, de penetração popular. E tal vulto toma o problema, que necessário se torna atacá-lo em suas causas e não apenas tratar os sintomas.
Entre essas causas encontramos a propaganda maciça e abusiva da anticoncepção, péssima forma de terapia sintomática que, pretendendo combater o mal, somente consegue fomentá-lo: forja na comunidade conjugal a ideia de que filho é um acidente, e como tal deve ser eliminado quando falhar a contracepção; favorece e estimula práticas sexuais extraconjugais e livres de compromisso, sobretudo entre jovens, aumentando assim a incidência de gravidezes imprevistas e indesejadas, além de corromper os costumes, o que leva a crescente promiscuidade, em círculo vicioso progressivo.
Evitar filhos aumenta a incidência de abortamento provocado ao invés de diminuir. No mundo inteiro a promoção do anticoncepcionalismo precedeu e preparou a promoção do abortismo. Os fatos indicam que nas cidades onde mais se pratica a anticoncepção é onde mais se pratica o abortamento, o que desmente a apressada ideia de que a difusão de métodos anticoncepcionais é capaz de diminuir a prática do aborto.
O que aconteceu em outros países começa a se observar em nosso Brasil: o surgimento de instituições que se destinam, inicialmente, a propagar e difundir métodos anticoncepcionais artificiais e uma vez criada a mentalidade anticoncepcional lança-se a campanha, de início velada e depois abertamente, em favor da “legalização” do abortamento.
Vale observar que tal mentalidade é estimulada e apoiada por uma campanha sistemática, dirigida por certa imprensa escrita, falada e televisada contra os valores de nossa cultura, atingindo mesmo os valores básicos de nossa nacionalidade, a pretexto de imitar países ditos desenvolvidos. É necessário enfatizar que isto é conseguência de uma visão estreita do desenvolvimento, tendo este como fim em si mesmo, em vez de encará-lo apenas como meio para o verdadeiro progresso — que tem por meta o homem, a felicidade humana autêntica — o progresso humano total, individual e social, em todos os seus aspectos, alicerçado em princípios morais, que devem ser preservados, a todo custo, para garantia da ordem social e dos direitos individuais.

“O problema ético da natalidade não se resume na salvaguarda da vida humana existente, nem se reduz a uma questão de técnicas, encaradas exclusivamente sob o prisma da conservação indispensável de todo ser humano concebido. O horizonte dessa matéria é bem mais amplo.
Antes mesmo de se configurar a situação dramática e extrema do aborto, o valor da pessoa humana exige que sua dignidade seja respeitada no próprio nível das fontes da transmissão da vida” (Pe. NEY SÁ EARPS),

Dispositivo intra-uterino (DIU) — Limitar-nos-emos a breve comentário sobre este artefato abortivo, que é muitas vezes levianamente referido como sendo anticoncepcional. Seu efeito impeditivo da implantação do ovo na mucosa uterina é fato reconhecido mesmo pelos que o adotam, embora insistam em classificá-lo erroneamente como anticoncepcional. Sobre o mecanismo de ação do dispositivo intra-uterino, remetemos o leitor a excelente estudo sobre o assunto, publicado na Revista da Associação Médica Brasileira (vol. 19, n.º 1 — janeiro de 1978 — págs. 33/40), de autoria do Prof. NILO PEREIRA Luz e col. Titular da Disciplina de Clínica Obstétrica, Departamento de Ginecologia e Obstetrícia da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. No referido trabalho os autores fazem extensa revisão da literatura médica — em que são relatadas numerosas observações científicas — e demonstram inequivocamente que o DIU não impede a ascensão do espermatozoide às trompas nem a consequente fecundação do óvulo, mas priva o novo ser, recém-concebido, das condições normais ao seu desenvolvimento, “seja impedindo a nidificação de um ovo fecundado, seja deslocando um ovo implantado”: Citaremos apenas um pequeno trecho, retirado dos comentários finais, em que os autores abordam os aspectos jurídico e ético das “serpentinas”

“Para situar, entretanto, o ponto de vista jurídico sobre o assunto, um de nós formulou consulta a respeito ao Conselho Regional de Medicina, tendo este, em parecer documentado, opinado se constituírem os dispositivos intra-uterinos em abortivos, tanto do ponto de vista ético quanto legal. Entre outros fundamentos, baseou-se o relator do referido parecer na legislação brasileira, extraordinariamente bem comentada por NELSON HUNGRIA (Comentários ao Código Penal Brasileiro, vol. 5.º, pág. 288):

'O Código, ao incriminar o aborto, não distingue entre óvulo fecundado, embrião ou feto: interrompida a gravidez antes do seu termo normal, há o crime de aborto. Qualquer que seja a fase da gravidez (desde a concepção até o início do parto, isto é, o rompimento da membrana amniótica), provocar sua interrupção é cometer o crime de aborto.

Se a principal ação dos dispositivos intra-uterinos é impedir a nidificação de um ovo fecundado; se, desde o ponto de vista científico, há que admitir que a vida de um novo ser começa com a fecundação; se, desde o ponto de vista do Código Penal Brasileiro, impedir o desenvolvimento de um ovo fecundado é cometer crime de aborto, parece claro que devem os dispositivos intra-uterinos ser considerados como abortivos e não como contraceptivos.

Resta aos Conselhos Regionais e Federal de Medicina tomar conhecimento do que aqui se publica e tirar as consequências no que tange à ética profissional do emprego de tais dispositivos.”

Impotência da lei — Em favor de uma legislação permissiva argumenta-se com a afirmação de que as leis atuais, proibitivas, são impotentes para reprimir a prática do abortamento e para pôr termo às facilidades com que os infratores escapam à justiça. Propõe-se então a legalização do referido crime na suposição de que, sendo ele “organizado” e “corretamente” realizado por profissionais “honestos, idôneos e competentes”, substituiria a prática clandestina, que é levada a efeito por pessoas ignorantes e incompetentes, as quais, estas sim, seriam punidas por sua ignorância e incompetência e não por serem criminosas. Afirma-se ainda que — por mecanismo nunca convincentemente explicado — a impunibilidade do crime resultaria em menor incidência do mesmo.
Ora, o extermínio voluntário de uma vida humana inocente e indefesa constitui delito muito mais grave que o roubo, cuja prática é muito mais difundida que o abortamento e cujos principais fautores também escapam, quase sempre, às malhas da lei. Nem por isso foi ainda proposta a legalização de certos tipos de furtos, a fim de que sejam praticados com mais parcimônia e comedimento por “distintos e respeitáveis” amigos do alheio, sem que corram eles risco de vida e de desonra, e nem envolvam terceiros, muitas vezes injustamente implicados. Na mesma linha de raciocínio se poderia propor a “legalização” do “Esquadrão da Morte”, que passaria a ser considerado instituição de “utilidade pública”, etc. etc. etc.
A análise fria e séria de fatos recentes mostra que, em vários países — como Japão, Dinamarca, Suécia, Rússia, Inglaterra, Estados Unidos — onde o abortamento foi de certa forma facilitado ou liberalizado, cresceu o número desta intervenção, cuja prática atingiu elevado grau de degradação e brutalidade jamais imaginado.
Notícias amplamente divulgadas relatam verdadeiros horrores.
Em Nova Iorque a prática do abortamento foi totalmente liberada, podendo a intervenção ser realizada até o 6.º mês de gestação (242 semana) — uma criança nascida prematuramente, no 6.º mês de gestação, tem condições biológicas de sobreviver e tornar-se adulto normal, desde que não lhe seja negada a devida assistência!... E o número de abortamentos aumenta assustadoramente, a ponto de os hospitais terem de sofrer adaptações para atender à procura, cada vez mais frequente. Uma notícia foi assim transmitida em 1970: “Desde o dia primeiro de julho, quando entrou em vigor uma lei mais liberal, os abortos constituem uma das operações mais freguêntes nos hospitais do Estado de Nova Torque.” Noticiou-se também que, sendo tão grande a facilidade, programaram-se viagens com todas as despesas pagas incluindo abortamento em Nova Iorque. Para propaganda pública foram utilizados grandes cartazes com os dizeres: ABORTAMENTO LEGAL: 250 DÓLARES.
Também na Inglaterra as conseguências foram funestas, contando-se o abortamento entre as intervenções mais realizadas. Em Londres multiplicam-se clínicas especializadas nesta macabra intervenção.
Notícias provenientes de várias partes do mundo são levadas ao conhecimento da opinião pública, insensibilizando-a. Divulgou-se que muitos fetos vivos, às vezes com o choro característico do recém-nato, são assim lançados ao incinerador ou cedidos a Institutos de Biologia para fins experimentais, onde chegam ao final de sua curta mas dramática existência.!1,55
Tais acontecimentos “mostram inquestionavelmente que não se pode expulsar o Diabo em nome de Belzebu”.
O fato de ser o abortamento clandestino uma prática difundida, apesar de legislação proibitiva, não constitui remédio adequado sua, liberalização legal, pois bem sabemos que as leis retamente formuladas constituem, pela sua expressão educativa, importante fator para a formação moral do povo. Qualquer iniciativa, destinada a remediar tão grave mal social, perderia sua eficácia diante de uma legislação permissiva, com várias consequências facilmente previsíveis.
A permissividade legal para a prática do abortamento em “casos especiais” servirá apenas para acobertar delitos ou propiciar alternativas mais fáceis, fora da verdadeira solução, diante de situações difíceis a exigir tarefa árdua e de responsabilidade. Constitui ainda grave injustiça para com os conceptos catalogados entre os “casos especiais”, excluindo-os injustamente da proteção legal.
Constitui fato bem conhecido que a lei não só é punitiva, mas é também educativa. Logo, além de injusta será de malfazeja consequência qualquer exceção que exclua da proteção legal o direito à vida de inocentes seres humanos — ainda no ventre materno, frágeis e inermes — pois enfraquecerá, na comunidade, a consciência do devido respeito aos direitos humanos naturais e inalienáveis.

Direito e Justiça — 'Transcrevemos outro trecho do já citado Juiz de Direito fluminense, Dr. CELSO PANZA:

“O Direito foi feito para realizar-se. Na sua realização, como ciência, obedece a uma programática advinda do dogmatismo que o elabora, constrói e critica. Antes de tudo é de ordem natural; em plano segundo tem origem nos ordenamentos fundamentais dos Estados — Constituições escritas ou não-escritas, rígidas ou flexíveis.
Aqui o seu eixo, a sua nutriz operacional. Em nosso pais, como em todas as nações, por princípio jurídico infenso de censura, inatacável ao curso dos tempos, o que for contrário à Constituição é contrário ao Direito e não pode realizarse. Seria superfetação dizer que a vida é um bem protegido pela Constituição. Ela compõe como bem mais excelente todos os artigos, parágrafos, incisos e alíneas de todas as Constituintes. Através dela brota o senso competencial para a União legislar em matéria penal (...).

O que é contrário ao direito não pode realizar-se. Excede do lícito. A liceidade tem linhas caracterizadas visivelmente nas normas e Institutos. Vulnerada, há o desequilíbrio das relações sociais. É princípio axiomático.
Tal raciocínio foi expendido para concluir-se não estar ao talante do legislador a harmonia social.
A lei, como ato humano, falível pois, sofre o policiamento da crítica, valor pensante mais alto da dogmática, e a censura dos tribunais nos lindes que extravasam da legalidade. Há, contudo, conguistas sociais marcadas em Lei, desnudas de críticas ou reprochabilidade. Fizeram-nas os homens após a vontade infinita da criação. Uma delas é a tutela da vida, garantia revelha como o surgimento do homem.

Esta seguridade foi cercada de angustiante preocupação.

Dai, por competência constitucional, o legislador penal, cuidadoso e profundamente analítico, recebeu da construção científica institutos que admitem a preterição da vida, por uma razão singela: em defesa da própria vida.
Inseriu, pois, no Código Penal, a cientificidade desses padrões. A legitima defesa, o estado de necessidade, o estrito cumprimento do dever legal ou exercício regular de direito, são causas excludentes de criminalidade. Todos com singulares caracteres. Todos inspirados no bem mais: relevante — a vida.

Através do Diploma Penal tutelam-se bens, definem-se suas lesões, exclui-se pelos institutos prefalados a antijuridicidade; como bem sobre-excelente protegido figura a vida, mas também, ao revés, no meu sentir, autoriza-se de forma “sui generis” sua predação, em desconformidade com o direito mandamentado no mesmo Diploma. O aborto não encontra resguardo em nenhuma excludente.”

Legislação brasileira — A legislação brasileira é, em letra e espírito, contrária à prática do abortamento.
O Código Civil” (art. 4.º) “põe a salvo DESDE A CONCEPÇÃO os direitos do nascituro”. Ressalte-se que 0 anteprojeto do Código Civil, publicado no Diário Oficial da União, de 7 de agosto de 1972," repete “ipsis litteris”, em seu art. 3.º, o art. 4º do atual Código Civil”
Também os arts. 458 e 462 do Código Civill”? se ocupam da proteção aos direitos do nascituro. Vejamo-los:
“Art. 458 — A autoridade do curador estende-se à pessoa e bens dos filhos do curatelado, nascidos ou NASCITUROS (art. 462, parágrafo único)” (grifo nosso).
“Art. 462— DAR-SE-A CURADOR AO NASCITURO, se o pai falecer estando a mulher grávida, e não tendo pátrio poder” (grifo nosso).
“Parágrafo único — Se a mulher estiver interditada, SEU CURADOR SERÁ O DO NASCITURO (art. 458)” (grifo nosso).
Da mesma forma o novo Código de Processo Civil, 18 já aprovado pelo Congresso, em seus arts. 877 e 878, se esmera no cuidado em proteger os bens do nascituro (cf. Lei n.º 5.869, de 11.1.1973):
“Art. 877 — A mulher que, PARA GARANTIA DOS DIREITOS DO FILHO NASCITURO, quiser provar seu estado de gravidez, requererá ao juiz que, ouvido o órgão do Ministério Público, mande examiná-la por um médico de sua nomeação” (grifo nosso).
“81º — O requerimento será instruído com a certidão de óbito da PESSOA DE QUEM O NASCITURO É SUCESSOR” (grifo nosso).
“8 2º — Será dispensado o exame se os herdeiros do falecido aceitarem a declaração da requerente.”
“8 3.º — EM CASO ALGUM A FALTA DE EXAME PREJUDICARÁ OS DIREITOS DO NASCITURO” (grifo nosso).
“Art. 878 — Apresentado o laudo que reconheça a gravidez, o juiz, por sentença, declarará a requerente investida na posse dos DIREITOS QUE ASSISTAM AO NASCITURO” (grifo nosso).
“Parágrafo único — Se à requerente não couber o exercício do pátrio poder, O JUIZ NOMEARA CURADOR AO NASCITURO” (grifo nosso).
O Código Penal vigente! proíbe o abortamento provocado, equiparando-o, tacitamente, ao homicídio (Parte Especial — Título I: Dos crimes contra a pessoa — Capítulo I: Dos crimes contra a vida — arts. 124 a 127).
Incoerentemente, porém, ressalva duas exceções, em que o isenta de punição (art. 128) (ver quadro comparativo).
O novo Código Penal? promulgado através de decreto-lei, em 1969, e que não entrou em vigor, mantém os mesmos dispositivos do atual Código Penal!” contrários a essa prática malsã (ver quadro comparativo).

Desafortunadamente, porém, conserva o novo Código?” as exceções do outro,!º favorecendo-as. O assunto é tratado no art. 130 do Novo Código Penal? cuja redação altera, para pior, não só a letra, mas sobretudo o espírito do art. 128 do Código vigente 19 Este (art. 128 do CP vigente) não descrimina o aborto praticado nas duas hipóteses previstas, apenas o isenta de punição, deixando preservada, em princípio, a idéia de iliceidade moral do ato, embora maculando-a por tolerar juridicamente o procedimento naquelas hipóteses excepcionais, em que não o pune. Já o art. 130 do novo Código Penal vai além da isenção de pena: ele descrimina o ato nas duas hipóteses previstas, bem como oferece maior facilidade legal para a prática do abortamento, visto permiti-lo mesmo “presumida a violência” (hipótese de estupro — inc. II).
No mesmo sentido encontra-se a inclusão de nova hipótese — aborto para “ocultar desonra” — pois que, embora descrevendo e punindo uma conduta criminosa, o faz de modo a assemelhá-la, quando da materialização, da repressão, aos casos de isenção de pena. Isto porque a penalidade imposta (não superior a 2 anos) pode ser suspensa por critérios penais legislados, o que quase sempre é feito, como bem observou o Dr. CELSO PANZA:2,

“.. incompreensível se torna o novo tipo de conduta criado pelo novel legislador no projeto do Código Penal, em seu art. 128 — aborto por motivo de honra.
O incentivo ao abortamento para ocultar desonra vem na própria apenação para o tipo surgido, cominando-se detenção de seis meses a dois anos, o que importa em concessão de “sursis” — suspensão da execução da pena — não sendo O sujeito passivo reincidente, critério este autorizado em lei — art. 71 e incisos do projeto — e adotado pela quase totalidade dos Juízes, diante da precariedade recuperadora em nossos regimes penitenciários.”

Amplia-se, dessa forma, a escapatória legal por onde passam ominosos crimes contra um princípio fundamental de direito natural e, portanto, de convivência em segurança na sociedade — o respeito à vida humana.
Vemos, assim, ser dado mais um passo no caminho da capitulação, aproximando nosso Código Penal dos chamados “Códigos de Herodes”, os quais, vigentes em alguns países ditos desenvolvidos, permitem e facilitam a absurda matança de inocentes.
Há quem considere obsoleta a legislação brasileira, no que se refere ao abortamento, por desejarem-na mais aberta. Em outro sentido, é certo assim considerá-la, pois, tendo a humanidade atingido desenvolvimento científico e técnico surpreendentes, não deve caber, em Código Penal condizente com o progresso, exceção, em que se permite a prática de ato considerado criminoso pelo próprio Código, erroneamente justificando-o por situá-lo como “terapêutico” ou como “sentimental” (caso de estupro).
Podemos ver, nas duas exceções acima referidas, uma grave incongruência na legislação brasileira. O Código Civil, 1 resguarda os direitos do nascituro desde a concepção, e o Código Penal, 1º, 2% é (tanto o vigente como o novo) classifica o abortamento entre os “Crimes contra a Pessoa”, “Crime contra a Vida”, logo, reconhecem, tacitamente, a inviolabilidade da vida fetal. Esta, consequentemente, não pode ficar à mercê de circunstâncias sobre as quais não lhe cabe responsabilidade direta. Nem é concebível, por ser absurdo, imputar-se aos fetos gerados por violência e aos que se desenvolvem no ventre de gestante doente a responsabilidade pela violência do pai ou pela doença da mãe. Não é lógico, portanto, que a lei faça exceções permitindo que se tire uma vida, com fundamento em circunstâncias que não incriminam, nem podem incriminar, a mesma vida que a própria lei protege.
O Diário Oficial (Seção I, Parte I), de 31 de dezembro de 1973, publicou a Lei n.º 6.016/31.12.73, decretada pelo Congresso Nacional e sancionada pelo Presidente da República, que altera dispositivos do Decreto-Lei nº 1.004, de 21 de outubro de 1969, que institui o novo Código Penal. A impunibilidade para o abortamento em caso de estupro foi, finalmente, revogada, como se pode constatar pela nova redação dada ao art. 130 (renumerado para art. 129, em que foi suprimido o item II):

“Art. 130 (renumerado para art. 129) — Não constitui crime o aborto praticado por médico, quando é o único recurso para evitar a morte da gestante.
Parágrafo único — No caso previsto neste artigo, deve preceder, sempre que possível, a confirmação ou concordância de outro médico.”

Convém esclarecer que o novo Código Penal não entrou em vigor, mantendo-se em vigência o Código Penal de 1940.
É elementar que o exercício de qualquer direito depende fundamentalmente de um só: o direito à vida.
Negado este, são com ele usurpados todos os demais.
Garantindo-o, fica implícita a intocabilidade da vida humana inocente desde o seu início, ainda no ventre materno, não sendo, portanto, lícito, em nenhuma circunstância, por ação direta e deliberada, antecipar a morte. Este fato ocorre no abortamento provocado, independente da denominação com que é rotulado, o qual consiste na morte ou expulsão direta e deliberada do concepto antes de sua viabilidade extra-uterina, e, portanto, no extermínio de uma vida humana antes do nascimento, de uma vida que tem o direito natural de desenvolver-se segundo suas potencialidades. O abortamento provocado é uma iniquidade.
Assim, a modificação que se deve esperar, ou desejar, ou pedir, no Código Penal brasileiro, ou na legislação de qualquer país civilizado, onde se respeitem os direitos naturais da pessoa humana, é a proibição total e definitiva da prática do abortamento, atitude mais consentânea com o direito e a justiça, bem como com o espírito e o progresso da Medicina.
Infelizmente, o que vemos nesse assunto é o mau exemplo de alguns países — atrás citados — ser referido como conduta mais inclinada ao espírito da época, e apontado como caminho a ser trilhado pelos países em desenvolvimento.
Admitir-se-á que o abortamento voluntário seja sinal dos tempos modernos se também o for o erotismo como substituto do amor, o nudismo endeusado, a pornografia estimulada, o homossexualismo cada vez mais promovido, e outras tantas aberrações, com que se quer marcar a época atual. Teríamos, assim, o progresso material da humanidade acompanhado de sua decadência moral, de conseguências imprevisíveis.
Direito de existir — O direito de existir, prerrogativa de toda criatura humana desde a concepção, não é problema de opinião. Não é uma convenção. O direito à vida não é adquirido progressivamente, pois tem início no momento mesmo em que a vida é concebida. É princípio de direito natural que há de ser sempre respeitado, no que pesem as inúmeras dificuldades que, em certos casos, isso possa acarretar aos pais, à família, à sociedade. Não pode, portanto, variar ao sabor de apreciações subjetivas ou de injunções econômicas, políticas ou sociais.
Quaisquer dispositivos legais que possam favorecer, ainda que em mínima parcela, a prática do abortamento, são perigosos e injustos, pois afrontam um princípio fundamental de Direito Natural e de Direito Divino Positivo: o direito de existir, o “não matarás”.
Nesse sentido, buscamos ensinamentos em inesgotável fonte de sabedoria, com dois mil anos de experiência e aprofundamento. Valemo-nos de pronunciamentos dos últimos Pontífices e transcrevemos breves trechos dos mesmos.

Pio XII:

“Além disto, todo ser humano, até mesmo a criança no seio de sua mãe, recebe o direito à vida imediatamente de Deus e não dos pais ou de alguma sociedade ou autoridade humana. Portanto, não há nenhum homem, nenhuma autoridade humana, nenhuma ciência, nenhuma “indicação” médica, eugênica, social, econômica, moral, que possa exibir ou conferir um título jurídico válido para dispor direta ou deliberadamente de uma vida humana inocente, quero dizer, para dispor dela para a sua destruição, encarada quer como fim, quer como meio para obter um fim, que talvez em si mesmo absolutamente não seja ilegítimo. Assim, por exemplo, salvar a vida de uma mãe é um fim nobilíssimo; mas matar diretamente o filho como meio de obter esse fim, não é permitido. A destruição direta de uma pretensa vida “sem valor”, nascida ou ainda não nascida, destruição essa praticada, há alguns anos, em larga escala, de forma alguma pode justificar-se. Por isto, quando essa prática começou a se difundir, a Igreja formalmente declarou que matar, mesmo por ordem da autoridade pública, aqueles que, embora sendo inocentes, por causa das suas taras físicas ou psíquicas não são úteis à nação, tornando-se antes uma carga para ela, é contrário ao direito natural e ao direito divino positivo, e, por conseguinte, proibido.
A vida de um inocente é intangível, e todo atentado direto ou agressão contra ela viola uma das leis fundamentais, sem as quais não é possível a vida em segurança na sociedade. Não precisamos expor-vos pormenorizadamente a significação e o alcance, na vossa profissão, dessa lei fundamental.
Mas, não vos esqueçais de que acima de toda lei humana e acima de toda “indicação” ergue-se, indefectível, a lei de Deus” (Mensagem de Pio XII aos Médicos, Edições Paulinas, 22 ed., pág. 492:
Alocução sobre o Apostolado das Parteiras, na audiência concedida a 29-10-1951).

JoÃo XXIII:

“A vida humana é sagrada: mesmo a partir da sua origem, ela exige a intervenção direta da ação criadora de Deus. Quem viola as leis da vida, ofende a Divina Majestade, degrada-se a si e ao gênero humano, e enfraquece a comunidade de que é membro” (Mater et Magistra, Editora Vozes, V ed., pág. 46). PAULO VI:f
“Nós queremos dizer aos governantes, que são os principais responsáveis pelo bem comum e que dispõem de tantas possibilidades para salvaguardar os costumes morais: não permitais que se degrade a moralidade das vossas populações; não admitais que se introduzam legalmente naquela célula fundamental que é a família práticas contrárias à lei natural e divina” (Humanae Vitae, Edições Paulinas, 22 ed., pág. 25).

Ainda PAULO VI:

“Outro tema triste é o aborto por indicação eugenética, terapêutica, social, ou como quer que o chamem.
Tampouco sobre este assunto pensamos estender-nos; só queremos recordar sumariamente que, tratando-se em definitivo de homicídio direto duma vida inocente, o aborto constitui um delito.
Não importa se é discutido com bela desenvoltura; está proibido, é pecado.
É uma tragédia que ataca as fontes da vida; é contradição violenta ao fim mais alto e mais sagrado da família; é desonra secreta mas queimante para quem o quer, para quem o leva ao término.
E já que, ante esta hecatombe de inocentes, nossos costumes já não reagem com a reprovação, a coragem, o heroísmo que seria necessário, queremos apelar para todos os que podem e devem, que estudem nos devidos termos tão delicada questão e retifiquem as falsas opiniões difundidas a respeito disso, fazendo tudo o que for possível para que esta dolorosa e humilhante chaga moral e social seja remediada com outros meios, que não sejam a propaganda contra a fecundidade da família, não a indiferença, à tolerância, à cumplicidade” (João Batista Cardeal Montini — depois Papa Paulo VI — 4 Família Cristã, Carta Pastoral, Edições Paulinas, 1963, pág. 38).

JoÃo PAULO II:

“Estas palavras resumem o meu próprio programa pastoral no que diz respeito à família: tema que hoje deve merecer prioridade, pois que a Igreja deve prestar um autêntico serviço ao nosso mundo atormentado. (...) É necessário proclamar alto a santidade do matrimônio, o valor da família e a intangibilidade da vida humana.
Não me cansarei nunca de cumprir esta que julgo missão inadiável” (Discurso dirigido aos participantes do primeiro congresso para a família da África e da Europa em 15-1-1981).

Ainda João PAULO II:

“Se concedemos direito de cidadania ao assassínio do homem, quando está ainda no seio da mãe, então encaminhamo-nos por isso mesmo para o declive de incalculáveis consequências de natureza moral. Se é lícito tirar a vida a um ser humano, quando ele é mais débil, totalmente dependente da mãe, dos pais e do âmbito das consciências humanas, então destruímos não só um homem inocente, mas também as mesmas consciências. E não se sabe quão larga e rapidamente se propaga o raio daquela destruição das consciências, nas quais se fundamenta, antes de tudo, o sentido mais humano da cultura e do progresso do homem. (...) O problema da responsabilidade pela vida concebida no seio de cada mãe é problema eminentemente social. E ao mesmo tempo é problema de cada um e de todos. Ele encontra-se na base da cultura moral de todas as sociedades. E dele depende o futuro dos homens e das sociedades. Se aceitássemos o direito de tirar o dom da vida ao homem ainda não nascido, conseguiríamos depois defender o direito do homem à vida em todas as outras situações? Conseguiríamos deter o processo de destruição das consciências humanas?” (Alocução do “Angelus” de domingo, 5 de abril de 1981).

E o Concílio Vaticano II:

“Com efeito, Deus, Senhor da Vida, confiou aos homens, para que estes desempenhassem dum modo digno dos mesmos homens, o nobre encargo de conservar a vida. Esta deve, pois, ser salvaguardada, com extrema solicitude, desde o primeiro momento da concepção; o aborto e o infanticídio são crimes abomináveis” (Concílio Vaticano II, Gaudium et Spes, nº 51, Edições Paulinas, pág. 72).

 

II. ASPECTO CIENTÍFICO

“Acima de toda lei humana e acima de toda “indicação” ergue-se, indefectível, a lei de Deus.”

Pio XII

Encontra-se a gestante sujeita a contrair todas as afecções que podem incidir na mulher não-grávida, com a particularidade de poder agravá-las devido às profundas alterações fisiológicas que, de certa forma, sobrecarregam o organismo materno.
Por outro lado, as afecções sistêmicas mais graves e as localizadas na genitália, quando ocorrem em idade procriativa, diminuem a fecundidade e predispõem ao abortamento espontâneo, mas não constituem causas de esterilidade ou infertilidade absolutas na mulher.
Analisando o problema da gravidez com intercorrência de enfermidade de natureza grave na gestante, sob o ponto de vista terapêutico, deparamo-nos, embora não frequentemente, com casos difíceis, que constituem verdadeiro desafio à formação científica e moral do médico.
Outrora, ocorriam em maior número os casos obstétricos em que o agravamento do mau estado de saúde da gestante colocava o médico na constrangedora situação de ver esvaírem-se duas vidas humanas, sem dispor de recursos eficazes para tentar a salvação de ambas.
Na época atual, porém, aquela desconcertante situação de “expectativa com os braços cruzados” não mais prevalece. Os extraordinários recursos de que dispõe atualmente a Medicina oferecem ao médico meios para prosseguir na luta em busca do fim almejado, qual seja a salvação do binômio mãe-filho.
Observa-se que, no concernente ao aspecto estritamente médico, as opiniões convergem, cada vez mais, na aceitação do fato de que se tornam mais raras as situações patológicas em que se poderia concluir pela impossibilidade de evolução da prenhez até a viabilidade fetal. Em tais casos é difícil, se não impossível, afirmarse que o abortamento salvará a mãe.
Não faltam no Brasil centros médicos suficientemente desenvolvidos e aparelhados para oferecerem a melhor assistência aos casos mais graves. Não seria difícil a remoção, para tais centros, das gestantes residentes no interior, desde que, para isso, se voltasse a atenção dos responsáveis.
De modo geral, a par dos cuidados dirigidos à vida fetal, os recursos terapêuticos aplicáveis à mulher grávida são os mesmos usados fora da gravidez.
Como vimos na Parte I deste trabalho, ao considerarmos o aspecto ético dos problemas relacionados ao binômio mãe-filho, a Moral de modo nenhum impede seja a gestante enferma tratada adequadamente.
É comum e correto afirmar-se que a gestante portadora de enfermidade de natureza grave pode ser tratada como se não estivesse grávida. Não quer isso dizer, obviamente, que se não envidem esforços para impedir venha o feto sofrer as consequências do tratamento materno. Deve-se, sempre que possível, adiar os tratamentos mais drásticos até o 3º ou 4º mês de gravidez para melhor segurança do concepto, ou mesmo, sobretudo as condutas radicais, até a viabilidade fetal, o que, infelizmente, nem sempre o processo patológico permite.
Dispõe a Obstetrícia de recursos semióticos e terapêuticos valiosos, que devem ser postos em prática com vistas ao concepto, coadjuvando o tratamento materno.
É importante atentar bem para a diferença que existe entre a prática do abortamento direto dito “terapêutico” (atentado voluntário, deliberado e direto contra a vida fetal com o fim de “salvar” a mãe) e a prática terapêutica, clínica ou cirúrgica, aplicada à mãe como se esta não estivesse grávida, mas que, paralelamente, colocará em risco a vida fetal. Enquanto esta conduta é lícita, aquela não o é.
Não pretendemos, neste trabalho, analisar todos os problemas médicos relacionados ao tema, nem expor e discutir todos os recursos clínicos e cirúrgicos existentes para a orientação desses casos.
Nosso propósito é apenas demonstrar, em linhas gerais, que o apelo ao chamado “abortamento terapêutico” como meio de salvar a vida da gestante não constitui recurso científico, sobretudo nos dias atuais, em face das modernas conquistas da Medicina.
Neste sentido nos alicerçamos em depoimentos científicos de personalidades médicas brasileiras de vasta experiência e reconhecido saber profissional. Vários desses depoimentos, obtivemo-los através de consultas por nós formuladas a ilustres colegas de várias especialidades, que se dignaram respondê-las. Outros foram extraídos de trabalhos científicos publicados em revistas ou apresentados em congressos médicos brasileiros.

CARDIOLOGIA — Uma das maiores expressões em Cirurgia Cardiovascular da América Latina, Dr. E. J.
ZERBINI, * 59. 64 respondendo a perguntas por nós formuladas, afirmou que a cirurgia cardiovascular pode contribuir para a salvação do binômio mãe-filho em caso de gestante portadora de cardiopatia grave. E negou que existam casos concretos em que, havendo indicação para tratamento cirúrgico, seja a gravidez obstáculo para sua indicação.
Sobre a época oportuna para a realização do ato cirúrgico, assim comentou:

“Em casos de indicação absoluta — ez.: esteno-se mitral, em edema agudo de pulmões — a cirurgia poderá ser realizada em qualquer época.
Em indicações relativas, prefere-se protelar a cirurgia até atingir o 39 mês de gestação.”

Vemos assim que, mesmo em casos gravíssimos, como ocorrência de edema agudo dos pulmões em mulher grávida, a cirurgia cardíaca, quando indicada, pode e deve ser realizada, certamente após prévio preparo, sem necessidade de recorrer-se ao sacrifício direto do feto, que, no caso, pode ser salvo junto com a mãe.
Revendo a literatura, encontramos na revista Arquivos Brasileiros de Cardiologia, órgão da Sociedade Brasileira de Cardiologia, artigo intitulado “Cirurgia Cardíaca Durante a Gravidez. Doze Casos Operados com Circulação Extracorpórea e Hemodiluição” (Milton Ary Meier, José Feldman, José Carlos Ferraro Maia, Waldir Jazbik, Paulo Pernambuco, Antônio de Pádua Jazbik, Breno Cruz Mascarenhas e Domingos Junqueira de Morais). Na introdução dizem os autores:

“O progresso nas técnicas diagnósticas, o melhor conhecimento das alterações hemodinâmicas durante a gravidez e o seu manejo clínico têm possibilitado que um número maior de cardiopatas atravesse os anos férteis com oportunidade de procriar.
A maioria das mulheres com cardiopatias suportam o ciclo gróvido-puerperal quase sem incidentes; outras, no entanto, apresentam sintomas alarmantes e graves que podem progredir até óbito de mãe e concepto. Estas pacientes são refratárias a todo tratamento clínico, exigindo que medidas mais enérgicas sejam tomadas.
Dentre 750 pacientes submetidos à cirurgia cardíaca com circulação extracorpórea, operamos 12 mulheres durante a gravidez. Dez foram operadas por apresentarem indicação absoluta para a cirurgia. Nove apresentavam estenose mitral, e uma, dupla lesão mitral. Além dessas, operamos mais duas pacientes, a primeira com aneurisma de aorta ascendente e a outra com estenose valvular pulmonar, sem sabê-las gestantes. Foram incluídas no presente trabalho, por serem, a nosso ver, casos elucidativos da validade e aplicabilidade do método.”

Após discorrerem sobre aspectos técnicos e relatarem cada caso de per si, comentam:

“Aparentemente a grávida tolera perfeitamente bem a circulação extracorpórea, pois em 9 pacientes da revisão citada, mais 12 casos de nossa série, 3 de Felipozzi e 2 de outros cirurgiões brasileiros mencionados, num total de 26 pacientes, não houve óbito materno. (...)
O extraordinário progresso das técnicas de circulação extracorpórea, incluindo a hemodiluição e uso de oxigenadores de pequeno volume inicial, tornaram possível a cirurgia cardíaca com grande Segurança, inclusive nas cardiopatias mais complexas.
Apesar do reduzido número de casos, a ausência de óbitos mostra que a circulação extracorpórea com hemodiluição pode ser realizada com risco igual ao verificado fora da gravidez. A ausência de mortalidade operatória e especialmente de morbidade fetal são razões suficientemente fortes para se adotar uma atitude mais intervencionista, indicando a operação naquelas pacientes que, durante a evolução da gravidez, apresentam sinais e sintomas que significam diminuição importante da reserva circulatória. (...)
As operações realizadas foram: comissurotomia mitral em nove gestantes; plicatura do anel mitral em uma doente com dupla lesão mitral; abertura da válvula pulmonar em uma gestante e resseção de aneurisma da aorta ascendente em outra.
As pacientes operadas estavam em várias idades de gestação, de 10 a 34 semanas, e não houve mortalidade materna ou fetal. Sete tiveram partos normais, 4 aguardam a data do parto e de uma desconhecemos o resultado final.”

O Dr. Adolpho Barcellini 3 9 5 (Chefe da Disciplina de Cardiologia do Departamento de Medicina da Escola Paulista de Medicina) e o Dr. José Bocanegra Arroyo (Chefe da Seção de Eletrocardiografia da Disciplina de Cardiologia) assim se expressaram, conjuntamente:

“Cerca de 2% a 4% das mulheres grávidas apresentam cardiopatias que são assim distribuídas, segundo a sua etiologia:
Reumáticas 85%

Congênitas 12%

Hipertensivas 1%

Outras 2%

A mortalidade nas grávidas cardiopatas oscila entre 1% e 5%, sendo a insuficiência cardíaca a maior responsável por este insucesso. Considerando-se, porém, as pacientes pertencentes a grupos funcionais III e IV, esta cifra atinge 15%.
Felizmente, na atualidade está havendo uma queda deste índice em virtude do emprego de recursos médicos, como o uso de cardiotônicos, diuréticos potentes, antiarrítmicos, anticoagulantes, corticosteroides, hipotensores e cirúrgicos, como a realização de comissurotomias, trocas de até três (3) válvulas cardíacas, correções de defeitos congênitos, implantação de marcapassos cardíacos em crises de Stoke-Adams, bloqueios átrio-ventriculares congênitos ou adquiridos, principalmente na cardiopatia chagástica.
Destaca-se o fato de que é sempre necessário o trabalho em equipe com obstetras, para conseguir melhores resultados.”

O Prof. Luiz V. Décourt,3 Titular do Departamento de Clínica da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, presidindo mesa-redonda sobre “Respeito à Vida”, encerrou-a com as seguintes palavras, que, por partirem de um dos mais experientes e conceituados cardiologistas de nosso País, constituem valioso depoimento:

“Desejo, então, fazer aqui duas apreciações finais.
Primeiro sobre o aborto terapêutico, problema Sério que nós cardiologistas enfrentamos todos os dias diante de mulheres grávidas e cardíacas. Na minha experiência de cerca de 30 anos, uma única vez eu me vi na dúvida sobre a imperativa indicação de aborto. Em todos os outros casos a cardíaca levou até o fim sua gravidez. Isto será possível, desde que a paciente seja tratada e orientada.

É evidente que poderá surgir um problema grave, mas em geral este não é resolvido com o trauma da própria interrupção. Conheci uma cardíaca com dupla disfunção valvular — não mora nesta cidade — e que recebeu o título de mãe do ano, porque chegou a ter 10 filhos. A minha experiência como cardiologista depõe pelo fato de que se a assistência for realmente bem traçada, a gravidez evolui com boa margem de êxito.
Mas o problema fundamental não é o de se levar avante a gravidez, e sim o de saber se a interrupção vai melhorar o estado circulatório. Porque, para matar conscientemente um ser humano seria indispensável, mesmo de um ponto de vista materialista, saber se realmente o outro será salvo.
Ora, o que encontramos não é esta certeza, mas uma presunção que antes exterioriza o desejo do afastamento de uma tarefa difícil. Para o médico, que pensa evitar uma incógnita de responsabilidade, e para a mãe, que procura fugir a um risco. A situação é perfeitamente compreensível do ponto de vista da fraqueza humana. E assim se permitem abortamentos e se evitam gravidezes apenas em nome do que poderia acontecer.
A pergunta que apresentei há pouco focaliza a eventualidade da “extinção de uma vida poder salvar a outra”. Ora, este poder atribuído a ato tão grave já é muito problemático do ponto de vista estritamente médico. De modo que sua aplicação, na quase totalidade dos casos, repousa sobre mera presunção.
Devo recordar o que o meu amigo, Prof. Fernando Carneiro, afirmou sobre o problema do doente e o dos direitos humanos não sendo o ato reprovável justificado por possível efeito bom.
Admito que os direitos do individuo devem ser respeitados até o fim e em todas as condições. (...)
E isto nos traz a pergunta final que o Prof. Fernando Carneiro tão brilhantemente responde.
Isto é, que o dever do médico não é interromper a vida. Em qualquer hipótese ele deve conservá-la sempre; evidentemente terá que mitigar os sofrimentos. A saúde não é apenas a ausência de doença, mas o bem-estar físico e mental. E se para o bem-estar é preciso que não haja sofrimento, então o médico, diante do princípio do duplo efeito, julgará a alternativa e utilizará seus meios lícitos. Mas apenas estes.
Creio que podemos encerrar esta mesa sobre o “Respeito à Vida”, reafirmando que o médico não tem o direito de abreviá-la ou de comprometê-la. A afirmação pode parecer simplista diante de algumas eventualidades dramáticas e bem o sabemos, mas o princípio fundamental não sofre exceção. A Medicina é um terreno onde muitas vezes só a austeridade e o bom senso do médico podem decidir, mas a decisão, qualquer que seja a alternativa, não poderá desconhecer o respeito elementar à vida. Eu diria, então, para terminar, que deveríamos mais uma vez pensar nas palavras de Pio XII, que acentuou não caber ao médico agir bem ou mal, desde que ele queira agir bem. Mas caberá a ele, que manuseia as mais profundas forças humanas, agir sempre bem, custe o que custar. É a sua prerrogativa, e também o seu ônus, interpretar o que agir bem.”

TISIOLOGIA — O Dr. Aloysio Veiga de Paula, 3 45. 59 Catedrático da Cadeira de Tisiologia e Pneumologia da Faculdade de Medicina da Universidade Federal Fluminense, emitiu sua abalizada opinião nos termos seguintes:

“Respondendo a pergunta, informo que sim, a Medicina atual dispõe de antibióticos e quimioterápicos para curar a tuberculose pulmonar nas gestantes, até a viabilidade fetal.
Os métodos de trabalho para descoberta e diagnóstico de caso de tuberculose são realizados nos Dispensários de Tuberculose, em todo o território nacional, sob a supervisão técnica da Divisão Nacional de Tuberculose e da Campanha Nacional Contra a Tuberculose.
Na Guanabara, contamos com o Hospital Nossa Senhora das Dores, que integra a rede de hospitais da Santa Casa de Misericórdia, sob a direção do Dr. Caio Vinicius Câmara, onde vêm sendo internadas as gestantes tuberculosas.
Em época anterior ao aparecimento dos tuberculostáticos, foi dado balanço nas atividades desse nosocômio concluindo-se que a gravidez não constitui fator de agravação no tratamento da tuberculose. (...)
Na época atual, a quimioterapia corretamente empregada cura as gestantes portadoras de tuberculose pulmonar, até a viabilidade fetal, observados os postulados básicos na sua administração, de responsabilidade dos médicos tisiologistas.”

O Professor Hélio Fraga,*. 26. 59 Diretor do Instituto e Tisiologia e Pneumologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro e Reitor da mesma Universidade, assim se expressou:

“1) em princípio, com os recursos atuais da Medicina, não há indicação para o chamado “abortamento terapêutico”;

2) nunca tive, em minha prática, necessidade de indicar o chamado “abortamento terapêutico”.
Sobre a iniciativa de mais de uma centena de médicos do Estado do Rio de Janeiro que em memorial dirigido ao Senhor Ministro da Justiça, Prof. Alfredo Buzaid, propõem a revogação do art. 128 do Código Penal, quero, como cidadão e como médico, declarar minha solidariedade com a posição assumida no referido memorial, de 29 de fevereiro de 1972.”

NEFROLOGIA — Transcrevemos trecho do editorial “Doença Renal e Gravidez”, da Revista do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, de autoria dos Drs. Pedro Renato Chocair e Emil Sabbagal* (este último chefe do setor clínico da Unidade de Transplante Renal).

“III — MANUTENÇÃO DA GRAVIDEZ EM PACIENTES URÊMICAS
1. Insuficiência renal aguda (IRA): existem contadas referências na literatura concernentes a este assunto. A primeira em 1960, enfatiza a sobrevida materna em 29 casos, os critérios para o diagnóstico de IRA e seu manuseio, omitindo, entretanto, os efeitos da uremia sobre a unidade útero-placentária. É digna de menção a sobrevida de 100% das pacientes, principalmente se se considerar a época em que os casos foram seguidos. Em 1961, THEIL e col. utilizaram pela primeira vez o rim artificial em uma gestante no 8º mês, para o tratamento de uma grave intoxicação por difenilidantoina e Fenobarbital.
Houve recuperação da mãe e, 43 dias após o episódio, nasceu espontaneamente uma criança normal de 8.160 9g. Comprovou-se, assim, a ausência de efeitos deletérios da hemodiálise e a heparinização que ela implica sobre o feto. Confirmouse posteriormente que a heparina não tem efeito anticoagulante em crianças nascidas de mães heparinizadas. Outro caso no qual utilizou-se a hemodiálise em gestantes foi citado por KURTZ e cols. Tratava-se de uma grávida no 5º mês, com 21 anos de idade, severamente intoxicada por glutetimide (Doriden). Foi submetida a uma sessão de hemodiálise de 10 horas, pelo aparelho de Koiff, na qual usou-se 60 mg de heparina e “priming” de 1.000 ml de sangue total.
Durante a execução da diálise, a paciente apresentou hipotensão arterial seguida de IRA, oligúria de seis dias de duração. No 6º dia, os níveis da ureia estavam por volta de 200 mg%. A paciente recuperou-se espontaneamente e quatro meses depois deu à luz a criança normal de 2.860 g. Caso realmente ilustrativo foi seguido por PASTRANA e col. quando mantiveram clinicamente uma gestante na 32º semana de gravidez, que após grave episódio de pielonejrite aguda permaneceu em IRA oligúrica, chegando o nível plasmático da ureia até 400 mg%. Houve regressão progressiva do quadro a partir do 13.º dia de evolução e em nenhum momento observaram sinais de sofrimento fetal. Possivelmente a uremia, acidose e demais alterações da insuficiência renal não oferecem maiores riscos para o feto, desde que não sejam de longa duração.
2. Insuficiência renal crônica: como foi assinalado, a mulher urêmica pode ovular e, consequentemente, engravidar. É sabido, entretanto, que existe na uremia elevada incidência de prematuros e natimortos, fato atribuído à isquemia placentária. Ao lado deste fator, tão importante ou mais é a hipertensão arterial que frequentemente vem associada às doenças renais. A manutenção dos níveis pressórios em nível satisfatório, em uma nefropata, com ou sem retenção nitrogenada, seguramente melhorará o prognóstico materno-fetal. O primeiro caso bem sucedido foi acompanhado por HERWING e col., em 1965. Assinalam a evolução de uma paciente portadora de nevropatia crônica, tratada com repetidas hemodiálises. No terceiro trimestre, por cesariana, nasceu um prematuro viável. Seis meses após o nascimento, a criança encontrava-se absolutamente normal. Outra paciente grávida em diálise crônica foi acompanhada por ROBINSON e col. Na 31% semana de gestação, após ruptura prematura das membranas, nasceu uma criança sadia por via vaginal, com tamanho normal para a idade gestacional, sem apresentar anormalidades em exames subsequentes. UNZELMAN e col., após acompanharem com sucesso uma nefropata crônica em hemodiálise, sugerem que a frequência de duração das diálises devam ser aumentadas, para manter a ureia sanguínea por volta de 70-80 mg%. Recomendam também suplementos de cálcio, dieta rica em proteínas e manutenção de hematócrito estável, oferecendo assim o melhor meio possível pelas circunstâncias ao feto.
Recentemente, CHOCAIR e SABBAGA (observação pessoal) seguiram uma paciente urêmica, portadora de rim único, que por problemas vesicais, secundários à tuberculose, era mantida com nefrostomia. Evolui durante toda a gestação normotensa e com função renal estável (ureia — 70 mg%;, creatina — 3,0 mg%; “clearance” da creatinina — 17 ml/min.). Após nove meses de gravidez, nasceu uma criança normal, apenas com deficit ponderal discreto.”

PSIQUIATRIA — 'Transcrevemos as palavras do Professor de Psiquiatria da Faculdade de Medicina da Universidade Federai do Rio de Janeiro e Presidente da Academia Nacional de Medicina, Prof. José Leme Lopes

“A pergunta: “Existe indicação psiquiátrica para o chamado abortamento terapêutico?' — a resposta firme é NÃO.
Explico:
1. Não há bases para um abortamento por motivo eugênico. Não há doença mental obrigatoriamente transmitida por herança.
2. Abortamento terapêutico senso strictu não existe em Psiquiatria. As psicoses no curso da gravidez têm bom prognóstico. Uma sintomatologia aguda (agitação psicomotora violenta) pode ser manejada sem prejuízo para a mãe e o filho.
Há registro de gestantes com boa tolerância ao eletrochoque.”

Em outra oportunidade, o mesmo Professor assim se manifestou:

“Venho trazer-lhes com esta carta meu decidido apoio à campanha que vêm empreendendo para corrigir no Código Penal a anomalia de uma especiosa caracterização do chamado aborto terapêutico. No momento em que a dessacralização da vida humana é tão profunda a não respeitar o direito de viver do nascituro, a posição assumida pelos ilustres colegas vale como uma tomada de consciência e uma partida para resistência e luta em favor dos ideais cristãos.
Como Professor de Psiquiatria quero acrescentar minha voz à dos que negam argumentos psicológicos e psicopatológicos para a prática livre do abortamento.”

HEMATOLOGIA — O Dr. Monteiro Marinho, Chefe do Serviço de Clínica Hematológica do Instituto de Hematologia do Estado da Guanabara, em trabalho sobre hematopatias no curso da gravidez (analisando, inclusive, os vários tipos de leucemia), assim concluiu:

“Em nenhuma das condições acima referidas tem cabida a prática do abortamento. Não haveria objetivo a visar. Uma boa conduta médica, fundamentada no conhecimento perfeito dos problemas, na experiência clínica e no bom senso, fará sempre o encaminhamento adequado e o insucesso ocorrerá nos limites do seu causalismo. Nenhum suporte ético, moral, religioso ou técnico justifica, em tais circunstâncias, a prática da interrupção da prenhez.”

O hematologista Dr. Herbert Praxedes,” Docente-Livre da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Rio de Janeiro e Professor Adjunto da Faculdade de Medicina da Universidade Federal Fluminense, respondeu à consulta por nós formulada nos seguintes termos:

“Tenho cada vez mais dúvidas sobre a validade da indicação clínica para o chamado “aborto terapêutico”, principalmente com os recursos da Medicina contemporânea, mas mesmo sem eles.
Sob o ponto de vista estritamente médico, se é possível dissociar da prática clínica quaisquer considerações morais, penso ser o organismo humano mais perfeito que muitos julgam, pois, como há alguns anos me dizia ilustre cardiologista paulista, se a gravidez é incompatível com algum estado mórbido da gestante, a própria doença se encarrega de interrompê-la. Se não há limitação moral ou legal ao uso da medicação necessária à mãe, capaz de lesar ou mesmo matar o feto, qual a justificativa clínica para optar-se por matá-lo preventivamente? Se considerações eugênicas começarem a ser pesadas, a justificativa para o aborto deixa de ser terapêutica para ser eugênica e daí às câmaras de extermínio para recém-natos defeituosos, à eutanásia e à eliminação de velhos imprestáveis ou doentes é questão apenas de tempo. Se alguém disso duvida basta consultar algumas edições recentes do Time onde o assunto já é discutido seriamente como foi anteriormente a liberação do aborto na legislação de alguns Estados americanos. Se é isso o que se deseja, ainda que inconscientemente, por que o chamado mundo civilizado tanto se orgulha da vitória sobre o nacional-socialismo alemão, o nazismo, que não apenas preconizava como colocou em prática medidas como essas? A Corte Suprema dos Estados Unidos, ao liberar o aborto naquele país, fez com que nós nos perguntássemos os motivos pelos quais somos chamados de subdesenvolvidos se desenvolvimento quer dizer aviltamento da pessoa humana. Como hematologista clínico, nunca tive qualquer caso que justificasse a existência na legislação de uma permissividade para o assassínio deliberado sob o manto pseudocientífico da terapêutica e tenho, como disse anteriormente, dúvidas sobre a validade de sua indicação nas demais especialidades médicas.”

FARMACOLOGIA — O Professor José Ribeiro do Vale,3. 5º 61 Chefe do Departamento de Bioquímica e Farmacologia da Escola Paulista de Medicina, respondendo à consulta por nós formulada, ressalvou que, como farmacologista, não dispõe de experiência pessoal no assunto. Todavia, fez questão de acrescentar:

“Sou contra o aborto sob qualquer forma, dependendo ou não da mal interpretada indicação terapêutica. Vivi na minha própria família o drama dessa'“indicação”. A mãe recusou a sugestão médica dadas as suas condições físicas precárias.
A filhinha nasceu sadia, não deu trabalho e foi o lenitivo e consolo da mãe nos seus dois últimos anos de vida. A indicação era formal na opinião do colega. Não foi seguida, graças a Deus.”

ENDOCRINOLOGIA E METABOLOGIA — O Dr. Antônio Rodrigues Ferreira, % endocrinologista de Belo Horizonte (Ex-Vice-Presidente da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia, Ex-Presidente da Seção de Minas Gerais da mesma entidade), em recentes considerações sobre o problema do abortamento provocado, assim se definiu sobre o abortamento terapêutico, negando base científica para sua legalização:

“De modo especial, subscrevemos a tese de que não existe argumento algum de ordem cientifica, jurídica ou moral que justifique o aborto “terapêutico”, “sentimental” ou “eugênico”.”

GINECOLOGIA — Na associação de ginecopatias e gravidez deparamo-nos com os casos mais particularmente trágicos e extremamente difíceis de resolver.
Em linhas gerais, porém, aplica-se também aqui o princípio do duplo efeito, pelo qual a paciente grávida, quando enferma, tem direito aos mesmos recursos disponíveis e aplicáveis fora da gravidez, ainda que tais recursos possam afetar o concepto.
Sendo variada a intercorrência de ginecopatias e gravidez, limitar-nos-emos a considerar as circunstâncias que oferecem maiores dificuldades, as quais, afortunadamente, são pouco freguentes.
Afecções mamárias — Interessa-nos aqui a associação de carcinoma da mama e gravidez. Constituindo intercorrência pouco frequente, são pequenas as estatísticas de cada centro especializado, o que não permite o estabelecimento de uma conduta geral. É fato aceito, porém, que o prognóstico de câncer de mama instalado em mulher grávida é pior do que o ocorrente fora da gravidez. Contudo, os autores que conseguiram reunir maior experiência admitem que a evolução do carcinoma não se modifica com a interrupção da gravidez e até, segundo alguns especialistas, os melhores resultados foram obtidos entre as pacientes cuja gestação prosseguiu normalmente.
No I Congresso Brasileiro de Patologia Mamária, realizado no Estado da Guanabara em setembro de 1971, o tema foi várias vezes abordado.
O Dr. Jerome K. Urban,” uma das maiores autoridades mundiais em câncer de mama, convidado especial para aquele Congresso, em uma de suas exposições referiu-se à associação de câncer de mama e gravidez.
Opinou, naquela oportunidade, que o abortamento não melhora o prognóstico dos casos curáveis e aconselhou tratar o câncer desconhecendo a gravidez. Sobre as pacientes operadas, disse não acreditar que uma nova gravidez possa ser prejudicial, embora não a aconselhe.
Também o Dr. Georges Arié? — Chefe do III Serviço de Cirurgia do Instituto Central da Associação Paulista do Combate ao Câncer — afirmou que não interrompe a gravidez em gestante com câncer de mama, nem desaconselha gravidez posteriormente ao tratamento. Em linhas gerais, assim resumiu sua conduta: até o 6º mês tratar como se a paciente não estivesse grávida; após o 6º mês induzir o parto e tratar o câncer.
O Dr. José Baptista Silva Neto,” cirurgião titular do mesmo serviço, chegou à mesma conclusão após rever substanciosa literatura sobre o tema e estudar 47 casos de carcinoma de mama associados a gravidez ou lactação. Publicou seu estudo e preconizou o seguinte tratamento:

“É quase universalmente aceito que o tratamento cirúrgico oferece os melhores resultados. No caso de câncer associado à gravidez, existem alguns pontos de discordância a respeito da época oportuna para a operação e do uso das irradiações.
A elevada percentagem de metástases axilares no nosso material, tanto no câncer associado à gravidez como à lactação, tem sido confirmada amplamente na literatura. Este fato indica-nos que o tratamento deve ser iniciado o mais cedo possível. Nos dois primeiros trimestres da gravidez operamos imediatamente. No 3º trimestre aguardamos até que o feto seja viável, quando então indicamos cesárea e mastectomia radical a seguir; esta espera é condicionada pelo alto risco de abortamento nesse período de gestação.
Enquanto aguardamos a viabilidade fetal, usamos radioterapia.
Existem dois aspectos do tratamento que merecem comentário maior, a saber: a oportunidade da operação durante o 3º trimestre e o problema do uso das irradiações durante a gestação. Há autores como Miller e Schmid que advogam a operação imediata também no 8º trimestre. Entretanto, Bunker e Peters não verificam piora nos resultados naqueles casos que aguardaram o parto para depois iniciarem o tratamento do tumor; ao contrário, foram exatamente estes casos que tiveram melhor sobrevida, enquanto os resultados menos favoráveis da série foram os das pacientes que iniciaram o tratamento no 3º trimestre da gestação. Por causa deste fato, Peters atualmente mantém essas pacientes sob observação, não usando qualquer tipo de tratamento até o parto e só após este é que dá início à terapêutica. Harrington também verificou melhores resultados nos casos operados após o parto. Entretanto, Holleb e Farrow referem resultados superiores nas pacientes operadas no 3.º trimestre. Pensamos que o ponto de vista de Peters ainda deva merecer uma investigação mais longa.
Quanto ao uso das irradiações, nós a indicamos no pós-operatório sempre que houver gânglios axilares comprometidos, bem como nos tumores de quadrantes internos ou central, mesmo sem metástases azilares. No câncer da mama comum, a percentagem de casos com metástases na cadeia ganglionar mamária interna nos tumores centrais ou internos, sem metástases axilares, gira em torno de 10%. No câncer associado à gravidez ou lactação, em que há aumento da vascularização tanto sanguínea como linfática, é provável que essa percentagem seja mais elevada.
Não temos visto em nosso hospital inconvenientes, pelo menos imediatos, ao feto. Usamos a radioterapia pré-operatória, no 3.º trimestre da gestação, enquanto aguardamos a viabilidade fetal, quando então é praticada a cesárea e mastectomia radical. No câncer, em lactação, operamos imediatamente e indicamos a radioterapia nos mesmos moldes ora referidos para a gravidez.”

Adiante concluiu:

“A gravidez subseguente nos casos de carcinoma da mama operados não parece piorar o prognóstico.
A revisão da literatura permitiu-nos verificar que até o presente momento não há indícios de que a interrupção da gravidez produza melhora nos resultados a cinco anos, quer nas pacientes com gravidez simultânea quer naquelas com gravidez subseguente ao tratamento do carcinoma.”

Afecções uterinas — As mais desconcertantes situações verificam-se na intercorrência de gravidez e doenças da matriz.

Mioma uterino — Por ser tumor reconhecidamente benigno, ainda que sofrendo certa influência do estado gravídico (embebição, amolecimento, hipertrofia), a melhor conduta, para a gestante e para o concepto, é a expectante. A intervenção cirúrgica só se justifica em face de complicações, que são as mesmas verificadas fora da gravidez (degeneração, torção de pedículos, necrobiose com infecção secundária, etc.). Complicação inerente a gravidez observa-se nos miomas volumosos em que o crescimento uterino, a expensas do estado gravídico e do próprio tumor, acaba por acarretar conflito de espaço, com dor e desconforto.
Nas circunstâncias em que o tratamento cirúrgico se impõe, este deve ser sempre conservador e limitar-se à exérese dos nódulos de mioma responsáveis pela complicação, salvo em certos casos, feto viável, em que a histerectomia, quando indicada, pode seguir-se à cesariana.

Carcinoma do colo uterino — Nos limites deste trabalho não vem a pêlo tecer comentários em torno da discutível influência da gravidez sobre o câncer da cérvice, nem discutir as dificuldades que esta afecção possa constituir para a boa evolução da gravidez. Ater-nos-emos à conduta terapêutica nesta dramática circunstância, de reduzida frequência, oferecendo por isso dados estatísticos escassos e inconclusivos.
Independentemente de gravidez, dois são os métodos terapêuticos aplicáveis à cura do carcinoma do colo uterino: cirurgia e radioterapia. Ambos só têm eficácia curativa quando aplicados em extensão radical, isto é, isolando, pela exérese cirúrgica ou pela ação actínica, todo o útero, paramétrios e anexos, de preferência incluindo também o tecido adiposo-ganglionar-pélvico.
Nos casos melhores, o uso adequado desses métodos, isoladamente ou associados, oferece elevado índice de curabilidade. Nos casos avançados todos os recursos terapêuticos são impotentes e só se aplicam em caráter paliativo.
Assim, podemos desde já selecionar os casos de associação de câncer do colo uterino e gravidez em dois grupos: pacientes curáveis e pacientes incuráveis (casos avançados).
Nos casos curáveis, fazemos nova seleção: fetos viáveis e fetos inviáveis.
Se o feto for viável, deve-se proceder à operação cesariana como tempo prévio de histerectomia radical (operação de Wertheim) ou, conforme o caso, do tratamento pelas irradiações.
Na gravidez incipiente (feto inviável), ambas as condutas adequadamente aplicadas terão como consequência, paralelamente à cura da mãe, a morte do concepto, consequência esta indireta, não visada nem desejada, embora prevista.
Objetivando-se, em casos particulares, salvaguardar a vida do feto, com prejuízo da mãe, foram realizados tratamentos radioterápicos especiais, com técnicas adaptadas: Zamitti Mammana% cita Pouey, que refere bom resultado com radiumterapia sem causar danos aos fetos; no Brasil é clássico o caso de Gerson Rodrigues do Lago, que tratou, com radium, carcinoma do colo uterino em paciente com gravidez gemelar, cujos gêmeos nasceram de parto cesáreo aos sete meses de gestação e evoluíram dentro dos limites da normalidade, ficando a mãe clinicamente curada. Existem autores, porém, que apresentam resultados opostos, com prejuízo materno.
Tais tratamentos de exceção, com técnicas adaptadas e portanto deficientes, não podem servir como regra, visto preterirem o direito materno a tratamento correto, com os recursos terapêuticos usuais, quais sejam a cirurgia radical ou as técnicas clássicas de radium e cobaltoterapia, também radicais.
A nosso ver, não sendo possível aguardar a viabilidade fetal, a melhor conduta consiste na histerectomia radical que, nessas circunstâncias, parece oferecer melhor possibilidade de êxito e ainda permitir o batismo do feto.
Lembramos ainda que, no segundo trimestre da gravidez, embora não sendo conduta obrigatória por constituir certo risco para a gestante, é possível aguardar a viabilidade fetal para só então intervir, salvando a criança. Neste procedimento é indispensável submeter a gestante a exames semanais a fim de que se possa surpreender qualquer progresso da doença, circunstância em que o tratamento não deverá ser mais adiado.
Como vimos na Parte I deste trabalho, aplica-se aqui o princípio do duplo efeito. A um ato bom ou indiferente (no caso a histerectomia) seguem-se duas consequências: uma boa, visada, à qual diretamente se dirige o ato (a cura da mãe), e outra má, não visada nem desejada, à qual não se dirige o ato, porém inevitável (a morte do concepto).
No grupo das pacientes incuráveis (casos avançados), parece-nos mais sensato aguardar a viabilidade fetal para só então, efetuada a cesariana, iniciar o tratamento paliativo.
Obviamente, cada caso deverá ser analisado de per si, levando-se em conta todas as implicações que o envolvem.

A seguir transcrevemos a conduta preconizada pelo Prof. A. Wolff Netto, Catedrático da Clínica Obstétrica da Faculdade de Medicina de Sorocaba e Docente-Livre da Clínica Ginecológica da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo:

“No tratamento do carcinoma do colo uterino em gestante devemos distinguir os casos operáveis dos inoperáveis.
Nos casos operáveis (estágio I), quando a gestação se encontra no início (1.º trimestre), deve ser feita a cirurgia radical imediata (operação de WERTHEIM), de vez que a espera da viabilidade fetal tornará o neoplasma inoperável. Mesmo do ponto de vista moral esta conduta é correta, porque não se trata de abortamento direto, mas indireto. Aqui não se visa destruir a vida fetal, mas retirar-se uma neoplasia maligna. A morte do feto não é fim, nem meio, mas consequência do tratamento necessário. Não é o caso do chamado abortamento terapêutico, onde a destruição da vida do feto é um meio de tratamento(?) e, portanto, a finalidade da ação.
Depois do 1.º trimestre já se poderá esperar pela viabilidade e, então, retirar um feto com possibilidades de vida ao lado da operação radical.
É necessário, entretanto, examinar periodicamente a paciente a fim de se avaliar da situação local da neoplasia e, ao menor sinal de propagação, intervir.
Se o carcinoma é inoperável, a aplicação de radium deve ser feita.
No início da gravidez é muito freguente a morte do ovo com a curieterapia.
No 2.º trimestre o feto não sucumbe tão facilmente e pode chegar à viabilidade quando será retirado por cesárea.
No 3.º trimestre de gestação, entretanto, os casos inoperáveis deverão ser tratados de maneira um pouco diversa. Pratica-se primeiramente a cesárea e, depois, submete-se o doente à aplicação de radium.
A maioria dos radioterapeutas aconselha só a cesárea e não a histerectomia, salientando a importância da conservação do útero para a boa prática da curieterapia. E quando, nesses casos, a histerectomia tiver de ser feita, pedem os fisioterapeutas a conservação, pelo menos, do colo uterino.

Carcinoma do endométrio — Constitui associação muito rara, visto incidir esta enfermidade em faixa etária acima do período reprodutivo da mulher. Quando ocorre, o diagnóstico desta afecção é muito difícil e o abortamento espontâneo é a regra. Só então, pelo exame do material, a doença é revelada. Nos casos, porém, em que é feito o diagnóstico simultâneo de gravidez e câncer do endométrio, a conduta correta consiste na exérese do útero doente, embora grávido. Esta operação é moralmente permitida, como já vimos ao estudar o princípio do dupnlo efeito.
Afecções ovarianas — A associação de tumor ovariano e gravidez constitui ocorrência das mais raras.
Todos os tumores ovarianos devem ser tratados cirurgicamente, conduta válida também durante a gravidez. Os tumores benignos podem beneficiar-se com a simples ooforectomia, procedimento adotado em pacientes jovens. Já os tumores malignos são geralmente tratados, em qualquer idade, com cirurgia mais ampla, que consiste na ablação do útero e ambos os anexos, mesmo nos carcinomas localizados. Como o diagnóstico definitivo de malignidade depende do exame histopatológico, muitas vezes o tratamento é feito em dois tempos, sobretudo em pacientes jovens, nas quais se cuida, sempre que possível (tumores não-malignos), de conservar o outro ovário e o útero a fim de preservar o equilíbrio hormonal, a menstruação e a função procriadora. Assim, no 1.º tempo, faz-se ooforectomia simples e aguarda-se o laudo do exame histopatológico. Se o resultado o exigir, procede-se a cirurgia mais ampla no 2.º tempo, excisando-se útero e anexos restantes. Quanto menor o tempo decorrido entre uma operação e outra, tanto melhor. O mais correto consiste no exame histopatológico pré-operatório do ovário tumoral, para prosseguimento imediato da cirurgia, quando conclusivo e positivo para malignidade o laudo do patologista.
Do ponto de vista ético, aplica-se aqui também o princípio do duplo efeito, que permite o adequado tratamento materno, como se não houvesse gravidez.
Embora a ablação do útero e anexos, na intecorrência da gravidez e câncer do ovário, seja conduta válida, por ser a mais segura, devemos considerar sempre a possibilidade de, após a exérese ovariana, aguardar a viabilidade fetal para concluir a terapêutica, sem esquecer,
porém, que entre os tumores ovarianos encontram-se os de maior malignidade. Aliás, existem trabalhos em que bons autores aconselham a preservação do útero para possibilitar a aplicação de radium no pós-operatório.
Também aqui, cada caso deve ser considerado particularmente, com todas as suas implicações.

OBSTETRÍCIA — Finalmente, a opinião dos obstetras, a quem cabe coordenar a assistência à mulher grávida. Formulamos consultas sobre o tema a colegas que exercem esta especialidade, cujas respostas transcreveremos a seguir.
Antes, porém, desejamos citar dois importantes estudos sobre o assunto:
O primeiro — apresentado na Academia Nacional de Medicina, na sessão de 26 de novembro de 1963, pelo eminente Professor Dr. Leonídio Ribeiro,2, 53 ex-Catedrático de Medicina Legal da atual Faculdade de Medicina da Universidade Federal Fluminense — versa sobre o aborto em caso de estupro, e a ele voltaremos adiante. Aqui nos interessa a referência que faz sobre o abortamento terapêutico, citando o eminente obstetra Professor Octavio de Sousa, ex-Catedrático de Obstetrícia na mesma Faculdade de Medicina:
“... eu não precisaria ir muito longe, pois, aqui mesmo desta tribuna, um de nossos mais ilustres companheiros, o acadêmico Octavio de Sousa, recentemente tratou do assunto, recordando a opinião de vários especialistas, nacionais e estrangeiros, todos proclamando que desapareceram, praticamente, até mesmo as indicações clínicas do aborto terapêutico. E afirmou que se contam, pelos dedos, os casos em que teve de apelar para esse recurso extremo, em seus quarenta anos de exercício de profissão de parteiro, dando-nos esta importante informação: “Compulsando o meu arquivo de Clínica Obstétrica da Faculdade Fluminense de Medicina, que consta de quase oito mil fichas, só encontrei três casos de aborto terapêutico, o último deles praticado em 1956.' E o acadêmico Octavio de Sousa concluiu: “Tenho por boa e oportuna a afirmativa de que o aborto terapêutico passará, dentro em breve, como passaram outras tantas condutas, na Obstetrícia.”

O outro estudo foi apresentado em São Paulo, no II Congresso Católico Brasileiro de Medicina, integrando a mesa-redonda sobre “Respeito à Vida”. A parte referente ao abortamento terapêutico foi apresentada pelo eminente Prof. Alberto Raul Martinez, da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, São Paulo, de cujo trabalho são os seguintes trechos:

“.. deve-se levar em conta que a reação mais comum do médico não afeito à especialidade ginecológica, quando a prenhez ocorre em uma de suas pacientes já afetadas por problema físico ou mental, é a de que a remoção da gestação poderia simplificar a questão.
Infelizmente, esses facultativos na maioria das vezes ignoram a maneira com que essas pacientes com doença orgânica ou funcional reagem à prenhez e ao parto. Excepcionalmente têm experiência sobre isso. Por outro lado, desconhecem quais os riscos intrínsecos da interrupção da prenhez não raciocinando que na maioria das vezes a interrupção da prenhez poderá ser mais nociva que a evolução da própria gestação. Normalmente, o chamado abortamento terapêutico constitui operação potencialmente perigosa e pode, em muitos casos, proporcionar maiores riscos do que a gestação de per si.”

Mais adiante, o mesmo autor:

“As indicações médicas estritas mostram que o lugar do aborto terapêutico está diminuindo ao invés de se expandir (Rosen, 1954).
Roth (1958) assinala que “atualmente não há quase indicação em medicina interna que justifigue a interrupção da prenhez'.
Na prática, o médico, devido a simpatias mal colocadas, pressões de colegas que veem somente um lado do problema, e considerações de parentes, é às vezes tentado a modificar o critério pessoal em um caso particular. Fazer uma exceção, entretanto, quase sempre leva a consequências embaraçosas. A indução de aborto com bases fracas em um caso inevitavelmente resulta na demanda de novas intervenções por indicação igualmente duvidosa. Estas podem vir de parentes ou amigos da primeira paciente e às vezes da própria paciente. Se uma mulher achar fácil livrar-se de uma prenhez não desejada, ela será menos cuidadosa para evitar outra.
Embora os princípios básicos que comandam a decisão permaneçam os mesmos, as indicações atuais para a terminação de prenhez se modificam rapidamente com o avanço dos conhecimentos médicos.
Cada caso necessita ser julgado separadamente de acordo com as circunstâncias inerentes a ele.
Qualquer doença não pode ser considerada sempre indicação para aborto terapêutico.”

Adiante, ainda o mesmo autor:

“Seriam, portanto, condições fundamentais a serem ponderadas no problema do aborto terapêutico, as citadas por Simonin em sua Medicina Legal Judiciária:
a) que a mãe corra um perigo extremo, real, atual, que ameaça sua vida e não apenas sua saúde;
b) que esse perigo dependa exclusivamente da gravidez;
c) que a interrupção da gravidez sem dúvida alguma o fará cessar;
d) não há outro meio, além do aborto terapêutico, para salvar a mãe.
Dados os conhecimentos atuais da Medicina, médico algum, de sã consciência, poderá afirmar ou infirmar categoricamente esses itens, principalmente o item “c”, ou seja, a interrupção da gravidez fará seguramente cessar o perigo de vida materno. Além do mais, a pergunta que se Jaz é sempre a mesma: se a prenhez mata, o aborto salvará? Por outro lado, a experiência nos ensina, embora isso seja muito difícil provar com dados exatos, que os resultados da prática do chamado aborto absolutamente necessário, em casos considerados desesperados pelos nossos conhecimentos atuais de Medicina, são numericamente os mesmos, quando comparados com aqueles de casos clinicamente semelhantes, em que se absteve de qualquer intervenção de natureza abortiva.
Aceita-se, ainda, que a indicação do aborto muitas vezes é feita sem tomar em conta as diversas implicações e nem sempre por médicos categorigados. Verifica-se também que a prática dos abortos mesmo em centros especializados não deixa de oferecer seus perigos e que, por outro lado, estudos feitos por diversos autores têm mostrado que a mortalidade materna não é melhor nos hospitais em que se pratica o aborto: “terapêutico” do que nos hospitais em que estes são proscritos — persistimos, portanto, com a interrogação: se a prenhez mata, o aborto salvaTá?”

Resposta do Dr. Emílio Mastroianni, Professor da Escola Paulista de Medicina, à consulta por nós formulada:

“A minha longa experiência trabalhando há mais de 30 anos, seja na clínica do Hospital-Escola, seja na clínica particular, individualmente e em equipe, posso afirmar que os progressos atuais das Ciências Medicobiológicas são de tal porte que dão ao médico-assistente uma plêiade de recursos que praticamente aboliram do arsenal obstétrico a indicação para abortamento terapêutico. Se algumas vezes o obstetra se encontra a braços com problemas que o fazem pensar nessa indicação, deverá considerar novamente toda a problemática, pois que, provavelmente, será a falta de recursos próprios, ou excesso de orgulho pessoal que o impedem de recorrer a especialistas que poderiam ampará-lo terapeuticamente, para resolver um caso clínico complicando uma gravidez, ou uma gestação que se instala numa paciente doente, e assim em vez de apelar simplesmente pela interrupção da gestação, terá meios de levá-la a bom termo, ou mesmo em casos excepcionais aos limites da viabilidade, e assim poderá ter cumprido um preceito hipocrático do juramento que o obriga sempre a tentar salvar uma vida e que não usará de seus conhecimentos para facilitar o crime ou perverter os costumes.
A legalização do abortamento seria mais um meio de corromper os costumes, completando os malefícios sociais que o uso indiscriminado da “pilula” está acarretando.”

Resposta do Dr. Henrique A. Paraventi Professor-Adjunto da Escola Paulista de Medicina:

“Sua pergunta a respeito do assim chamado “Abortamento Terapêutico” em nossa época deixou de existir.
Meu testemunho como “Prof.-Adjunto”, na Clinica Obstétrica da Escola Paulista de Medicina e pré-natalista na Disciplina de “Higiene e Saúde Materna”, na Faculdade de Saúde Publica da Universidade de São Paulo, jamais indicamos ou presenciamos este tipo de intervenção nestes 31 anos de vida profissional.
Na Clínica Obstétrica da Escola Paulista de Medicina passaram as mais variadas intercorrências clínicas e cirúrgicas, cuidando-se sempre a preservação fetomaterna.
Somos particularmente contrários a este movimento de legalização do aborto, pois até o item do nosso Código Penal atual, onde refere que o aborto não é punível quando feito em mãe com grave risco de vida, redunda hoje pelo avançar técnico e dos conhecimentos médicos que este termo deve ser suprimido.
Espero ter respondido e dado minha opinião fundamentada na experiência de uma clínica universitária de responsabilidade didática e formativa como a nossa.”

Deixamos para o final a resposta do Prof. Álvaro Guimarães Filho, ex-Catedrático de Clínica Obstétrica da Escola Paulista de Medicina, ex-Catedrático de Maternologia da Faculdade de Higiene e Saúde Pública da Universidade de São Paulo, atual responsável pelo Amparo Maternal. Seu depoimento constitui verdadeira aula sobre o tema:

“Especificando o objetivo da indagação nos é solicitado responder às seguintes perguntas:
1o — Na Obstetrícia moderna existem condições, inerentes à gravidez, que justifiquem o chamado abortamento terapêutico?
2o — Dispõe a Medicina atual, com o extraordinário progresso das ciências, de recursos que possibilitem ao médico conduzir com êxito, até a viabilidade fetal, os casos de gravidez em gestante que seja portadora de enfermidade de natureza grave (cardiopatia, nejropatia, pneumopatia, hipertensão arterial, etc.)?
“QUANTO A 1º PERGUNTA, RESPONDEMOS: NÃO, isto é, não existe na atualidade indicações obstétricas ou indicações clínicas do chamado “ABORTAMENTO TERAPÊUTICO”.
“Sintetizando a nossa opinião de especialista, informamos que em 46 anos de vida profissional, continuada, nunca indicamos um ABORTAMENTO TERAPÊUTICO.
Também informamos que regemos duas cátedras universitárias com a responsabilidade direta e pessoal da conduta clínica de todo o corpo de médicos, que compunham os aquziliares de ensino, quer obstetras, quer internistas, e que são:
a) A CLÍNICA OBSTÉTRICA DA ESCOLA PAULISTA DE MEDICINA, que foi por nós regida desde a fundação da cátedra em fevereiro de 1938 até nossa aposentadoria compulsória em agosto de 1966, com uma maternidade aberta e serviço de ambulatório ativo no Hospital São Paulo, sendo que nos 29 anos de magistério nunca foi no serviço indicado um abortamento terapêutico, nunca deixamos de estudar a tese de sua indicação, tanto no curso teórico, como na prática clínica diária da enfermaria e do ambulatório, dando um testemunho vivo e inestimável da sadia conduta obstétrica, facilmente controlado pelas ótimas estatísticas nosográficas que sempre apresentamos.
b) Exercemos outra cátedra universitária, a CADEIRA DE MATERNOLOGIA DA FACULDADE DE HIGIENE E SAÚDE PÚBLICA DA UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO, com seu serviço de Higiene Pré-Natal. Esse serviço funcionou desde 1934 no Centro de Saúde do Instituto de Higiene da Faculdade de Medicina de São Paulo, e depois fez parte integrante de nossa cátedra, para a aplicação prática dos princípios ensinados no Curso, quando foi fundada a Faculdade de Saúde Pública e a cátedra de Higiene Pré-Natal por nós regida até nossa aposentadoria compulsória em agosto de 1971.
Com seus múltiplos cursos Pós-Graduados, na regência da cátedra e no serviço de ambulatório sempre foi defendida a mesma tese e nunca houve indicação de “abortamento terapêutico”, nem registramos os chamados efeitos deletérios da incompatibilidade clínica com a gravidez em dezenas de anos de exercício profissional quando muitos milhares de pessoas foram assistidas.
c) Devemos também informar que somos responsáveis pelo AMPARO MATERNAL, sociedade beneficente que cuida especificamente da maternidade e infância na Capital de São Paulo. Fundada em 20 de agosto de 1939, e com sua Maternidade funcionando desde 1962, com suas portas abertas ao público, sem qualquer seleção ou restrição, abrigando dois serviços de pronto socorro obstétricos, um municipal e outro estadual, com movimento crescente, pois atingimos em 1971 a 23.856 atendimentos, tendo sido no ano internadas 17.151 mães; realizamos 10.356 partos e prestamos assistência a 3.078 abortamentos.
Nesse movimentado serviço, igualmente, não indicamos e nem praticamos “abortamentos terapêuticos” e nem por isso nossas estatísticas denunciam qualquer malefício que essa conduta possa ter determinado às milhares de mães atendidas em dezenas de anos de atendimento e dando um saldo realmente positivo, pois foram milhares de crianças salvas, que seriam imoladas em nome de uma pseudo-assistência mais “moderna” e mais “científica”.
É toda essa experiência clinica, baseada em fatos inconfundíveis, na miríade de casos clínicos de todas as formas, e em tanto tempo, que nos permite afirmar que NÃO EXISTEM AS CHAMADAS INDICAÇÕES TERAPÊUTICAS, pelo menos na observação diuturna que representa uma só filosofia, uma só orientação e um só resultado, em quase meio século de clínica na Capital Paulistana.
QUANTO A 24 PERGUNTA, RESPONDEMOS: SIM, não apenas “atualmente”, mas já há muito tempo a Medicina possui recursos que possibilitam ao médico conduzir com êxito, até a viabilidade fetal, os casos de gravidez em que a gestante é portadora de enfermidade de natureza grave.
Não pretendemos, nem esta análise rápida permitiria, especificar as doenças e os estados funcionais, que em todos os tempos serviram para indicar a interrupção da gravidez, mas devemos lembrar que, se for feita uma simples leitura dos tratadistas clássicos, é demonstrável a larga manu que as chamadas “indicações” mudam com o tempo e com a moda.
Antes eram as doenças sistêmicas, como o vômito gravídico ou incoercível, as úlceras gástricas; a tuberculose em suas várias formas; as cardiopatias nos seus aspectos anatômicos e funcionais; as moléstias renais, etc. que levaram a palma.
Nas décadas de 30 e 40 esses quadros nosográficos foram caindo de moda, pois não mais se justificava a interrupção, em face da evidência dos resultados terapêuticos sobre essas doenças, e as chamadas “indicações terapêuticas” passaram a ter prioridade nas doenças nervosas e estados emocionais, sendo, também, utilizadas na incidência de certas moléstias infecciosas na fase embriogênica da gravidez.
Superado esse período, as doenças foram paulatinamente abandonando o rol dos abortivos e da prática dos abortadores, e em seu lugar foram acrescentando, com grande prodigalidade, certos distúrbios psíquicos que não demonstrando, de imediato, a incompatibilidade, indicavam, entretanto, a interrupção da gravidez para realizarem a “profilaxia” de moléstias psíguicas e nervosas tardias.
Nessa época as indicações sociais se avolumaram, principalmente em regiões em que a sociedade apresenta liames morais muito frouxos. Nessas dreas o abortamento chamado “terapêutico” constitui a tábua de salvação comodista para uns e meios rendosos para outros, em virtude dos imperativos biológicos de uma vida licenciosa.
Chegamos, finalmente, aos tempos mais modernos, aqueles que não mais usam as muletas das “indicações médicas”, e admitem sumariamente o ABORTAMENTO SOCIAL, pela simples vontade da gestante, do seu companheiro ou da sociedade corrupta em que vivem, sendo a volta do paganismo, aliás muito própria do espetáculo que presenciamos nestes dias.
Cumpre lembrar que, na análise dos resultados da terapêutica abortiva, duas são as situações de fato: a) aqueles que a praticam não podem pretender defender o efeito salutar do abortamento praticado, pois não têm como provar o efeito deletério da gravidez, em face da doença, pois esta foi anulada; b) enquanto que aqueles que não praticam o abortamento provam à evidência que não houve a incompatibilidade, pois resolvem biologicamente o problema da gravidez, e demonstram com a vida materna a desnecessidade da indicação abortiva.
Estatísticas levantadas em dois grupos homogêneos de hospitais conceituados dos Estados Unidos, um dos quais os médicos praticam habitualmente o abortamento terapêutico, e o outro grupo no gual os obstetras não indicavam a interrupção da gravidez, demonstraram que no mesmo periodo de tempo e com uma observação de cerca de 3.000.000 de partos, as mortalidades maternas estudadas globalmente ou especificamente em face da doença intercorrente eram em menor número nos hospitais que observaram a assistência conservadora.

Isto é o que pensamos sobre as “chamadas indicações”, elas não subsistem dentro de uma conduta médica, obstétrica ou ética honestas, mas apesar disso cada vez mais são praticados os abortamentos, às vezes camuflados com rótulos médicos, mas exatamente constituindo os abortamentos criminosos no sentido legal e social da expressão.
Os códigos anacrônicos para alguns continuam a cominar penas e a estabelecer regras que pretendem defender o nascituro; seus artigos, entretanto, são letras mortas, tão mortas como a vida fetal ou embrionária no conceito de alguns colegas, que praticam diuturnamente o abortamento, como verdadeiro “meio de vida”.
Na proximidade de alteração dos Códigos, em vias de reforma, alguns pretendem modificar a letra da lei, para que desse modo, com a abolição do conceito atual do abortamento criminoso, justificarem suas condutas clínicas diárias, sem que lhes caibam admoestações ou censuras, de
caráter médico, ético, ou mesmo dos Conselhos de Medicina.
Será essa orientação a que segue a maioria dos médicos do Brasil?
Pensamos que não. Pois inúmeros são os médicos que conhecemos, que permanecem fiéis aos princípios milenários, hipocráticos e cristãos, cumprindo com rigor e satisfação um voto solene com que ingressaram no exercício profissional. Esses são nossos conceitos, a longo tempo vividos e que procuramos sintetizar.”

 

II. ASPECTO SENTIMENTAL

“O Senhor disse a Caim:
— Que fizeste?
A voz do sangue do teu irmão
clama da terra até mim.
De futuro serás maldito sobre a terra.”

Gên. 4, 10-11

Costuma-se denominar de “sentimental” o abortamento provocado em mulher cuja gravidez foi consequência de estupro.
Pelo fato de ter sido a mãe vítima de brutalidade e engravidada por violência, quer-se justificar o extermínio, pelo médico, de uma vida humana inocente e indefesa, ainda no ventre materno, violentando-se, assim, o espírito e a finalidade da Medicina, o respeito à vida humana e, consequentemente, o Direito e a Justiça.
E com que fim?
Evitar uma crueldade já praticada? Impossível!
Repará-la? Não com o sacrifício de uma vida inocente, mas, isto sim, proporcionando à mãe assistência médica, psicológica e espiritual adequadas.
Ocultar as consegiências do ato bestial? Nem mesmo isto, pois a prova de violência exige tramitação policial e judiciária demorada, justificável pela gravidade do caso, o que não pode ser feito em segredo e tem inevitável repercussão e consequente divulgação, embora indesejada.
Enquanto isso, a gravidez evoluindo até a viabilidade acabará por absolver da “pena de morte” o “réu” sem culpa, o filho inocente, pelo crime que seu pai cometeu.
Por esse motivo, tem sido comentada a impraticabilidade desse inciso do Código Penal (art. 128, inc. II) e sugerida sua revogação, o que, neste ensejo, também o fazemos.
O ilustre Prof. Leonídio Ribeiro, 5 no importante trabalho a que atrás nos referimos, e que foi publicado na Revista da Academia Nacional de Medicina, no n.º 1, de 1965, primeiro trimestre, às págs. 25 a 30, obteve o parecer de vários médicos e juristas sobre o tema do abortamento em caso de estupro. Abaixo transcrevemos aqueles que nos pareceram mais expressivos.

Afrânio Peixoto:

“Toda sociedade constituída tem fundamento explícito no respeito à vida humana e o médico, incumbido de cuidar dela, não pode, sob pretexto algum, sustá-la ou diminuí-la. É uma questão fechada de ética profissional.”

Alcântara Machado (Jurisconsulto e Professor de Medicina Legal) :

“Não reivindico, para mulher alguma, o direito de fazer-se abortar. Fruto de um estupro ou de um amor livremente compartido, filho do inimigo bestial ou do homem eleito, o que eu distingo é a criatura humana. Todas as maternidades são sagradas, todas as vidas são invioláveis.”

Moreira da Fonseca (da Academia Nacional de Medicina) :

“O Estado protege o embrião, porque há um direito a tutelar, que se realiza na vida do nascituro. O argumento contrário é sem sentido, diante da intangibilidade dos direitos futuros e que se concretizam, durante a gestação, na pessoa física e biológica do feto. O feticídio é um homicídio.”

Fernando Magalhães (iniciador da Escola Obstétrica Brasileira) :

“Não cabe, dentro de um Código de Deontologia, a permissão ao médico de praticar o aborto. O embrião é um sujeito de direito, é alguém, e matar alguém é um crime.”

Olavo de Oliveira (Catedrático de Direito Penal da Universidade do Ceará):

“Quando e como pode e deve o médico efetuar o aborto? Se fosse após o processo, o tempo exigido seria superior ao da gestação. Tornar a vítima o único juiz da operação, é abrir uma fonte de ominosas levezas e segura impunidade, para muitos abortos. Deixar a decisão ao arbítrio pessoal do médico, nessa conjuntura, senhor de admitir ou não o estupro, é tese alheia à sua profissão.”

Ataliba Nogueira (Professor de Direito Penal da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo):

“Nem os moralistas, nem os juristas, poderão autorizar o aborto, pois ao homem não é permitido matar um ser humano, alegando-se legitima defesa ou estado de necessidade. A Medicina é defensora da vida e ao clínico não incumbe nunca matar. O preceito do Código Penal nada mais é que a escapatória por onde passam os mais abomináveis atos contra a moral. Suprimilo é o mesmo que impedir numerosos abusos acobertados pela pseudociência e geralmente aprovados pela sociedade atual, corrupta e materialista.

Talvez chegue a um milhão o número de vidas ceifadas pelo aborto, anualmente, no Brasil. E tudo isso por culpa dos médicos, levados exclusivamente pelo dinheiro. Essa é a razão que justifica a aprovação do projeto que revoga o texto do Código Penal em vigor, no capítulo que permite a interrupção da gravidez.”

Leonídio Ribeiro.(ex-Catedrático de Medicina Legal da Faculdade de Medicina da U.F.F.):

“Por que matar criaturas humanas que não tiveram a menor parte de culpa no crime praticado por seus pais?

Já então Professor de Medicina Legal, em três escolas superiores, duas de Medicina e uma de Direito, escrevi um volume analisando e criticando a nova legislação penal, em face da minha especialidade. E dediquei um de seus capítulos ao problema do aborto, em cujas páginas afirmava tratar-se de uma licença que deveria ser condenada, como ato ilícito, imoral e antisocial, pois o sacrifício da vida humana atinge a própria fonte da riqueza de um povo, desde que é o elemento fundamental de seu progresso e desenvolvimento.

Trata-se, em essência, de um ato delituoso, um homicídio típico. O próprio Código Penal vigente assim o qualifica. O feto é um ser vivo, com a proteção do Direito para tudo o que lhe interessa, com a garantia de todos os direitos, mátime o primordial deles, que é o direito à vida.
Ainda aqui, prevalece o velho conceito romano: “nasciturus pro jam natus habetur si de comodo ejus agitur”.

Por isso mesmo, considero um aovsurdo que o novo Código de Ética, agora em via de ser reformado, continue aprovando a prática do aborto, em caso de estupro, abrindo as portas aos parteiros que não respeitam o seu juramento e que se transformaram em frios criminosos reincidentes.

o artigo do Código Penal em vigor, em nosso País, autorizando a prática do aborto, em caso de estupro, é uma monstruosidade jurídica...”

Transcrevemos, também, os seguintes trechos de C. Z. Mammana:

“Ao juízo de GAUTIER, a anlicação com absoluta segurança dos princípios da impunidade, ou legitimidade do aborto em caso de violação, se dará tão raras vezes que sua admissibilidade será mais perigosa do que útil. (...)

Antes de terminar, não nos podemos furtar de tecer comentários quanto à posição do médico ante o aborto ético e sentimental, previsto em alguns Códigos Penais. Com efeito, a quase totalidade dos dispositivos, não mencionando as provas do fato, fazem subentender que autorigem o médico a provocar aborto não só nos casos em que a vítima apresentou queixa à policia, mas também ante o simples relato da gestante que se diz alvo de violência carnal. Em outras palavras, outorgam ao médico habilitado poderes especiais de JUIZ ABSOLUTO E CARRASCO: JUIZ ABSOLUTO porque, sem práticas judiciárias, condena à morte um inocente, e CARRASCO porque ele próprio executa a pena de morte. Não se concebe como possa o médico enfeixar nas mãos poderes para decidir de uma vida humana cujos direitos são inalienáveis.

Para o médico que vive À custa de perpetração de abortos e que diariamente está fora da lei, tais dispositivos representam maravilhosa...
válvula de segurança que lhe permite, sob o manto protetor da lei, continuar francamente na faina de ceifar vidas inocentes e alargar o campo de atividades. As clientes de aborto que habitualmente afluem a seu consultório e que não têm a mínima idéia do que venha a ser o estupro, são por ele instruídas acerca desse crime, e do aborto dito necessário. Se vor uma circunstância qualquer se vir envolvido nas malhas da justiça, apela sempre para o mesmo refrão: “Trata-se de um triste e doloroso caso de violação carnal, previsto no Código de meu país!"

Contudo, o médico de boa fé e sem malícia, que faz parte da maioria que exerce honestamente a nobre profissão e acredita nas alegações de sua cliente, sempre se encontra em dificuldade, quando assediado por uma vitima ou pseudovíitima de estupro ou pelos familiares que insistem e lançam mão de todos os recursos para conseguir o intento, isto é, a interrupção da gestação. A inexperiência em questões jurídicas convence-o de que toda e qualquer legislação penal se fundou na sã moral e na verdadeira doutrina jurídica: isto é, que a nenhum homem é permitido matar o semelhante. Acreditando nesse princípio, a leitura do dispositivo penal de seu país, que permite ao médico provocar aborto em mulher violentada, ou vitima de estupro, leva"f falsa concepção de que, interrompendo uma gravidez em caso de tal natureza, está dentro da lei, o que vale dizer, não comete infração contra os preceitos da doutrina jurídica e da moral natural, sem falarmos da moral cristã.

Essa gravissima e perigosa falha constante nos estatutos penais, verdadeira monstruosidade jurídica, influi maleficamente no espírito de grande número de médicos, levando-os a, amparados na lei, praticar inconscientemente aborto que, ainda assim, não deixa de ser criminoso. (...)

Qual a situação do médico perante a justiça, se amanhã ficar provado que as alegações da mulher eram falsas, ou se esta vier a sucumbir em consegiiência de manobras abortivas? Num ou noutro caso, ele pode ser responsabilizado civil e criminalmente pelo fato, não encontrando então, na lei penal, as circunstâncias em que poderá fundamentar a sua defesa. (...)

Para o médico não ter aborrecimentos futuros, aconselham alguns autores que o aborto só se execute após manifestação de autoridade judiciária. Surge, então, o problema do tempo em que esta deve pronunciar-se: se deve aguardar as provas de que a gravidez se verificou em consegiiência de um delito, ou se é necessário esperar o desate do processo-crime. Este requer, as mais das vezes, espaço de tempo demasiado longo, no decorrer do qual a gestação se torna cada vez mais patente ao público, podendo até chegar ao termo.”

Valemo-nos, mais uma vez, da colaboração valiosa do Dr. Celso Panza (Juiz de Direito)

“O aborto sentimental, secundado pela violência — estupro — dispare sob quaisquer ângulos, não encontra resguardo em nenhuma excludente.
Aberra do direito como fruto féleo de pós-guerra. O quadro psicossomático futuro, em termos de previsibilidade, é chamado a intervir com galas de antijuridicidade. Tudo sem a necessária autorização da Ciência do Direito. Um salto no escuro em. termos científicos. O impalpável; sem a mínima tecitura para interpretação e discussão adequada.

A antijuridicidade, em minha convicção, está em ceijfar vida latente, indefesa, inerme, inculpável no ato biológico violento.

Porque não existente o amor no ato genésico, o feto não merece ter vida extra-uterina.

É a teoria do desamor.

Mas qual o maior desamor, qual o maior crime?
A vida chegada de um ato onde o amor foi ausente, ou a morte consentida pelo desamor?

Onde o desamor maior?

Tenho que na segunda proposição. Isto é induvidoso. Traumas futuros podem ser equacionados, evitando-os, através de psicólogos, psiquiatras e terapêuticas adequadas; muito mais, tratando-se da inesgotável fonte de amor — a maternidade.

Jimenez de Asúa o cognominou de sentimental por ser “libertador das justas repugnâncias da mulher: (in Liberdade de Amor e Direito a Morrer, págs. 137 a 144).

Não se questionou o notável tratadista alienigena, se a maior repugnância não seria a de matar quem tem o direito a viver.
O inesquecível Afrânio Peixoto, sempre, desenobreceu tais intuitos com veemência, entre outros médicos de nomeada que consigo ficaram acordes.”

 

IV. ASPECTO EUGÊNICO

“Conhecias até o fundo do meu ser, meus ossos não te foram escondidos.
Quando eu era feito em segredo, tecido na terra mais profunda,
teus olhos viam meu embrião.”

Salmo 189, 15-16

O abortamento eugênico é proibido pelas nossas leis.
A sua legalização tem sido proposta em algumas oportunidades, na tentativa de introduzir nova cunha, de abrir nova fenda, na muralha ética da Medicina.
Consiste, em última análise, no extermínio, em nome da eugenia, de fetos defeituosos ou com probabilidade de o serem. Ora, a Eugenia, considerada como Ciência, jamais poderia se afirmar patrocinando a destruição de vidas humanas. Legitimada essa prática abortiva, enveradaríamos numa linha de raciocínio até a justificação de todas as barbaridades já praticadas em nome de uma falsa idéia de eugenia.
Assim se expressou Dayl de Almeidas (Prof. de Direito) :

“Diremos nós agora: homicídio covarde, homicídio contra quem não pediu para começar a existir nem tem condições de reagir contra as agressões que o atingem. Concordamos com tudo o que dizem esses médicos. Concordamos com eles, porque para nós também a vida humana é uma unidade cujo valor está em seu próprio existir. (...)

Não creio que os homens sejam julgados, no merecimento de sua vida, pela integridade de seus órgãos ou de suas funções. A eugenia aplicada à humanidade não deve ser a mesma aplicada à animalidade. Não preparamos homens para corridas, nem preparamos homens para lutas, nem preparamos homens para a produção e reprodução, como se prepara gado, como se preparam cavalos para os hipódromos. Que critérios temos para julgar o valor de uma vida só por seus defeitos eugênicos? E pergunto o que mais pode contribuir para o desajustamento de uma família: a lembrança de um assassinato ou a presença estimulante do amor e da solidariedade, diante de uma criança viva, porém defeituosa? O que mais importa para a elevação da nobreza dos sentimentos e da solidariedade humana senão a comoção de um pai diante de um filho excepcional? Creio que isso pode muito mais unir a família do que pode separá-la a lembrança de um assassinato. (...) Diziamos que, científica, filosófica e teologicamente, a vida humana é uma unidade que vai do ovo à sepultura, e que o homem é um individuo com características e personalidade fundamentalmente irredutíveis a avaliações sobre seu mérito por outros homens.

Assim, o direito de existir é prerrogativa de toda criatura humana desde a concepção. E esse direito não vode estar submetido à opinião de quem quer que seja, porque não é fruto de uma convenção, não é fruto de um raciocínio, é um mandamento, é um imperativo da própria natureza humana e, mais do que isso, é uma determinação da própria vontade divina” (Diário do Congresso Nacional, Seção I, págs. 1580/88, 8.6.72).

Truncando o óbvio, para confundir o público em geral, alguns médicos abortistas afirmaram, em entrevista à imprensa leiga, que advogam “o direito de uma criança nascer perfeita e saudável”. Ora, ninguém deixará de advogar esta causa, O que eles defendem — facilmente se conclui — é bem outra coisa. Eles advogam que só as crianças perfeitas, saudáveis e “desejadas” têm Oo direito de nascer, as outras não: se é cega, se é defeituosa, se é débil, se é indesejada, deve-se matá-la, ainda no ventre materno.
É evidente que esse crime nunca deveria ser cometido, e lei nenhuma poderá legitimá-lo.
A esse propósito, para promover o verdadeiro progresso, compete ao Poder Público, como vem fazendo, estimular o desenvolvimento da assistência pré-natal em todo o território nacional, bem como propiciar o surgimento de entidades que se destinem ao estudo e diagnóstico de taras hereditárias, para orientação e aconselhamento de pessoas interessadas, evidentemente sem caráter obrigatório e resguardados os limites da moralidade e os direitos essenciais da pessoa humana. Cumpre-lhe ainda incentivar o desenvolvimento de instituições, preferentemente particulares, com a finalidade de prestar assistência e auxílio, de todas as modalidades necessárias, visando à recuperação das criaturas portadoras de graves deficiências, não apenas as assim provenientes do ventre materno, mas também as que as adquiriram em traumatismos do parto ou em doenças várias, no decorrer da vida.
O crescente progresso científico e tecnológico oferece novas condições e recursos sempre melhores, de valor inestimável, para orientação desses casos, visando sua recuperação física e mental e melhor integração social.
Os Drs. Reginaldo de Oliveira Silvas e Eduardo Martins Passos, em recente estudo, assim se expressaram sobre o diagnóstico, tratamento e profilaxia das malformações congênitas:

DIAGNÓSTICO — Esse tema pode ser encarado sob dois aspectos: 1) diagnóstico intra-utetino, e 2) diagnóstico extra-uterino, após o nascimento.

Ambos são importantes, porém, a nosso ver, o diagnóstico da malformação fetal in utero, tema de trabalho de um de nós (SLVA, R.O.), que dentro em breve será publicado, tem maior importância, principalmente nos casos de hidrocefalia, anencefalia e monstruosidade dupla, pelas implicações que podem trazer quando do trabalho de parto.

O diagnóstico após o nascimento deve ser precoce, principalmente para permitir a correção da malformação o mais cedo possível.
Segundo BARBOSA, as vantagens de um diagnóstico precoce são:
1. Orientar o obstetra sobre condutas especiais para o parto, ditadas pela existência de certas malformações fetais.
2. Preparar cuidados especiais para o malformado ao nascer.
4. Providenciar a correção da malformação congênita dentro do mais breve prazo em que for indicada.
4. Estabelecer a natureza congênita da maljormação, evitando confusão com doenças de outras etiologias e não estabelecer tratamentos inúteis, nem interpretações errôneas no futuro.
5. Poder informar aos pais sobre as condições apresentadas pelo recém-nato e as perspectivas prognósticas não só do seu caso como dos próximos filhos.

TRATAMENTO — Com a evolução da Medicina, no particular da Cirurgia e especialidades afins, as possibilidades de recuperação dos malformados aumentaram consideravelmente. É bem verdade que existem malformações incompatíveis com a vida, porém na maioria são passíveis de tratamento cirúrgico, o que permite uma integração não só física como social do malformado, como ser humano que é.
Importante é que o tratamento seja instituído o mais breve possível, o que é permitido por um diagnóstico precoce, como já referimos.

PROFILAXIA — A profilaxia das malformações congênitas é da responsabilidade de todos os médicos, porém, principalmente, do obstetra, que tem como sua grande arma a assistência pré-natal.
Uma boa assistência pré-natal permite, a nosso ver, não só a eliminação dos fatores causadores das malformações, como também o diagnóstico precoce das mesmas, com suas conveniências já referidas. Isso é um fato indiscutível, pois verifica-se uma maior fregiiência de malformações em pacientes de baixo nível econômico-social, que têm pouca ou nenhuma assistência prénatal.”

Julgamos oportuno transcrever os tópicos que se seguem (citados por Maria Helena Fraga)? para que melhor se possa perceber a contradição dos que preconizam o abortamento eugênico e se dizem defensores do “direito de uma cridnça nascer perfeita e saudável”.

Pierre Maroteaux:

“No homem, são múltiplas as causas de má-formação congênita e esquematicamente podemos classificá-las em três grupos:
1) doenças hereditárias;
2) anomalias dos cromossomos;
8) ação de vírus ou de alguns medicamentos nocivos durante a gravidez.

No primeiro caso podemos dizer que as possibilidades de nascer uma criança anormal são de 1 para 4 ou de 1 para 2, dependendo de haver ou não, na família, casos de anomalia. Pela aniocentese procede-se à análise do líquido que envolve o feto e que permite o reconhecimento das doenças graves, antes do parto. Não pode ser feita antes do quarto mês de gestação e não é isenta de riscos. O resultado do laboratório sobre as culturas celulares exige pelo menos quatro semanas de prazo. Nesses casos, portanto, o aborto só seria possível no 5.º ou 6.º mês de gravidez.

No segundo caso, de anomalias dos cromossomos, que têm o mongolismo como exemplo mais conhecido, nada permite prevê-lo salvo em casos excepcionais. Sua causa é puramente acidental e só a idade avançada da mãe pode favorecê-lo. A aniocentese leva ao diagnóstico.

No terceiro caso, das doenças infectuosas, especialmente a rubéola, é impossível verificar, com certeza, a situação da criança. Quando ataca a mãe no 2.º mês de gravidez, no caso o mais vulnerável para a criança, somente 20% dos fetos são portadores de má-formação. O risco diminui, gradativamente, tornando-se nulo depois do 4.º mês.

Somente as anomalias cromossômicas podem ser caracterizadas através da aniocentese sistemática que, por vezes, precisa ser repetida. Deve-se tornar obrigatório este exame que está longe de ser inócuo?”

Professor Lejeune:

“Que motivos levariam a sustentar que é lícito rejeitar os trissômicos (que representam 11 a 12% dos débeis mentais) sob a alegação de podermos caracterizar sua anomalia antes do parto quando deixaremos viver os outros débeis que têm a sorte de passarem despercebidos?
(...) Julgo que a Medicina terá que escolher entre a que mata e a que trata.”

Dr. Rendu:

“No caso de mães que tiveram rubéola, será necessário matar todas as crianças quando uma boa parte delas é normal? Uma pesquisa prospectiva, conduzida desde 1955 no Laboratório de “séroprophylazxie” no Hospital das Crianças doentes de Paris, sobre as mulheres grávidas com rubéola tendo nessa ocasião tomado uma dose superior a 10 ml de gamaglobulinas plasmáticas humanas “standard” (a 16,5%), foram os seguintes os resultados globais:

— aborto espontâneo: 126 (47%);
— natimortos e mortos ao nascer: 47 (1,8); -— anormais: 85 (1,3%);
— normais: 2.453 (922%).

Seria necessário matar 2.488 crianças para evitar o nascimento de 35 anormais?”

Os ensinamentos acima nos mostram que, mesmo raciocinando com os critérios dos abortistas, podemos demonstrar a inconsistência de seus argumentos.
Mas os nossos critérios são outros. Sabemos que em toda vida humana, mesmo na defeituosa, existem sempre valores a preservar, e entre eles o valor da própria vida. O abortamento provocado constitui um crime contra a vida, seja a vítima normal ou anormal, pois se é crime bárbaro matar um ser humano inocente e saudável, não o deixará de ser pelo fato de o inocente apresentar deficiências. A vida deficiente necessita de proteção e não de agressão.
Admitir a eliminação da vida humana deficiente, em sua fase intra-uterina, significa verdadeira agressão moral a todas as pessoas deficientes, de todas as idades, pois seria o mesmo que dizer aos nossos irmãos deficientes que nós apenas os toleramos, que eles não deveriam existir, que melhor seria se eles tivessem sido mortos no ventre materno...
A esse propósito, são oportunas as seguintes palavras do atual Pontífice, João Paulo II, que transcrevemos de sua última encíclica, sobre o Trabalho Humano (Laborem Exercens):

“Também elas (as pessoas deficientes) são sujeitos plenamente humanos, dotados dos correspondentes direitos inatos, sagrados e invioláveis, que, apesar das limitações e dos sojrimentos inscritos no seu corpo e nas suas facuidades, põem mais em relevo a dignidade e a grandeza do homem. E uma vez que a pessoa que tem quaisquer “deficiências” é um sujeito dotado de todos os direitos, se lhe deve facilitar a participação na vida da sociedade em todas as dimensões e a todos os níveis que sejam acessiveis para as suas possibilidades. A pessoa deficiente é um de nós e participa plenamente da mesma humanidade que nós. Seria algo radicalmente indigno do homem e seria uma negação da humanidade comum admitir à vida da sociedade (...) só os membros na plena posse das funções do seu ser, porque, procedendo desse modo, recair-se-ia numa forma grave de discriminação, a dos fortes e sãos contra os fracos e doentes.”

 

V. LEI MORAL NATURAL E CÓDIGO DE ÉTICA MÉDICA

“A ninguém darei,
para agradar, remédio mortal nem conselho que o induza à destruição.
Também não fornecerei a uma senhora pessário abortivo.”

(do Juramento de Hipócrates)

As exigências do exercício profissional não permitem ao médico se aprofundar no estudo de outras ciências importantes para o seu mister, especialmente a Ética, como seria desejável e necessário. No exercício diuturno da profissão, no relacionamento com o doente e seus familiares, com os demais colegas e outros profissionais da área médica, vê-se o médico, não raras vezes, com problemas mais ou menos delicados, relacionados ao seu dever de conduta, valendo-se do bom senso para não infringir o Código de Ética Médica. Entretanto, para o correto exercício da profissão, nos dias atuais, necessário se faz um maior aprofundamento nos estudos da Ética em geral e da Ética Médica em particular, Sentimo-nos no dever de tentar abrir clareiras na vastidão de conhecimentos que compõem os preceitos normativos da conduta do exercício profissional.
Esta a razão por que nos propomos fazer as presentes considerações, que representam antes um esforço de busca da verdade, do que a intenção de ministrar conhecimentos sobre assunto que não é especificamente da nossa seara, mas que não podemos ignorar.

LEI NATURAL — Vale reafirmar que existem determinados direitos da pessoa humana que lhe são inatos, necessários, inalienáveis, não lhe são outorgados por nenhum outro homem, por nenhuma sociedade ou Estado ou mesmo entidade supra-estatal (ONU, OMS, etc.), enfim, por autoridade humana nenhuma e sim, diretamente, por Deus, direitos estes inseridos no recesso de sua consciência moral, independente de época, civilização e contexto.
Por outro lado, vemos que a natureza é regida por leis imutáveis e que só pouco a pouco o homem vai conhecendo e utilizando para o seu desenvolvimento, para o seu progresso. As leis físicas, por exemplo. Os organismos animais são regidos por leis da Fisiologia, que lhes permitem nascer, crescer, sentir, se reproduzir e morrer.
E existem ainda as leis psicológicas, as leis sociológicas, etc. Para o homem, ser livre, isto é, dotado do livre-arbitrio, que lhe condiciona o mérito ou demérito em suas ações, o único capaz de agir livremente, conforme o seu entendimento e a sua vontade, existem as leis que regulam a sua conduta para conformá-la ao bem, à verdade, à finalidade das coisas. Essas leis constituem, em seu conjunto, as leis da natureza, a lei natural em seu sentido genérico. (Reserva-se mais propriamente este termo, lei natural, para aquelas leis que regem a conduta humana, a lei moral natural.) Recebem o nome de lei, porque assim foram impostas aos seres, segundo suas necessidades que, sendo conforme a natureza de cada ser, são diferentes no inorgânico, no orgânico e no Homem.
Afirma-se que as leis morais, antes que impostas, são propostas à natureza livre, racional do homem, no sentido de que elas não são inelutáveis. É evidente que o homem é dotado de uma capacidade física (liberdade física) de cumprir ou não a obrigação moral. Entretanto, a sua observação constitui um dever, pois a ninguém é dado o direito de fazer o mal. A realização deste seria um abuso da liberdade: é livre para fazer o bem. Porque a liberdade autêntica implica na obediência à lei moral natural. A obrigação moral se impõe à liberdade humana tanto quanto a fatalidade se impõe aos demais seres. Assim, a realização do bem é um dever, por imposição da lei moral natural. Essa capacidade física possibilita ao homem agir de maneira contrária ao dever, mesmo em número respeitável, sem criar normas de conduta com isso: o homem não se define estatisticamente.
Dentro da lei moral, há uma parte que trata das relações que devem existir entre as pessoas e sobre as quais se deve assentar a ordem social e jurídica e que se denomina direito natural ou lei jurídica natural, Dessa concordância entre o direito positivo (ordem jurídica) e direito natural forma-se a noção de que as leis elaboradas são justas e, com isso, obrigam as consciências. O direito positivo só tem realmente valor quando se fundamenta na justiça, entendida esta como um valor moral. Assim, o Direito deve se conformar à Moral e tudo que existe de justo, de legítimo, na lei humana procede da lei moral natural.
A Lei Natural teria então esse sentido, mais amplo, da lei moral decorrente da natureza racional e da dignidade da pessoa humana, a lei moral em toda a sua amplitude, lei que o homem é capaz de conhecer pela luz natural da razão, implícita na natureza das coisas e no fundo de seu ser racional. Todos nós estamos impregnados dela, porque se encontra impressa em nossas consciências. Está tão intimamente ligada à essência e à ordem das coisas que apenas por meio delas já são cognoscíveis.
Exemplificando: todos reconhecem que a ninguém é permitido esbofetear o próximo, ou cuspir-lhe no rosto, tomar-lhe seus pertences, denegrir-lhe a honra, ridicularizá-lo, etc. Constituem esses exemplos as mais elementares noções de lei moral natural, noções estas ao alcance de qualquer pessoa, independentemente de seu grau de instrução. Logo, todos os homens estão obrigados, moralmente, a não praticarem tais atos, contrários às leis morais naturais. A natureza, porém, em face de nosso livre-arbítrio, só nos impõe impedimentos morais de realizá-los, os quais são percebidos pela consciência, e não impedimentos físicos. Dai a necessidade de leis expressas, com punições determinadas, para garantia da ordem moral e segurança da vida em sociedade.
Façamos um parêntese aqui para responder a uma pergunta que se impõe, quanto às dificuldades que a razão possa ter para alcançar a essência das coisas. São conhecidas as três circunstâncias que dificultam a luz natural da razão: a paixão, os costumes perversos e a má disposição de natureza.

1. Paixão — Em certas circunstâncias a razão se encontra como que obnubilada, obscurecida por um sentimento forte e profundo, criando um estado afetivo tal que não permitia um raciocínio normal. São originados, às vezes, verdadeiros bloqueios em nosso raciocínio por esses influxos de afetividade. Por isso afirmamos, por exemplo, que ninguém pode ser juiz em causa própria.
2. Costumes perversos — Também, em certas épocas ou culturas, os costumes podem se tornar de tal maneira pervertidos, que a razão fica deformada a ponto de não mais conseguir atingir o bem, a verdade e a finalidade das coisas. Podemos mesmo afirmar que estamos presenciando um fenômeno dessa natureza, pela mentalidade hedonista, utilitarista, que se insere na consciência do homem moderno. Não caberia evidentemente uma análise sociológica e filosófica dos tempos atuais: falta-nos competência para isso. Entretanto, não é difícil comprovar em nossa civilização, a procura ansiosa da felicidade a qualquer preço, a esperança que o homem colocou no progresso, no desenvolvimento, na técnica para ser feliz; de tal maneira, que o progresso deixou de ser um meio através do qual o homem conquiste a felicidade e passou a ser um fim em si mesmo: o progresso pelo progresso, o desenvolvimento para não ser subdesenvolvido. É a procura do crescimento indefinido, canceroso, da sociedade à custa de sua desumanização. E o homem que é o autor do progresso não é o seu beneficiário. Quase sempre é sua vítima. O conflito que resulta dessa situação podemos vislumbrá-lo através das ansiedades, depressões, angústias, que dia a dia batem à porta dos nossos consultórios. O homem perdeu-se a si mesmo, perdeu a razão de ser de sua existência. Com a angústia e o desespero existencial, a procura ansiosa do prazer passa a ser uma constante, um hábito, uma segunda natureza, como se fora um reflexo condicionado. Os costumes tornam-se corrompidos, vê-se as fugas para as drogas, para o álcool, o erotismo difundido e estimulado, o homossexualismo ganha foros de sexualidade humana normal. Em tudo vemos o embotamento do sentido ético que é reduzido ao útil e ao agradável: o prazer é que determina o valor ético da ação humana.
8. Má disposição da natureza — O ato livre, ou seja, a liberdade, muitas vezes, é limitada por condições patológicas da pessoa humana cuja razão fica tolhida pura atingir a verdade. Entendemos que, em seu aspecto |uuramente biológico, as funções neuro-endócrino-psicoógicas são essencialmente regidas pelas leis da hereditnrledade humana e acidentalmente pelos fatores cósmicos e sociais. As falhas daí decorrentes podem comprometer a razão humana. É a referida má disposição da nutureza, que abrange uma grande faixa de doenças gemúticas e adquiridas. Várias doenças neurológicas estariam aqui enquadradas, especialmente as relacionadas com a patologia cerebral. No terreno da endocrinologia, por exemplo, sabemos o quanto nossas glândulas podem influenciar o nosso comportamento. No campo da psicopatologia, podemos lembrar as alterações da percepcão, das representações, da memória, da atenção, da afeLividade, da orientação. Não que defendamos a existêncla de determinismos biológicos pelos quais o homem não seria responsável pelas suas ações. Como, também, não defendemos que o homem seja um produto do meio, não obstante sabermos o quanto este pode influenciá-lo.
Apenas enfatizamos que há circunstâncias nas quais as alterações da inteligência são de tal maneira que vão comprometer a liberdade moral. Pessoas há, portanto, que por má disposição da natureza estão incapazes de alcançar a verdade.
Fechemos o parêntese,
A lei moral natural é imutável e necessária como a mesma essência das coisas. Por isso não decorre de um convênio tácito ou expresso entre os homens — seria muito frágil e inconsistente — e sim, necessariamente, da ordem natural, da ordem ontológica, sem depender do arbítrio de qualquer autoridade humana. Impõem, em seus princípios gerais, objetivos, um “não-dever-fazer-de-outra-maneira”, se bem que, em si, seja suscetivel de diversas modalidades de realização, particularizada pelos costumes. O que pode parecer um paradoxo.
Entretanto, se atentarmos bem, veremos que não há aqui qualquer contradição. É o que afirmam a respeito Walter Brugger e J. de Vries:

“A lei moral natural é imutável na medida em que as exigências morais resultam, por necessidade incondicional, de determinadas esferas ontológicas. Perdurando isso, vigoram em qualquer tempo, independentemente de todas as circunstâncias históricas, as normas morais que dimanam da natureza humana, sempre igual. Ao contrário, as normas que só valem por efeitos de circunstâncias reais, historicamente mutáveis, perdem sua força obrigatória, quando cessam essas condições.”

Não se entenda que vamos adaptar as normas morais às circunstâncias de cada caso e torná-las uma moral individualista ou moral de situação; mas, isto sim, fazê-las permanecer uma moral objetiva, que dimana da natureza humana e da essência das coisas.

Código de Ética Médica — O nosso C.E.M., pela própria designação, é uma coleção sistematizada de leis e princípios relativos às normas de conduta no exercício profissional. Foi elaborado pelo Colendo Conselho Federal de Medicina, nos termos do art. 30 da Lei nº 3.268, de 30-04-57, que criou os Conselhos de Medicina e foi publicada no Diário Oficial da União de 11-01-65, data em que entrou em vigor.
Por se referir a preceitos éticos, em tese, é anterior e superior ao direito positivo. No que se refere ao exercício da Medicina, está o médico, sobretudo por dever de consciência, obrigado a seguir os ditames da lei natural, e o legislador, por sua vez, ao explicitar as leis que comporão o C.E.M. e o direito relativo ao ato médico, deve-se basear igualmente na lei moral natural. É a aplicação, ao campo da Medicina, dos princípios citados.
É necessária essa sistematização, essa codificação dos preceitos da lei natural, pois, sendo eles muito gerais, carecem de uma determinação clara. A aplicação de seus princípios gerais necessita de prescrições detalhadas e precisas, para lhes facilitar a exequibilidade nos atos médicos de rotina quotidiana.
Entretanto, data venia, acnamos que não foram felizes os elaboradores do C.E.M., pois, percebe-se que, numa inversão de valores, procuraram copiar determinadas prescrições do nosso Código Penal, sem terem a preocupação de verificar se estavam ou não de acordo com a lei moral natural. Já o eminente jurista Levi Carneiro, autor do Código de Ética dos Advogados, referindo-se à relação entre o Direito Penal e o Código de Ética, diz:

“E muito antigo, muito sabido, e muito exata, q configuração do Direito e da Moral como dois círculos concêntricos, o segundo mais amplo que o primeiro. A Moral estabelece preceitos muito mais dilatados e mais dificeis que os do Direito.
Já os romanos reconheciam: “non omne quod licitus honestum est.”

Pela importância do assunto e pelo que a ele se relaciona nos tempos atuais, vejamos, por exemplo, o art. 54 do C.E.M., que repete de maneira fiel o art. 128 do Código Penal, permitindo, incongruentemente, as duas hipóteses de isenção de penas previstas pelo crime de abortamento; e, justamente, quando trata da proteção da vida humana, que é o escopo mesmo da Medicina. A esse respeito, o Professor Afrânio Peixoto, de indiscutível valor no campo da Medicina Legal, afirma:

“Toda sociedade constituída, toda organização de direito tem fundamento implícito no respeito invioldável à vida humana. Por isso, os crimes contra as pessoas sempre foram punidos, as penas corporais e canitais foram e vão sendo abolidas, a guerra — assassínio coletivo — deixará de existir numa civilização digna desse nome. Este respeito à vida humana começa no momento da fecundação e vai até o último alento da criatura.
O médico, incumbido como técnico de cuidar dela, não pode, sob pretexto algum, sustá-la ou diminuí-la. É uma questão fechada de ética profissional. Não há médico legista que mereça esse nome e não tenha, como dogma, tal preceito de Deontologia. A prática do aborto será, pois, criminosa, e nem faço a ressalva daqueles casos que ainda infelizmente ocorrem, nos quais se oforece ao clínico a alternativa de arriscar a vida da gestante ou suprimir a do feto, porque são transitórias incapacidades da obstetrícia, amanhã provida dos meios de salvar ambas as vidas.”

E o Deputado Ataliba Nogueira — Professor de Direito Penal da Universidade de São Paulo — em um parecer exarado sobre a matéria, quando na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados, diz:

“A Medicina é defensora da vida e ao clínico não incumbe nunca matar. O preceito do Código Penal nada mais é que a escapatória por onde passam os mais abomináveis atos contra a moral.”

Não há razão, portanto, para copiar prescrições do Código Penal em nosso C.E.M., mormente se são contrárias à defesa da vida humana ou a qualquer preceito da lei natural.
Devemos, atentamente, evitar cairmos no relativismo moral, na moral de situação, baseada em um individualismo ético que solapa a lei moral natural.
Na elaboração do Código de Ética Médica, devemos ter sempre presentes os preceitos da lei moral natural, especialmente, em se tratando da Medicina, os direitos inatos, necessários, inalienáveis da Pessoa Humana. Na elaboração das normas de conduta, pelas quais vamos pautar o exercício da nobre profissão médica, importa, sobretudo, lutarmos para que a Medicina ocupe na sociedade o lugar que sempre lhe foi reservado, quer pelo seu alto escopo de proteção e defesa da Vida Humana, quer pela lisura do comportamento dos seus cultores,

 

VI. PROTEÇÃO DA FAMÍLIA E PATERNIDADE RESPONSÁVEL!

“Antes mesmo de te formar no ventre materno, eu te conheci; antes que saísses do seio,
eu te consagrei.”

Jeremias 1,5

“O valor da pessoa humana
exige que sua dignidade seja respeitada no próprio nível
das fontes da transmissão da vida.”

Pe. Ney Sá Earp

Proteção da família — Acima dos fatores de caráter meramente material ou econômico, relacionados com a organização e proteção da família, os poderes públicos deveriam promover, de forma cuidadosa e especialíssima, um ambiente de moralidade geral, entre outros aspectos, naquilo que se refira à exploração exagerada e abusiva do sexo, por parte dos poderosos meios de publicidade. Vivemos em um ambiente de poluição moral em que o erotismo é artificialmente exacerbado. O cinema, a televi-' são, o rádio, a imprensa, o teatro, os espetáculos frívolos, a literatura, a exploração do nu, em todas as suas formas, contribuem para formar uma atmosfera carregada de sexualidade, que deprecia os valores fundamentais da vida familiar, estimulando de maneira constante o exercício desordenado dos instintos primários. É óbvio que uma das principais e urgentes medidas que o governo deve adotar — não só por motivos éticos mas, e inclusive, para que se evite o amadurecimento prematuro e inconveniente da nossa juventude, o relaxamento dos costumes e a procriação irresponsável — é a de promover, por todos os meios ao seu alcance, o saneamento do ambiente espiritual e moral da sociedade. Com esses prematuros estímulos, com o uso e abuso dos contraceptivos que são colocados à venda, sem a menor interveniência das autoridades, com a multiplicação irresponsável dos móteis e similares, acabaremos vendo implantada em nosso País a prostituição institucionalizada, a fonte estimuladora dos abortos, da violência, da propagação de doenças que já haviam sido praticamente abolidas, tais como a sífilis, a blenorragia e as demais doenças venéreas que são transmitidas em grande escala, e, se mal tratadas, vão constituir riscos reprodutivos e de infertilidade, muitas vezes irreversível,

Paternidade responsável — A paternidade responsável é implícita ao próprio exercício da função conjugal.
O problema que se coloca é: como fazer uma honesta e consciente paternidade responsável? O consenso universal nos diz que existem ações honestas e ações desonestas: nem todos os atos humanos são bons e honestos. No modo como se realizar a paternidade responsável é importante, sobretudo, salvaguardar a dignidade da pessoa humana. Só há verdadeiramente progresso, só há o desenvolvimento do homem quando são desenvolvidas as potencialidades naturais de humanização. Muitas vezes, a ciência e a técnica, quando mal empregadas, são desumanizantes. Se a fissão e a fusão nuclear são empregadas para impor o terror atômico, ou se conhecimentos de Psicologia são empregados para lavagens cerebrais, não se pode falar de crescimento humano. O homem, no seu agir, não pode ser inconsequente e desorientado. Ele necessita de normas objetivas de comportamento, de critérios objetivos de moralidade, que não devem ser confundidos com costumes (uso, convenção). Estes devem ser informados pelas regras morais, se se quer promover a dignidade humana. A consciência moral é uma necessidade básica do ser humano e isso é muito importante nesse momento histórico, pois que — não é difícil de concluir — a crise da humanidade, a crise do nosso mundo, é de natureza moral. A técnica em si é neutra, indiferente; depende de como o homem a utiliza ou para quê.
Por exemplo, fazer aborto, mesmo dentro das melhores técnicas, consiste em matar seres humanos inocentes e indefesos. Não se pode falar em progresso humano quando se institui a lei do mais forte! O aborto continua sendo um crime mesmo se houver omissão legal da punição.
Quais são, portanto, as características de uma paternidade consciente humanizante? Considerando que a função do médico é a de prevenir e curar as doenças dentro das premissas da saúde e da normalidade do seu cliente ou da sua comunidade, quais são, para o médico, as linhas mestras de uma paternidade consciente conforme a natureza humana?
Do ponto de vista ético, é necessário não abrir mão dos valores genuinamente humanos que as soluções pragmáticas desprezam. Dentre esses valores, ressalta O respeito à integridade morfológica, fisiológica e psicológica da pessoa humana. Quanto mais se destrói o processo natural do ato, tanto menos ele se conforma à sua instituição objetiva. Os processos artificiais de planejamento familiar não consideram essa desnaturação do ato.
Daí todos eles terem contra-indicações médicas, algumas de natureza grave, absolutas, como é o caso dos anovulatórios; outras vezes, menos graves, como é o caso do coito interrompido, do condon, do diafragma, etc. cujas perturbações psicológicas para o relacionamento conjugal são conhecidas e não desprezíveis. Também é necessário reafirmar, dentro da sexualidade humana, o respeito que se há de ter pelo outro — o respeito à dignidade humana — e denunciar, vigorosamente, uma tendência da própria sexualidade: o instinto de posse e de dominação. Há uma tendência, característica do comportamento atual, de colocar o prazer como fim em si mesmo do ato sexual e nessa: perspectiva o outro é instrumentalizado como objeto do prazer. Isso é uma “coisificação” da pessoa humana, que atenta contra sua dignidade própria.
E a sexualidade humana perde a sua bondade natural em detrimento da exaltação do prazer sexual. É a ambiguidade que marca os grandes valores humanos. Em vez de libertar humanizando, o homem é escravizado à sua animalidade instintiva, reduzindo a sexualidade à sua dimensão genital, despersonalizadora. Cria-se, dessa maneira, uma mentalidade fundamentalmente anticoncepcional, causa e conseqiiência do egoísmo e utilitarismo característicos do nosso momento histórico, deturpando, desnaturando aquela bondade fundamental da sexualidade humana. É o egoismo sexual narcisista, imaturo e caracteristicamente irresponsável porque voltado para o próprio prazer e não voltado para a dimensão psicossociobiológica, interpessoal, humanizante, da sexualidade.

Método natural — Esses valores, genuinamente humanos, são preservados no planejamento natural da família. Optamos pelos métodos naturais, entre outras razões porque os métodos artificiais são prejudiciais à saúde e têm proporcionado uniões sexuais pré e extraconjugais, a promiscuidade sexual, aviltando a sexualidade humana e promovendo formas irresponsáveis de comportamento humano, que minam a estrutura básica da família e da sociedade.
Já o planejamento natural da família implica no respeito básico aos processos biológicos da reprodução humana, respeitando igualmente os seus aspectos psicológicos e sociais, tornando a união conjugal a expressão responsável de um bom relacionamento humano.
É sabido que para haver gravidez é necessária a ovulação e que é em torno dela que se localizam os períodos férteis da mulher. A ovulação é precedida e acompanhada de sintomas (muco cervical, elevação térmica, etc.)
que podem ser percebidos com relativa facilidade pelas mulheres. Na percepção desses sintomas, principalmente a presença do muco cervical, com aspectos físicos definidos que caracterizam o período fértil, se baseia o êxito que o método da ovulação — o método Billings — vem alcançando no planejamento natural da família. É um método verdadeiramente científico, comprovado com avaliações hormonais e exames físicos e já submetido a provas experimentais. É bastante simples e prático, aplicável, inclusive, em áreas geográficas de baixo nível cultural. Experiências bem sucedidas foram feitas em países como Filipinas, Irlanda, índia (Bangalore), El Salvador e Nova Zelândia, sob a orientação da O.M.S., que, por sua vez, incluiu o método de Billings entre os de mais alta eficácia (98,5%). É um método aplicável a situações variáveis da fisiologia feminina, tais como os ciclos regulares ou irregulares, ciclos anovulatórios, na amamentação, na pré e pós-menopausa, etc. Para isso, a mulher deve aprender a observar o seu próprio padrão de muco, o que não é difícil, como já tem sido observado por vários especialistas brasileiros, inclusive no ambulatário de planejamento natural da família do Setor de Esterilidade Conjugal do PAM 517.051.402 de Niterói-RJ, onde já vem sendo aplicado o método que se revelou inócuo e eficiente, e que respeita a relação sexual em sua plenitude, é simples, prático e economicamente nada despende, nem mesmo exige pessoal especializado, pois os próprios casais podem propagá-lo, quando orientados para tal,
No método sintotérmico, o período fértil é identificado pela combinação de sinais e sintomas de ovulação, tais como a percepção de muco cervical característico, a dor e o sangramento intermenstrual; o fim do período fértil é identificado pelo desaparecimento do muco cervical característico e pela elevação da temperatura basal corporal.
O método de Billings (conhecido também como “método da ovulação”) baseia-se somente na observação, pela mulher, da sequência de modificações na quantidade e qualidade do muco cervical; admite-se que, virtualmente, todas as mulheres podem identificar os dias férteis e inférteis do ciclo menstrual, atentando para a sensação produzida pelo muco cervical e sua aparência.
Assim, as técnicas do planejamento natural da família se apóiam no fato científico de que as mulheres, ao longo de sua maturidade sexual, correspondente à fase reprodutiva, têm longos períodos estéreis, alternados com pequenos períodos de fecundidade. A capacidade de a mulher reconhecer quando é fértil ou estéril é uma característica importante da sua maturidade pelo conhecimento de si mesma. A partir desse conhecimento, juntamente com o marido, ela é capaz de, numa perspectiva humana de crescimento com responsabilidade, regular o seu relacionamento físico sexual em vista do número de filhos que pode e deve ter.

 

VII. COMENTÁRIOS E CONCLUSÕES

“Não me derramaste
como leite e coalhaste como queijo?
De pele e de carne me revestiste, de ossos e de nervos me teceste, Deste-me a vida, e o amor,
e tua solicitude me guardou.”

Jó 10, 10-12

1. É fato cientificamente comprovado e amplamente difundido que o ciclo de uma nova vida humana tem início com a fecundação do óvulo pelo espermatozóide, ocasião em que se estabelece todo o potencial genético do novo ser e tem início o seu desenvolvimento progressivo e ininterrupto até a morte.
2. Há unidade e continuidade no desenvolvimento do novo ser, o qual passa por todas as fases geneticamente determinadas na célula inicial, sendo, todas, etapas da mesma, vida,
38. Consiste o abortamento provocado direto na morte premeditada do novo ser, em sua fase intra-uterina. É, assim, um atentado contra a vida humana. Por isso, a legislação brasileira o equipara ao homicídio.
4. O direito de existir não emana de simples convenção, mas constitui princípio fundamental de direito natural. É prerrogativa de todo ser humano desde a concepção e é conditio sine qua non de todos os outros direitos. Logo, a Medicina só pode ser aplicada em favor desse direito, e não contra ele,
5. É falsa e perigosa qualquer tentativa de solucionar problemas humanos desvalorizando e rebaixando a vida humana ao nível animal, em qualquer fase de sua existência, de modo a poder ser destruída impunemente.
6. O progresso da ciência — no caso particular das ciências médicas — não deve, nem pode, ser utilizado contra a vida humana, mas a favor e para o bem de todos.
7. Fundamentando-se nos importantes depoimentos científicos atrás transcritos, pode-se afirmar que, atualmente, a Medicina oferece ao médico meios para prosseguir na luta em busca do fim almejado, qual seja a salvação do binômio mãe-filho, não sendo válido o apelo ao chamado abortamento “terapêutico”.
8. O estupro não interfere comprometedoramente no processo fisiológico da gestação dele resultante, e o fato de ser brutal violência não constitui problema obstétrico, não cabendo, portanto, outra conduta médica que não seja a correta assistência pré-natal, coadjuvada pelo amparo psicológico e espiritual.
9. Em casos de gravidez por estupro, a prática do abortamento — extermínio deliberado de uma nova vida humana — consiste em violência ainda mais brutal e incompatível com a consciência médica e com o espírito e a finalidade da Medicina.
10. A permissibilidade legal para a prática do abortamento em “casos especiais” servirá apenas para acobertar delitos ou propiciar alternativa mais fácil, fora da verdadeira solução, diante de situações difíceis a exigir tarefa árdua e de responsabilidade. Constitui, ainda, grave injustiça para com aqueles catalogados dentre os “casos especiais”, excluindo-os injustamente da proteção legal.
11. 'Torna-se cada vez mais fácil prever que o passo seguinte à liberação do aborto será a legalização da eutanásia. A escalada prossegue em ritmo acelerado na sucessão e intercorrência de fatos: Anticoncepção tolerada e depois consentida, estimulada e amplamente difundida — Confusão premeditada no conceito de anticoncepção, incluindo-se, entre os anticoncepcionais, alguns métodos sabidamente abortivos (exemplo típico é o DIU: Dispositivo Intra-Uterino, e também a chamada “pílula do dia seguinte”) — Abortamento legalizado em casos especiais, em que a lei isenta de punição, e agora tentou descriminar — Benevolência legal para outras situações, em que o abortamento é apenas debilmente punido por lei -— Ampliação das permissões legais ao abortamento até a liberação total. — A seguir-se: eutanásia, primeiro “caritativa”, depois eugênica, econômica, social, etc.
12. A ninguém é lícito julgar o valor intrínseco de uma vida humana por suas deficiências, ou. por fatores que lhe são aleatórios, para considerá-la tão insignificante e desprezível que mereça ser destruída.
13. O anticoncepcionalismo, quebrando o primeiro elo da lei moral de respeito à vida humana, favorece a aceitação de métodos criptoabortivos e, depois, do abortamento livremente praticado, fato largamente comprovado; sabe-se que nas cidades do mundo onde mais se pratica a anticoncepção é onde mais se pratica o aborto.
14. As implicações ético-sociais dos métodos artificiais de controle da natalidade, bem como os efeitos danosos sobre o organismo humano e ainda a repercussão altamente desfavorável sobre a moralidade, contribuem para a corrupção dos costumes e consequentemente prejudicam a ordem e a harmonia social.
15. Dispositivo intra-uterino (DIU) é um artefato abortivo sistemático disfarçado em anticoncepcional, é um corpo estranho intencionalmente colocado dentro do útero para impedir — por força de sua presença — o desenvolvimento da gravidez todas as vezes que sua portadora concebe um filho.
16. O planejamento natural da família (opção pelos métodos naturais) implica no respeito básico aos processos biológicos da reprodução humana, respeitando igualmente seus aspectos psicológicos e sociais, mantendo na união conjugal a expressão responsável de um bom relacionamento humano.
17. O método natural é verdadeiramente científico, comprovado com avaliações hormonais e exames físicos e já submetido a provas experimentais, é bastante simples e prático, aplicável, inclusive, em áreas geográficas de baixo nível cultural.
18. A Organização Mundial de Saúde (OMS), após experiências bem sucedidas, incluiu o método natural (método de Billings) entre os de mais alta eficácia (98,5%).
19. O método de Billings (natural), também chamado método da ovulação, é aplicável a situações variáveis da fisiologia feminina, tais como os ciclos regulares ou irregulares, no puerpério, na amamentação, na pré e pós-menopausa, etc.
20. “A Medicina, desde as suas mais remotas origens e em todas as suas formas, sempre se caracterizou pelo conteúdo fundamentalmente moral de suas intenções e de seus atos” (P. KASSAB).
21. Finalmente, “acima de toda lei humana e acima de toda 'indicação', ergue-se indefectível a lei de Deus” (Plo XII).

 

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